Yellow escrita por Eduardo Mauricio


Capítulo 1
Capítulo 01 - Nevasca




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1997

O despertador no quarto de Troye tocou às sete horas. Ele demorou alguns segundos para acordar e tatear o criado-mudo em busca dos seus óculos de grau. Quando os conseguiu, desligou o aparelho barulhento e se sentou, respirando fundo e encontrando forças para se levantar da cama.

(Grimes – Oblivion)

Enquanto escovava os dentes no banheiro do seu quarto, cuja porta estava aberta, ele se olhava no espelho, vendo que uma espinha começava a nascer na sua testa. Troye sempre tivera um rosto de bebê, mas aparentemente aquilo começava a mudar. Droga!

Ele cuspiu o creme dental e lavou a boca. A mãe entrou no quarto sem bater.

— Troye? — perguntou ela.

— Mãe, eu tô de cueca! — disse ele. — Podia bater antes de entrar, né?

— De onde você tirou essa? Eu sempre te vi de cueca.

— É — falou ele, voltando ao quarto e vestindo uma calça jeans jogada sobre a poltrona — Mas eu não sou mais uma criança.

Ela abriu a janela, deixando a luz do sol entrar, e riu, recolhendo algumas roupas e colocando dentro de um cesto. A luz do sol estava escondida atrás das nuvens. Além disso, uma tempestade de neve caía do lado de fora.

— Estou preparando o café, não demore muito.

A sra. Thompson saiu do quarto, deixando o filho terminar de se arrumar.

O pai e a irmã de Troye estavam à mesa quando ele desceu as escadas e foi para a cozinha. Justine tinha apenas 6 anos e ele a adorava, apesar de odiar ser o irmão mais velho.

— Nevasca forte, essa de hoje, né? — comentou ele, sentando-se à mesa, segundos antes de sua mãe lhe servir suas panquecas.

— Eu sei o que está fazendo — disse ela, sorrindo. — Nem adianta dizer nada, você vai para a escola de qualquer jeito.

— Mas eu tenho certeza de que todo mundo vai faltar.

— Você não é todo mundo.

Ele revirou os olhos e começou a tomar o café da manhã.

— Já eu tô animada pra ir — falou a irmã, com a boca cheia.

— Tá vendo? Siga o exemplo da sua irmã.

— Ela só quer ir porque hoje é dia da torta de maçã.

A garota riu alto.

— Querida, os Ulrich já voltaram de viagem? — perguntou o homem, folheando o jornal. — Eu preciso da minha caixa de ferramentas e o George pegou emprestado.

— Não sei, acho que voltam amanhã — respondeu ela. — Eu te disse para não sair emprestando tudo.

Troye terminou de tomar café e subiu para o quarto, onde pegou seu casaco e suas luvas. Quando desceu as escadas, seu pai estava na sala.

— Já estou indo — disse ele.

— Nesta nevasca? — falou o homem. — Não, eu vou te levar.

— Não precisa, eu gosto de caminhar.

O pai lançou um olhar desconfiado.

— Ok.

— Tchau.

— Tchau.

Quando saiu, Troye foi atingido um vento extremamente frio e descobriu que as luvas e o casaco não eram totalmente eficazes.

Cruzou os braços, tentando esquentar suas mãos, e começou a caminhar. Ele adorava neve, então sempre gostava de caminhar no inverno, mesmo que isso soasse esquisito para quase todo mundo.

***

Quando chegou à escola, Troye encontrou seu melhor amigo, Misha, saindo do carro de sua mãe. O garoto esperou enquanto o amigo falava algo com a mulher loira dentro do veículo. A mãe dele acenou para Troye, que devolveu a gentileza. Em seguida, os dois começaram a caminhar para o interior da escola.

A parte da frente estava praticamente vazia.

O interior do colégio estava muito menos frio, mas ainda assim ele não se atreveu a tirar as luvas.

Os dois amigos observavam o movimento fraco nos corredores.

— Quase todo mundo faltou hoje — disse Misha. — Eu disse a minha mãe, mas ela insistiu que eu viesse.

— Aconteceu a mesma coisa comigo.

— Ei, você terminou o relatório de biologia?

— Que relatório?

— Sobre tipos sanguíneos.

— Oh, merda!

— Cara, já é o terceiro, acho que desta vez a srta. Nasser não vai perdoar.

— Vou rezar para que ela faça isso.

Os dois foram surpreendidos quando alguém tocou seus ombros. Olharam para trás e viram uma garota baixinha e sorridente, com um piercing no nariz e mechas rosas nos cabelos curtos e castanhos. Sarah.

— O que as duas senhoras fazem aqui nesse dia tão frio? — perguntou ela, inserindo-se no meio dos dois.

— Minha mãe me obrigou a vir — respondeu Troye.

— Mesma situação — falou Misha.

— Qual é, Misha, uma vez você faltou porque seu cabelo não conseguia ficar no lugar... Aliás, como sua mãe deixou você faltar naquele dia?

— A clássica dor de barriga, é claro.

— Por que você está aqui, Sarah? — perguntou Troye, com ênfase no "você".

— O relatório da srta. Nasser é bem importante.

Misha olhou para ele com uma cara de "tá vendo".

— Eu sou o único que esqueceu completamente disso?

— Você esqueceu?

— Pois é.

— Acho que alguém vai conhecer a detenção hoje.

— Oh, Deus, não.

O sinal soou, ecoando pelos corredores. Sarah resmungou batendo o pé no chão.

— Que droga, eu queria uma rosquinha — ela choramingou.

— Ainda dá tempo, é melhor você correr — disse Misha.

— Não, esquece, eu preciso emagrecer mesmo.

Os três caminharam até a sala. O movimento era realmente pequeno.

A srta. Martindale, professora de literatura, estava lá, sentada atrás da sua mesa, com os olhos fixados em um livro através dos óculos. Ela usava uma calça jeans e uma camiseta de manga comprida, com um casaco. Totalmente diferente do estilo sóbrio e elegante que ela sempre tinha.

Na sala havia apenas cinco alunos além dos três, dois garotos de cabelos castanhos sentados no fundo, conversando um com o outro, uma menina rechonchuda com duas marias-chiquinhas nos cabelos pretos, um menino magro e pálido folheando um livro de matemática e outra garota, de cabelos loiros e curtos, que batia a caneta contra a mesa em um tédio contagioso.

— Ok, acho que seremos só nós hoje — disse a professora, fechando o livro com delicadeza e ficando de pé.

***

Na hora do lanche, a cafeteria estava cheia de alunos. Troye, Misha e Sarah estavam em uma fila indiana, pegando o lanche. Algumas batatas fritas, um hambúrguer e um suco de caixinha.

Quando terminaram, caminharam até uma mesa no canto do amplo salão, como sempre.

— O que vocês vão fazer nesse natal? — perguntou Sarah, sentando-se de frente para os dois.

— O mesmo de sempre — respondeu Troye. — Nada.

— Meus pais vão viajar para o interior pra rever a família... Eu odeio meus primos.

— Eu estou agradecendo a Deus por não ter que visitar parentes, mas acho que alguns tios meus virão para um jantar.

— Meu pai vai ser mandado para uma conferência em outra filial da empresa logo dois dias antes do natal, se eu não for com ele, vou ter a casa toda pra mim por uns quatro dias.

— Ou vai ficar com sua avó — disse Misha.

— Vira essa boca pra lá.

***

A nevasca parecia ficar cada vez pior. Troye estava sentado na sua carteira, olhando para o lado de fora. A srta. Nasser, com seus longos cabelos loiros e uma saia até os joelhos, estava falando alguma coisa sobre genética, mas ele praticamente não escutava.

— Agora eu vou recolher os relatórios, coloquem sobre suas carteiras. — Ele só ouviu quando ela disse isso e ficou nervoso.

Olhou ao redor, todos estavam retirando anexos de papeis e colocando em cima da mesa. Misha olhou para o amigo sentindo um pouco de pena e medo.

A professora começou a caminhar e recolher os relatórios, fazendo uma cara de decepção quando chegou a vez de Troye.

— De novo? — perguntou ela.

***

Troye caminhou por um corredor vazio até a última porta, em cujo vidro havia uma pequena placa de papel colocada com fita transparente. Detenção.

Ele abriu e entrou. As quatro pessoas que ali estavam olharam para ele imediatamente, surpresos com sua aparência. Ele não parecia o tipo de garoto que causava problemas, era pequeno, com cabelos castanhos meio ondulados, rosto de bebê e um óculos de grau.

Tinha uma garota sentada no canto da sala, lendo um livro, ela tinha pele negra e cabelos não muito longos, decorados com uma tiara azul, que combinava com seu vestido simpático de mesma cor. A garota parecia envergonhada por estar ali. Ele já a tinha visto algumas vezes nos corredores, mas não sabia seu nome.

Ela voltou sua atenção ao livro dando um sorriso tímido. No outro canto da sala estava um garoto loiro sentado com as pernas na cadeira da frente. Ele tinha fones nos ouvidos e segurava um walkman. Suas unhas estavam pintadas de preto, que também era a cor da sua roupa e maquiagem (Não tão pesada quanto a que ele usava diariamente). Troye sabia que seu nome era alguma coisa com H. Talvez Henry.

O garoto olhou para ele com uma cara feia e depois ignorou.

Troye caminhou e se sentou em uma carteira. Pouco mais à frente havia um casal. A garota tinha pele negra e longos cabelos cacheados e o olhava com curiosidade, mascando um chiclete. Ela vestia uma camiseta verde-limão com mangas compridas e uma calça aveludada de cor roxa, tão folgada na parte de baixo que parecia um vestido. Na sua testa havia um pequeno adesivo de estrela.

O garoto sentado de frente para ela era negro, um pouco rechonchudo, com cabelos extremamente curtos e maquiagem no rosto, sombra azul e um batom vermelho. Ele usava uma camiseta preta com uma calça de zebra e um cachecol verde-musgo ao redor do pescoço.

Os dois pareciam amigos, pois voltaram a conversar segundos depois.

Troye olhou para os lados e respirou fundo. O que diabos iria fazer ali?


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