Dracologia escrita por Tia Cafira


Capítulo 18
Espectrofobia


Notas iniciais do capítulo

Apresento a vocês, o primeiríssimo capítulo com narrador-onisciente conta a história em 3ª pessoa e, às vezes, permite certas intromissões narrando em 1ª pessoa. Ele conhece tudo sobre os personagens e sobre o enredo, sabe o que passa no íntimo das personagens, conhece suas emoções e pensamentos.
Não se preocupem, os P.O.V's continuarão ♥



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É uma faculdade, são cinco da manhã e todos estão dormindo.

Corrigindo, sonhando.

Sabe, o mundo mágico é fantástico, sem sombra de dúvida. É uma realidade alternativa muitas vezes invejada por aqueles que não fazem parte dela. Afinal, a grama do vizinho sempre parece mais verde. Obviamente um lugar onde a magia resolveria problemas é um sonho. Mas, esquecemos que esse mundo é muito mais vulnerável, instável e, consequentemente, perigoso. Os livros contam histórias sobre heróis com superpoderes e eles sempre vencem, e isso faz da vida dele uma grande aventura, tudo acaba bem no final. Só se esqueceram de dizer, que é mentira. O mundo mágico é confundido com o surreal fantástico, e é na verdade, Halloween Town. E é a melhor descrição já feita. Foi um moleque de 8 anos que morava dentro de uma caixa de papelão pois tinha medo de fantasmas.

Há leis, há varinhas, fadas e sereias. O único detalhe, é que as sereias são canibais e as fadas são ladras, notou a diferença? Tudo é manipulável aos olhos de um ignorante. O moleque de 8 anos morreu assassinado por um dos fantasmas que ele tanto temia e hoje é um deles.

Se vir um vampiro, não há a menor possibilidade de ele ser seu amigo. Não há a menor possibilidade de ele se apaixonar por você.

Se ouvir algo na cozinha, não vá ver.

Se tiver olhos brilhantes, corra.

Os unicórnios existem mas eles entraram em extinção e hoje enfeitam lareiras.

Então, não há nada para sentir além de pena de cada um desses jovens nessa Universidade. Pobres almas infortunadas. Um perturbado ainda está acordado, assassinando um casal dentro de um carro. Ele era um arcanjo, ela era uma bruxa, e o assassino é um lobisomem.

–Uriel!! Não! Por favor!

Bom, é quase indiferente dizer que, já era tarde demais para Uriel, tarde demais para Ramona, e tarde demais para Wild Melnikov Schweinsteiger.

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–Wild? Wild! Wild acorda, porra!!

–Me deixa em paz, merda!

Aquele jovem estava claramente assustado, era óbvio. Ele já estava observando seu colega de quarto há semanas e não era a primeira vez que Wild aparecia com as roupas imundas, rasgadas. Mas era a primeira vez que o cara aparecia coberto de sangue.

–Wild, o que você fez?

Um gatilho na mente do rapaz se acendeu, e ele se deu o trabalho de sentar-se na cama, e ao olhar as próprias mãos, já tinha uma ideia do que havia acontecido. Estava com nojo de si mesmo, mas estava com medo. Sim, medo. Medo dele mesmo, do que faria com o próprio amigo, medo do que o amigo pensaria dele, medo do que seu avô pensaria.

–Wild? Wild, olha pra mim. - o amigo estava imóvel, mas pensava seriamente em sair correndo, ele simplesmente não sabia o que fazer. Estava tentando guiar-se pelo o que um irmão faria. Talvez esse tenha sido o maior erro dos dois. Todos nós sabemos onde cumplicidade vai parar.

–Kai eu não... E-eu..

–Ei, vai pro chuveiro, ok? Eu vou me livrar dos lençóis e descobrir qualquer coisa, não conta nada pra ninguém nem sai do quarto, ok?

–Ok.

O moleque foi pra baixo do chuveiro, via a água sair tingida de vermelho e fechou os olhos várias vezes, com vergonha. Vergonha e ele sentia-se falho. Não importava em a posição da lua, ele continuaria se sentindo um monstro pelo resto da sua vida, tinha chegado o primeiro dia de sua inevitável vida de assassino. Agora era queda livre, questão de tempo. Ele nunca seria o amigo que estava pensando em se tornar para Kai, nunca chegaria a imaginar seus mais loucos sonhos, o de voltar a ter uma namorada. E o que o faria chorar debaixo daquele chuveiro, nunca mais veria vovô e Rex. Nunca mais voltaria para casa, mas também sabia que não seria preso. Estava na realidade pelo qual ele pertencia, apenas seria banido para uma ilha nojenta e escura, onde ele poderia viver com a sua condição de serial killer sem modus operandi.

Ele não queria aquilo, tinha tanta inveja do colega popular, que finalmente levou uma garota para sair e ia bem nas provas, e sempre sorria despreocupado. Tinha ouvido as viagens de Di Venus fingindo tédio, mas a verdade é que queria comer pipoca enquanto ouvia a maravilhosa vida de um cara normal. O lado bom de ter decepções amorosas. O lado bom de brigar com os pais. O lado bom de se sentir mal. Ele era só um garoto de 24 anos que tinha parado no tempo tendo 17 e ainda não conseguia lidar com os demônios dentro de si. Por que o Sol nunca nascia pra ele?

–Wild! - o amigo invadiu o banheiro e o viu sentado na banheira, cheia de água escarlate. Ele quis vomitar, mas arregaçou a manga, mergulhou o braço e tirou o ralo. Os dois viram a água ir embora formando uma espiral. Agora ele estava sujo também.

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–Eu morri! Eu morri, Sean!

–Eu não quero saber! Você não tinha o direito de fazer o que fez! O que você acha que eu sou? Otário?

–O que acha que eu sou? Acha que eu esqueci as promessas que você tinha feito? Como acha que eu me senti? Os dias foram mórbidos aqui!

–Você é uma garota dramática e estúpida, Dagda! Eu não vivo pra você, merda! Eu pensei que fosse madura! Também pensei que fosse leal, olha a merda que eu pensei! Você é uma vagabunda!

Você não pode estar falando sério. NÃO PODE! Eu não acredito que gastei tempo com você! Não acredito que me enganei tanto com um babaca, é isso o que você é! Você é um babaca egoísta!

Cala a boca, vagabunda! Foi você que resolveu dar uma de piranha! A egoísta que só se importou em dar uma gozada foi você!

–Eu não dormi com ninguém! Você não pode me chamar de vagabunda, nem de piranha! Você é um filha da puta! É isso o que você é, um filho da puta mentiroso e nojento, VOCÊ É NOJENTO!

Você nem se lembra pra quantos deu! Eu nem sei como se lembra do meu número, nem sei por que me ligou, eu te liguei de volta? Eu não ligo, eu realmente não ligo! Eu estava ocupado, eu não sou seu cachorrinho, sua vaca! Mas se você quiser voltar pra mim, eu te dou uma coleirinha, porque é isso que você merece! Quer uma colei-...

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–Trabalhar cedo é uma droga. - ele murmurou. Mas ainda sim, murmurou isso com um sorrisinho de canto. A verdade é que ele estava feliz. Estava até com ridículas esperanças de talvez, levar a amiga no cinema. Pagar pra ela! Talvez saísse com o colega de quarto e ela pra uma saída pela cidade. Talvez, talvez... Talvez ele mandasse algum dinheiro para casa para ajudar a pagar a conta de luz, mas tinha medo do pai acabar gastando com cocaína. Caralho, tinha medo de tanta coisa... Medo do futuro, era o pior deles. Tinha medo de muita coisa.

–Ei, daqui a pouco é hora da aula! Não esqueça de tirar o avental! - a chefe disse.

–Ok!

Sim, ele estava feliz. Pela primeira em muito tempo. Feliz e com medo, sabia que a vida não era como nos filmes, ele nunca começaria com garçom e ficaria milionário, nem lançaria um livro depois. Mas ele ainda poderia se formar, chamar uma garota legal para sair e... Ter uma vida feliz. Talvez pudesse ajudar o pai, colocando-o em uma clínica, e depois eles viveriam na mesma casa, a esposa cuidaria dele, com uma enfermeira. As crianças ouviriam as histórias antigas do avô, e quando estivessem mais velha, ouviriam as histórias tristes do vovô e isso serviria de lição. A vida não seria como nos filmes, mas deveria. Jaden adoraria.

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–E aí, cara, soube o que houve na estrada? - Harris ainda não tinha tomado vergonha na cara para lavar o gorro encardido. O verde da lã estava obsceno, parecendo muco.

–O quê? Não, eu estava no trabalho. - o amigo com cara de durão sentou na carteira e olhou-o com aquela cara de guitarrista entediado.

–Um casal daqui foi assassinado! A polícia vai revistar a faculdade inteira!

–Isso é sério, Harris. - Sabe de mais alguma coisa?

–Bem, eram veteranos... Uriel e... Qual era o nome da menina, Trina?

–Ramona. Ela era bruxa, estudava Bruxaria, já estava no último período. O cara era Arcanjo, estava no último período de Demonologia. Os dois saíam há um tempo, pelas fofocas do pessoal.

–Dá pra acreditar? O cara era Anjo! Morreu, que ironia.

–Que falta de sensibilidade, Harris. - Jaden riu. Mas se xingou depois de ter rido. - A faculdade é isolada. Pode ter sido um aluno daqui.

–É isso que estão investigando. Suspenderam até a coleta de lixo, pra ver se acham alguma coisa...

A aula seguiu-se depois. Os alunos ficaram conversando paralelamente a aula inteira, e o professor desistiu, apenas escreveu algo na lousa, ele poderia ter dado uma bronca neles, poderia ter dado um chilique por silêncio, mas não o fez. Também estava inquieto, e bem tentou ouvir o que os alunos falavam. Ramona era uma de suas alunas e ela faria falta.

–Quem está com a lista de chamada? - o professor ajeitou os óculos.

–Está comigo, professor! - Jaden gritou.

–Filho, seu nome é tão longo assim?

–Estou vendo quem faltou.

A mente dos dois se conectou naquela hora. O professor sabia o que seu aluno queria dizer, e o aluno entendeu que o professor sacou. O resto dos alunos também entendeu, e o ar ficou tenso, o professor descontraiu e disse que mais de uma pessoa havia faltado.

Coincidentemente, dois colegas de quarto.

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As duas choravam. O céu lá fora era cinza, o dia era frio, como sempre, mas tinha o toque de gelo da morte. Uma jovem pode ter sido assassinada lá fora, mas dentro daquele gabinete, as duas jovens ajoelhadas na cama sabiam o que havia morrido. As esperanças inocentes de uma jovem. O corpo dela tremia, mas não era de frio, era de raiva. O rosto estava inchado, vermelho, o nariz úmido. Não era sua primeira decepção amorosa, mas isso não significou doer menos. Ela estava cansada. Sabia o que a vida pedia dela, sabia que pedia dela a coragem e a cara pra bater, mas ela sentia o rosto vermelho com marcas de dedos. As feridas foram feitas por telefone.

–Não acredito até agora! - ela gritava e mal conseguia terminar a frase, as lágrimas a afogavam antes disso. Branca chorava junto porque se lembrava de todas as vezes que tinha sentido aquela tristeza. Quantas vezes achou o idiota errado? Quantas vezes chegou a pensar aquilo do próprio noivo? Ouvir os soluços da amiga, tão sinceros, era de cortar o coração. As duas tinham assistido a primeira aula e voltaram para lá, as crises de choro iam e voltavam. Branca tinha desistido de recolocar sua máscara para cílios.

–Eu... - ela respirou fundo. - Eu acho que, que ele estava diferente antes. Antes disso... - e o choro continuou assim até o telefone das duas tocar, avisando-as da próxima aula.

–Não precisamos ir. - Branca secava as lágrimas da amiga e jogava o cabelo dela para trás, podia ver o lindo rosto dela. Os belos olhos verdes. A pele levemente queimada.

–Não vou perder aula pra ficar chorando! - as duas riram entre lágrimas.

É assim que se fala.

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–Viu aquela garota?

–Qual, Felicia? - Trina aparava a franja preta na frente do espelho e comia muffins com a outra mão.

–A Dagda, estava tão... Abatida.

–Eu percebi. Percebi que Jaden me largou naquela festa pra poder ajudar ela a vomitar, também.

–Trina, está com ciúmes do Jaden?

–Somos só amigos, e você sabe. Sabe como estou na do Kai. Sabe que o mesmo não me ligou hoje, nem ontem. - as duas cruzaram os braços.

–Ele faltou hoje. Ele e Wild. Estranho?

–Não sei. Acho que não, Kai não faria nada demais. Nem Wild, o cara parece um adolescente de 15 anos com algum retardo mental a mais!

As duas riram.

No resto da conversa das duas, Trina tentava convencer Felicia de um encontro duplo com Wild e Kai. Muitas risadas, até que Felicia disse que teria que voltar pra casa, Amarantha tinha pego uma pneumonia.

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