Até que ponto é fantasia escrita por Niebla


Capítulo 8
Pobre ervilha




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/664730/chapter/8

Sinto aquela mesma força de antes nos puxar para fora do livro. O chão gelado tocava um dos meus pés que estava fora do tapete, eu o puxo para trás imediatamente, estava completamente desacostumado com a temperatura da biblioteca. O sono vinha em espirais e parecia aumentar a cada segundo, fazendo da ideia de continuar ali com os olhos fechados naquele cobertor quentinho, um ótimo convite para um cochilo.

— Essa realmente foi corrida… Fiquei até tonta! — Assobia depois de um tempo.

— Não mais que o normal.

Ela se aproxima de mim e eu até tento me afastar, mas o cobertor não estava ajudando nem um pouco… Eu não sabia o que raios aquela maluca queria, então, para não piorar a situação eu decido ficar parado.

— O que você quer?

Lun não responde, apenas solta uma risadinha irritante. Ela estava perto demais… Consegui ouvir claramente o momento em que ela prendeu a respiração antes de enfiar aquela mão gelada bem no meio das minhas costas. Filha da mãe… Eu pulei para trás tentando me livrar da mão dela. Bamba do jeito que estava por continuar rindo, ela acabou escorregando para cima das minhas pernas. Ela se afasta e coloca um dedo gelado na minha bochecha rindo ainda mais alto.

— Hahaha! Você ficou todo vermelho!

— Besta…

Eu suspiro quando finalmente consigo me livrar dela e do cobertor para ficar de pé. Teria que tomar cuidado para não tropeçar naquilo quando fosse dar a volta…

— Não vai fazer nada? Pensei que fosse revidar ou soltar um palavrão, pelo menos…

Mesmo debochando, ela parecia um pouco surpresa. Sua voz vinha de um pouco mais para cima do que antes, deveria estar de joelhos ou agachada puxando o cobertor que se arrastava no tapete.

— Até pensei em fazer algo agora, mas… seria tão fácil devolver na mesma moeda. Aguarde, eu não tenho pressa…

Preferi deixar no suspense só para me divertir com a reação dela que nem se mexe, deveria estar me encarando. Continuo com a mesma expressão desafiadora tentando conter o riso que se formava ao imaginar a cara que ela deveria estar fazendo.

— Er… É melhor a gente subir! — Sua voz estava uns três tons mais aguda do que o normal. O que achava que eu iria fazer com ela?

Ela levanta de uma vez só, roçando o cobertor no meu tornozelo ao passar por mim. Eu vou até a porta da biblioteca para não rir na frente dela. Depois de tossir disfarçando o riso, solto um longo bocejo e a escuto bocejar também.

— Boa noite…

— Para você também… Eu vou guardar as coisas aqui e já-já eu subo.

— OK.

Eu subo as escadas devagar, mesmo não fazendo grande diferença, (todos os degraus tinham a mesma altura, exceto o primeiro que começava mais baixo fazendo do intervalo entre ele e o próximo minimamente maior) tinha morado por boa parte da minha infância e adolescência nessa casa então não seria apenas ironia dizer que eu poderia andar de olhos fechados dentro dela. Eu estava com sono demais para realmente aprestar atenção no que eu estava fazendo ou pensando… Se ficasse acordado por mais tempo, logo começaria a rir do nada, ficar mole e falar um monte de coisas estranhas… Não queria ser lembrado disso amanhã. Eu me enfio debaixo das cobertas tentando esquentar a cama completamente gelada. Meu irmão fazia uns barulhos estranhos enquanto dormia, não acordaria tão cedo.

Escutei Luna começar subir pouco tempo depois, ela pisava devagar como quem não queria fazer barulho, mas era nada boa nisso, ela tinha conseguido bater no corrimão (com o cotovelo, provavelmente) duas vezes antes de abrir a porta do quarto. Sempre tão graciosa… Cruzei os braços atrás da cabeça, antes de realmente dormir eu já estava sonhando…

Acordei com Gabriel falando algo sobre castores e macarrão, nós dois falávamos dormindo, mas as coisas que ele dizia quase sempre eram absurdas. Tentei relaxar e adormecer de novo, mas o bipe irritante das notificações do celular dele resolveu tocar três vezes seguidas, ele nunca lembrava de colocar aquilo no silencioso… Eu viro para o outro lado tentando voltar a dormir, mas quando quase estava pegando no sono o celular bipou mais uma vez. Eu suspiro me levantando, não gostava de acordar assim. Pego minhas roupas e vou direto para o chuveiro, era o jeito…

Depois de me vestir eu até tentei arrumar os meus cabelos, mas eles continuavam tão bagunçados quanto mais cedo, o jeito era passar os dedos torcendo para não ficar muito estranho, bem que o tempo em que eu realmente me importava com isso já tinha passado fazia muito, muito tempo. Eles simplesmente tinham vontade própria e detestavam ser contrariados, bastava aceitar.

Fui direto para a cozinha pensando que deveria ter olhado que horas eram antes, mas o máximo que iria acontecer caso ainda fosse muito cedo, seria precisar esperar os outros acordarem, na verdade seria até bom caso Luna também quisesse ler um pouco e… Não. Seria estranho simplesmente bater na porta dela logo cedo perguntando algo assim. Ou talvez ela até gostasse do convite… Eu não sabia e talvez estivesse pensando demais… Enchi um copo com suco de limão e o bebi antes de ir para a sala.

A casa estava muito silenciosa, sem muito esforço podia ouvir os pássaros cantarolando no jardim enquanto o movimento da avenida mais próxima só podia ser escutado bem ao longe. Uma manhã perfeita para estudar ou ler um livro. Liguei o meu notebook e coloquei meus fones de ouvido. Era só abrir uns arquivos que eu já tinha separado para quando tivesse um tempinho livre e ver se adiantava um pouco da pesquisa dos trabalhos que ainda tinha para fazer, mas que eram para a metade do próximo mês.

Minha cabeça doía um pouco, provavelmente por ter ficando forçando os olhos quase a noite inteira, mas não era como se fechá-los fosse atrapalhar a minha leitura… E aqueles óculos escuros… Eu contorno a armação levemente retangular deles com os dedos. Como eu os adorava! Queria poder levá-los para dentro dos livros…

Em pouco mais de uma hora escuto a voz sonolenta de Luna chamar o meu nome, eu tirei os fones e abaixei a tela, já estava cansado da voz irritante do leitor narrando o enorme texto que eu estava lendo.

— Ainda são sete e meia… Você deve estar aqui faz tempo. Por que acordou tão cedo?

— Por que eu quis? — Ela bufa com a minha “pergunta”.

Dou de ombros e abro o computador novamente, mas dessa vez entro em um site que eu tinha encontrado mais cedo. Ele estava uma verdadeira bagunça, mas tinha um texto aparentemente bem escrito sobre acústica; eu sempre acabava lendo sobre isso… Tentei não parecer interessado no que ela estava fazendo, mas era inevitável, ela andava em círculos arrastando a ponta do cobertor (que eu esperava que não fosse o meu) no chão, como se procurasse por alguma coisa ou quisesse ficar tonta. Lun suspira frustrada jogando o cobertor na ponta oposta do sofá e sobe as escadas correndo. Eu bufo tentando aprestar atenção no texto que até que estava interessante…

Pouco tempo depois ela desce mexendo em umas coisas da estante e eu ignoro ainda entretido com o texto. Mas que ótimo! A parte mais legal da coisa estava em uma imagem e o link que continha um artigo que a autora jurava ser interessante, estava “embaixo da seta coloridinha” segundo ela, ou seja, em outra parte “misteriosa” da página. Tentei vários atalhos, mas nada funcionava como deveria e eu estava com muita preguiça de mudar de leitor, o jeito era deixar para depois… Estava cedo demais para ficar mais mal-humorado do que eu já estava.

— Posso pegar o telefone daqui emprestado?

— Não vejo ninguém te impedindo.

— Nossa… Bom dia para você também!

Lun resmunga dando meia volta puxando o telefone sem fio da base. Eu deveria ter soado bem mais ignorante do que o necessário, mas eu não me importava tanto a ponto de pedir desculpas, preferia ficar aborrecido aqui e ela aborrecida lá… Ela disca um número e algo debaixo do canto sofá que eu estava começa a vibrar, o celular dela. Eu tiro o aparelho do chão e ela o pega rapidamente.

— Obrigada. E-eu vou ali na cozinha e já volto.

O tom da voz dela tinha mudado completamente, soava muito mais seco, bem diferente de quando estava irritada comigo. Algo que ela viu quando ligou o celular deve ter mudado o humor dela. Eu desligo o meu computador e espero por longos minutos até ela voltar.

Luna sentou no sofá pequeno dizer nada e ficou parada ali por um bom tempo, cheguei a suspeitar que ela estivesse dormindo, mas ela não faria isso sem pegar o cobertor que estava do meu lado. Isso eu teria notado. Será que ela tinha saído e eu, distraído enquanto colocava o meu notebook na mesinha não tinha percebido?

— Lun? — Eu me mexo desconfortável. — Você está bem?

Ela dá um pulo, assustada por ser tirada de seus devaneios. Depois de um suspiro ela senta ao meu lado passando a mão pelos cabelos.

— Estou… Vamos pegar um livro? — Ri nervosa.

— É a minha vez de escolher, certo?

— Não. Sim! Mas tanto faz…

— Espere aqui que eu vou lá, ok?

Se ela respondeu foi balançando a cabeça, porque não disse uma palavra. Estava tão desanimada… O que estava acontecendo com ela? Não podia ser fome? Podia? Eu pego um dos livros do meio da arca e volto para a sala torcendo para ela não ter saído dali, já que quieta do jeito que estava, as chances de acabar trombando com ela eram grandes. Eu sento no mesmo lugar de antes e ela solta mais um suspiro. O sopro dela roçou de leve a minha bochecha e eu sorri com isso.

— O livro está do lado certo?

— Uhum…

Ela parecia distraída… Eu passo a mão pela capa do livro esperando achar algo que mostrasse alguma diferença caso estivesse de cabeça para baixo, logo percebi que na lateral do livro havia uma risca funda na parte de cima e duas na de baixo, se em todos fosse assim, eu tinha como me garantir caso ela quisesse me enrolar numa hora dessas. Eu viro a capa para ela esperando que ela a lesse, inútil, ela deveria estar olhando para o outro lado.

— E vai ser…

— A princesa e a ervilha…

— Tem um príncipe nessa história, né? Se a ervilha não fosse ser esmagada pela princesa, até que não seria ruim representar esse papel…

— Isso não é muito estranho de se dizer?

— Quem sabe… Mas você tentando resgatar uma galinha é umas vinte vezes mais.

— Deve ser…

— Não sei o que deu em você, mas vê se para de fazer essa cara que você deve estar fazendo. Seja lá o que for, quando estiver aqui, quero que seja só eu a te aborrecer, tá bom?

— Não estou fazendo cara alguma…

— Ia dizer que vi, mas não rola… Então descruze esses braços e pare de enrolar. Vamos abrir logo esse livro.

— Como você… Ah, deixa.

Ela ri dando um pulinho para ficar mais perto de mim. Estava aliviado por ela estar um pouco mais “normal” do que antes. Não diria que eu estava preocupado, mas aquilo me incomodava… Nós abrimos o livro e a mesma força de antes nos puxa para dentro dele.

 “Era uma vez um príncipe que se recusava a casar com uma princesa que não fosse de verdade. Ele se dedicou a ir atrás dela pelo mundo inteiro, mas nenhuma das muitas e muitas princesas que encontrou era quem ele procurava. Era muito difícil de se saber se alguma delas era mesmo de verdade, mas sempre achava algo nelas como não deveria ser e assim sabia que não era ela. Há algum tempo o príncipe tinha voltado para a casa, deixando o rei e a rainha ansiosos enquanto ele continuava aborrecido, pois queria muito encontrá-la e ninguém que não fosse ela serviria.

— Filho, você está sendo muito exigente, se continuar assim nunca vai conseguir se casar… — “O rei velho, com o rosto mal iluminado pela luz fraca das poucas tochas que clareavam o aposento naquele dia chuvoso, olha com preocupação para o filho”.

— Eu sei. — “Ele suspira. Mal suspeitava o rei que era exatamente esse o objetivo do filho”. — Mas tem que ser assim… Ela precisa ser nobre de verdade.

— Você quer ver o nosso filho casado com uma princesa de mentira? Você sabe que princesas verdadeiras são muito raras, mas existem e nosso filho vai encontrar uma delas e ser muito feliz ao seu lado. — “A rainha velha aperta os ombros do príncipe, ela tinha abraçado a ideia do filho desde o começo”.

— Até lá, paciência… — “O rei suspira”.

“O príncipe se aproxima de uma das janelas fechadas imaginando como estaria lá fora. Uma tempestade terrível caia em todo o reino desde cedo. O vento forte parecia querer varrer as árvores e as pequenas casas dos camponeses para longe, os trovões chacoalhavam o chão e os ouvidos das pessoas enquanto os raios e relâmpagos iluminavam as nuvens extremamente carregadas e escuras”.

 “Foi então que bateram à porta do castelo. Curioso o rei olha em volta procurando um dos empregados, mas eles estavam em outros aposentos tentando enxugar o chão encharcado pela água que entrou pelas janelas abertas pela tempestade que a pouco tempo tinha apertado. Sem ter a quem recorrer, ele decide abri-la pessoalmente sendo seguido pela rainha. Parada na frente da porta havia uma bela moça completamente encharcada pela chuva. A água escorria por seus cabelos castanhos compridos gotejando em seu vestido bastante colado ao corpo e três vezes mais pesado por causa da água e da lama, seus frágeis sapatos estavam quase desmanchando, mas mesmo tremendo de frio por estar molhada até os ossos, ela sorria tímida olhando nos olhos do casal que abrira a porta para ela”.

— Entre, minha menina. — “Convida, o rei piedoso. Era uma pena a visão que a água e o vento faziam da bela garota, se continuasse assim talvez ficasse gripada”.

— Obrigada. — “Ela torce inutilmente a ponta do vestido antes de entrar”.

— Você é uma princesa? — “Pensa que seria melhor ser ou então ficaria bastante decepcionada”.

— Sim, é claro que sou. — “A moça abre um sorriso leve e nervoso”.

— É mesmo? — “A rainha procurava firmeza nas palavras da moça”.

— Sim! Sou uma princesa de verdade mesmo.

— É melhor arranjar algo seco para ela vestir…  — “O príncipe suspira virando o rosto para a mãe”. — Você está bem? — “Pergunta para a visitante”.

— Uhum…

— Vou pedir para prepararem um dos quartos para a princesa.

— E eu vou buscar um dos meus vestidos, aposto que servirá perfeitamente. — “A rainha velha sorri para o estranho interesse do filho pela moça. Se ela era verdadeira ou não com o teste eles descobririam”. — Depois disso vamos todos jantar.

— O que vai ser dessa vez? — “A moça olha para o príncipe preocupada e ele dá de ombros sem saber exatamente o que a mãe queria dizer”.

— Espero que nenhum resgate…

— Por quanto tempo ainda vai falar disso? — “Ela ri tremendo por causa do frio”.

— Até você fazer algo mais memorável… — “O príncipe pensa em piscar, mas com os olhos fechados isso seria no mínimo esquisito”.

— É só abrir antes então… — “Ela aperta os olhos para tentar ver melhor a expressão dele, aquela área estava especificamente mais distante das tochas”. — O que tem de e…

— Não mesmo. — “Ele ri jogando o casaco que usava sobre os ombros dela”.

— Mas vai molhar tudo… — “Ela tenta devolver o casaco para ele”.

— E…? Aproveita que ele ainda está quente.

— Tá bom… — “Ela vira os olhos aproveitando o calor escasso da peça”.

“Com um de seus vestidos mais simples em mãos, a rainha leva a moça para o quarto de hóspedes que o rei mandara preparar. Depois de seca e vestida, a hospede vai para a sala de jantar. O tecido fresco e claro caia elegantemente pelo pequeno corpo da garota. A rainha pensou que talvez ela estivesse mesmo dizendo a verdade, afinal, agora ela parecia mesmo uma princesa. Os quatro jantaram em silêncio na grande mesa e antes de levá-la pessoalmente para o quarto de hóspedes, a rainha conversa com uma das empregadas na cozinha e some por um tempo”.

— Espero que tenha uma boa noite. — “A rainha se despede entregando a luminária na mão dela e vai para o quarto do filho querendo interrogá-lo”.

“Ao abrir a porta, a moça encontra uma escada apoiada numa cama com vinte colchões empilhados um em cima do outro, todos cobertos por um grande lençol de seda macia. Na pequena estante estava o casaco do príncipe dobrado do jeito que ela deixara, assim ele não secaria, ela o pega pensando em pendurá-lo na ponta da cama para deixá-lo secar bem até o dia seguinte”.

— Por que isso!? — “Ela morde o lábio começando a subir as escadas”.

“A moça escorrega no primeiro degrau e acaba batendo o cotovelo. Ela morde o lábio com força, fazendo de tudo para não derrubar nada e volta a subir com mais cuidado. Aquilo ficaria roxo… Chegando no topo, ela encontra vinte travesseiros de pluma macia e um cobertor. Ela faz o que pretendia com o casaco. Aquilo tudo era muito estranho, mas ela não podia fazer nada além de tentar dormir um pouco, estava cansada. Ela apaga a luminária depois de pendurá-la em um gancho no teto”.

“Ela revirava de um lado para o outro sem conseguir dormir. Não era por não estar sentindo sono, todo o caminho que trilhara sozinha debaixo da chuva e vento tinha garantido isso. Seus olhos pesavam, mas sua mente trabalhava inquieta. O vento assobiava por todas as brechas que encontrava nas paredes do castelo deixando-a mais agitada, estava difícil de pegar no sono”.

— Preocupada com os problemas da vida real, não? — “Ela fala sozinha e ri disso”.

“Talvez estivesse com problemas que não deveria levar para a cama, ela sabia disso e sentia como se pudesse fazer nada. Começava a se perguntar se seria melhor ficar por ali mesmo ao invés de tentar apressar as coisas e ir embora. Logo seu pensamento foi para o príncipe e ervilhas de alguma forma, ela o imaginou vestido de ervilha. Ele tinha falado algo assim mais cedo… Se ele dançasse daquele jeito seria mais engraçado. Ela começou a rir muito, principalmente quando imaginou a cara que ele faria ao ouvir isso. Com certeza era o sono alimentando ainda mais a sua imaginação fértil”.

— Tem algo a ver com o nome do conto… Mas tenho certeza de que dessa vez o livro não ficou de cabeça para baixo. Que história mais maluca… — “Ela murmura com o rosto encostado em um dos travesseiros”.

“Mesmo sem querer ela voltava a pensar nos muitos problemas que tinha que resolver logo-logo. ‘O que Len faria?’, ela pensava, mas tudo o que lhe vinha a mente era algo bruto ou frio demais para ela, bem que ela não conseguia mais vê-lo como um bloco de gelo, era estranho, mas não era ruim… Ela vira deitando de cabeça para baixo e continua se revirando”.

“O jeito era não se deixar abater. Era um bom conselho… Ela não podia deixar passar, mesmo se fosse algo pequeno, aquilo a incomodava, estava decidida a tomar alguma postura. Ela se apoia nas duas mãos apertando os olhos na escuridão, tudo estava completamente escuro, mesmo que em pouco tempo fosse amanhecer; às vezes ela se sentia assim… ‘Como ele conseguia viver assim?’. Ela deita de novo esticando os braços, algo de pano roça seus dedos. O casaco do príncipe, ela o puxa para si o abraçando para ver se ainda estava úmido. Um cheiro tão bom pairava no ar… Não sabia o que estava pensando ou fazendo, mas o sono apertou mais e antes de cair de vez no sono ela solta um longo suspiro mais e mais sonolenta. Ela sonha com um tsunami de ervilhas dançarinas e com o que teria que fazer quando chegasse em casa”.

“Na manhã seguinte uma empregada a acordou oferecendo uma vasilha com água para lavar o rosto. Sem se sentir nem um pouco mais acordada, com os cabelos um tanto desgrenhados, pálida e cheia de olheiras, a moça vai ao encontro da realeza”.

— Dormiu bem princesa? — “O rei pergunta juntando as sobrancelhas ao ver o estado dela”.

— Dormi muito mal. — “Suspira. A rainha olha para ela como se esperasse que prosseguisse com a narrativa, queria que ela fosse franca”. — Mal preguei os olhos, não conseguia me sentir confortável de jeito nenhum.

— Que terrível! Mais tarde você pode tentar tirar um cochilo. — “A rainha sorri contente. Para ser sensível o bastante para conseguir perceber a pequena ervilha no meio de tantos colchões e travesseiros tão macios, a moça só poderia ser de uma princesa completa. Era um alívio”.

— Venha tomar café da manhã conosco. — “O rei convida”.

“Ela se serve escolhendo entre uma enorme variedade de alimentos e assim como os outros três, começa a comer. Olhando para o largo sorriso da rainha ela sorri de volta imaginando o que seria. O príncipe tenta esconder o riso enfiando um pedaço de pão na boca”.

— Estamos muito felizes por você estar aqui, pode ficar o tempo que quiser. — “Segura na mão da moça. Finalmente seu filho tinha encontrado uma princesa verdadeira para se casar. Já podia imaginar o castelo todo decorado, lilases por toda parte e todo o reino reunido, o vestido da noiva feito com os melhores tecidos e todo decorado com pedras preciosas, ela levando o príncipe para o altar e…”.

— Com licença. — “A moça cora bastante”.

— Você comeu tão pouco… — “O rei bebe mais um gole de vinho”.

— O suficiente. — “Ela ri sem graça”. — Acho que agora consigo tirar um cochilo. — “Mente”.

“Ela volta para o quarto suspirando aliviada. O príncipe bate na porta e ela a abre rindo de toda aquela situação maluca”.

— Estou ouvindo esse tipo de coisa desde ontem.

— Não sei como aguentou! — “Ela coloca a mão debaixo do colchão mais baixo e em poucos segundos encontra a bendita ervilha”. — Imaginar que você poderia ser isso…

— Acho que não iria funcionar…

— Sério? — “Ela ri se lembrando do sonho e no que pensara antes de dormir e então faz de tudo para não pensar nisso”.

— O quê?

— Ah… Eu não vou falar… — “Diz rápido demais”. — Agora vamos para a sala decidir as coisas do nosso casamento. — “Ela ri nervosa”.

“Dali para frente eles e todo o reino seriam muito felizes, afinal, o príncipe encontrara sua nobre princesa verdadeira”.

Quando saímos do livro Luna respira fundo e solta o ar devagar. Ela bate o livro que pegou do meu colo na mesinha e se enrola no cobertor.

— Uma pontinha até que cairia bem… Esfriou um pouco.

— Onde… — Ela provavelmente abraça o cobertor.

— Aqui?

— O quê? — Boceja.

— Vai dormir, vai.

— Mas eu já dormi! Do que você está falando?

— Do cobertor!

— Ah… Depois que eu comer alguma coisa eu volto ao normal.

— Bom mesmo…

Eu dou risada e junto com ela puxo uma parte do cobertor que felizmente não era o meu! Comemoro internamente. O meu era um pouco mais grosso do que o dela. Meu estômago roncou de leve e eu a cutuco com o cotovelo para perguntar se ela estava com fome também.

— Ai!

— O que foi? — Eu me afasto.

— Doeu…

Ela se mexe bastante e chega a me dar duas cotoveladas, mas eu ignoro, ela deveria estar se contorcendo para achar algum corte ou algo assim.

— Que estranho, parou de doer do nada…

— É… A fome não te faz muito bem, te deixa ainda mais estranha…

— Bobo. — Ela ri se levantando. — Vamos preparar alguma coisa.

Eu concordo com a cabeça e me levanto pegando o livro.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

É, às vezes não precisamos de mais do que um probleminha pequeno ou uma ervilha para não conseguir dormir direito a noite...



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Até que ponto é fantasia" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.