Hana parou em frente à Universidade Raimon, contemplando a beleza do lugar. Era exatamente como havia sonhado a sua vida inteira: os estudantes espalhados pela grama, muitos deles em rodinhas cantando alguma coisa. À direita, os dormitórios. E a música. Ela estava em todos os lugares. Como era começo de ano, o campus inteiro estava tomado por barracas de clubes à procura de novos membros.

Quem visse aquilo tudo provavelmente pensaria estar em um filme norte-americano, mas a Universidade Raimon localizava-se no Japão, uma das melhores de todo o país. Contudo, o que atraíra Hana Haruki até ali não havia sido as inúmeras conquistas acadêmicas dos estudantes que a frequentaram ou o grande número de estrelas de futebol que ela possuía, e sim um lendário grupo de coral à capela chamado Raimon Stars.

A mãe de Hana havia feito parte do grupo quando tinha sua idade. Recordava-se dela dizendo que aqueles foram os melhores anos de sua vida. Então, Hana cresceu alimentando o sonho de ser uma Star, como sua mãe. Mas antes ela precisava encontrar sua sala. Percebeu que havia passado tempo demais olhando para a entrada da universidade e tratou logo de entrar. Passou vários minutos andando pelos corredores. Como ela mesma já esperava, estava perdida. Colocou uma mecha de seu cabelo para trás, pensando. Iria pedir informação.

Avistou no corredor uma garota perto de uma máquina usada pelos estudantes para comprar café expresso, refrigerante, suco, entre outras coisas. Ela parecia querer destruí-la, dando chutes e socos, até seu café começar a sair normalmente e ela ajeitar sua postura como se nada tivesse acontecido. Tomando um gole, ela se preparava para sair do lugar.

— Com licença — Hana havia parado ao seu lado no exato momento que a garota saía, sem querer assustando-a e fazendo com que ela derramasse o café em sua blusa de seda vermelha.

— Idiota!

Ela era linda. Os cabelos eram lisos, negros e repicados parando em seus ombros, com uma franja. Vestia uma blusa vermelha sem mangas — que agora já não estava tão vermelha por causa do café —, com um colar que caía sobre a mesma, semelhante a uma corrente, dando três voltas em seu pescoço e um short curto preto, junto com um salto-alto da mesma cor. Além disso, possuía belos olhos castanhos que nesse momento fuzilavam a canadense.

— Ai, meu Deus! Me desculpa. Foi sem querer, eu-

— Qual é o seu problema? Droga! Essa blusa foi caríssima. Ela deve ter custado mais que o seu carro! — Que carro?

— Eu já disse que foi sem querer.

— Sem querer nada! — a garota empurra Hana. — Pode ter certeza de uma coisa, novata, isso não vai ficar assim! Você vai me pagar — E saiu a passos pesados, como se fosse matar alguém a qualquer momento. Provavelmente, estava atrasada para a aula ou queria trocar de blusa o mais rápido possível. Se não fosse isso, certamente Hana já não estaria mais ali para contar a história.

— Que grossa... — Haruki murmurou vendo a morena se afastar.

Suspirou. Você começou muito bem, Hana, muito bem. E isso nem era o pior. Ela ainda não havia encontrado sua sala e os corredores começavam a ficar ainda mais vazios.

— Perdida?

A loira se virou em direção a voz e notou que a pergunta havia sido feita por um garoto ruivo. Ele parecia um pouco mais velho que ela, era também alguns centímetros mais alto. Usava uma camiseta xadrez verde — que acabava combinando com os olhos da mesma cor. — por cima de outra cinza. Em seu pescoço, estava a alça de uma câmera fotográfica.

— É claro que não! — forçou um sorriso, depois virou-se novamente fingindo esperar alguém.

— Ok — disse ele — É que eu te vi aí com cara de quem estava perdida e pensei em te ajudar. — ele fez uma pausa — Está esperando alguém? Porque... as aulas já vão começar.

— Estou — mentiu — Não precisa se preocupar...

— Hiroto.

— Não precisa se preocupar, Hiroto. Eu estou bem.

— Tudo bem então. — ele deu de ombros — Se você não está perdida, eu já vou.

Viu ele dar meia volta. Queria chamá-lo de volta, mas as palavras não saíam. Suspirou mais uma vez. Teria que engolir seu orgulho. Na situação em que estava, não podia se dá ao luxo de escolher de quem iria aceitar ajuda.

— Hiroto, espera!

— Sim? — deu meia volta, tentando, sem muito sucesso, esconder o sorriso vitorioso que se formara em seus lábios.

— Eu estou perdida. — admitiu de cabeça baixa.

— Eu sei. Vem, vamos procurar sua sala.

♫

— É essa — Hiroto apontou para uma porta.

— Obrigada — Hana sorriu. Estava feliz por ter conhecido pelo menos uma pessoa legal naquele dia.

— Então... — ele olhou para a placa na porta da sala. — Teatro, né?

— É e, hum, eu imagino que você faça algo relacionado a fotografia — Hana apontou para a câmera no pescoço dele.

— Isso. Aliás — Hiroto segurou a câmera e a apontou para a garota, tirando uma foto que logo em seguida foi revelada. —, uma lembrança do seu primeiro dia.

            Ele entregou a foto e começou a se distanciar, andando de costas. Sorriu para a loira uma última vez e se virou para ir até sua sala. Hana deixou escapar um sorriso também, intrigada com o jeito do garoto que acabara de conhecer.

♫

Hana já tinha planos para o final da aula: iria fazer o teste para entrar para as Stars. Caminhava animada em direção ao auditório. Por sorte, havia conseguido um mapa da universidade com uma estudante da sua sala, que também era uma das integrantes das Stars. Ela sentiu seu coração ir a mil quando a garota disse se chamar Elizabeth e fazer parte do famoso grupo à capela — embora ela tenha sido um pouco fria e sarcástica, mas isso não era importante no momento.

Depois de preencher a ficha, ela sobe ao palco. Iria cantar A thousand years e seria avaliada por duas integrantes das Stars. Reconheceu Elizabeth. Os profundos olhos esverdeados concentrados em alguns papéis, mal notando a presença da Haruki. Seu cabelo louro-claro ondulado estava da mesma forma quando Hana a viu mais cedo: solto e jogado para o lado esquerdo. Seu sorriso logo desapareceu ao ver quem era a outra garota.

Merda! Entre elas, com um sorriso maléfico, estava a mesma garota na qual Hana havia “derramado” café mais cedo — e que agora vestia uma blusa branca de algodão. .

“Você vai me pagar.” As palavras de repente vieram em sua mente como um soco. Pelo visto, ela pagaria da pior maneira possível.

— Ora, ora — disse a morena — quem diria? O mundo dá voltas, não é mesmo? Veio jogar mais café em cima de mim?

— Na verdade, eu não joguei. Eu só-

— Meu nome é Samantha White — ela interrompeu Hana. —, sou a líder das Stars.

Merda dupla! Ela ficou em silêncio, sem saber o que responder. Viu Elizabeth revirar os olhos esverdeados diante da frase da morena e deu graças quando ela lhe tirou daquela situação desconfortável:

— Você não é japonesa, né?

— Sou canadense. — Hana respondeu sorrindo, percebendo que Elizabeth também não deveria ser japonesa — Mas meus pais são japoneses e-

— Ninguém liga — Samantha cortou-a mais uma vez — Você lembra que eu te avisei que você ia pagar, não lembra?

— Oui.

— O quê?

— Digo, sim.

— Espera — Elizabeth interrompeu levantando-se da cadeira de repete, como se tivesse acabado de ver um fantasma — Você é filha de Ai Haruki?

— Sou.

— Ai, meu Deus! — exclamou Samantha — Aquela Ai Haruki?

— Ela... Ela é uma lenda das Stars! — exclamou Elizabeth. — Inclusive, foi líder do grupo por alguns anos e eu ouvi dizer que ela tinha um alcance vocal de cinco oitavos!

— Tinha mesmo. — Hana confirmou, feliz por sua mãe ainda ser tão bem lembrada.

— Tudo bem, herança, por você ser filha da Ai, eu vou ser legal com você e te avaliar de verdade. Eu ia te reprovar mesmo que você fosse boa, mas estou te dando uma real chance de entrar. Certo, pode começar. Vamos ver se você herdou mesmo alguma coisa da sua mãe. — Samantha voltou a se sentar.

Ela me chamou de herança? Ignorou o novo apelido e começou a cantar. Havia se preparado para aquele momento a sua vida inteira e agora não poderia estar mais nervosa, como se não tivesse praticado tantas vezes que nem poderia contar.

Passou a apresentação inteira de olhos fechados, concentrada só no que estava fazendo e, quando terminou, Elizabeth estava boquiaberta e Samantha sorria. Um sorriso discreto, mas ainda sim um sorriso.

— Herança...

Samantha levantou de repente, com a cabeça baixa apenas para criar um suspense. A franja agora cobrindo quase todo o rosto dava a morena um ar macabro. Hana se perguntava o que estaria se passando pela cabeça dela naquele momento.

— Parabéns, você passou! — disse ela levantando a cabeça e sorrindo. — Agora você é uma Star.

Hana começou a pular e a dar gritinhos histéricos, mas depois procurou se acalmar. Ela acabara de realizar seu sonho — na verdade, era apenas o início dele, então a partir daquele momento faria de tudo para ser uma boa Star.

— Pegue suas coisas e leve para o dormitório das Stars. — continuou Samantha, com o tom autoritário de sempre, enquanto pegava sua bolsa.

— Pode deixar.

♫

Uma música animada tocava no último volume quando Hana entrou no quarto, cheia de malas e com algumas mochilas. Uma garota, que ela deduziu ser sua colega de quarto, pulava em cima da cama. Seus cabelos eram castanho-escuros, quase negros, e iam até o meio das costas com uma franja que cobria seu olho esquerdo. Já os olhos eram castanho claro. Ela usava uma camiseta da Demi Lovato e calças de pijama xadrez.

— OII! — ela gritou mais alto que a música, acenando para a loura.

— OI!

— MEU NOME É YASMIN!

—HANA!

— NÃO, YASMIN!

— MEU NOME É HANA!

A garota desceu da cama e foi até o som para desligá-lo.

— Muito prazer, Hana, e bem vinda a Stars! — puxou a loura para um forte abraço de repente.

— O-Obrigada.

Querido Diário, hoje foi o meu primeiro dia na Raimon... Não foi como eu esperava, mas não posso reclamar. Entrei para as Stars! Nem eu estou acreditando ainda. Tudo parece um sonho. Também conheci um garoto hoje, o nome dele é Hiroto. Não estou dizendo que fiquei perdidamente apaixonada por ele, mas ele parecia legal. De qualquer forma, duvido que eu vá vê-lo outra vez (só com muita sorte). A líder das Stars, Samantha, me assusta, mas eu espero que possamos ser amigas no futuro. E também tem minha colega de quarto que eu acabei de conhecer, mas já considero pacas haha!

Beijos, Hana. ♥