Beatrice e Matheus escrita por ACL


Capítulo 30
São Joagno




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/665817/chapter/30

A família Agno é bem grande. Luís Fernando e Maria Glória tiveram cinco filhos e dezessete netos. O filho mais velho, Luís Fernando Filho, também conhecido como Luisinho (ou tio Luisinho) era responsável pelo encontro anual dos Agno, na festa que ficou conhecida como São Joagno. Foi numa delas que Bia e Mati se conheceram, em 2006.

Apaixonado pela cultura brasileira, Luisinho comprou um terreno enorme no interior de Pernambuco e construiu uma casa grande mas modesta, que foi melhorando com o passar do tempo. Era uma casa de quatro quartos que comportou a bem a família em um momento, se tornou pequena em outro e agora, voltou a ter um tamanho suficiente, já que a terceira geração cresceu e não tinha mais tanto tempo para a casa quanto quando eram mais jovens.

Em 2011, entretanto, o São Joagno seria especial. Como se tratava dos 80 anos do patriarca, todos os Agno e mais alguns amigos especiais estariam presentes. Alguns somente para a festa, outros, para o feriado e uns poucos para as férias de julho.

Foi uma ótima distração para Bia, e uma ótima despedida para Mati. Os dois lembrariam dessa época com um calor gostoso no coração, a memória uma época incrível que você só percebe o quão boa era quando ela se vai.

Entre os primos de Matheus e os de Bia, havia treze adolescentes na casa para o feriado. Foi bem divertido, eles estavam sempre jogando alguma coisa, dançando, festejando e levando reclamações tanto por ir dormir quanto por acordar muito tarde.

Bia ficou mais próxima que o normal de Matheus nesses quatro dias, e o normal já era bastante. Eles dormiam no mesmo quarto, o quarto dos 13 adolescentes, e conversavam por horas depois que seus primos tinham dormido. Faziam tudo juntos, o que levava os familiares de Mati a provocarem, dizendo que deveriam namorar.

— Voltamos à era pré Manu e Caio — comentou Bia com Mati quando vó Maria comentou que achava engraçado as duas noras de Antônio serem primas.

No dia de São João, na sexta-feira, dia 24 de junho, aconteceu o São Joagno. Entre comer comidas de milho, estourar bombinhas, se aquecer na fogueira e dançar forró juntos a noite inteira, Bia e Mati lembravam o dia em que se conheceram. Também numa sexta-feira, na véspera do aniversário de 10 anos de Bia.

— Eu odiei ter que vir — Bia comentou enquanto comiam pamonha, depois do forró acabar. — Estava odiando cada minuto até sua mãe nos apresentar.

— Eu também — confessou Matheus. — Nenhum dos meus primos veio naquele ano, eu tava entediado pra caralho.

— Era quase uma festa da empresa que painho e tio Luisinho trabalhavam. Foi um saco mesmo.

— Eu lembro que mainha não deixava a gente estourar fogos. Hoje em dia ela só aceita. Ah, eu acho que eu nunca te disse isso, mas eu tentei jogar sal no fogão uns dias depois, pra testar aquilo que tu me disse sobre sódio no fogo e tal.

— Mentira! — Bia riu. E aí?

— Não sei, mainha me deu uma bronca porque eu estava mexendo no fogão sem ela estar por perto. Ela sempre foi meio maluca da segurança. Não vou dizer que não entendo, mas era bem chato às vezes.

— Eu era tão chata naquela época. Ficava contando pra todo mundo que eu conhecia as histórias que painho contava.

— Você ainda faz isso, de certa forma. Mas eu achava legal. Ainda acho.

Bia e Mati não conseguiam tirar o sorriso do rosto. Não tinha mais ninguém lá além deles, os adultos tinham recolhido toda a comida e a maioria deles tinha ido dormir. Os jovens estavam dentro de casa se acolhendo do frio. Lembrar do dia em que se conheceram era aconchegante.

Eles deixaram a nostalgia tomar conta deles, lembrando de outras histórias que viveram, enquanto se aqueciam à fogueira. Foram interrompidos alguns minutos mais tarde, quando Gabriel Agno veio chamar “os pombinhos” para jogar Eu Nunca.

Nem Bia e nem Mati queriam interromper o momento com um jogo idiota, mas o primo de Mati era bem insistente. Eles foram.

Num movimento instintivo, Matheus segurou a mão de Bia, que, também instintivamente, afastou. Olhou para ele como quem pergunta se ele está doido, mas voltou atrás. Lembrou que passariam um ano longe um do outro e decidiu que aproveitaria o máximo do calor humano dele que pudesse, independente do que as outras pessoas diriam.

Quando chegaram na sala, ainda de mãos dadas, as conversas cessaram. Todo mundo olhava para eles com olhar questionador, mas Bia calou quaisquer perguntas que viriam a ser feitas ao lembrar-lhes do jogo para o qual tinham sido convidados.

Bia e jogos de adolescentes não eram uma combinação muito boa. Verdade ou desafio a levou a uma briga com Mati e, eventualmente, a namorar Caio. Ela não gostava de jogar Eu Nunca também, porque não gostava de se expor. Principalmente entre os primos de Matheus, a quem ela mal conhecia. Principalmente na frente de Olívia, a quem tinha como uma irmã mais velha. Principalmente porque Dora Agno roubou uma garrafa de vodca para o tal jogo.

— Eu não vou beber — ela disse assim que avistou a bebida.

— Que besteira, Bia — comentou Theo. — A gente está em família aqui.

No final, Bia concordou em beber um pouco, se estivesse diluído.

A roda começou em Malu, a prima louca. Ela não é realmente louca, mas ela amava inventar história, então ninguém nunca sabia se o que ela falava era verdade ou não.

— Eu nunca beijei o namorado de uma amiga — ela disse, e bebeu logo em seguida.

Bia nunca entendia quando as pessoas falavam alguma coisa e bebiam logo em seguida, a não ser que ela quisesse que as pessoas soubessem daquilo. E beijar o namorado da amiga não é algo para se gabar sobre. De qualquer forma, ela perguntou se beijar o namorado da filha da madrasta contava e descobriu que só se elas já fossem amigas na época. Então, ela não bebeu.

O jogo seguiu e Bia bebeu bem menos do que imaginou que beberia. Acontece que ela não tinha uma vida tão louca assim, porque os primos de Matheus (e Theo também) tinham tido várias experiências bem malucas. Talvez Clarisse que fosse implicante demais.

— Eu nunca fiz sexo — Bia disse quando chegou sua vez, surpresa por ninguém ter dito isso ainda.

Todos olharam em volta enquanto quase ninguém deixou de beber. Além de Bia e Mati, só Dora, surpreendendo a todos.

— Espera, Bia, você não vai beber também? — comentou Leo o irmão de Dora, que nem morava na mesma cidade que eles, mas ainda era bem próximo a um dos melhores amigos de Caio, então, sabia das fofocas.

— Não, por que eu beberia? — Bia respondeu, confusa.

— Você e Caio não… — ele não concluiu a frase.

E assim Bia descobriu o que Caio vem falando por aí. Bia se sentiu enojada e enraivecida. Leo contou a versão dele, que foi incrementada pela de Olívia e esta foi incrementada pela de Theo. Matheus acrescentou que ouviu comentários no banheiro, mas não imaginou que chegaria a  pessoas a quem ela mal conhecia e que chegaria a outros estados.

Bia sentiu sua privacidade invadida. Era mentira, e Bia fez questão de apontar, então, aparentemente, todas as pessoas ali sabiam disso. Mas, ainda assim, se sentia exposta. Caso fosse verdade, Caio se via no direito de espalhar para todo mundo? Não sendo, ele não tinha vergonha na cara? Talvez Bia fosse a próxima Brunna Magalhães da escola.

Ela correu em direção ao quarto, mas descobriu que lá era o pior lugar para se esconder. Em pouco tempo, todos os primos Agno (e os Matoso) chegariam e veriam a cena patética (em sua opinião) dela chorando. Quando deu meia volta, esbarrou no melhor amigo. Matheus a abraçou e a consolou, tentando fazê-la acreditar que tudo ia ficar bem, apesar de ele mesmo não saber se acreditava naquilo.

Ele a levou para as redes do pátio de trás da casa e eles dormiram do lado de fora, sendo praticamente devorados vivos pelos mosquitos.

No dia seguinte, Bia decidiu que não ia dar moral aos boatos. Ela não era Brunna Magalhães. Tinha dado sorte em ter amigos incríveis, que não acreditariam em qualquer merda que Caio inventava ou que ele não se dava o trabalho de desmentir. Não seria tão fácil, mas isso é um problema para a Bia do futuro. Ela não podia estar mais grata por estar de férias. Decidiu aproveitar um pouco mais o melhor amigo enquanto ele não viajava. Então, ela aceitou o pedido de Mônica para passar as férias de julho lá, longe de todo mundo e com uma internet péssima, que mal pegava no único computador da casa. Quando ela voltasse, no próximo semestre, todos já teriam esquecido. Ninguém mais ia comentar sobre a sua vida não tão interessante

Ela estava um pouco enganada. Bia ainda seria muito alvo da fofoca de seus colegas de escola. E naqueles dias incríveis com Mati, eles não sabiam o tanto que isso ia lhe custar.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Beatrice e Matheus" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.