O seu nariz sentiu o leve aroma quente de bolo caseiro pronto. Era três horas da tarde e um dos principais horários em que se enchia de pessoas querendo bolos para viagem.
Ele botou sua xícara vazia de café de volta na mesa ao lado do balcão , ouvindo a xícara fazer aquele barulho quando se choca com o prato de porcelana ainda sentindo o amargor gostoso do café quente em sua língua .
Ele já sabia o que tinha que fazer em seguida, já fazia parte da sua rotina.
Pegou as luvas térmicas , abriu a porta do forno e retirou de lá uma linda fornalha quentinha de bolos caseiros.
Eram de vários sabores dês de bolo de milho , formigueiro, fubá, cenoura com cobertura de chocolate, coco e entre outros mais simples.
Abriu a portinhola da prateleira de vidro e começou a depositar os bolos nas estantes dispostas para as pessoas desavisadas na rua que passassem ali ficariam com vontade de comer um bolo.
Fazia poucos meses que ele havia abrido esse pequeno negócio ,tinha estudado quatro anos numas das melhores faculdades de São Paulo para que do nada , num dia qualquer , essa idéia de abrir uma loja especializada de bolos surgisse. Como se um anjo tivesse sussurrado essa idéia .
Mas ele não fez isso sozinho.
Com as receitas antigas que havia conseguido com a sua mãe Zilda e sua tia Gema .
Depois de construir o espaço , e colocar a placa com o nome : “ O CHEIRO DOCE DA VOVÓ”.

Com aquelas paredes de tijolos simples , todos os moradores que conheciam Pedro se simpatizaram com a loja bem simples e admirável . Gostavam na verdade da idéia da cidade de Belarrosa ter uma loja de bolos prontos onde se pode tomar até um cafezinho com bolo .
Era natural para todos eles verem Pedro vestido com um avental todo sujo de farinha e cobertura de bolo com um lenço na cabeça que escondia todo o seu cabelo que lembrava uma juba de leão , servindo eles com um sorriso adocicado.

E Pedro era sempre definido pelo seu atendimento dedicado e charmoso.

Entrar na loja , toda a manhã , passara a ser realmente um prazer. Ser recebido pelo aroma gostoso acentuado de cenoura , misturado ao cheiro do açúcar derretido , dava uma sensação secreta e misteriosa , como se Pedro tivesse finalmente encontrado um lugar perfeito para se morar.
A campainha da loja anunciou a entrada de alguém . Era uma moça vestida com um vestido preto básico que entrou na loja . Era uma morena oriental com um rosto agradável , mas que tinha um olhar aflito. Na verdade , ela estava aflita diante a tantas opções expostas nas prateleira .
A moça era de estatura baixa , com cabelos castanhos presos na nuca e olhos castanhos claros que emolduravam um sorriso cativante mesmo estando naquele estado.
Pedro se inclinou e apoiou os cotovelos na mesa. E deixou abrir um sorriso em seu rosto .
–Posso ajudá-la?
E então ela olhou – o nos olhos , e ele lhe devolve o seu olhar. Nunca Pedro sentiu o mundo parar.... como se o mundo só fosse dele e daquela garota.
Só que num instante ela se desviou dos olhos dele. Foi tão rápido ...

Por que será que o olhar dela o incomodou tanto?

– Olá, quero dizer, boa tarde ... éee o meu nome é Letícia e eu preciso de um bolo de milho verde para eu levar para a minha avó, por favor?- disse com a voz nervosa e doce ao mesmo tempo.

Ela se aproxima do balcão, nervosa e deixa sua mão pousar suave no vidro. E Pedro estica o braço e pega a mão da moça, mas não aperta; em vez disso, levanta- a até que toque em seus lábios e beija como se estivesse cumprimentando uma princesa. A barba de Pedro roça em sua mão mas ela não se incomoda, era tão bom receber carinho de alguém assim que faz você se sentir tão bem, tão cuidada...

A pobre moça sentiu –se envergonhada e tocada ao mesmo tempo.Suas pernas até ficaram bambas .

Enquanto ele, o Pedro não soube de onde veio uma onda de calor em seu peito, como se aquela moça fosse um brilho de uma estrela que precisasse ser olhada eternamente.

– E então como foi seu dia, Letícia ? – perguntou preocupado e sincero enquanto retirava o bolo pedido e o colocava numa sacola com o logotipo da loja.

Imediatamente, Letícia foi assaltada por aquela sensação estranha de ninguém , nunca, ninguém mesmo havia feito essa pergunta para ela.
Ela mordeu seus lábios sentindo receio e desconforto de se revelar muito da sua vida para aquele balconista gentil e misterioso que fez seu coração começar a bater mais alto.

Era uma bobagem ficar preocupada com a opinião dos outros, sabe?
Desde quando a opinião dos outros importa se você é você?!

Ela , então , coloca o livro que estava carregando em seu outro braço.
“O Morro dos Ventos Uivantes.”

– Foi um dia de trabalho muito cansativo. Muito cansativo. – disse sincera. Pronto.

–Entendo. Está num cargo muito complicado?

–Sim. Uma agência de viagens e tive que lidar com clientes difíceis.

– Então se eu resolver viajar já sei com quem vou falar, com a senhorita Letícia . - E eles não puderam deixar de darem uma gargalhada. Uma gargalhada contida, mas sincera. - Mas o que importa é que o dia já acabou, e com certeza , você conseguirá ter uma tarde linda e agradável com sua avó . Bom, aqui está o seu pedido. - Estendeu a sacola .

Ela pegou a sacola, mas seus dedos finos e delicados tocaram nos dedos grossos de Pedro.

Letícia sentiu o toque dos dedos dele impregnar na sua carne.

“DROGA ! ”, disse para si mesma ao sentir um choque percorrer em seu peito.

–Obrigada pela sua dedicada atenção , moço . Tenha uma boa tarde. – E ela saiu correndo dali sem se dar conta que havia esquecido seu livro no balcão.

Pedro não havia deixado isso despercebido , ele pegou o livro que estava ali e correu atrás dela, mas ela já não estava mais na rua . Dá para acreditar?
E o pior é que quando Pedro voltou para sua loja ,o relógio estava marcando quatro horas e trinta minutos ....
Sem avisar o tempo parou e esqueceu de passar por eles. Mas por quê ?

E ele se deu conta que não havia dito o seu nome para a jovem Letícia .