A Proposta escrita por Freak Kyoko


Capítulo 1
Capítulo Um - X




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Já era a terceira vez naquela semana em que Bárbara, minha irmã gêmea, discutia com meu pai logo pela manhã. Geralmente eu não me importaria, já que ela e papai são como cão e gato: não se suportam.

Não sei nem porque insistem em morar na mesma casa, vinte anos de experiência nos provaram que eles nunca se dariam bem. Quando Bárbara deu um grito histérico decidi sair do quarto e ver o que acontecia em minha casa.

Ainda usava um pijama folgado e minha cara não deveria ser das melhores, saí para o corredor e percebi que a gritaria vinha do andar debaixo e desci as escadas praticamente rolando de sono. Bocejei antes de me dirigir a cozinha e, de certa maneira, já esperava ver minha gêmea emburrada e tentando jogar algo em nosso pai. No entanto vi a cena mais absurda de toda a minha vida, os dois estavam abraçados e ela pulava de felicidade.

Estraaanho.

Esfreguei os olhos para ter certeza de que estava mesmo acordada e que aquilo não passava de um sonho, mas não era, os dois estavam parados e abraçados como se fossem... Sei lá, nunca imaginei presenciar essa cena.

— O que está acontecendo? — perguntei desconfiada. Os dois se afastaram e minha irmã veio saltitando, toda feliz, até onde eu estava e, quanto mais perto ela chegava, ficava mais claro que ela já estava totalmente produzida para sair de casa. Senti até dor de cabeça.

Bárbara e eu éramos gêmeas univitelinas, então, supostamente, deveríamos ser idênticas, porém não conseguia ver pessoas mais diferentes. Enquanto ela tinha longos cabelos pretos e sedosos, o meu era curto e só isso, eu precisava de praticidade. Ela tinha a mesma altura que eu, mas estava 90% do tempo de salto alto, além de ter um estilo mais sexy de roupa. Resumindo, ela era a Barbie.

Eu? Bom... Eu não tinha tempo pra isso.

— Bia você não vai acreditar! — animou-se e eu suspirei, não conseguia acordar de bom humor. Nunca. — O pai vai me dar um carro! — gritou novamente e tive que fechar os olhos um pouco. Como ela conseguia emitir um som tão agudo?

Opa... Como é?

— Carro? Meu pai? Que brincadeira é essa, pai? — perguntei andando até a pia, já tinha café quente na cafeteira, eu peguei uma caneca do escorredor de louças e despejei uma boa quantidade da bebida dentro. Papai suspirou e cruzou os braços, pensando no que me responderia. Ergui uma sobrancelha e esperei.

— Não é brincadeira Bia, sua irmã conseguiu um emprego e acho que já está na hora dela ganhar um carro. — respondeu e eu tive que rir.

— Bárbara? Trabalhando? Ah me conta outra, vai... Ela não vai durar nem seis meses, todo mundo sabe. — dei mais um gole em meu café quente — E ela merece um carro por conseguir um trabalho? Ela já está quase formada, era pra estar trabalhando há meses, mas não segurou nenhum estágio, você sabe! — fiz questão de lembrá-lo. O velhinho pareceu, finalmente, cair em si.

— Realmente. Não tinha pensado por esse ângulo... — refletiu e eu sorri cinicamente para Bárbara, que gritou (novamente), porém agora de raiva e bateu o pé no chão com força, fazendo birra. Já me preparei psicologicamente para o que viria a seguir.

Ela voou para cima de mim, quase enfiando o dedo indicador em meu nariz. Suas bochechas estavam vermelhas de raiva.

— Você não consegue me ver feliz, né? Sua invejosa, ridícula! — gritou e tomei outro gole de café. Já estava acostumada com toda a ceninha dramática.

— Inveja eu tenho de Albert Einstein, de você eu sinto pena. — retruquei e ela arregalou os olhos.

— Beatriz por que você sempre tem que se meter na minha vida? Eu finalmente consigo convencer o pai e você vem com essa sua bocona estragar tudo, como sempre! Você não se toca, garota? — Bárbara gritava e gesticulava como se fosse um boneco inflável de posto de gasolina.

Tive que rir com a imagem que se formou na minha mente.

— Ué, eu só disse verdades. Você não para em um serviço, sempre bota defeito onde quer que esteja, arruma briga com todos os seus superiores e ainda consegue a proeza de ficar com metade da empresa. Você nunca ficou três meses em um emprego, Bárbara. Para de se fazer de louca, seus namoros duram mais que suas experiências profissionais. — respondi e dei uma olhadinha de canto para meu pai, que observava tudo com olhar compenetrado, como se tivesse absorvendo muitas informações de uma vez.

— Pelo menos eu tenho um namorado. Não perco minha vida toda enfiada dentro do quarto estudando pra merda nenhuma! — minha irmã respondeu. Tive que rir novamente, mas dessa vez sem nenhum humor.

— Querida, eu tenho coisas muito mais importantes para fazer além de namorar. — retruquei e ela cruzou os braços e mordeu o lábio inferior, da maneira que fazia sempre que tinha uma das suas ideias malucas.

— Tem coisas mais importantes ou não consegue arrumar um namorado? São coisas bem diferentes. — fiquei embasbacada.

Como é?

— Claro que consigo, se eu não namoro é porque não quero, estou solteira por opção! — me defendi começando a achar o assunto um porre.

— Por opção dos outros, né? Admita Beatriz: ninguém te suporta. Você não conseguiria nem começar um namoro, imagine investir sentimento, tempo, dedicação e amor ao relacionamento. Ou você acha que tudo isso é fácil? — perguntou. Dei de ombros.

— Difícil é o teorema de Euler, namorar qualquer um consegue. E o que isso tem a ver com você ganhar um carro? — perguntei saindo do assunto desagradável.

— Tudo! Você se acha superior a todo mundo porque estuda o dia inteiro, mas você não é. Cada um tem suas prioridades e dificuldades, para de estragar a felicidade dos outros! — reclamou.

— Se você acha que namorar demanda qualquer tipo de dificuldade, você é bem mais burra do que eu imaginei. — retruquei.

— CHEGA! — papai gritou e até me assustei com sua voz. Nos viramos para ele, que estava levemente vermelho, o que era engraçado em contraste com o seu cabelo grisalho. — Bárbara, sua irmã está certa, não vou te dar um carro por ter conseguido um trabalho. Se você conseguir ficar, no mínimo, seis meses nesse novo emprego eu te dou o carro que eu te prometi. — ela gritou de felicidade e voltou a abraçar meu pai. Revirei os olhos e gesticulei negativamente com a cabeça.

Bárbara seria premiada por fazer algo que não era mais do que sua obrigação. Mereço.

— E Beatriz, se você acha que estar em um relacionamento é tão fácil, por que não tenta estar em um? Acha justo julgar sua irmã se você nunca namorou na vida? — papai perguntou e eu fiquei de boca aberta.

Como é que é?

Eu não tenho tempo e nem paciência para ficar trocando mensagem e beijinho, pai. E outra: não vou ganhar nada com isso! — respondi e meu pai sorriu.

— Se... Mas só se, você conseguir namorar por dois meses, te dou um carro também. — papai disse e eu arregalei os olhos.

— O senhor está de brincadeira né? — perguntei e ele gesticulou negativamente.

— Não estou. E ainda digo mais: as duas aceitam a proposta ou não haverá carro pra ninguém. — condicionou e encarei Bárbara assustada. Ela me devolveu o mesmo olhar de pavor.

O quê?! — respondemos em uníssono. Droga de gêmea.

— Pegar ou largar, só assim vão saber quem está certa. — papai disse e sorri.

Eu sempre estava certa. Mas achava ridículo aceitar uma proposta tão sem fundamento. Namorar não provava nada a ninguém, só demonstraria o quanto é superficial a interação humana afetiva. Eu era de biológicas, então sempre achei o amor supervalorizado: acreditava mais em troca de favores. Em um relacionamento sempre acontecia uma troca, alguém dava e alguém sempre recebia. Amor era tão clichê que não via qualquer fundamento nele.

Precisaria pensar muito bem no que responder, sabia que Bárbara aceitaria numa boa, mas eu estava finalmente chegando na época de provas e precisava passar no vestibular, esse era o último ano em que poderia tentar em uma universidade pública, se não passasse eu teria que me virar para trabalhar e dar conta da faculdade de medicina. Seria uma loucura! Tinha que me focar totalmente nisso e não tinha ideia de como arrumar um namoradinho tão rápido.

Eu estou fodida!


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Notas finais do capítulo

E aí gente, curtiram? Vão continuar lendo ou posso largar a ideia?

Aceito sugestões!

Beijinhos!



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