Nunca fui a mais disputada entre os rapazes do Acampamento. Não, isso só acontecia com as filhas de Afrodite. Nós, filhos de Apolo, sempre ficamos em segundo plano. Então, diante dessa revelação, você já deve entender porque fiquei confusa.

Mas agora que eu tinha mais opções, quem eu escolheria? Hermes era legal, e me fazia rir, mas me sinto intimidada diante de mais de três mil anos de experiência. E além do mais, ele era imortal. Quantas namoradas já teve, e quantas terá?

Com Charles é diferente. Não é nem um pouco experiente, e é legal tê-lo por perto. Sempre de bom humor. E ainda tem aqueles olhos, ah, os olhos... Me deixaram assustada da primeira vez que vi, mas agora me hipnotizam completamente.

Pensei tudo isso durante o segundo que durou nosso beijo.

— Você está começando a tomar gosto por isso, hein? – sorri.

— É, descobri que sou um exímio beijador. – fez uma pose triunfante. – E agora eu também salvo donzelas em apuros.

— Deixe-me adivinhar. Principalmente aquelas que gostam de sair tropeçando por aí? – será que a referência estava bem clara?

— Exatamente. Oh, mas sobre quem estamos falando? – sua voz soou falsamente dramática. – Será que é sobre uma garota com um bronzeado extravagante demais para o inverno?

— Rá rá, estou morrendo de rir. – mostrei minha língua infantilmente. – Vamos entrar logo Senhor salvador-de-donzelas-em-apuros.

E voltamos para o calor da casa, felizes com a presença um do outro.

.

— Pensei que não te veria novamente tão cedo, Senhor Hermes. – falei, enquanto admirava o jardim onde estávamos. Na verdade, eu nem mesmo conseguia olhar nos olhos do Deus dos ladrões.

— E o que te faz pensar isso, Sunshine? Sabe que ADORO o prazer de sua companhia. – o jeito como ele pronunciou a palavra adoro me fez tremer. É claro, se referia a noite da festa.

— Imagino. Mas não pense que vou ser fácil, viu? – essa frase pareceu mais ridícula do que eu havia imaginado. – Nunca mais vou beber na minha vida.

— Não precisa exagerar, Emma. – ele riu. Eu estava falando sério! – Na verdade, não foi uma boa ideia te chamar aqui hoje. Tenho algumas entregas importantes, e acho que não teremos muito tempo.

— Ah, tudo bem. – fiquei mais aliviada do que pensei que ficaria. – Então é só me levar pra casa. Sem problemas.

— Mas eu tenho um presente pra você. – com gesto exagerado demais, fez um buquê de rosas aparecerem. – Aqui está. Pela sua primeira vez.

— Obrigada. São lindas. – nunca recebi flores em toda a minha vida. Foi emocionante. – Não tenho nenhum presente para te dar.

— Isso basta. – me roubou um beijo, e dei um tapinha de brincadeira nele. Será que eu deveria ficar lisonjeada com o seu comentário? – Ei! Você me bateu!

— Você não disse que estava ocupado? Me manda logo de volta!

— Seu desejo é uma ordem, Majestade!

Quando abri os olhos, já estava na sala. Ia em direção a escada, quando ouvi um pigarro. No sofá, meu pai me analisava da cabeça aos pés. Ah não, hoje não...

— Pode me dizer onde você estava, Senhorita Emma? – estreitou os olhos.

— Eu... Ahn... Fui ao mercado. – eu podia ter dado uma desculpa melhor, mas me faltava inspiração. Droga!

— E onde estão as compras? Tudo o que eu vejo é um buquê.

— Eu que comprei! Foi para me presentear, sabe?

— Você não me engana, garotinha! – me senti como uma criança de cinco anos que roubou doce da geladeira. – Você foi se encontrar com Hermes!

— Como sabe?

— Eu sei de tudo! Sou o Deus das profecias também, lembra? – a humildade é de família. – Minha filha, toma juízo! Hermes é um malandro!

— Que nem você, né? – rá! Xeque-mate!

— Pode até ser, mas eu sou seu pai! É o meu dever te dar conselhos!

— E quais são? – cruzei os braços.

— Sente-se aqui, querida. – fui para o seu lado no sofá. – Meu conselho é só um.

— Que é...?

— Largue esse Deus de araque e fique com Charles! – ele gritou a plenos pulmões.

— Pai! Deixe de ser infantil!

— Não! Eu vou colocar a boca no trombone! – continuou. Ai, que vergonha... – Esse garoto tem futuro, Emma! Não é o mais bonito do mundo, é verdade, mas pelo menos não é um canalha que pode te trair a qualquer momento!

— Isso é um absurdo! Hermes é muito legal! Foi ele que me deu essas flores.

— Ah, eu sei. E também sei do que aconteceu há algumas noites atrás. – ops. A noite da festa.

— Olha, pensa assim... Nem foi tão ruim. Eu não me lembro de nada, e eu tenho certeza de que ele foi bem gentil. Afrodite até me mandou um CD...

— Do que você está falando? – franziu o cenho. – Eu ia dizer que vocês estavam se pegando nos jardins do Olimpo algumas semanas atrás. MAS QUE HISTÓRIA É ESSA, EMMA BROWN?!

— Calma! Não é nada demais, é só... – que desastre! Eu deveria ter ficado calada!

— Não precisa dizer mais nada! Aquele desgraçado te levou para a cama, não é? Miserável! Eu vou acabar com ele!

— Apolo! Para com isso! Se controla! – os vizinhos iriam reclamar. Pior, Charles poderia acordar! – Não foi culpa dele, Dionísio me deu uma bebida e...

— Não importa! Você tem só dezessete anos! É quase uma criança! – ele respirou fundo, e ficou alguns segundos fazendo uma pose dramática de pai preocupado. – Tá, tudo bem. Eu deixo essa passar, se...

— Se o quê?

— Se você ficar com esse garoto e deixar Hermes em paz! Se fizer isso, eu juro que esqueço tudo, até posso fingir que essa conversa não aconteceu. O que me diz?

— Não sei, pai. É complicado. Não me decidi ainda. – AINDA não, mas eu teria que fazer isso logo.

— Tudo bem. Te dou alguns dias para pensar, está bem? Nos vemos depois do ano novo. – deu um beijo na minha testa e evaporou. Ufa...

— Ei, Emma. – Charles apareceu no pé da escada, com o cabelo cobrindo os olhos. – O que aconteceu, hein? Ouvi gritos...

— Ah, nada demais, só uma conversinha que tive com o meu papai querido. – será que ele reparou no jeito como falei de Apolo? – Pode voltar a dormir.

— Tá, tudo bem. Boa noite. – assentiu a cabeça e voltou para o seu quarto.

Meu tempo estava acabando, e eu ainda não fazia ideia de quem escolher. Será que seria melhor seguir o conselho de meu pai e ficar com o filho de Hefesto?