Contato escrita por Aleksa


Capítulo 22
Quem (Yura)


Notas iniciais do capítulo

Pra tds q gostam do Yuyu-chan XD



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Capitulo 22 – Quem (Yura)

 

 

Era muito engraçado, tudo isso, e ela esqueceu o telefone...

Eu mexia no meu cabelo bagunçado, e revia mentalmente tudo o que havia acontecido. O que eu posso fazer? Sou nostálgico...

Muito bem, durante esse processo o celular de Alice tocou, o mesmo telefone que ela esqueceu, diga-se de passagem. Ela já tinha subido, e possivelmente ido dormir... Bem, eu atendo...

- Alô? – eu disse indiferente no telefone.

- Ah, desculpe, eu devo ter ligado errado. Esse não é o telefone de uma garota chamada Alice, é?

- É sim.

- Posso falar com ela?

- Ela está dormindo.

- Pode dizer a ela que Cristine ligou?

- Ah sim, digo. Algo mais?

- Ah, acho que não...

- Então adeus.

- Tchau...

Vejamos, estou entediado, acho que vou continuar o mural.

- Vou pegar as tintas.

Alice deveria dormir por mais algumas horas... Minha culpa. Nem sequer posso dizer que me arrependo. Raramente me arrependo de algo, além do que eu tenho sido muito complacente com ela... Pela minha vontade eu já teria... Esqueçam. Mas é bom ela não se acostumar, não vou me manter calmo por muito mais tempo. E ela que reze pra não me encontrar num dia de inspiração, juro que a faço chorar...

- Será que seria legal...?

Ela deve sempre pensar em meus limites... São quase inexistentes. Já tenho tanta coisa na cabeça que eu adoraria experimentar...

Sou uma pessoa de sangue quente, é fato, não posso mudar minha natureza. Existem coisas que me fascinam, a forma como o olhar muda quando as intenções se distorcem, o toque febril na pele de um amante, a voz transparente, a sinceridade causada pelo entorpecimento dos sentidos... É uma harmonia entre corpo e alma, o mundano e o espiritual, um realismo vulgar, venenos sutis; é o momento de maior verdade do espírito, em que se assume a natureza mortal.

Estava desenhando já há algum tempo; demoraria mais uns dias até que terminasse tudo e secasse completamente. Pintar me ajudava a limpar minha mente frenética, concentrando todo o meu foco em algo primário.

- Yura. – Alice chegou se espreguiçando no corredor.

- Oi.

- Você não dormiu nem um minuto?

- Não, estava pensando, e por falar em pensar, Cristine ligou.

- Como você... Você atendeu o meu telefone?

- Você se esqueceu dele. – comentei levantando o fino telefone preto no ar.

- Ah... é verdade...

- Te distraio tanto assim?

Não era uma pergunta irônica, apesar de me divertir em pensar que podia tão casualmente desconcentra-la, até mesmo em seus raciocínios bem moldados.

- Se me esquece do telefone, é devido ao excesso de adrenalina que circulava no meu cérebro.

- O que está intimamente ligado a mim...

Ela não respondeu. Discutir estes assuntos comigo era como tentar secar ou tornar o oceano num lago de água doce;  algo impossível de se conseguir. Além do fato de meus argumentos serem bem mais interessantes...

- De qualquer forma. – iniciou ela. – Devolva-me. Preciso mudar o toque e ligar pra Cristine.

- Claro, meu acordo com você foi cumprido. – eu disse estendendo a mão em que o telefone estava.

- Não me sinto bem, parece que eu fiz algum tipo de transação criminosa.

- Bem... – comecei. – Pode se dizer varias coisas a esse respeito...

- Por favor Yura, poupe-me...

- Se você diz. – permaneci entretido no mural.

Alice, por sua vez, foi até a sauna. Não a segui, pois não faria mais nada hoje. Não digo por mim, mas por ela. Se fizesse, com certeza a mataria... Por isso, por hoje, acabou.

- Acho que quero chocolate... – completei enquanto traçava uma montanha na parede.

Fui até a cozinha, procurei nos armários e encontrei o que queria. Como disse, fui uma criança mimada, tenho que ter tudo o que quero quando quero, porém inevitavelmente essas mesmas coisas vêm até mim, e quando não vem, é fácil encontrá-las... Como chocolate, no caso.

Sentei-me na sala de TV e decidi ver um filme. Foi decepcionante descobrir o péssimo gosto pra filmes de Estela, basicamente composto por terror em geral...

- O que seria “Doce veneno”? – comentei comigo mesmo. – Que ridículo, parece nome de doença... – completei suspirando, sentindo-me estranhamente familiarizado com o nome do filme.

Alice surgiu na porta e perguntou:

- O que está fazendo?

- Descobrindo o decadente gosto pra filmes de Estela.

- Por exemplo?

- “Doce veneno” seja lá o que for...

- É um filme de terror famoso. – comentou ela.

- E você gosta desse tipo de coisa?

- Posso dizer que não chego a odiar.

- Se quiser ver, tudo bem, só não espere que me interesse.

- Claro.

Me sentei no grande sofá em frente a televisão, ligando-a. O início do filme já foi péssimo: pessoas sendo decapitadas por placas de trânsito voadoras...

- Oh céus... – eu disse, inconformado com a falta de conteúdo do filme.

Alice, silenciosa, estava agarrada a uma almofada, em uma das muitas cenas de suspense do filme que caminhava obviamente para outra morte pouco criativa e sangrenta.

Logo após esse momento, a pessoa em questão caiu num posso cheio de espinhos e foi empalada... Céus! Que inutilidade! É uma afronta a minha inteligência ver algo assim!

- Cansei...

Me levantei e caminhei até a porta deixando Alice sozinha na sala de TV, com o filme ridículo e a almofada. Disse que não iria me interessar. Caminhei até o quarto, peguei um dos livros de capa dura da estante e pus-me a ler, ainda me perguntando quanto tempo eu havia gasto com aquela inutilidade ridícula.

Minha leitura era bem mais interessante: nenhuma placa voadora decapitava ninguém, não havia pessoas fugindo, correndo, morrendo ou qualquer outra coisa nesse gênero.

- Tomara que Alice não seja impressionável...

Pensei em minha próprias palavras por alguns instantes...

- É, isso com certeza não foi uma boa ideia...

Retomando minha leitura, eu esperaria até que ela voltasse pra tomar alguma atitude. Além do que, se isso a divertia...

Uns quarenta e cinco minutos depois, Alice entrou trêmula e pálida no quarto.

- E então? Como acabou?

- Todos morreram...

Eu já esperava. Com isso, existem duas possibilidades: ou estavam testando o filme pra criar uma parte dois, ou simplesmente queriam encerrá-lo, e pronto.

- É um filme de terror, essas coisas são esperadas...

- Eu... acho que tem razão...

- Não ficou chocada com o filme, ficou?

- Talvez, acho bem provável.

- Não foi inteligente, se sabe que é sugestionável por esse lixo, não veja.

- É, mas...

- Que tipo de “mas” pode haver? Se for o caso deixe seu abajur ligado...

- Eu acho que estou bem, só um pouco chocada.

- Alice, eu te aviso, se por acaso eu tocá-la durante a noite e você ficar histérica, eu a coloco pra fora do quarto, fui claro?

- Foi...

- Então ótimo. Já é tarde, vá dormir.

As pessoas são estranhas. Pagam pra ficarem assustadas em um cinema, mas trancafiam-se do mundo exterior pra fugirem do medo... Curioso não?

Até onde pude notar, Alice dormiu tranquilamente na noite anterior. Já pela manhã ao acordar estava sozinho no quarto. Espreguicei-me, caminhei até a janela, observando que a neve havia pausado por alguns momentos, deixando o Sol pálido transparecer as nuvens.

- Para um dia na neve, está bastante bonito.

Sobravam mais alguns dias pra ficarmos lá. Três dias, pra ser mais especifico e eu já estava completa e absurdamente cansado da paisagem branca e gélida do exterior da janela.

- Aliás, onde Alice pode estar...

Dirigi-me para fora do quarto e vi Alice, insistentemente encarando a janela da sala.

- Diga-me que você dormiu. – pedi, inconformado com a possibilidade de ela ter passado a noite em claro.

- Dormi, mas acordei muito cedo.

- Percebo.

Voltaríamos perto do dia dos namorados, logo depois da páscoa, o que significa: minha mãe e Estela virão me sufocar de atenção e mimos que me aborrecem. Porém procurarei parecer o mais interessado possível... Como ser um “bom menino” é cansativo...

- Dia dos namorados é...? – claro que isso não passaria em branco, adoro datas temáticas...

Alice ainda encarava a janela.

- Alice, será que pode parar de pensar naquele filme? – perguntei abraçando-a.

- Sinto muito, preciso pensar em outras coisas.

Minha mente já cogitava duas ou três coisas que ela poderia pensar, mas me reservaria para os feriados. Adoro feriados justamente por serem temáticos.

- Nenhum comentário? – ela perguntou.

- Nada na verdade. Por quê? Alguma expectativa de resposta?

- Não... – ela disse desviando o olhar.

- Entendo. – completei, soltando-a.

Vejamos o que estes feriados vão reservar a nós dois. Espero não me inspirar de forma nenhuma, seria muito danoso à estrutura emocional de Alice. Ela ainda não está pronta... Hum, me sinto um daqueles mestres estranhos que testam seus alunos... Acho que não deixa de ser afinal...

- Isso me lembra que tenho que ir a sala de música continuar aquele mural...


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