Oh, vã cobiça! escrita por Eduardo Marais
Regina abre os braços e apresenta sua biblioteca para a filha. Percebe que ela não mostra entusiasmo.
– Todos os livros que nós duas estudávamos, eu tirei daqui. Tudo isso foi conseguido durante toda a minha vida, comprando no mercado negro.
Yasemine estreita as sobrancelhas escuras.
– Mercado negro é um lugar...bom, isso não é importante agora. Quero que observe a quantidade de livros para o nosso estudo.
A menina começa a brincar com as próprias mãos. Abaixa a cabeça e fica entretida com seus movimentos.
– Eu sei que você já conhece este lugar. Não sei como ou quando, mas conseguiu abrir a porta e vir até aqui sem a minha permissão.
Levantando apenas os olhos, a menina não se mostra amistosa.
– O que você conheceu aqui?
Olhando para um canto qualquer, Yasemine ignora a pergunta.
– Você leu livros? Decorou alguma receita? E depois que decorou, usou em alguma pessoa? – Regina aproxima-se da filha. – Não quero ser rude, mas caso continue ignorando minhas perguntas, enviarei o seu pai de volta para dentro do livro que o tirei.
– Não! Você não pode! – Yasemine grita e rosna, encarando a mãe.
– Posso! E farei isso, porque ele é a razão do seu mau comportamento! Você está começando a ferir pessoas por sentir ciúmes de seu pai! Caso continue agindo como se fosse uma bruxa louca, eu enviarei seu pai de volta para o reino dele!
A menina começa a chorar imediatamente. Era um choro dolorido, agudo e desesperado.
– O que você fez ao menino gordo de sua sala? O menino que rasgou a foto!
– Nada!
– O que você fez para que ele ficasse doente? Ele está emagrecendo e vai secar! – Regina inclina-se para frente e mostra-se pouco gentil. – Sabe que sou mais forte que você e posso fazer o que estou ameaçando!
– Eu ordenei que ele ficasse magro! Como está escrito no livro do cigano!
Regina empertiga-se e cruza os braços diante do corpo. Olha a filha com a superioridade das rainhas e não se comove com o choro. Estava começando a ficar incomodada com aquele comportamento possessivo sobre Vasco.
– Nós iremos visitar o menino e você vai desfazer sua maldição. Não há discussão!
Horas mais tarde, Vasco desce dos quartos e encontra Regina entretida na leitura de uma revista qualquer. Ela o aguardava para verem um filme na televisão.
– Eu fiquei preocupado com o humor de Yasemine. – ele se senta ao lado da esposa e a recebe encostada em seu peito. – O que houve?
– Chamei a atenção dela por uma agressão a um colega de classe. O menino que rasgou a foto.
– Você interrompeu com os ensinamentos?
Regina ri, achando graça na pergunta.
– Sim.
– E apagou as lembranças que ela tem sobre os conhecimentos?
– Caso eu faça isso, Vasco, vou fritar o cérebro de nossa filha. Ela será transformada em um zumbi. É isso que quer?
Ele não responde. Apanha o controle remoto e aciona o comando para iniciar o filme. Não tinha argumentos e nem conhecimento específico para debater o assunto com a esposa.
Na manhã seguinte, Vasco entrega as filhas para as profissionais que trabalhavam na escola. Observa Yasemine andar insubmissa para dentro da escola, enquanto Alda seguia saltitante e feliz, conversando com sua cuidadora.
– Sr. Agilulfo!
Os olhos de Vasco desviam-se para a origem do som e encontra a jovem professora de Yasemine, em pé diante dele e com o mais brilhante dos sorrisos estampados em seu rosto.
– Srta. Smila! Bom dia!
– Serei rápida porque ambos temos de começar nosso trabalho. – ela segura o antebraço dele com ambas as mãos. Era uma invasão. – Haveria a possibilidade de sua empresa importar um filme romeno para mim?
Vasco não consegue responder de imediato. Aquelas mãos sobre seu braço pareciam queimar sua pele sob a manga do casaco. Extremamente incomodado, ele se sente totalmente despido em meio a toda aquela multidão de mães e crianças.
– Procure a...a minha empresa...meus f-funcionários atenderão a s-seu pedido. – ele começa a desvencilhar-se suavemente, mas as mãos da mulher não saíam dele. – Srta. Smila, preciso ir trabalhar...poderia dar-me licença?
Ela sorri e afasta-se dele. Aquele seria o primeiro de muitos toques. Tinha a certeza de que os próximos toques não teriam os tecidos das roupas impedindo suas mãos de sentirem o calor da pele do homem.
Sorri ao vê-lo sair apressado. Sente que havia provocado um incômodo nele. Então, ele não deveria ser tão fiel à Rainha Má, como tentava mostrar ao mundo.
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