Eu permaneci calada após enfrentar Hur e ele também preferiu se calar após ouvir a minha ameaça, talvez fiquemos assim até Djoser chorar ou até mesmo um de nós dois voltar a falar. Mas nenhuma dessas coisas aconteceu, o que aconteceu em seguida foi a entrada de Gab em meu quarto.
Ele olhou primeiramente para Hur e se deparou com o a incredulidade dele ao ver o quanto atrevido ele é, depois ele dirigiu seu olhar para mim como se pedisse ajuda, mas ao mesmo tempo ele se aproximava sorrateiramente e com precisão.

—O que faz aqui? —Hur pergunta alterado, mas Gab não se deixou intimidar. —Saia daqui! —Ele esbraveja. Olho para Djoser que ainda dorme tranquilamente em seu berço, ele não se assustou com a voz do seu pai.

—Você não é ninguém para me dar ordens! —Gab esbraveja de volta. Quando eu vi que ambos estavam dispostos a brigar, criei forças e me levantei da cama.

—Mas o que é isso? —Pergunto indignada ao ver os dois brigando enquanto meu filho dorme.

—Me perdoe, princesa. Mas eu não irei tolerar uma afronta como essa. —Gab fala olhando direitamente para Hur.

—Atrapalho? —Paser pergunta ao me ver entre Hur e Gab.

—Afaste-se dela. —Hur fala e me puxa pelo braço.

—Mas o que é isso? —Paser pergunta incrédulo. —Não se envergonha disso, príncipe Gab? Se aproximar de uma mulher casada com tanto atrevimento.

—Em momento algum me atrevi a tocar na princesa Henutmire, mas o marido dela não parece confiar nela. —Gab debocha. Eu o observo por alguns instantes e percebo o quanto cínico ele é.

—Eu lamento em ter que ver o senhor por mais algumas luas até o meu neto completar dois meses de nascido... —Paser revela. Gab poderá passar todo esse tempo conosco?

—Eu não lamento. —Gab fala e me olha pleno de cobiça, mas acaba se retirando de dentro do meu quarto.

—Se sente disposta para conhecer Amenhotep? —Paser pergunta e me deixa confusa, mas rapidamente entendo o que ele fala. Se trata do meu sobrinho... —Traga o príncipe Djoser para conhece o primo, princesa. —Paser fala animado. —A senhora precisa ver o quanto meu neto é forte! —Ele fala estridente de alegria. Vi Hur carregar Djoser em seu braços, mas também vi o quanto raivoso ele estava pelo o que acabava de acontecer. Ele se retirou com Djoser nos braços sem dizer nenhuma palavra, o que fez Paser me olhar por preocupado.

—Preciso de sua ajuda, Paser. —Falo.

—Pode falar, princesa.

—Preciso que pesquise para mim sobre algumas histórias sobre... —Palavras faltaram no momento que olhei bem nos olhos de Paser. —Quero saber sobre as histórias dos herdeiros que não eram filhos dos soberanos, entende? —Pergunto ao ver dúvida no olhar de Paser.

—Príncipes que se tornaram reis sem serem merecedores do trono, a senhora quer dizer. —Paser fala e eu concordo. —Não é preciso procurar isto em nenhum papiro, senhora. Isso foi muito comum durante o governo de antigos faraós.

—Comum?

—Sim, princesa. As vezes era comum até mesmo o irmão da rainha governar no lugar do cunhado pois os soberanos não conseguiam ter filhos! —Paser revela. Eu nunca havia pensado em tal coisa em toda a minha vida, já presenciei de perto outro tipo de coisa, como por exemplo a chegada do pai de meu pai ao trono do Egito.

—Eu pergunto isso por quê, como você sabe, o meu avô se tornou rei do Egito somente por ser o general de confiança de um do rei que governava naquela época.

—Mas no caso que a senhora se refere houve muitos conflitos. —Paser fala ao lembrar de algo. —Tutancâmon, um faraó muito respeitado, teve a sua verdadeira história revelada. —Ele fala me deixando confusa. —Sua verdadeira mãe era uma princesa e seu tio era o faraó. A esposa do tio de Tutancâmon teve quatro filhas, nunca deu um herdeiro para o marido, então Tutancâmon foi trocado.

—Trocado? —Pergunto assustada. —Quer dizer que a mãe dele criou a sobrinha enquanto o irmão criava o filho dela?

—Exatamente. —A confirmação de Paser me deixa assustada. —O tio do antigo faraó Tutancâmon não tinha amor pela própria filha como o faraó Seti tinha pela a senhora, princesa. —Paser fala me deixando pensativa. Se Nefertari tivesse tido uma filha ao invés de um filho, Ramsés teria a coragem de entregar sua filha para mim e cuidar de Djoser como filho para não se sentir "envergonhado" pelos demais? —E a senhora acabou fazendo história também, princesa...

—Com Djoser? —Pergunto.

—Me refiro à Moisés. A senhora será lembrada como a princesa egípcia que recebeu dos deuses um crianças que estava destinada a viver como escreva pela lei da ordem cósmica estabelecida pelo seu próprio pai, senhora. —Paser fala orgulhoso. —Eu espero que a senhora e o príncipe Djoser escrevam mais uma bela história para ser lembrada como tantas outras.

—Eu espero que sim, Paser. —Falo temendo pelo futuro do meu filho.

(...)

—Vamos entrar? —Hur pergunta ao me ver se aproximar dos aposentos de Ramsés, eu aceno e em seguida adentramos e nos deparamos com Ramsés com o filho nos braços. Trato de retirar Djoser dos braços de Hur e o levo comigo para conhecer Amenhotep.

—Amenhotep, esta é sua tia Henutmire. E aquele que está nos braços dela é o seu primo Djoser. —Ramsés fala erguendo seu filho aos poucos.

—Ele se parece com você. —Falo ao ver o belo rosto de Amenhotep.

—Irei levar isso como um elogio, Henutmire. —Ramsés fala em um misto de ironia e brincadeira. Colocamos Djoser e Amenhotep lado a lado e olhamos para os dois tentando achar alguma semelhança, mas eles são extremamente distintos.

—Eles são tão diferentes... —Falo ao ver o quanto Djoser e Amenhotep são diferentes. De repente, Amenhotep começa a chorar e assusta Djoser. Noto que o olhar de Djoser caí em direção a Amenhotep, e então, seu choro se torna ainda mais forte.

Algo me diz que Amenhotep e Djoser não serão distintos apenas fisicamente, mas suas personalidades também serão extremamente diferentes...

Dois Meses Depois...

—Pelos deuses, como este menino está pesado... —Ouço Hur se queixar ao sentir o peso de Djoser nos braços.

—Somente o soberano é capaz de suportar Djoser e Amenhotep nos braços ao mesmo tempo. —Uri fala e toma Djoser dos braços de Hur. O jardim real está se tornando pequeno para Djoser pelo o que vejo...

—Princesa? —Leila me chama e faz um gesto para eu me afastar dos demais.

—O que foi? —Pergunto.

—O príncipe Gab deseja ver a senhora antes de partir. —As palavras de Leila me fizeram observar Hur e Uri dando atenções para Djoser. Eu e Hur sempre brigamos por causa de Gab, em alguns momentos estamos em paz e harmonia, mas é só Gab se aproximar que tudo muda. Mas eu não posso fazer uma desfeita dessas por causa do ciúmes de Hur!

—Me leve até Gab.

(...)

Gab estava saindo da sala do trono quando Leila me levava até ele, ele acabava de se despedir de Ramsés e Nefertari. —Princesa... —Ele fala ao me ver. —Pensei que não atendesse ao meu pedido. —Gab fala surpreso.

—Apesar de tudo, sou uma boa anfitriã. —Minha ironia faz Gab rir.

—Não posso dizer o mesmo em relação ao seu marido. —Gab fala fazendo Leila dar um passo para trás.

—Com licença. —Leila pede e se retira incomodada.

—Levarei como lembrança os seus olhos. —Gab fala me deixando constrangida, mas o que veio logo em seguida foi mais constrangedor. Gab tocou em meu rosto e me olhou por alguns segundos antes de voltar a falar. —Olhos como as ondas do mar. —Ele tenta me seduzir com seus poemas, mas eu retiro a sua mão de perto do meu rosto.

—Adeus, príncipe Gab. —Falo friamente e ele engole um seco ao ser duramente afastado de mim.

—Adeus, princesa Henutmire. —Gab fala e segue em frente. Eu não viro para trás para olhar a sua saída, apenas sorrio de canto ao saber que nunca mais Gab me fará ter problemas com Hur.

Uma tontura inexplicável toma conta de mim enquanto permaneço sozinha no corredor, mas consigo ir até a sala do do trono e vejo Ramsés, me parece que Nefertari não quis se despedir de Gab...

—Henutmire... —O soberano fala ao me ver entrar na sala do trono sem ser anunciada. —Ultimamente você parece brilhar mais que o próprio Rá.

—Talvez ele tenha me favorecido hoje. —Falo ao subir cada degrau até ficar frente a frente com ele no altar. Uma nova tontura toma conta de mim novamente, mas eu consigo fazer com que Ramsés não perceba.

—E Djoser? Onde o meu sobrinho está? —Ramsés pergunta.

—Está no jardim com o pai e o irmão. —Falo enjoada, mas desta vez Ramsés percebe que estou indisposta.

—Algum problema? —Ramsés pergunta preocupado. —Você está pálida, Henutmire. —Ele adverte ao olhar bem para o meu rosto. Começo a ver tudo girar em minha volta e acabo caindo de bruços nos degraus do trono, e por fim, fecho os olhos.