Observo Djoser beber vinho ao meu lado e então sorrio por ver o quanto ele mudou. Acabo me servindo do vinho que meu irmão trouxe, mas logo repúdio o vinho por ser tão forte. Djoser acaba rindo e me oferece um pedaço de pão para que eu coma. Acabo aceitando o pão e logo começo a tossir.

—O vinho do Egito não é mais o mesmo. —Djoser fala enquanto bebo mais vinho.

—Faz tempo que não como ou bebo nada de lá. —Falo e então ele sorri. —Porque demorou tanto? —Finalmente pergunto.

—Tinha que manter tudo em ordem. —Djoser responde. —Quer saber como a mamãe está? —Ele pergunta e eu fico sem reação. —Ela espera você.

—Ela não está louca como você disse, está? —Pergunto enquanto nos alimentamos.

—Ela não está mais louca. —Djoser fala me aliviando. —Quando ela aceitou a morte do nosso pai, sua mente voltou a raciocinar. —Meu irmão fala.

—E Lyanna? —Pergunto querendo saber como minha irmã era.

—Eu menti sobre ela. —Djoser revela me deixando furiosa. Espero por uma explicação enquanto bebo mais vinho.—Lyanna está viva. —Foi a vez de minha garganta repudiar o vinho por tamanha surpresa. Logo começo a tossir novamente, mas meu olhar permanece em Djoser.

—E porque diabos você me disse que ela morreu? —Pergunto. —Djoser, porque também não me contou que meu tio morreu? Eu soube porque Zion se informou com mercadores. Porque está me escondendo tantas coisas?

—Porque eu precisava despistar Amun. —Djoser fala. —Ele queria Lyanna, então mandei ela para longe.

—E nossa mãe? —Pergunto incrédula.

—Tive que arrancar Lyanna dos braços de nossa mãe. Com o tempo ela aceitou que era o melhor para Lyanna. Mas eu vi o quanto mal ela ficava, então dei um jeito de mandá-la para a Núbia e lá ela viver com Lyanna. —Djoser revela. —Não podia falar tudo para você. Correria o risco de Yaffa contar para Amun.

—E como Lyanna é? —Pergunto. —Ela tem cinco anos?

—Sim. —Djoser responde risonho. —Para todos no Egito Lyanna morreu. —Ele fala. —Eu sempre vou para a Núbia ver como elas estão. As pessoas acreditam que vou para ver se nossa mãe melhorou de suas faculdades mentais, tudo isso para Amun crer que estamos fracos.

—Mas, me diga como nossa irmã é! —Peço mais uma vez fazendo Djoser rir.

—Teimosa. —Djoser fala e então rimos. —De cabelos negros como eu.

—E os olhos? —Pergunto curiosa.

—Negros como a noite. Lyanna herdou tudo do nosso pai, Anippe. —Djoser revela. —Ela me pediu para levar você para casa. —Acabo rindo. —E nossa mãe não vê a hora de te ver.

—E como ela está agora? Mudou muito?

—Ela não corta mais os cabelos desde que estava grávida. —Djoser revela. —Seus cabelos já estão abaixo dos ombros novamente, presos e as vezes bagunçado por Lyanna. Loiros como o seu e o de Gab.

—Gab? Não o vi lá fora. —Falo.

—Ele ficou no Egito. —Djoser fala. —E nossa mãe na Núbia, como já disse.

—Yaffa não será a única a ir conosco. —Falo para sua surpresa. —Leila e Gahiji também vai.

—Soube que eles se casaram. —Djoser fala e então sorrimos.

—Halima e Zion irão também. —Falo para sua surpresa. —E Yaffa.

—Eu irei falar com ela. —Fala. Logo somos surpreendidos por Halima que entra em minha tenda. —Halima.

—Djoser. —Halima fala sorridente. —Ou devo lhe chamar de majestade?

—Não precisa. —Djoser fala sorridente.

—Eu vim lhe chamar para jantar, mas pelo o que vejo... —Halima brinca.

—Eu irei com muito prazer. —Djoser fala como se estivesse encantado por Halima. —Vem, Anippe? —Ele me chama.

—Não. —Falo. —Podem ir. —Falo e então vejo um sorriso nos lábios de Halima.

—Shalom. —Halima fala ao sair ao lado de Djoser. Mal eles dois saem e vejo Arão entrar em minha tenda. Desde que Joquebede morreu, preferi ter minha tenda.

—Arão? —Indago ao ver o homem em minha frente. —Está tudo bem?

—Eu vim apenas saber como você está. —Arão fala e então sorrio. —Agora você vai embora.

—Talvez amanhã ao amanhecer. —Falo sorridente.

—Anippe, eu sei que é inadequado. —Arão fala ao se aproximar de mim. —Mas eu sempre me mantive longe de você desde aquele dia...

—E eu também. —Interrompo o homem. —O que fizemos foi errado. —Falo. —Era apenas um desejo seu.

—Não, não era! —Arão nega me surpreendendo. —Eu te amo, Anippe. —Arão se declara me deixando perplexa. —Eu não queria aceitar isso porque você ainda era uma menina naquela época. —Fala.

—Eu também te amo, Arão. E é isso que tento entender desde que nos beijamos. —Falo para sua surpresa. —Mas isso não vai adiantar de nada agora. Eu vou embora, Arão.

—Não faça isso. —Arão pede ao segurar minhas mãos. —Não agora que sei que sou correspondido por você, Anippe.

—Mas eu preciso voltar para casa. —Falo. —Eu não fui feita para amar , Arão.

—Como não, Anippe? Você acaba de dizer que corresponde aos meus sentimentos e agora diz que não foi feita para amar? —Arão pergunta incrédulo. —Se eu revelei meus sentimentos foi porque esperei você se tornar uma mulher feita. —Ele fala. —Esperei por anos e anos com medo de você me ignorar. E agora estou aqui parecendo um adolescente na sua frente.

—Não me trate assim! —Peço exaltada. —E não pense que não sinto o mesmo! —Falo. —Ou por acaso acha que eu iria falar para você que te amava? Eu pensava que no mínimo seria ridícula ao fazer isso. —Falo.

—Agora é tarde demais, Anippe. —Arão fala lastimo com a situação e então resolvo me levar pelas emoções.

—Eu te amo, Arão. Eu sempre te amei. —Falo ao me aproximar dele para minha surpresa. Fico próxima de seu rosto, assim como um dia fiquei. —E eu quero você para mim. —Revelo enquanto olho no fundo dos seus olhos. —Eu vou partir, Arão. Mas antes eu quero levar a melhor lembrança desse amor que não foi vivido. —Falo deixando claro o meu desejo. Arão então me envolve em seus braços como nunca fui antes envolvida.

—Eu não posso fazer isso com você, Anippe. —Arão pede ao me ter perto de si. Eu então toco em seu rosto e vejo Arão fechar os olhos com o meu toque.—Não posso desonrar você. —Ele fala ao abrir os olhos ternamente. Arão é um homem muito honrado, eu sei muito bem disso. Mas ele me ama...

—O que é honra quando se ama? —Minha pergunta não foi respondida com palavras vindas de Arão, mas sim com um beijo seu. Quando Arão e eu nos deitamos na cama eu fico certa de apenas uma coisa. Eu serei de Arão essa noite. E eu farei de tudo para não esquecer o que está para acontecer aqui.

(...)

—Anippe? —Djoser chama por mim e então me acordo assustada, mas não demonstro nada. Noto que Arão não está ao meu lado. E então me lembro de tê-lo visto partir antes do amanhecer para não levantar suspeitas.

—Onde você estava? —Pergunto para meu irmão. Djoser não dormiu em minha tenda.

—Adormeci na tenda de Moisés. —Djoser responde e então sorri. —Já conversei com Yaffa e estamos esperando você.

—Me esperando? —Indago curiosa. —Porque?

—Já perdemos a manhã por sua causa, você dormiu demais. —Djoser fala e eu arregalo os olhos. Eu devo ter dormido muito por causa da noite que tive... —Espero você. Ainda faltam algumas coisas de Yaffa e Halima... —Meu irmão dá ênfase ao falar de Halima. —É uma pena que Chibale não venha conosco.

—Uma pena. —Finjo estar lastimada. —Eu vou me preparar. Logo irei ao seu encontro. —Falo e então Djoser se retira com um sorriso nos lábios.

Acabo me deitando novamente ao sentir o perfume de Arão em minha pele. Mesmo sendo um grande pecado por ele ser o sumo sacerdote, eu não me arrependo de ter me entregado para ele. Eu amo Arão, mas sei que o amor não é feito para mim. Por isso deixarei a noite anterior como a única lembrança da nossa história que não foi sequer vivida como deveria ter sido. —Esse é o nosso pecado. Mas ninguém nunca vai saber sobre o que aconteceu entre nós dois. — Mesmo que eu sinta meu coração bater forte, não ficarei. Logo trato de me levantar e preparar minhas coisas para a minha partida e tento esquecer o que aconteceu.

—Anippe. —Miriã chama por mim ao entrar. —Já está preparando as suas coisas para partir. —Ela fala triste.

—Já deveria ter feito isso. —Falo. —Djoser veio de surpresa e olha só como são as coisas. Eu quem tenho que correr para arrumar tudo. —Falo risonha.

—Vai embora depois do que aconteceu? —Miriã pergunta me deixando confusa.

—O que aconteceu? —Pergunto enquanto olho para Miriã.

—Ontem a noite vi Arão entrar nessa tenda. —Miriã fala olhando fixamente para mim. —E antes do amanhecer o vi sair. —Ela revela. —Eu sei que Djoser não dormiu aqui. Ele estava na tenda de Zion.

—Zion? —Pergunto incrédula. Meu irmão disse que dormiu na tenda de Moisés... Então ele mentiu para mim, mas porque?

—Sim, Anippe. —Miriã afirma. —E para finalizar você perdeu a manhã dormindo como nunca dormiu antes. —Ela finaliza. —O que vocês dois fizeram foi grave.

—Ninguém precisa saber. Vou embora hoje mesmo. —Falo.

—Não se todos obrigarem Arão a casar com você. —Miriã fala e me surpreende.

—Pare com isso, Miriã. —Peço. —O que ganharia com isso?

—Eu não ganharia nada. Mas o que você e Arão fizeram foi grave. —Miriã fala e eu concordo. —Mas agora não tem mais volta.

—Por isso mesmo não deve falar para ninguém. —Falo. —Guarde esse segredo, Miriã. Guarde com sua vida.

—Tudo bem. —Miriã então é convencida por mim. —Agora me deixe ajudar você.

—Pensando bem. —Falo ao achar as roupas que usei ao chegar no acampamento após sair do Egito. —Eu só vou levar isso comigo. —Falo para surpresa de Miriã. Olho então para o vestido que Halima fez para mim e sorrio. —Eu só trouxe isso comigo. É só isso que vou levar. —Falo. —Não vou vagar quarenta anos no deserto, Miriã. —Falo e então ela me olha surpresa. —Não por um erro do meu próprio povo.

—E vai voltar para um reino que é...

—O Egito aceita apenas Deus, Miriã. Djoser me disse que muita coisa aconteceu por lá. —Falo enquanto olho para o vestido. —E sendo assim vou voltar para lá. —Falo e então abraço Miriã. Permaneço com seu rosto bem próximo ao meu e então pego o pequeno espelho para ver a semelhança em nossos olhos. —Mas sempre vou lembrar de tudo o que aconteceu aqui.

—Espero notícias suas. —Miriã fala e então sorrio. —É sua? —Ela pergunta ao ver um rubi próximo as minhas coisas. Me lembro de ver Arão pôr algo aqui, certamente é esse rubi.

—Sim. —Respondo. Esse rubi é uma lembrança que Arão quer que eu leve com ele. —Vamos, Miriã. Minha hora chegou. —Falo ao preparar tudo com a ajuda da mulher.

(...)

—Eu não acredito que você vai embora. —Moisés fala enquanto segura minha mão. —Mas se você acha melhor assim. —Ele fala.

—Sentiremos sua falta. —Zipora fala e então sorrio para os meus sobrinhos.

—Eu vou dizer para nossa mãe tudo o que aconteceu. —Falo para Moisés.

—Tia? —Bezalel chama por mim ao lado de Leila. —Acho que preciso me despedir de vocês duas.

—Quando você quiser ir, ou Leila quiser voltar. —Falo sorridente. —Somos uma família, não somos?

—Mas é claro que somos. —Djoser fala ao se aproximar e sorrir. —E temos mais quarenta anos para ver nosso povo entrar em Canaã. —Ele fala. —As portas do palácio vão estar sempre abertas para o meu povo. —Ele fala.

—Então... —Falo ao abraçar meu sobrinho. —Até breve. —Falo antes de me dirigir até Arão.

—Espero que saiba o que fazer com o rubi. —Arão sussurra.

—Farei uma jóia cujo diamante principal seja o rubi.—Falo e então nos abraçamos pela última vez. —Eu te amo. —Falo baixo e então ele sorri.

—Eu também. —Arão fala trêmulo. —Adeus, Anippe. —Ele fala infeliz ao me ver partir para sempre.

—Adeus, Arão. —Me despeço e então sorrio pela última vez para Arão.

Vejo Halima no mesmo cavalo que Zion está, assim Djoser me põe no seu e se despede de Moisés. Yaffa está entre Leila e Gahiji, juntamente ao filho deles. Logo Djoser monta em seu cavalo e olhamos pela última vez para todos os hebreus. —O vento bate em meus cabelos enquanto os homens de Djoser nos cercam formando a nossa segurança. Quando partimos, Djoser então resolve falar.

—Não vamos atravessar o deserto, Anippe. —Djoser revela e então permaneço confusa. —Há uma embarcação nossa próximo daqui. —Ele fala. —Nós vamos chegar pelas águas. —Ele revela me fazendo sorrir. —Estamos voltando para casa, Anippe. —Ele fala enquanto cavalgamos no seu cavalo. —E desta vez, vamos ficar juntos.