Thalia.

Thalia se sentia cansada. Estava no segundo ano de ensino médio, mas ainda não se acostumara com a rotina. Haviam tantos trabalhos e provas, assim como lições de casa e atividades extracurriculares. Droga! Não tinha nem tempo para ler, passatempo que antes admirava. Claro que ainda lia para crianças em seu projeto voluntário, mas não era a mesma coisa do que deitar-se na cama e ler num dia chuvoso.
Sua vida estava uma bagunça.
Desde que mudara-se para a nova escola, sentiu um frio imenso na barriga. Ela odiava a sensação de ser a aluna nova, mas Jason a ajudara. Ela sabia que sempre poderia contar com o irmão gêmeo. E claro, havia Annabeth! Annabeth era extremamente importante: a amiga de infância não só a ajudara com a adaptação na escola em que também estudava, como a havia acolhido. A apresentara para seus amigos, incluindo seu primo e namorado de Annie, Percy Jackson. Porém, ela sentia que algo estava faltando; só não sabia o que era.
Thalia suspirou e levantou-se de sua cama. Era domingo à noite e ela sabia que deveria estar curtindo a vida, mas se sentia exausta, mesmo sem sono. Tirou a regata preta colada ao corpo e logo depois a calcinha, então partiu para seu banheiro particular para tomar um longo banho gelado.
Passou sabonete esfoliante: ela adorava esfoliantes pois, além de cuidar da pele, eram divertidos. Acabou o banho e secou-se com uma pequena toalha branca e usou uma menor para enrolar o cabelo, mas esta manchou-se de azul.
Droga, pensou, tenho que tingir o cabelo de novo.
Saiu do banheiro e abriu o armário, pronta para pegar seu pijama, mas a porta se abriu e Jason apareceu em seu quarto.
Seu irmão era lindo: alto, pele bronzeada de sol, cabelos loiros espetados e olhos azuis elétricos, assim como o da irmã; mas, na maior parte do tempo, ele se mostrava irritante, principalmente quando entrava no quarto de Thalia sem bater.
– Thals – chamou – Papai mandou avisar que vamos numa pizzaria hoje à noite. Coloque um vestido.
– Por que não posso usar calças? – questionou.
– Quer deixar Hera falar sobre sua “falta de bom senso e a maneira de como constrangiu toda a família?” – ele abriu um sorriso brincalhão.
– Não, pode deixar. – Thalia não pôde evitar a careta. Jason riu e saiu do quarto, deixando-a sozinha com inúmeras possibilidades do que vestir.
Abriu a segunda porta do guarda-roupa e jogou tudo em cima da cama. Procurou por vestidos pretos: Se fosse para usar vestido, que fosse um básico. Acabou por escolher um sem mangas, de alças grossas e justo até o busto. A saia era soltinha, mas não rodada. Calçou VANS pretos, afinal, usar vestido e saltos era demais. Colocou um colar de caveira prateado e fez uma trança no cabelo metade azul. Passou um batom vermelho nos lábios e rímel preto.
Ela se olhou no espelho e gostou do que viu. A garota era de estatura mediana, tinha cabelos longos de cor preta e azul na nuca e olhos azuis elétricos que faziam contraste na pele branquinha e cheia de sardas no nariz, e a boca carnuda era avermelhada. Tinha seios não muito grandes, e sim entre o “mediano” e o “grande”, e quadril não muito largo. A pele era salpicada de discretas sardinhas nos braços, e isso a deixava bonita, ao seu ver.
Quando pronta, colocou seu celular e a carteira na bolsa preta e desceu as escadas. Logo encontrou Hera batendo o pé no chão e seu pai e Jay largados na sofá. A megera lançou-lhe um olhar de desprezo e passou as mãos na saia dourada do vestido para depois chamar Zeus, o pai de Thalia, para a garagem.
Thalia se enfiou no banco de trás do carro e deitou a cabeça no ombro de Jason. O irmão passou o braço forte por sua cintura e beijou sua testa.
– Estou cansada. – ela falou, depois de certo tempo.
– Eu sei, mas estamos chegando. Não quer comer um pouco de pizza?
Thalia sentiu a barriga roncar e fez que sim com a cabeça, o que soltou uma risada de Jason.
– Já estamos chegando. – avisou.
Thalia fechou os olhos e assentiu. Ficou em silêncio por um tempo, mas logo chegaram ao lugar.
A pizzaria era grande e arrumada. Tinha paredes brancas iluminadas por luzes douradas que a deixavam com tom de ouro, e janelas de vidro enormes que davam para uma excelente visão da praia.
Thalia seguiu sua família e entrou no restaurante.
***
Sentou-se numa cadeira encostada na janela de vidro e observou o movimento das ruas da Califórnia. Era um rodízio de pizzas, por isso não havia nada em seu prato. A barriga de Thalia continuava vazia e ela sentia fome, mas tentou não se importar. Logo, ouviu uma voz atrás de si:
– Com licença, Gostosona?
– Oi? – Ela se virou e se surpreendeu com sua visão.
Era um garoto não muito alto, mas não era muito baixo; tinha olhos castanhos amendoados que combinavam com os cabelos castanhos encaracolados e pele bronzeada, e isso sem contar as orelhas levemente pontudas e o sorriso brincalhão.
Ele era lindo.
– É uma pizza, senhorita. – ele disse, com polidez, mas não parecia ligar muito para a educação, principalmente porque seu olhar estava concentrado em Thalia, ou melhor, em seu rosto.
Quantos anos ele tinha? Parecia ter sua idade, ou talvez um pouco mais novo, mas ela não podia alimentar a esperança. Era um garçom, o pobre coitado não iria ligar para alguém como ela.
– Ah sim, claro. – ela corou e o sorriso do garoto se abriu ainda mais. Ele pôs a pizza em seu prato, pediu com licença e se retirou.
Thalia manteve o olhar fixo no lugar onde o vira pela última vez, mas logo se virou e começou a comer sua pizza. Uns 40 minutos depois, lá estava o garçom de novo. Desta vez, com uma pizza coberta de coco e algo que parecia... marshmallow derretido?
– Beijinho? – questionou.
Thalia se virou e sorriu.
– Eu aceito um.
O garoto soltou uma risada e logo lhe entregou o pedaço de pizza.
– Ao seu dispor.
Ele se retirou novamente, mas seu olhar permaneceu cravado em Thalia, o que o fez esbarrar em um outro garçom que segurava uma jarra de água, despejando uma pequena quantidade do líquido em si mesmo.
Thalia riu e voltou-se para a mesa. Seu pai e a madrasta pareceram não perceber o que havia ocorrido a pouco, mas Jason a encarava, questionador. Ela retribuiu o olhar e começou a comer sua pizza.
Logo, o jantar acabara. Thalia levantou-se da mesa e acompanhou a família porta afora, não sem antes dar uma última olhada no garçom, que a encarava de volta. Na calçada, surpreendeu-se com a forte chuva. Passara tanto tempo pensando no garçom que não se importou com o tempo. Estava encharcada, mas não se importou, ao contrário de Hera: a madrasta saíra correndo, desesperada, até a BMW preta da família, estacionada a dois quarteirões dali. Zeus a seguiu, com Jason um pouco atrás, e Thalia já ia segui-los quando sentiu uma mão em seu ombro. Ela se virou.
Era o garoto.
Ele a encarava, os olhos castanhos com um olhar ansioso. Parecia nervoso com alguma coisa, mas o que era?
– A senhorita esqueceu isso lá dentro. – ele entregou-lhe sua bolsa.
Droga! Ela se sentiu estúpida por pensar que ele fora falar com ela. Devolver a bolsa, e só isso.
Mesmo decepcionada, Thalia o encarou.
– Meu nome é Thalia, e obrigada. – ela o encarou uma última vez e saiu andando.
Que estranho, pensou, algo em seu olhar parecia... triste?
***
Thalia acordou e a primeira coisa que sentiu foi o frio. Saiu correndo para o chuveiro e ligou na água quente, sentindo-se relaxar com a temperatura. Ela odiava banhos quentes, mas não havia como negar em certas situações. Foi um banho curto, mas de tempo o suficiente para fazê-la recordar dos acontecimentos da noite anterior.
Saiu do banho e se vestiu rapidamente: uma camisa branca com um smile de cabeça para baixo e os dizeres: “Whatever Nevermind”, legging preta, casaco preto folgado e claro, seus típicos VANS pretos. Olhou-se no espelho e prendeu o cabelo num coque um tanto frouxo, e não passou maquiagem alguma, o que deixou seu rosto um tanto redondo, mas ela não se importava. Se com maquiagem ela não conseguira chamar a atenção do garçom, por que usar?
Thalia pegou sua mochila preta, seus fones de ouvido e desceu as escadas. No andar de baixo, deu uma mordida numa maçã e esperou Jason escorada em seu carro, do lado de fora. Não deu tchau a ninguém, pois não queria. Quando o irmão chegou, acionou o carro e Thalia foi de carona. Quando chegaram à escola, Thalia saiu do carro e deu dez pulinhos para se esquentar. Jason olhava a cena, divertido, e a garota apenas deu a língua para ele. Saiu correndo pelos corredores, o irmão logo atrás, até avistar uma cabeça loira.
Annabeth sorriu para ela e Thalia balançou as mãos no ar. Ela deu um abraço de urso na amiga e começou a tagarelar.
– Thals, como eu senti sua falta! Vem conhecer a Pipes e o Leo, eles estavam viajando até ontem, e agora eles estão aqui, e você vai amar muito eles e... – a loira continuou a falar, mas Thalia só prestou atenção de fato quando Annie a apresentou à garota morena.
Piper era alta e sua pele era morena, dotava de corpo atlético e usava camiseta larga e jeans surrado. Ela era realmente bonita: os cabelos castanhos eram lisos e de corte torto, como se a mesma o tivesse cortado, e eram enfeitados por uma pena azul-pavão; porém, o mais impressionante eram seus olhos de caleidoscópio, que pareciam mudar de cor a toda hora.
Ela percebeu quando o queixo de Jason caiu e soltou um risinho. Decidiu que não iria deixar de zoar o irmão pela situação, então fechou seu queixo. O irmão a encarou, bravo, e ela o retribuiu com um olhar maléfico.
– Thalia, Piper, Piper, Thalia! – disse Annabeth, mas Thalia não teve tempo de conhecer a garota, pois, naquele momento, um garoto cuja cabeça estava enfiada num armário, virou-se.
Thalia prendeu o ar e olhou fundo naqueles olhos amendoados.
Era ele.