Levantei assim que o despertador indicou 6:30. Vaguei meus olhos pelo quarto procurando algo novo, mas a monotonia dos dias eram cada vez mais constantes.
Uma mensagem de texto indicava que Melanie iria se atrasar, enviei um emoticon dizendo que estava tudo bem. Mas não estava tudo bem, pelo menos, não comigo.
Tranquei a porta do meu quarto com delicadeza, em passos silenciosas para que ninguém percebesse que eu já estava acordada. Meu horário de acordar costumava ser as 7:00, mas hoje não era um dia comum, hoje eu iria testar algumas mudanças.
Quando olhei para o espelho me assustei com a figura que aparecia na minha frente. Minha pele estava mais pálida, sardas haviam nascido próximas aos olhos, minhas bochechas pareciam terem sido maquiadas com Blush bem avermelhado, e meus lábios um tom de batom sutil. Eu não entendi direito o que estava acontecendo, mas poderia afirmar com toda certeza que meu cabelo parecia mais brilhante e intenso.
Meus olhos não pareciam terem mudado, o azul cintilante pairava sob a pupila, e minha sobrancelha permanecia levemente arqueada.
Respirei fundo.
Não era a primeira vez que eu mudava assim. Já aconteceu umas duas vezes. Houve mudanças bruscas da noite para o dia depois da dor irreconhecível que vinha me atingido durante os últimos anos. Mas desta vez, eu sabia que estava bem mais diferente.
Meus pais nunca questionaram sobre a minha mudança de aparência. O que antes era natural agora parecia ter sido preenchido durante horas por maquiagens especializadas.
A sorte é que todos daqui conheciam a Melanie, que é bem mais vaidosa do que eu, de qualquer forma eu "usaria" suas especialidades como uma pequena ajuda no meu visual.
Eu nunca me perguntei porque tinha essas coisas. Enquanto os adolescentes se preocupavam com o baile da primavera, minha preocupação era se eu iria ter mais um ataque dos que eu tinha de repente. Iriam rir de mim, me zombar, fora o título de sobrenatural que eu já tinha naquele colégio. Mas eu não me importo, são tudo uma perca de tempo.
Uma hora e vinte minutos depois, Melanie chegou na minha casa buzinando assustadoramente. Nós tínhamos combinado de que iríamos para a escola juntas hoje, por algum motivo que eu ainda não descobri.
– Querida? Melanie está lá embaixo - disse minha mãe.
Quando eu apareci na porta, Melanie usava um cachecol de oncinha e um óculos escuros Rosa, completamente chamativo. No banco da carona estava uma de suas bolsas Channel edição limitada, ela tinha mais outras duas com o mesmo modelo.
– Anda Emily! Estamos atrasadas! - Ela berrou e tirou o óculos de repente, quando eu apareci na porta.
– Não acredito!
Ela me fitou por longos segundos.
– HÃ?
– Você passou maquiagem!
Revirei os olhos. Ela não sabia sobre mim...
– Certo, só um pouquinho...
– É o menino novo, não é? Eu sei! Você deu uma fugida com ele e ainda inventou que estava passando mal... Ah sua espertinha! Entra logo!
Eu entrei e fomos desajeitadas para o colégio.
– Não é o menino novo! Não tem nada a ver!
Ela revirou os olhos discretamente como se entendesse o que eu sentia. Mas como ela entendia sem nem eu mesma sabia o que era?
O carro atravessava a rodovia agitada e Melanie não poupava o acelerador. Seu maior costume era correr a 100 km/h na rodovia, sem medo de multas ou problemas maiores. De certa forma, eu aprovava a adrenalina, embora custasse nossas vidas.
– Acho que você deveria me contar - ela disse, um pouco séria, fitando a estrada. - Você está gostando dele? Ele a maltratou?
Tentei entender sua pergunta.
– Maltratou? Não.. Ao contrário, ele me ajudou!
– Por que não me chamou? - Ela me olhou por um momento. - Sabe, estou sempre pronta pra te ajudar. E caso esse garoto tenha feito algo de errado com você, quero que me conte, pra acabar com ele!
– Não Mel, ele me ajudou! De verdade. Fiquei tonta e ele acabou me vendo. Com certeza só fez aquilo por generosidade, e por não conhecer ninguém...
– Ele já fez alguns amigos - disse ela. - Henry e seu grupinho fútil já o conquistaram. Ontem eles estavam no intervalo unidos, falando sobre garotas e sexo.
Ela revirou os olhos.
Por um momento, eu me decepcionei. O menino angelical não era mais tão angelical assim... Logo, digo, será apenas mais um menino com o rostinho bonito e sem caráter.
– Tem certeza que era ele? - Perguntei só pra confirmar.
– Sim, tenho.
Por um momento Melanie fez uma careta de culpa, que rapidamente foi substituída por outro assunto. Mas aquilo ainda estava na minha cabeça, mesmo depois de Melanie começar a falar do seu relacionamento que nunca é verdadeiramente assumido com Josh. O sentimento de impotência e fraqueza me pegou, fazendo-me baixar a cabeça e refletir. Nesse momento, Henry e seus amigos já devem tê-lo apresentado a escola, e caracterizado cada uma das meninas. Inclusive eu, a bruxa satânica que bebe sangue humano.
Chegamos à escola e meu estômago estava dobrando. As pessoas me olharam diferente por um momento, e só depois de Melanie lembrar-me que a maquiagem faz milagres que eu recordei da minha breve ida ao espelho checar as minhas mudanças misteriosas de manhã. E de verdade, aquilo estava me mudando muito. Era assustador.