1.

A primeira coisa de que me lembro é de estar debaixo de alguma coisa. Era uma mesa, eu via uma das pernas de madeira. Isto foi no Mexico. Eu devia ter dezesseis ou dezessete anos de idade. Eu gostava de estar ali, ninguém parecia saber onde eu estava, exceto a filha do gerente. Ela me empurra para o lado para que ela possa ter um espaço para permanecer ali em baixo da mesa também. Regina possuía a mesma idade que eu, mas seus traços eram típicos de mulheres do seu país, com sua pele levemente bronzeada, enquanto eu era totalmente pálida. A primeira coisa que me lembro de ouvir Regina dizer foi “Você é estranha”.
Ela disse isso pela primeira vez logo que conseguiu se acomodar ao meu lado, e voltaria a repeti-lo por diversas vezes ainda.
Concluo que a minha adaptação em outro país tenha sido difícil. Eu tinha mudado para Acapulco com meu pai, pois o meu avô, James, havia deixado seu patrimônio para ele, que era seu único herdeiro, os dois tinham tido uma discussão quando meu pai ainda era jovem que no qual um nunca soube o motivo, desde então nunca mais trocaram uma única palavra, eu nem se quer conheci meu avô. Mas agora David, meu pai, iria comandar o hotel, que foi deixado pelo seu pai. E assim foi feito, meu pai dedicava sua vida ao hotel, mas nunca deixou de ser um pai presente na minha vida. Eu vivia pelos corredores, ajudava no inglês com os turistas, e Regina sempre estava por perto. Construímos um grande amizade ao longo desses treze anos. Ela esteve comigo quando assumi minha orientação sexual para o meu pai, chorou comigo quando finalmente contei sobre a morte da minha mãe no parto, que até então eu escondia a verdade, ela ofereceu o seu colo quando eu tive pela minha vez meu coração partido, e acredito ter feito tudo o que ela fez por mim na mesma proporção, sempre que ela precisou.

2.
Lembro do fusca amarelo. Do banco elevado, e do couro macio, e nos dias quentes, pelas manhãs, e também várias outras vezes, eu e Regina éramos obrigadas a lavar a lataria. Não que fosse ruim, ao contrário, nos divertíamos muito, praticamente tomávamos banho enquanto o carro era lavado.
Aos domingos, meu pai nos levava para passear no fusca. Meu pai gostava de dirigir o veículo, e sábia que era uma boa forma de aproveitar o tempo comigo. Há um domingo em especial de que me recordo. Meu pai não conseguiu escapar do serviço que o hotel lhe dava, então decidi que eu mesma iria dirigir e passear com Regina.
- Emma - perguntou a morena - ficou louca?
- Tranquila. Ninguém vai ficar sabendo.
- Eu não acho essa uma ideia legal.
- Entra logo nesse fusca.
Regina ficou estática em seu banco enquanto avançávamos pelo caminho. Eu dirigi o carro para o acostamento, estacionei perto de uma certa que tava para a praia, descemos do veículo e na areia ficamos sentadas. Regina se acomodou entre minhas pernas e encostou suas costas no meu peito, era de costume ser assim, mas quem nos visse poderia pensar que éramos um casal, Regina nunca se importou com o que pensavam ou comentavam da nossa relação, sempre foi e fez o que ela tinha vontade em relação a mim.
- Quero te fazer uma proposta. - disse Regina. Ela nem havia se virado para fazer menção a mim, apenas disse tais palavras com os olhos ainda voltados para o mar.
- Diga.
- Se você não se casar, e nem eu, aos trinta anos, você aceita ter um filho comigo?
- Aceito.
É claro que eu achava que ela se casaria e teria filhos, ela era e ainda é incrível, inteligente, linda, com um corpo de deixar qualquer um babando. Pensava que não existiria menor chance da morena passar despercebido pelos olhos de alguém tão incrível quanto ela. Regina com certeza desistiria daquela ideia.