Beatrice e Manuela não eram amigas. Apesar das tentativas de Alexandre e Leila, nada era muito útil para melhorar o relacionamento delas. Até Matheus tentou intervir, sem sucesso. Era como se o universo conspirasse para que elas não fossem nada filha do parceiro de um dos pais da outra.

No final, Matheus foi o gatilho para desenvolver essa amizade.

Bia e Manu não eram amigas, mas elas tinham algo, ou alguém, em comum: Matheus. Ao contrário da mãe, Bia era até boa em dar conselhos. Quando Manu chegava em casa um pouco estressada depois de um encontro com Matheus, Bia era a mediadora. Quando Manu não sabia o que dar de presente de algum mês de namoro (eu espero que esse tipo de coisa não exista hoje em dia, sempre achei bem ridículo), Bia guiava Manu.

Nem Beatrice sabia porque fazia aquilo. Talvez fosse o dom dela na Terra ajudar os casais a se darem bem, talvez ela simplesmente gostava de falar e dar palpite na vida das pessoas. Seja qual for o motivo, ela não podia deixar de falar com Manu, que entrou e foi direto para o quarto naquele dia.

— O que foi que Matheus fez dessa vez? – perguntou Bia, seguindo Manu para o quarto.

Manu permaneceu de cara fechada, esforçando-se para não chorar. Em algum lugar da cabecinha dela o choro era algo repudiado, um sinal de fraqueza. E ela não poderia ser fraca por causa de um menino.

— Se eu quisesse conversar sobre isso, eu teria ido falar contigo – respondeu, seca.

Bia entrou no quarto de Manu, mesmo sem convite e sentou-se sobre sua cama. Poderia estar sendo um pouco inconveniente, mas decidiu que não sairia de lá até Manuela desabafar sobre o que lhe incomodava. Manu revirou os olhos, ela sabia disso.

— Ele terminou o namoro – sussurrou, ainda absorvendo a informação.

Bia deixou a boca cair.

— O QUÊ? Por quê?

— Bia, eu não estou com vontade de falar sobre isso agora.

— Mas ele pelo menos disse por que ele terminou? Ele não pode ter feito isso do nada.

A paciência de Manuela esgotou-se. Ela levantou-se da cadeira onde estava sentada e abriu a porta do quarto, convidando Bia a sair.

— Chega. Vai procurar alguma coisa para fazer, Beatrice. Quem sabe falar com teu amigo. Só sai da minha frente.

Bia estranhou a dureza de Manu. Reitero que não eram amigas, mas Manuela nunca tinha sido grosseira com Beatrice antes. Bia ainda não tinha muita sensibilidade para lidar com meninas que acabaram de terminar o namoro (estamos falando de uma garota de 14 anos), então ela não percebia a tristeza e o um pouco de rancor na fala de Manu.

Então, cheia de insensibilidade, Bia continuou perguntando sobre o motivo de o namoro de Manu e Matheus ter chegado ao fim. Quem podia conter a curiosidade de Beatrice Olímpio?

— Foi por sua causa, Beatrice – estourou. – Feliz agora? Matheus terminou comigo porque “acha que ainda sente alguma coisa forte” por você. Aliás, que merda de ideia foi essa de beijar meu namorado, agora ex, sei lá, na formatura? Quer saber? Chega de verdade.

Manu, furiosa, empurrou uma Bia cheia de pensamentos e perguntas para fora do quarto e bateu a porta, ignorando a regra número um de Alexandre e Leila: nada de portas fechadas.

Bia não poupou tempo e mandou uma mensagem para Matheus, perguntando-lhe o que queria dizer tudo aquilo. Por que ele terminou com Manu? Por que ele beijou Bia na formatura? O que queria dizer ele ainda sente alguma coisa forte por ela?

Em sua casa, Matheus pensava no acontecido. Tinha a sensação de ter feito o certo, mas não podia deixar de se culpar pelo sofrimento pelo qual Manu estivesse passando naquele momento. Desabafou com Guilherme, mas ele não pode dar muita atenção para o irmão mais novo pois precisaria planejar o aniversário de três anos de namoro com Olívia. Até pensou em conversar com Laís, mas não queria incomodá-la com problemas de adolescente. Foi quando recebeu a mensagem de Bia.

“Como assim você terminou com Manu?????”, com cinco interrogações, para demonstrar intensidade.

Matheus respirou fundo e ligou para a única pessoa com quem não queria falar naquele dia.

— Oi, Bia.

Deixou que ela dissesse tudo o que tinha entalado na garganta. Amigos há quase cinco anos, era de se esperar que Matheus conhecesse Bia, não é? Então ele esperou Bia terminar de falar para explicar-se, mas a última fala de Bia pesou em sua mente.

— Ela disse que você sentia alguma coisa forte por mim. O que isso quer dizer, Mati?

A tendência de Matheus escapar de todo conflito emocional o fez querer fugir da conversa imediatamente. Quis desligar a ligação e dizer que o sinal caiu ou que o celular descarregou, mas não podia fazer isso com Bia.

— Eu sou apaixonado por você praticamente desde o primeiro dia – desabafou, finalmente. – Deveria ter passado a essa altura, principalmente depois de eu começar a namorar Manu, mas não passou. Eu sei que você namora Caio e tal, mas eu não posso mudar o que eu sinto. E não era justo eu continuar com ela estando apaixonado por outra pessoa.

O mudo do outro lado da linha fez Matheus pensar que Bia tinha desligado, mas depois de alguns segundos, ela voltou a falar.

— Eu preciso de um tempo para pensar em tudo isso – outra pausa silenciosa. – Mati, eu não sei o que você espera de tudo isso. Talvez que eu termine com Caio ou algo do tipo, mas isso não vai acontecer. Não quero que você coloque expectativa nas coisas erradas.

Mais tarde naquele dia, Manu foi procurar Bia para desculpar-se. Bia ofereceu um abraço e disse que nenhuma desculpa era necessária, a não ser que partisse dela por não respeitar o momento de Manu. Explicou o que aconteceu na formatura e como não podia controlar o coração de Matheus. Sugeriu algumas músicas de Taylor Swift para ajudar a afodar as mágoas e ensinou a Manu que não fazia sentido conter o choro.

Mais uma vez, Manuela estava se abrindo para uma amizade. Pela primeira vez, Bia estava deixando o rancor de lado.

Infelizmente, nem tudo são flores. Seriam, se eu tivesse escolha. Em algumas situações, você precisa perder alguma coisa para ganhar outras. E, da mesma forma que amizades nascem de formas inesperadas, outras se esvaem de formas mais inesperadas ainda. O importante é que, no final, você nunca está só. Mesmo sem ninguém ao seu redor, você sempre vai ter as lembranças de quem um dia tanto te amou. E isso era uma coisa importante para Bia aprender desde já.