— Senhores passageiros, preparem-se para o pouso. — Ouço a aeromoça assim que acordo. Olho pela janela e vejo a costa da ilha aproximando-se. Só agora percebo quanta falta senti desse lugar.

Em poucos minutos o avião perde altitude e começamos a pousar no Sydney Airport. Pego minha bagagem de mão e sigo para a saída. Ao sair, chego à sala de desembarque, onde encontro Lucy esperando-me com um sorriso no rosto, e corro para abraçá-la.

—Aurora, estava morrendo de saudade de você! — Diz ela sem me soltar.

—Eu também, Lu.

Nesse momento, sinto meu celular vibrar. Pego-o e vejo uma ligação de John.

—Oi, amor. — Atendo.

—Oi, anjo.

—Como você tá?

—Bem, e você? Como foi a viagem?

—Foi tranquila, estou no aeroporto com a Lucy, ela veio me buscar.

—Que bom. Você vem aqui em casa hoje a noite, né?

—Tenho que falar com a Lu pra ver se ela não programou nada pra gente. Qualquer coisa te ligo, okay?

—Okay, tchau.

—Tchau, beijos. — Desligo.

Guardo o celular no bolso e dirijo-me ao táxi junto com a minha amiga. Pedimos que ele nos leve até a república.

Desembarco do táxi e retiro a bagagem de mão do porta-malas. Lucy fica para trás a fim de pagar o motorista, então vou sozinha para o quarto.

Encontro-o idêntico ao que estava antes, não fossem as novas embalagens de doces e refrigerantes. Coloco a mala ao lado da minha cama e atiro-me sobre o colchão, descansando em silêncio até que os passos de Lu sejam audíveis. Sento no momento em que ela adentra no aposento.

—Vamos dar uma volta? — Pergunta ela.

—Pode ser, só vou tomar um banho antes.

—Okay, te espero lá em baixo. Não demore!

Ela sai e eu vou para o banho. Dispo-me, entro no chuveiro e coloco a água na temperatura mais alta. A água quente desliza pelo meu corpo e faz-me lembrar de John e suas carícias. Preciso ligar para ele depois.

Terminado o banho, enrolo-me na toalha e volto para o quarto. Uso um vestido vermelho até os joelhos, justo no busto e com a saia mais solta. Calço uma sapatilha preta e delicada. Mantenho o cabelo solto e passo apenas um pouco de rímel.

Depois, desço para o hall, onde encontro Lucy já pronta e me esperando. Por ser próximo, optamos por ir ao cinema caminhando ao invés de chamar novamente um táxi.

Em poucos minutos chegamos e assistimos “O Portal”, um filme de aventura sobre viagem no tempo onde um grupo de jovens é tele transportado ao participar de um experimento. Acaba sendo bastante divertido, e ao sair da sala ligo para o meu namorado.

—Hey, John! Você está em casa?

—Claro, amor. Quer vir aqui?

—Sim, se você não estiver ocupado...

—Não, pode vir! Estou te esperando, até logo. — Diz ele, evidentemente animado com a ideia.

—Até, beijos.

Desligo o telefone e falo para minha amiga que vou visitar John e, por isso, ela pode ir para a república sem mim. Ligo para que um taxi venha me buscar, pois a casa do meu namorado é do outro lado da cidade.

Quando chego, toco a campainha e logo sou atendida.

—Oi.—Diz ele, abraçando-me e me dando um selinho.

—Oi.—Respondo, puxando-o para mais um beijo.

—Entra, mas não repara a bagunça porque estava na biblioteca quando você ligou e vim correndo pra cá, não deu tempo de arrumar.

Não acho que a frase faça muito sentido, já que para mim a casa está perfeitamente arrumada: muito mais organizada que a minha, com certeza. As paredes cinza mate ornamentadas com quadros emoldurados dá ao cômodo um toque de elegância. O sofá era o único móvel desorganizado do local, com suas almofadas jogadas no chão.

John me leva para o sofá e então vai para a cozinha, deixando-me sozinha na sala. Como não sabia se ele ia demorar, liguei a televisão. Uns minutos depois ele voltou com uma bandeja cheia de doces e salgadinhos. John sempre foi muito amoroso, e adorava me mimar. Ele senta ao meu lado e oferece a comida:

—Pega, estão deliciosos. Mirian passou aqui e eu disse que você viria então ela deixou isso pronto pra gente.

—Okay.

—Venha, estou com saudades de você. — John me puxa para perto e deito a cabeça em seu ombro. Suas mãos acariciam meu cabelo e ele distribui pequenos beijos pelo meu rosto. Levanto minha boca até a sua, para que possamos nos beijar. Começamos lentamente, de modo suave, mas conforme evolui, o beijo fica mais quente.

Ele morde o meu lábio delicadamente. Depois, começa a subir os dedos pelo meu corpo com toques delicados, colocando as mãos debaixo do meu vestido e acariciando minha pele. Todos os pontos que ele toca ardem pelo desejo e vejo-me aprofundando cada vez mais nosso beijo. Porém, quando sinto suas mãos abrindo meu sutiã, interrompo-o bruscamente.

—Não, John, pare. — Peço aos sussurros quando percebo que o momento está ficando quente demais. Posso ver a decepção nos seus olhos por um momento, mas ele logo recobra a razão.

—Ah... Claro, desculpe... Eu... Eu não sei o que estava fazendo. — Diz, envergonhado, sem conseguir sequer encarar-me.

—Ei, não precisa ficar assim, não tem nada de errado. Eu só não me sinto pronta para isso ainda, okay?

Ele finalmente me olha, e eu abro um pequeno sorriso de conforto. Isso o anima um pouco, mesmo que ele ainda pareça cabisbaixo.

Pego um pastelzinho, delicioso, por sinal.

—Lembre-se de agradecer Mirian por mim depois, ela é uma cozinheira maravilhosa! — Falo, apenas para mudar de assunto.

—É, é sim. — Mas mesmo tentando voltar à conversa normal, nossa noite já havia sido arruinada.

***

Mais tarde, volto para a república. Era tarde, as luzes já estavam apagadas e os demais, dormindo. Vou para o quarto na ponta dos pés, sem fazer barulho. Ao entrar no cômodo sou bombardeada por perguntas de uma silhueta baixinha em meio às sombras.

—Estava com o John? Vocês estavam sozinhos? Vocês transaram?

—Lucy! Fale baixo. — Digo, sussurrando, certa de que toda a casa podia nos ouvir. — Estávamos sozinhos, mas não fizemos isso que você está pensando.

—Sei... — Fala ela em tom desconfiado, mas sorrindo.

—É sério! Vá dormir, amanhã é o primeiro dia de aula e quero estar bem descansada.

—Tudo bem, mas amanhã você vai me contar cada detalhe!

—Okay, mas agora me deixe descansar. — Digo-lhe, apenas para fazer com que fique quieta.

Tiro os sapatos e deito na cama ainda de vestido. Pego quase que imediatamente no sono, mas antes de me perder na escuridão da inconsciência não consigo deixar de sorrir com a lembrança dos meus momentos com o John. Mesmo que eu tenha arruinado a noite, ele conseguiu fazê-la ser maravilhosa. Como eu poderia querer um namorado melhor?

***

Acordo ao som do despertador alto, agudo e irritante. Que ótima maneira de começar o dia, penso. Levanto e percebo que ainda estou com a roupa do dia anterior, então a troco por uma camiseta branca e calça jeans comum. Amarro o cabelo e retiro a maquiagem borrada.

Vou ao banheiro, arrumo-me, lavo o rosto e depois desço para a cozinha. Preparo uma torrada e uma xícara de café preto. Como, escovo os dentes e sigo até o hall para esperar por Lucy.

Vamos para a escola juntas, mas nos separamos, pois fazemos cursos diferentes: eu, psicologia, e ela, música.

—Te vejo mais tarde na biblioteca. — Despeço-me, antes de entrar na sala.

Para pagar a faculdade eu ajudava na biblioteca todos os dias depois da última aula da tarde.

Foi um dia extremamente cansativo, pois não estava mais acostumada com a rotina escolar. Ainda assim, foi maravilhoso reencontrar os colegas e amigos: Louise, Lauren, Jordan e vários outros.

Ao fim da aula, ouço o sinal de liberação e vou o mais rápido possível para a biblioteca.

O local ainda estava parcialmente vazio, então sento na cadeira giratória atrás do balcão e espero até a chegada da minha amiga, que alguns minutos depois entra na biblioteca e larga a mochila no chão de qualquer jeito.

—Desculpe a demora, precisei falar com o professor depois da aula.

—Sem problemas. — Pego uma grande pilha de livros fora da estante e lhe entrego. — Pode compensar me ajudando a organizar tudo isso. Depois de revirar os olhos e suspirar, relutantemente ela pega a pilha e começa a tagarelar sobre os acontecimentos das férias de verão enquanto coloco um a um os livros em seu devido lugar na prateleira. Sorrio, aliviada por ela ter esquecido o episódio da noite anterior com o John.

Subitamente, ela fica em silêncio. Levanto e ao olhar para cima vejo o que lhe deixou muda. Dou de cara com um homem alto de cabelo castanho encarando-me. Ele era muito bonito, com um olhar penetrante e uma postura ereta. Levanto e vou até ele.

—Precisa de ajuda? —Pergunto evidentemente envergonhada.

—Oi, só quero renovar um livro. — Informa ele, com um tom muito mais doce do que eu imaginava que teria.

—Claro. — Vou para trás do balcão e pego o livro que ele havia colocado ali: “Principais nomes da atualidade e sua história”. — Qual o seu nome?

—O que? — Pede-me ele, distraído.

—Para o registro. Seu nome.

—Ah, claro. Ethan Bradley.

Procuro por um momento na lista até encontra-lo. Acho seu nome e renovo o livro. Demora um pouco para imprimir o comprovante.

—Seu nome é Aurora?

— Sim, como você sabe? — Olho-o assustada.

— Está no seu crachá. Belo nome.

— Ah, obrigada. — Sinto as bochechas corarem levemente, e para a minha sorte o comprovante fica pronto. Coloco-o no meio do livro e entrego para ele.

—Prazer em te conhecer, Aurora.

—O prazer é meu. — Falo, sem olhar para o seu rosto.

—Até outra hora. — Ele vira-se e sai da biblioteca, deixando-me perdida em pensamentos, sozinha com minha amiga que segura a risada.

—O que foi? — Interrogo-a, revirando os olhos e já prevendo o que ela diria em seguida.

—Parece que alguém ficou mexida com o professor gato. — Diz-me ela com tom de deboche.

—Professor?!

—Você não sabia? Mas não se preocupe, aqui na faculdade ele é aluno como nós. Está fazendo graduação.

—Ah, não importa. Eu tenho namorado, e mesmo se não tivesse, mal o conheço!

—Nossa, e quem estava falando em namorar? Só estava comentando que você pareceu nervosa diante dele. — Ela sorri de forma falsamente inocente.

—Você tem uma imaginação muito fértil. E além do mais, você não deveria estar em uma reunião agora? A diretora do departamento da biblioteca provavelmente está te esperando há uns 20 minutos.

—Okay, okay. Acalme-se, não precisa ficar nervosa, eu já estou indo. Até mais tarde.

Bufo e nem a respondo. Volto para a prateleira e termino de organizar os milhares de livros extremamente tediosos em seus devidos lugares por ordem cronológica. Mesmo com tanto trabalho não consigo tirá-lo da cabeça.