Marcada escrita por Violet


Capítulo 15
Hora de Partir...


Notas iniciais do capítulo

Olááááá meus fofuxos e fofuxas!!! Sejam bem vindos a mais um capítulo de Marcada! Aeoeoeoeoeo. Primeiramente, eu queria dizer que notei um aumento considerável de visualizações essa semana, e isso me deixa muitooo feliz! Mas mesmo assim, não se compara quando vejo um comentário. Gente, vocês não sabem o quanto me motiva saber a opinião de vocês, se não quiserem favoritar ou deixar aquela recomendação, tudo bem... Mas deixem a tia saber o que vocês estão achando da história, isso influencia muito, ok? Bom, sem rodeios, nem piruetas, e vamo que vamooo! õ/
Com amor, ~Violet



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O sol já parecia se pôr quando levantei do transe. Meus olhos ardiam como se tivessem milhões de partículas de areia neles, minha cabeça mais parecia que ia explodir a qualquer momento. Cada parte do meu corpo gritava de dor como se tivesse sido esmagada por um caminhão carregado de chumbo, tudo doía, exceto minha marca. Observei ao redor, e o aroma natural e caseiro me avisara que estava de volta ao meu lar, ou não tão meu assim. Não lembrava de muita coisa que havia acontecido, as memórias ainda se misturavam e me bombardeavam. Mas só de saber que estava com os Ackles novamente, já era um imenso alívio. Observando um pouco melhor, pude notar uma bandeja escancarada para mim na mesinha de canto. Sorri ao lembrar da imagem que aquilo me remetia. Apanhei-a e a pus no colo lentamente, e meu sorriso se desfez ao notar que não havia geléia de amendoim e nenhuma daquelas guloseimas que gostava.

                O excesso de frutas e a forma um pouco desajeitada com que a bandeja havia sido montada, dizia que não era ele quem havia feito. Claro que não, ele havia partido, uma ida sem volta. Ponderei um pouco antes de ler o cartão que pendia debaixo da xícara. “ Sei que não é a senhorita fitness, mas está muito fraca. Então sugiro que coma tudo, e nem pense em tentar me enganar mocinha, ou sofrerá a ira de Derick Ackles! Volto em algumas horas, ursinha!” O bilhete encerrava com um pequeno ursinho desenhado em sua extremidade. Levei alguns longos segundos para processar aquele apelido. Até que um estalo me veio à mente. Mesmo sob protestos dos meus músculos e ossos sofridos, fui até o guarda-roupa e confirmei a origem daquele apelido. Ele havia roubado uma das minhas calcinhas cuja tinha um ursinho bordado. Essa era antiga, mas nunca havia me livrado dela, agora eu tinha que me livrar dele! Cretino! Tinha remexido as minhas coisas de novo, argh!

                Meus pensamentos assassinos foram interrompidos por um pequeno estrondo. Tentei buscar a presença de alguém, mas ao que parecia estava sozinha. Meu coração acelerou quando o abajur começou a piscar freneticamente. Um vento frio arrebatara a janela e a cortina já não sossegava. Mesmo depois de fechá-la, os arrepios e um mau pressentimento continuavam a me incomodar. O ranger da madeira me alertava sobre alguma aproximação. Recuei alguns passos até minhas costas se reterem na parede fria, cerquei o peito com os braços tentando impedir  que meu  coração saltasse para fora. As luzes instáveis não me permitiam uma visão muito clara do ambiente, dei um pequeno grito interior quando ouvi o barulho bruto da porta rangendo enquanto era aberta lentamente. Tentei focar naquele espaço e avistar alguma silhueta, mas não havia nada. As luzes haviam apagado de vez e um raio cortara o céu lá fora, até então nem tinha reparado na tempestade que estava por vir.

                Não sabia se meu corpo tremia de frio, de medo ou se estava tendo algum ataque epilético. Olhei para o meu braço esperando que a marca brilhasse ou ardesse, mas ela parecia só mais uma marca de nascença. Seja lá o que fosse, nada tinha a ver com ela. Minha visão voltou a focar na porta entre aberta, já estava quase pedindo para que entrassem logo  para acabar com aquele suspense todo. Mais um estrondo e a porta bateu fortemente, um segundo clarão atravessara o céu e me permitira ver a silhueta que tanto esperava. O quarto permanecia escuro, não pude assimilar a identidade de quem era, mas a julgar pela postura, era um homem. Ele tinha o dobro do meu tamanho e estava a centímetros de distância de mim. Um enorme e desesperado grito foi a única reação que consegui esboçar. O terceiro clarão revelara a sua identidade e um alívio percorreu minhas vértebras. Era Sam, num estado quase irreconhecível, mas era ele.  Quando as luzes retornaram e finalmente pude observá-lo com detalhes, tive que me segurar para não cair. Ele estava num estado deplorável, de longe não era o Sam que conhecia.

                Sua pele estava pálida, e com um aspecto degradante. Estava muito mais magro do que o normal, era possível avistar nitidamente cada costela sua, a clavícula, tudo.  Havia somente a pele e os ossos. Sua aparência era de um corpo dessecado, suas veias estavam dilatadas, ele usava uma calça social um pouco suja, e não vestia nenhuma camiseta. Seu cabelo estava totalmente desarrumado, e a barba estava cheia, totalmente o contrário do que ele costumava ser. Tive vontade de chorar quando avistei seu semblante, era tão sem vida e sem expressão. A falta de peso exorbitante havia modificado o molde do seu rosto, seu maxilar quase nu, mostrava um aspecto desnutrido. Tentei dizer algo, mas parei quando vi aquele par de olhos mortos cruzarem os meus. Definitivamente, não era o meu Sam.

— O que aconteceu com você? – perguntei ainda relutante e ele desviara o olhar para um ponto cego.

— Eu estou morrendo, Jessie. – respondeu ainda sem me encarar, numa voz fraca e rouca.

— Quem fez isso com você, Sam?! – tentei me aproximar e tocar o seu rosto, mas ele me encarou de volta.

— Acabou para mim, não há mais esperança. – disse secamente, e voltei a encarar aquele corpo deteriorado, ele parecia ter que fazer uma força anormal para falar.

Não me contive, ignorei qualquer relutância e o envolvi num forte abraço. Mesmo sem ele retribuir o gesto, continuei abraçando-o e repetindo que iria ficar tudo bem. Sua pele era fria e ressecada, era como tocar um cadáver.

— Vamos encontrar quem fez isso com você, e vamos fazê-lo pagar por tudo, Sam. Eu prometo!

— Ou eu mesmo posso fazê-la pagar... –  sua indagação me intrigara profundamente, e antes que eu pudesse recuar e olhá-lo nos olhos, já sentia uma dor aguda na lateral do meu pescoço.

Ele me pressionava com uma das mãos, e com a outra ele segurava uma espada que já tinha sua ponta íntima à minha pele. Uma lágrima de sangue escorrera pela minha nuca e pousara na camiseta branca.

— Sam, o que você ta fazendo?! – gritei,  já desesperada, mas ele não me soltara. Era quase impossível respirar, pela primeira vez provava da sua força.

— Me desculpe, Jess... Mas eu não posso deixá-la viver – parei para encará-lo pela minha visão periférica, e haviam lágrimas escorrendo daquele rosto magro. – Se tivesse a mínima chance de salvá-la, eu faria, mas não há como. Eu vi, Jess... Eu vi. Você não vai resistir, eu vi seu corpo sem alma, o caos, a destruição, a guerra... Eu não posso deixar que isso aconteça. Eu tenho que protegê-los, é meu dever... eu não posso! – ele já soluçava intensamente e sua mão tremia freneticamente, podia ver a enorme força que ele estava fazendo para empunhar aquela espada.

— Tudo bem. – disse num tom firme e terno. Segurei a mão que empunhava a espada, e direcionei-a para a minha garganta, ajudando-o a manter foco.

— Jess... – seu semblante triste e desesperado me despedaçava por inteiro. Foi então que sorri mesmo sob protesto de uma lágrima, fechei os olhos e aguardei.

                Respirei fundo e esperei que ele acabasse com tudo aquilo. Mas ao que parecia, ainda estava viva. Abri os olhos quando senti um líquido quente escorrer pelo meu ombro esquerdo. Era sangue, mas não o meu. Ele estava caído sobre o meu corpo, e da sua boca era expelido uma quantidade considerável de sangue. A espada estava cravada no seu abdômen, e ele se retorcia de dor até ir de encontro ao chão.

— Sam!!! – gritei, indo ao seu encontro.

— Ah não, de novo não! – ouço uma voz feminina surgir atrás de nós.

Ela era alta, magra, mas com algumas curvas acentuadas. Usava uma calça jeans escura e justa, uma regata branca e um casaco de couro marrom. Era realmente bonita, os olhos castanhos claros só não chamavam mais atenção que os lábios carnudos enaltecidos por um gloss leve. Sua pele era morena clara e parecia ser macia como um pêssego. Os cabelos castanhos iam até a altura da cintura, e era um ondulado que emanava brilho e hidratação, estavam presos no alto da cabeça.

— Ele, ele... Temos que buscar ajuda!

— Eu sou a ajuda. Com licença? – ela pediu passagem para se aproximar dele, e cedi.

— Você é--------

— Kristen. – respondeu, enquanto verificava a pulsação dele.

— O que é isso? – perguntei apontando para outros ferimentos que se abriam pelo seu corpo.

— Não é a primeira vez que ele “se mata” para poupar a sua vida. – senti uma aspereza no seu tom.

— Como assim, não é a primeira vez?

— Ele já tentou te matar outras vezes, só que você ainda estava desacordada. Uma delas o Derick teve que interferir. Mas depois ele sempre acaba  enfiando uma espada em si próprio.

— Mas por que ele quer me matar? – ela passava um líquido pastoso e cinza, que me remetia o barro puro, em cada uma das suas feridas.

— A anciã que vocês visitaram teve uma visão de você divando com uma foice e trazendo caos e destruição. Provavelmente não era você mesma, o único caos que você parece trazer é para o coração deles – vi uma indireta certeira naquela sobrancelha arqueada. – Resumindo, pra impedir que a deusa retorne, ela queria você morta, e passou essa tarefa para o Sam. – ambas olhamos para ele, que parecia mais um corpo sem vida.

—  A quanto tempo isso ta acontecendo?

— Uma semana mais ou menos...

— Nem posso imaginar o quão ele deve ter sofrido nesse tempo. – indaguei, tocando sua face fria e pálida.

— Mas eu posso. O veneno da mordida está matando-o aos poucos, e vai continuar matando enquanto ele não cumprir o propósito dado pela anciã. Além de ter que lidar com esse fardo, ele tem que lutar contra si mesmo a cada segundo.

— Ele estava tentando me proteger...

— Sim, mas veja até que ponto essa proteção chegou. Você está forçando de forma indireta ele se esfaquear várias e várias vezes, pondo até mesmo seu irmão contra ele. Sabe o quanto Derick sofreu ao ter que lutar contra o próprio irmão, mesmo sabendo o quanto ele estava sofrendo. Sabe? Pois eu sei, é uma dor infinita que você nunca vai sentir! – suas palavras saíam como lâminas afiadas cortando tudo à sua frente, e eu já me sentia em pequenos pedaços estraçalhados. – Olha, eu sei que não é sua culpa, você não pediu por isso – ela apontou com o olhar para a minha marca. – O que estou tentando dizer é... Eles já estão se arriscando muito só em estar com você, entende? Você matou os guardiões da fênix, isso te torna uma criminosa perante o céu e inferno. É questão de tempo até vocês serem pegues. E eles já tem os próprios fardos para carregar, não precisam de mais um. – tentei dar uma resposta, ou alguma justificativa, mas ela estava certa, completamente certa.

                Ficamos ambas em silêncio por um bom tempo. Ela levou Sam para o seu quarto e eu a ajudei. Haviam alguns panos sujos de sangue, e um vidro de morfina na mesinha ao lado da cama. Todos os objetos cortantes haviam sido retirados do cômodo, e comecei a pensar no quão ele havia sofrido ali enquanto eu dormia. Ela umideceu  um pano limpo e começou a limpá-lo, fiquei observando o quão cuidadosa ela era, seja lá a ligação que ela tinha com eles, era muito forte.

— Pode me passar aquele lenço?

— Onde está o Derick? – perguntei, já lhe entregando o objeto.

— Ele foi pegar mais ervas para que eu possa controlar o veneno. Está se espalhando rápido. – ela analisava o corpo de Sam com um imenso pesar nos olhos, senti a culpa cair sobre os meus ombros.

— Sinto muito...

— Pelo quê? – ela continuava cuidando dos ferimentos dele.

— Por fazê-la passar por tudo isso, a culpa é minha afinal.

— Não tem que pedir desculpas. Estou aqui por eles, não por você. Não recusaria nunca um pedido de ajuda deles. Principalmente do Derick, você não tem muitas opções quando ele te pede algo. – nós duas rimos com o comentário. Pelo menos nisso concordávamos.

— Você parece ser bem íntima deles. Qual sua ligação com eles exatamente? – perguntei receosa por estar invadindo a sua privacidade.

— Hm... Ah, é uma longa história, carrega séculos e séculos. Digamos que nós temos um vínculo forte, só isso.

— Interessante, queria saber um pouco dessa história. Sabe... não temos muita coisa pra fazer até o king-kong chegar, então...

— King-kong?! – ela começou a se contorcer em gargalhadas. – Essa é boa! Eu costumava chamá-lo de Akman!

— Akman?

— É um demônio antigo que assustava as crianças. Ele era grande, forte e muito grosseiro. Além de ser um pouco nojento, ele comia os próprios resíduos, se é que me entende... – fizemos uma expressão enojada, acompanhada de pequenas risadas.

— Você parece conhecê-los bem... – arrisquei.

— E você parece ser bem curiosa, mocinha... Bom, é verdade que os conheço mais que bem. Nós crescemos juntos, e passamos por muitas coisas juntos. Principalmente depois que fomos expulsos de lá.

— Expulsos? – perguntei, demonstrando um maior interesse. Me recostei na poltrona ao lado da cama, e fiquei observando-a cuidar dos ferimentos do Sam.

— Sim, somos demônios, não humanos. Ou você achou que havíamos nascido aqui?

— Não, eu só... – ponderei um pouco e percebi que não sabia nada sobre suas origens.

— Nós éramos muito felizes. Foi uma boa época, e teria continuado ser se... – ela me observou com um olhar hesitante. – Acho que já falei demais.

— Se eram tão próximos assim, por que o Kaeth odeia tanto você? – pude notar o seu semblante mudar ao ouvir o nome dele.

— Isso é outra longa história, talvez ele te conte um dia. Mas nem sempre foi assim, nós tínhamos um vínculo maior do que você possa imaginar. Na verdade... – ela havia terminado de fazer os curativos, e já se virava para mim, me dando total atenção. – Depois que fomos expulsos do Inferno, logo que chegamos aqui, as coisas não começaram a ir muito bem. Os três estavam afastados e viviam a própria dor.

— Pelo mesmo motivo, eu presumo...

— Não, não. Quer dizer...também! – a vi apoiar a mão sobre o peito e ponderar, como se estivesse se perdendo nas próprias lembranças. – Sam tinha que suportar a dor de todos como sempre. Além da vergonha de ter sido expulso do próprio clã, ele sofria com a rejeição que havia passado a sofrer do pai. Esse sempre deixava o peso da responsabilidade cair sobre os ombros dele. Ele era muito exigente, e cobrava muito do Sam. Queria que ele fosse o mais forte para assumir a liderança, Sam nunca quis isso, mas o fazia por causa do pai. Houve uma época em que ele se apaixonou por uma garota, muito bonita, diga-se de passagem. Fora o primeiro amor da vida dele, mas ela era um demônio de classe inferior. Quando seu pai descobriu que ele estava apaixonado por ela, não demorou muito para ir tomar satisfações. Ele dizia que o sentimento o deixava vulnerável, e que ele seria o futuro chefe da família, logo não poderia se dar ao luxo de sentir algo assim. E ele aprendeu isso da forma mais difícil – ela o olhava com um olhar entristecido e logo entendi do que se tratava.

— O que aconteceu com ela? – perguntei, temendo a resposta.

— Ela morreu.

— Que horror!Céus, nem imagino o que ele deve ter sentido quando soube!

— Ele presenciou a sua morte. Na verdade... – a vi hesitar veemente antes de continuar. – ele mesmo a matou. Seu pai pediu uma prova de lealdade forçando-o a matar a mulher que ele amava. Desde então ele se fechou totalmente para sentimentos e emoções. Ele se culpa até hoje pela sua morte, e carrega esse fardo, porém não deixa transparecer. Hoje ele pode se esconder nesses ternos caros, mas ele já teve que sujar muito as próprias mãos para proteger a família.

Ficamos algum tempo observando Sam, que parecia dormir num sono profundo. Ela trocou seus lençóis antes de continuar a contar sobre as origens dos Ackles.

— Derick foi o que menos sofreu, mas deu um belo trabalho. – ela sorria enquanto absorvia as memórias – Apesar do jeito marrento e esquentado, ele era muito sensível quando era criança. Sempre foi muito apegado à mãe. Ela amava todos os três, mas pelo fato do Derick ser mais dependente, ela o tinha como um xodó. Quando ela morreu dias antes deles serem expulsos, Derick entrou em depressão. Ele arranjava encrenca com cada um que cruzava seu caminho, e acabou piorando de temperamento.

— Imagino que sim... E o Kaeth? Também teve um motivo particular? – a vi cravar o olhar na minha alma, como se vasculhasse toda a minha vida nela. Tentei manter o semblante seguro, ela retribuiu com um olhar irônico e uma pequena risada.

— Kaeth sofreu também, muito mais que os outros dois. Ele ficou um bom tempo isolado nessa ilha. Não queria ver ninguém, falar com ninguém, ele não vivia, só existia.

— E o que o fez mudar?

— Eu. – disse, não a fim de se exibir, mas naturalmente, o que machucava ainda mais. Podia ver nos olhos dela, na forma como ela falava dele, o vínculo dos dois era muito mais forte do que aparentava ser. – Nós fizemos uma promessa um ao outro ali – ela apontou em direção à um pequeno pico numa montanha através da janela. Seu semblante brilhava ao lembrar.

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— Kaeth? – do alto da montanha chamava Kristen. Ela usava agasalhos em cima de agasalhos. O inverno havia chegado, e a temperatura não passava dos doze graus negativos. Ela caminha alguns passos, observando a neve que pendia dos galhos, não havia nenhum sinal de alguém ali. Com um salto veloz, ela sobe mais duas montanhas, é quando ela avista uma silhueta sem camisa e sentada na neve fria. Ele não parecia se incomodar com o gelo queimando sua pele. O vento frio balançava aqueles cabelos loiros, e pequenos fragmentos da neve se depositavam em seus ombros.

— Vai acabar pegando um resfriado desse jeito. – indagou a morena, já se aproximando.

— Eu vou morrer disso?

— Hm... Não, mas eu posso dar um jeito nisso! – concluiu entre risadinhas, e só então ele passou a encará-la. – Não cansa de ficar nesse lugar?

— Não cansa de me perseguir?

— Hm... Também não! – um último olhar se teve ali, e ambos voltaram a encarar o mar que já estava parcialmente congelado. – Kaeth, não pode passar a eternidade se martirizando.

— .................

— Kaeth-------

— Olha Kris, eu agradeço pelo o que está tentando fazer por nós, mas... Eu não quero ficar alegre, eu não quero fingir que nada aconteceu. Eu não mereço sequer estar vivo. A única coisa que eu posso fazer agora, é me martirizar pela eternidade até não aguentar mais. Não há mais salvação pra mim, Kris... – ele continuava sem encará-la.

— Claro que há! Nós podemos recorrer, falar com o Crowley, quem sabe ele não nos deixe voltar e-------------

— Não! Eu sou um assassino, Kris! Eles jamais vão me deixar voltar. Quantas vezes vou ter que repetir?! E mesmo que eu pudesse voltar, não tem mais nada para mim lá, nada...

— Você tem seus irmãos! Eles te amam, e estão preocupados com você. – disse, tentando se aproximar mais, mas ele permanecia focado na visão à sua frente.

— Sam me odeia por tudo que eu causei à família, Derick é um egoísta e só está afogando a própria dor em raiva. Tudo por minha causa, eles estão sofrendo por minha culpa!

— Não, você não teve culpa, Kaeth. Nós dois sabemos que não foi sua culpa.

— Claro que foi! Se eu não tivesse... – seus punhos estavam cerrados, e seus olhos azuis reluziam com algumas lágrimas que já se acumulavam.

Notando a incapacidade de falar, e a dor das lembranças envolvendo o loiro, Kristen o abraça subitamente, acolhendo seu rosto contra seu peito, deixando que ele se livrasse do próprio tormento. Não houve retribuição do gesto, ele apenas se deixou consolar. Ela o afagava como uma criança com medo do escuro. Após alguns instantes, ela o afasta sutilmente forçando-o a encará-la nos olhos. Ele a observa intrigado e ela lhe defere um moderado tapa, mas para reanimá-lo que feri-lo.

— Isso, é por você dizer que não tem nada. Eu estou aqui por você, Kaeth. Sempre estive, e sempre vou estar. Então pense bem antes de dizer que não há nada para você.

— Kris...

— Não me venha com “Kris”. Eu mais do que ninguém deveria estar sofrendo agora, você sabe muito bem o porquê. Mas não, estou aqui em pleno frio congelante consolando você! Eu saí de lá por sua causa, Kaeth. Eu escolhi vir pra cá por sua causa.

— Acho que não to entendendo...

— Não, Kaeth! Você nunca entende nada! Só quero que me prometa uma coisa, em nome de tudo que já passamos. Me prometa que não vai deixar de viver por causa do que aconteceu. Me prometa que vai sair daqui e se desculpar com seus irmãos, e voltar a ser a velha e maluca família Ackles! Me prometa que vai ficar bem, por favor... – agora seu tom já não estava tão autoritário como antes, e sim terno e sensível.

— Eu prometo! – seus olhos já ganhavam brilho novamente. E agora fora a vez de Kristen ser consolada. Ela se jogara nos braços do loiro, envolvendo num forte abraço, que agora... era retribuído.

— Eu te amo! – um baixo e abafado sussurro se teve ali.

— Disse alguma coisa? – ainda envolvidos num abraço, Kristen o responde com um acenar negativo com a cabeça, envolvendo-o mais forte ainda nos braços.

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— Kristen? Tá me ouvindo? – perguntei pela décima vez, mas ela parecia estar em alguma espécie de transe. Piscou algumas vezes antes de se pronunciar.

— Hum? Desculpa, ruivinha... O que eu estava mesmo falando? Bem, não importa. Deixa eu te dar um conselho de alguém bem mais experiente que você. – ela se levantara da cama e vinha em minha direção. Depois de ficar de joelhos frente à poltrona, igualando nossas alturas, ela continuou. – Eu os conheço há muito tempo, e arriscaria a minha vida por qualquer um deles, e mataria se preciso fosse – senti uma pequena ameaça nessa última frase. – E sei que você também faria o mesmo... Se você realmente os ama, deixe-os em paz. Nós duas sabemos que essa sua marca só trouxe problemas até agora. Você está sendo caçada por todo o mundo, e consequentemente, eles também. Sam não vai aguentar muito tempo até matar você de vez, e lógico... Derick não vai deixar, o que vai levá-lo a enfrentar o irmão. Você só trouxe coisas ruins para os Ackles. Primeiro o Kaeth, afastando-o da própria família, depois o Derick fazendo-o sofrer desse jeito com essa sua indecisão, e agora o Sam... Onde isso vai terminar, Jessie?

Fiquei alguns instantes presa ao silêncio, absorvendo aquelas lâminas disfarçadas de palavras que vinham da sua boca e me acertavam em cheio. Ela tinha razão, eu só os tinha feito sofrer, teria que fazer algo logo.

— O que sugere que eu faça?

— Você sabe o que deve fazer... – concluiu já se levantando e deixando o quarto.

                Algumas horas mais tarde...

                A noite já havia caído, e Sam já despertava lentamente. Ainda sob protesto de dores, ele se recosta na cama e observa o lugar ao seu redor. Ele toca o abdômen e tórax, lugar onde haviam os ferimentos, que agora já pareciam totalmente curados. De repente, uma crise de pequenos espirros se inicia, ele busca a causa e não demora muito para avistar o culpado. Uma pequena gatinha ronronava, roçando ao seu lado na cama.

                Na sala de estar, Derick e Kristen permaneciam concentrados em alguma conversa, quando são surpreendidos por Sam que descia as escadas vestindo seu hobby de seda preto, usando uma pequena máscara e no colo carregava “Key”.

Alguém pode me explicar o que significa isso? – perguntou, erguendo um pouco a gatinha que continuava a ronronar.

— Pelo visto o veneno já saiu completamente. De nada, senhor! – ironizou Kristen, mas fora ignorada.

— Derick... – persistiu o irmão, e Derick jogou um bilhete sobre a mesa.

— Veja você mesmo.

                “Queridos Ackles, sei que bilhetes são meio clichês, mas não sou boa em despedidas, então... vai assim mesmo! Primeiramente gostaria de me desculpar com todos vocês, especialmente com você Sam. Kristen disse que o veneno poderia demorar a sair, então espero que fique bem. Sinto muito por tudo que teve passar esses últimos dias. Obrigada a cada de um vocês por tudo que fizeram por essa humana inútil. Por terem me ajudado, me dado um lar (muito luxuoso, diga-se de passagem), e apesar dos pesares, o principal de tudo... Amor! Infelizmente não vou poder acompanhá-los em suas jornadas. Mas quero que saibam que agora mesmo já estou sentindo saudades, droga! Malditas cebolas invisíveis que me fazem chorar! Mas, não vamos ficar tristes, não é mesmo?! Sam, obrigada pelos conselhos, pelas dicas de moda, e por mesmo não merecendo, ter me ajudado até o último minuto. Derick, não deveria agradecer nada, já que as únicas coisas que você fez foi me irritar, e roubar minhas peças íntimas! Mas obrigada mesmo assim, por ter me ensinado a ficar mais forte por aqueles que amamos, e por ter me protegido até o fim. Ao Kaeth, digam que agora ele está livre e pode voltar sem medo, agradeçam a ele por mim, e peçam para ele ter cuidado e não beber tanto. Acho que vocês já têm alguém para cuidar de vocês, Kristen... Eu deixo essa tarefa árdua com você. Bom, é isso... Ah, já ia esquecendo... Estou deixando uma parte de mim aí, só para garantir que não esqueçam de mim. Já devem tê-la notado. Ela se chama “Key” e é super dócil. Ela gosta de biscoitinhos de amendoim, e bolinhos de atum, separei alguns na geladeira. Sei que o Sam tem alergia, mas acho que podem dar um jeito nisso, não? Não a deixem sozinha, e preservem a virgindade dela! E se acaso ela sujar o seu tapete indiano, Sam... Por favor, releve, ela só quer brincar. Bom, então é isso... Acho que o papel vai estar todo encharcado de lágrimas depois, mas... enfim, eu amo todos vocês!

P.S: Prometo que vou recompensá-los por tudo que fizeram por mim, desejem-me sorte!

                                                                                                              Com amor, Jess!”

 — Isso não é tudo... – indagou Derick, observando o irmão que parecia surpreso. – Eu encontrei isso aqui. – disse, apontando para um imenso livro sobre a mesa que estava entre aberto. Sam se aproxima a fim de averiguar seu conteúdo. Era um livro antigo que mostrava a localização de portais. A página destacada direcionava para o portal do submundo.

— Parece que ela foi para o Inferno, literalmente! – concluiu Kristen, e ambos se entreolharam em preocupação.


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