Serena escrita por Maria Lua


Capítulo 19
Se fosse de Oz... Gostaria de ser o homem de lata


Notas iniciais do capítulo

Dois em um só dia! Sim! (depois da meia noite conta, não é?)
Bom, espero que fiquem felizes com esse. Estou muito feliz por ter ganhado uma leitora nova nessa altura. Obrigada pelas palavras, Angel! E obrigada, Liz, por todos os elogios! E, também, obrigada aos comentários do Bruno e da Jú Boxer, que sempre me incentivam!



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Fiquei sentado na cama assistindo ao filme “se meu apartamento falasse”, de 1960, até a meia noite. Quando ouvi soar as badaladas da igreja do colégio eu decidi vestir meu casaco e ir lá fora. Estava frio, ventava muito, o que fez com que eu andasse abraçando meus próprios braços. O vento fazia sons estranhos, o que me assustava um pouco. Olhava em volta torcendo para ser um espírito ou um assassino – temia que fosse Violet, voltando com as suas tendências vingativas. Se bem que, olhando de certo ângulo, eu tenho me sentido tão solitário ultimamente que até mesmo a sua perseguição ao estilo Maximus me traria alguma alegria. Há dez dias falo apenas com a diretora, uma ou outra aluna, e troco e-mails com meus pais. Isso me desmotivava.

Tudo estava um breu: silencioso, escuro, vazio... Até alcançar o dormitório A-23, onde começo a ouvir sussurros e movimentos. Imagino dezenas de coisas: orgias, torturas, planejamentos. Não duvidava de nada vindo das garotas que ali viviam. Foi então que ouvi um som curioso. Bum! Era como um tiro, seguido de várias risadas. De olhos esbugalhados eu entrei rapidamente no quarto, já imaginando um homicídio ou coisa semelhante. Com a porta abrindo de repente muitas das garotas gritaram, mas logo em seguida ficamos todos perplexos nos encarando.

O quarto estava escuro, com vários pisca-piscas espalhados pelas paredes. O quarto era composto por seis camas grandes, seis armários e duas escrivaninhas, e havia a porta de uma suíte ao lado. Uma das meninas segurava uma garrafa de champanhe na mão, aberta, soltando espuma. Todas elas estavam seminuas – de topes, mini-saias, vestidos muito curtos. Exceto uma delas: Serena. Serena estava sentada em cima de uma das escrivaninhas vestindo somente uma mini saia e um sutiã que eu já conhecia – um preto com listras brancas. Uma de suas pernas estava levantada, enquanto a outra balançava. Era, basicamente, a cena mais sensual que já havia visto.

Porém, aquele meu transe não foi muito bem encarado. As meninas me encaravam assustadas.

– O que está fazendo aqui?! – gritou uma, correndo para cobrir sua barriga com um lençol. As outras a imitaram, escondendo as bebidas e seu corpo. Serena, por sua vez, permaneceu imóvel, me encarando. Seu olhar neutro sob mim me causava tristeza, mas tive que me manter composto.

– Me digam vocês! Estão acordadas depois do horário... Bebendo?! – falei indignado, dando um passo à frente.

– Que audácia! Você invadiu nosso quarto! Meu pai é advogado, pode muito bem te processar por assédio sexual. – uma delas falou, com a voz tremendamente irritante. Ela olhou para Serena, que continuou parada. Sua postura de abelha rainha era de se admirar. – Serena, diga alguma coisa!

Ela deu de ombros.

– Ele pode mesmo. – ela falou, se referindo ao processo. Todas as meninas a encaravam confusas. Uma se aproximou dela e sussurrou em seu ouvido, mas de maneira que eu também pudesse ouvir

– Sê, você precisa falar alguma coisa. Se ele contar que estávamos bebendo no quarto nós vamos ser expulsas! – falou em tom ríspido. – Faz alguma coisa! Ele é afim de você! Você sabe o que pode comprá-lo!

Serena olhou para ela com a expressão morta, bufou, e andou em minha direção. Com a sua saia mostrando grande porcentagem da bunda, um sutiã espremendo seus peitos e o cabelo bagunçado eu a encarava. O que estava fazendo antes? E, por Deus! Por que tinha que ser tão bonita?

Ela atravessou a porta e parou, me esperando do lado de fora do quarto, de braços cruzados, olhando o horizonte. Eu a segui, fechando a porta atrás de mim. O vento estava forte, e ela demonstrava sequer perceber que saiu de seu aquecedor.

– Você não vai contar nada. – ela falou, simplesmente.

– Por quê? – perguntei.

– Por dois motivos. Primeiro que, como você sabe, eu tenho prioridade aqui. Não vou ser expulsa ou prejudicada, mas cada uma delas vai ter que procurar uma escola nova amanhã se isso for exposto. – falou. – E segundo que você me deve essa. – a sua voz refletia mágoa, rispidez, e isso cortava o meu coração.

– Não foi isso que quis dizer. – falei, fazendo-a olhar para mim. – Por quê?

Ela bufou e abaixou a cabeça. A vi sorrir, mas não da maneira que eu queria. Ela estava sendo irônica.

– Por quê! Pergunta-me o motivo! Tem certeza de que isso não está escrito naquele livro que você fez? Ou vai acrescentar depois? – falou. Fiquei confuso por um instante. – Eu confiei no colégio. Eles me garantiram que era confidencial, e você participou dessa farsa toda!

– Mas Serena... Eu não sabia... – tentei argumentar, mas fui cortado.

– O problema, Charles, é justamente esse. Você sabia. – ela abriu a porta do quarto e entrou, chateada. Fui atrás dela. Todas as meninas nos encaravam.

– Serena... Por favor, me escute. – falei, mas logo notei a intimidade que demonstrei. Pensei em corrigir, chamá-la de Doolitle, levá-las à diretoria, mas não poderia. Devia isso à ela, e talvez fosse um modo de reconquistar sua confiança.

Ela virou-se para mim, com um sorriso de canto de boca. Todas as garotas olhavam para ela com respeito e admiração, como quem assiste a um filme excelente. Serena era uma inspiração para todas, e com razão. Estava seminua com um professor a perseguindo. Tinha quinze anos e os seios mais lindos que jamais ninguém viu.

– Perdão, mas já encerramos. Estamos combinados que nada desse quarto sairá daqui, não é? – perguntou.

– Sim, mas... – tentei começar.

– Então, se for possível, gostaria de fechar a porta. É uma festa um tanto particular, e a Caroline é nova no grupo. Precisa experimentar as melhores coisas possíveis. – falou, fazendo todas as outras gemerem de ansiedade. – Além do mais, talvez não seja uma visão agradável para você. A não ser que insista muito em partir seu pobre, desleal e não-confiável coração de vez.

Eu permaneci parado, não sabia como reagir. Foi então que percebi o que estava prestes a acontecer: Serena abaixou sua saia, ficando somente de lingerie. Nesse momento todas as garotas arregalaram os olhos, sorridentes, e assistiram ao mesmo que eu. Serena aproximou-se da garota nova, provavelmente Caroline, uma morena de seios e coxas fartas, e surpreendentemente começou a beijá-la.

E foi nesse momento que paralisia nenhuma me segurou. Saí do quarto enfurecido, magoado, sentindo-me traído. Essa esquizofrênica precisava de salvação, e eu precisava de menos sensibilidade. Ah, é como disse o mágico! Mal sabia o homem de lata de Oz a dádiva que era não ter um coração...


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