Revenge Angel escrita por V Giacobbo


Capítulo 7
Going back home




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/65575/chapter/7

7.    Going back home

Duas semanas de boas maneiras, questionário e refeições à mesa. Duas semanas aprendendo a ser educada com o homem que eu mais odiava em todo o universo.

Havia se criado uma rotina, eu acordava cedo e, depois de minha higiene, tomava café-da-manhã na cozinha com Snape. Durante a refeição ele questionava sobre minha nova história de vida, a de Laureen Ebony. Quando eu errava a resposta, ele me paralisava com um feitiço até que eu lhe desse a resposta certa. É claro que nos primeiros dias eu fiquei irritada com aquilo e minhas falas e modos ousados me renderam mais alguns minutos sob o feitiço.

Depois do café eu não podia mais voltar ao quarto, devia permanecer na sala, onde ficava lendo a biografia da minha nova personagem até o almoço. Este seguia idêntico à refeição anterior, perguntas em cima de perguntas.

Durante a tarde, ainda na sala, minha leitura variava entre a biografia e os livros de Snape, que ele permitira meu uso depois de uma cena vergonhosa e cômica. Obviamente eu mantinha distância dos livros de Artes das Trevas, algo que Snape não deixou escapar, sentado em sua poltrona todo o tempo.

No jantar havia uma exceção ao questionário e isso me causara espanto durante as primeiras noites. Snape me perguntava sobre o livro que eu lera durante a tarde. Assim, nós conversávamos sérios e controlados, uma interação claramente forçada. Tanto eu quanto ele atuávamos excepcionalmente bem, vendendo uma imagem de duas pessoas que se respeitavam e dividiam os mesmos gostos. Eu não gostava de admitir para mim mesma, mas era verdade que eu e Snape tínhamos alguns gostos em comum, uma verdade aterrorizante.

Meu dia terminava com um banho quente e relaxante e, antes de deitar-me, eu tomava outra dose da poção transfiguradora, para manter minha aparência falsa por um limite de trinta horas, para deixar a imagem de Lilian Potter viva pelo dia seguinte.

Faltava exatamente uma semana para o início do ano letivo, eu já sabia de cor toda a história de Laureen e já me acostumara a responder por este nome.

- Bom dia, senhorita Ebony. – desejou-me Zaxy, a elfa-doméstica, quando entrei na cozinha aquela manhã.

Antes de respondê-la, reparei que não havia outra pessoa no recinto, pois a cadeira de Snape jazia vazia.

- Bom dia, Zaxy. – eu me sentei e recebi dela meu copo de suco matinal – Onde está o diretor? – perguntei com uma sutil falta de interesse, claro que falsa.

- O diretor saiu, mas disse que voltará em breve. – o tom da elfa foi de aviso e seus grandes olhos castanhos eram quase ameaçadores.

- Foi ele quem mandou você agir assim? – perguntei séria, mas achando graça do jeito dela.

Zaxy foi pega desprevenida, como uma criança durante uma travessura. Ela corou e gaguejou sem jeito, oscilando seu peso entre os pesinhos e seus olhos para qualquer outro lugar, exceto eu.

- Ah! – exclamou ela, derrotada, fazendo-me sorrir – Você entendeu.

- É claro, Zaxy. Sem gracinhas. – eu disse risonha.

Nós nos fitamos por um tempo antes de rirmos baixinho. Ela voltou aos seus afazeres e eu ao meu café-da-manhã. Zaxy era uma elfa muito gentil e engraçada. Era baixinha e fofinha, suas orelhas pontudas não eram muito grandes, mas seus olhos pareciam compensar esse detalhe, os castanhos eram enormes e brilhantes. Ela trabalhava em Hogwarts, por isso chamava Snape de diretor e não de mestre.

Desde a primeira vez que a vira e ela me defendera, eu sentia que poderia ser amiga dela e esse sentimento logo se tornou algo concreto. Nós costumávamos conversar durante a noite. Eu havia lhe contado quase tudo sobre mim, minha real história, não a de Laureen; e ela me contara a dela.

Eu evitava criticar Snape na frente dela, pois nas vezes que acontecera ela ficou muito irritada, deu-me sermões de palavras rápidas e tão emboladas que eu não entendia uma única sequer; e ficou horas sem falar comigo ou me olhar.

Ela era muito legal e carinhosa comigo. Algumas vezes, cheguei a pensar se Snape havia ordenado a ela para que fosse minha amiga. Contudo, o brilho amoroso em seus olhos e o sorriso divertido em sua boca eram verdadeiros e eles excluíram meus pensamentos instantaneamente.

- Animada para voltar à Hogwarts, senhorita Ebony? – perguntou-me Zaxy, quando se aproximou para retirar a mesa.

- Se vai me chamar por esse nome falso, Zaxy, ao menos me chame de Laureen. – pedi para ela, talvez pela centésima vez e ela assentiu com um sorriso de desculpas – Não sei o que sentir sobre Hogwarts. – acrescentei, respondendo sua pergunta.

Ela acenou positivamente com a cabeça compreensiva, fazendo suas orelhas balançarem comicamente; seus olhos perdendo um pouco o brilho.

Como Snape não estava em casa, tive a liberdade de ser mais eu mesma, ficando na cozinha com Zaxy, ajudando-a e brincando com ela. Com a diversão, a manhã correu depressa, mais do que nós duas gostaríamos. Quando terminei de almoçar, a pequena elfa me expulsou da cozinha com o argumento de que Snape poderia chegar em breve.

Com um suspiro, voltei para a sala e peguei um livro que tinha começado a ler alguns dias antes. Sentei-me em uma cadeira sob a janela e apoiei os cotovelos na mesinha, abrindo o livro e reiniciando minha leitura. Tanto a cadeira quanto a mesinha, ambas de madeira escura, eu havia conjurado para ficar em um lugar mais iluminado e, principalmente, sentir-me mais a vontade, sentada tão afastada de Snape.

Sentada ali, sozinha, não consegui me ater à leitura. Suspirei, depositando o livro sobre a mesa e apoiando a cabeça nas mãos. Olhei pela janela. Eu sentia que faltava algo, embora não conseguisse captar o que.

Fiquei olhando pela janela durante horas, vendo a rua inóspita e o dia escurecer e clarear à medida que as nuvens encobriam e libertavam o sol. Minha mente voou, pensando em tudo e em nada ao mesmo tempo. Algo me impedia de raciocinar, a mesma coisa que não me deixava ler o livro com atenção. Permaneci na mesma posição, sentada, a cabeça apoiada em uma das mãos, o outro braço estendido sobre a mesa, minhas pernas cruzadas involuntariamente.

Então, fosse o que fosse, o que me faltava surgiu e me completou, abraçando-me com tamanha intensidade que suspirei, aliviada e relaxada. Completa do jeito que estava, pude racionar coerentemente e perceber as coisas a minha volta. As estantes de livros às paredes, a poltrona e o sofá ao centro e alguém à porta.

“Snape!” – conclui, virando o rosto e todo o meu corpo, quebrando a posição na qual permanecera por tanto tempo.

De fato, Snape estava ali e, quando percebeu que eu o notara e o encarava, desviou seu olhar de mim e cruzou a sala, sumindo pela porta oculta da cozinha.

“Eu não o vi chegar.” – lancei um olhar rápido pela janela, avistando quase completamente a rua – “Por onde ele veio?”

Os passos denunciaram a volta de Snape à sala. Ele caminhou até mim, eu o olhando desde que o ouvira, e, parando na minha frente, entendeu um envelope. Eu o reconheci instantaneamente, o pergaminho amarelado, dobrado criteriosamente até formar um envelope que ganhara uma bela insígnia. Era a carta de Hogwarts.

Eu a peguei das mãos de Snape com movimentos lentos e suaves, quase não acreditando no que via.

- Obrigada. – agradeci, sem interpretar pela primeira vez desde que assumira a aparência de Lilian Potter.

- De nada. – respondeu Snape, afastando-se enquanto retirava a capa de viagem.

Eu me sentei corretamente, encostando-me nas costas da cadeira. Olhei para o envelope e vi que estava endereçado à Vitória Skywalker. Virei-me para Snape, que havia se sentado em sua poltrona, com típica ira que meu antigo nome causava e ergui o envelope.

- O nome está errado.

- Laureen Ebony está matriculada e seu envelope foi gerado. – ele retirou o envelope do bolso interno de seu sobretudo – Porém, Vitória Skywalker ainda está matriculada e, como não é possível ao diretor alterar os dados dos alunos sem a presença deles ou de seus responsáveis, seu sobrenome permanece nos registros. Seu envelope deveria ser entregue, ou mais envelopes seriam expedidos, você conhece a magia que envolve essas cartas.

Eu bufei. Abri o envelope e retirei as folhas de dentro dele, amassando-o em uma bola ao final. Desdobrei as folhas e comecei a ler. Conferi a lista algumas vezes, chocada com a presença de um livro de Artes das Trevas e a ausência de um de Defesa contra as Artes das Trevas.

“Não imaginava que eles iam se infiltrar tão profundamente na estrutura de Hogwarts.” – pensei amargurada, mas sem demonstrar qualquer emoção.

- Eu vou providenciar seus materiais. – disse Snape.

- Já tenho todos os materiais.

- Todos? – ele pareceu surpreso, certamente pensando no livro de Artes das Trevas.

- Menos o da nova matéria. – respondi, lendo novamente a lista para ter certeza que tinha os outros livros – Sim, todos menos esse daí.

- Onde?

- Em Oxford, é claro. – me levantei, fechando o livro que tentara ler e dobrando a lista de materiais – Eu vou lá buscar.

- Não! – disse Snape, seu tom de voz tão autoritário que eu parei de caminhar em direção à saída das escadas.

- Hã? Por quê?

- Eu vou, você fica. – ordenou ele, pondo-se de pé e vestindo a capa de viagem que jogara sobre o sofá.

- Ah não! Nem drogada eu deixaria você entrar na minha casa sozinho. – exclamei irritada – Eu vou!

- Não permitirei que saia desta casa. – ele praticamente rosnou, tamanha a ira que o tomou.

- Então vá junto! – exclamei sem ao menos pensar, surpreendendo Snape e eu mesma.

- Concordo . – disse ele ao se recompor, sem me dar tempo de retirar minha proposta.

Eu girei os olhos e bufei, saindo da sala.

Voltei minutos depois, vestindo minhas próprias roupas e com minha mochila em minhas costas. Minha aparência era quase a original, graças aos feitiços de transfiguração que eu dominava tão bem.  Minha real imagem causou espanto em Snape tão logo ele me viu.

Dei-lhe um sorriso arrogante e passei por ele, saindo da casa. Ele me seguiu, parando ao meu lado e estendendo o braço.

- Desiluda-se. – falei, já executando o feitiço em mim mesma.

- Por que deveria? – eu sentia seu olhar fixo em mim, apesar dos efeitos do encantamento.

- É um bairro trouxa. Você quer mesmo aparatar em meio a eles? – perguntei, segurando seu braço.

Segundos depois ele estava desiludido e eu mal conseguia vê-lo mesmo estando ao seu lado.

“Tenho que praticar” – pensei antes que ele nos aparatasse.

Assim que o redemoinho de imagens e o mal estar passou, encarei minha casa, seu portão baixo a poucos metros de distância.

- Ninguém a vista. – informou Snape, tornando-se visível novamente.

Eu o soltei e cancelei meu feitiço enquanto cruzava o portão. Não demorou muito para a nostalgia me tomar, parecia que alguns séculos haviam se passado desde quando deixara aquela casa para caçar Snape. Parei no meio do hall, logo após atravessar a porta de entrada. Ouvi Snape atrás de mim, fechando-a.

Eu olhei à minha volta, revendo imagens de um passado distante e falsamente feliz. Por um momento eu congelei, esqueci do que ia fazer, do que havia feito nas últimas semanas.

- V? – chamou Snape, despertando-me.

- Fique aqui. – tentei ordenar, mas minha voz ficou tão fraca perante a dor que tomava meu coração que mais parecia um pedido.

Não esperei por resposta nem conferi a reação dele, apenas me dirigi às escadas. Caminhei diretamente ao sóton, onde meus livros estavam guardados, subindo por uma escada móvel. Tudo estava exatamente como eu havia deixado. Nenhum sinal do retorno de Alice ou Luke, o que fui imensamente agradecida.

De dentro da minha mochila, retirei as poções que havia levado para a caçada e as devolvi aos seus lugares. Em Hogwarts não iria precisar delas. Conferindo a lista de materiais do sexto ano, peguei os livros que precisava, sorrindo bobamente ao lembrar-me de Alice e suas peripécias. A lembrança foi tão forte, que minha mente projetou a imagem aos meus olhos.

- Mãe, que livros novos são esses? – a minha figura aos treze anos surgiu ao meu lado, parecia um fantasma, seu corpo não parecia tão real quanto o meu, mas, mesmo assim, fiquei assustada com o que via.

Uma risada chamou minha atenção e vi a imagem de Alice, seu rosto bondoso conservado apesar do mando da ilusão que a cobria.

- Provavelmente são os livros que você usará nos próximos anos. – respondeu ela, a voz macia.

- Ah, mãe. – a minha cópia mais nova fez bico e cruzou os braços – Eu gosto de ir ao Beco Diagonal todos os anos.

- Mas nós ainda iremos, ao, ao invés de gastar esse precioso tempo com compras, vamos nos divertir. – explicou Alice, caminhando até minha imagem.

- Sério? – perguntou a pequena Vitória, um largo sorriso nos lábios, e pulando animada.

- É claro. – respondeu Alice, rindo e me abraçando.

Senti um vazio em meu peito, o vazio que a ausência de Alice causava, um espaço que apenas ela, minha mãe, poderia preencher.

Ver minha mãe me abraçando e rindo comigo e sentir aquela saudade me fez esquecer que aquilo era uma ilusão. Eu estendi a mão para tocar minha mãe, para anunciar à ela minha presença, para que ela pudesse direcionar seu carinho para mim e não para minha cópia.

- V!

A ilusão se desfez antes que eu pudesse tocá-la devido ao susto que levei ao ser chamada. Virei-me com os olhos arregalados e vi Snape para ao lado da entrada, olhando-me curioso.

- O que você estafa fazendo? – perguntou ele.

Eu olhei de novo para o local onde minha ilusão habitara e recolhi a mão, sentindo-me sozinha apesar de Snape estar ali.

- V? – ele me chamou de novo, agora seu tom tinha uma mescla quase insignificante de preocupação.

- Eu disse para me esperar lá embaixo. – recobrei meu auto-controle e retomei minha nova atitude e personalidade de anjo vingador.

Ele ergueu uma sobrancelha e sua expressão tornou-se fria.

- Você estava demorando demais. – respondeu ele, seco.

Terminei de guardar meus livros e me aproximei dele, que pareceu interessado pelo aposento.

- Saia. – ordenei, irritada.

Ele me olhou dom desdém e desceu as escadas. Eu o segui e lacrei a entrada ao pisar no piso do 2º andar.

- Então vamos. – disse Snape, dirigindo-se às escadas que conduziam ao 1º andar.

- Tenho que pegar outras coisas ainda. – eu disse, dando-lhe as costas e seguindo pelo corredor.

Meu quarto estava bagunçado, exatamente como eu o havia deixado. Os pedaços do meu aparelho de som estavam espalhados pelo chão e minhas roupas, pela cama.

Puxei meu malão debaixo da cama e o abri com um toque da varinha. Retirei os livros do ano anterior e os joguei sobre a cama. Executei um feitio simples e minhas roupas começaram a voar de dentro do guarda-roupa e da cama para o malão e se arrumar dentro dele.

Enquanto isso, sai do quarto e entrei na porta mais próxima. De relance vi Snape se aproximando pelo corredor. No outro aposento, encontrei minhas vestes de Hogwarts limpas, passadas e dobradas dentro de um gaveteiro. Preferi não olhar pelo aposento por medo de ver outra ilusão, já que era naquele lugar que Alice praticava seus hobbies tipicamente trouxas.

- Você não precisa disso. – disse-me Snape, quando passei por ele no corredor.

- Que? – parei à porta do meu quarto e o olhei.

- As vestes da Grifinória, não é certeza que as usará. – explicou ele.

- Como assim? – fiquei confusa, eu era uma grifinória, é claro que usaria o uniforme da casa rubra.

- Você é uma aluna nova, esqueceu? Passará pela seleção novamente. – respondeu ele, surpreendendo-me pelo seu tom calmo.

- Não tem problema. O chapéu já me selecionou para a Grifinória, ele não pode mudar sua escolha. – argumentei com confiança.

Ao entrar no quarto, meu malão já estava pronto, faltando apenas meus uniformes, livros e itens de higiene pessoal. Depois de guardar o que faltava, fechei o malão e o lacrei novamente. Com um ultimo feitio, mandei-o para a casa de Snape.

- Pronto? – perguntou ele, impaciente, quando voltei para o corredor.

Assenti com a cabeça.

Depois de trancar a porta de entrada, não olhei para trás. O pavor de ser pega em outra ilusão privando-me de despedir-me novamente da minha antiga vida antes que Snape nos aparatasse para longe dali.

=.=.=

Pela primeira vez em dias o jantar foi silencioso.

Depois de voltar de Oxford, eu me isolara em minha mente, tentando entender o que havia acontecido. Snape também estava concentrado em si mesmo, volta e meia eu sentia seu olhar sobre mim. Zaxy estava inquieta, tentando disfarçar isso com tarefas extras. Eu sabia que ela iria me visitar durante a noite.

Para minha surpresa então, Snape descansou seus talheres e murmurou:

- V...

Fingi que ele não estava fazendo aquilo, que ele não ia começar a infernizar minha vida novamente.

- O que aconteceu... V? – ele parecia estar realmente tentando conversar comigo e isso só me deixou mais irritada.

- É Laureen Ebony, Snape! – eu exclamei, levantando-me brutalmente, fazendo a cadeira cair – E não finja que se importa com o que acontece comigo. Já é crueldade demais deixar que elas simplesmente aconteçam.

Eu falei com raiva, mágoa e dor, olhando profundamente naqueles olhos negros. Aquele maldito brilho que eu não conseguia classificar surgiu naquela escuridão e me deixou sem chão. Naquele momento eu tive que me controlar ao máximo para não sucumbir aos sentimentos que estavam me inundando. Quando vi que ia perder a batalha, sai correndo. Passei pela porta da cozinha, sem olhar para trás.

Ao entrar no meu quarto, encostei-me à porta e escorreguei até o chão. Fiquei olhando para o teto, tentando resistir às lágrimas que chegavam. Porém, foi uma luta em vão.

Eu não conseguia entender porque chorava, porque me sentia com frio, porque tinha a sensação de estar no fundo de um buraco negro.

Lembrei-me do que vira no porão da minha casa em Oxford. As imagens fantasmagóricas, mas, ao mesmo tempo, tão reais. Então eu compreendi o que sentia, o turbilhão confuso no meu peito.

- Mãe... – eu murmurei, balançando a cabeça.

Eu estava cometendo um erro. Eu havia abandonado quaisquer laços que tinha com minha antiga existência para seguir naquela missão, naquela vingança. Sendo assim, não podia sentir falta dela, não podia desejar estar perto dela, receber seu carinho ou atenção. Eu abandonara tudo isso por causa da minha vingança.

- Perdoe-me, mas você não merece uma filha como eu, como a Allison. – tentei me acalmar, aceitar o argumento que eu mesma me dava, mas, naquele momento, parecia impossível.

Um estalo anunciou a presença de Zaxy. Ela arfou ao me ver naquele estado e correu para perto de mim.

- O que aconteceu? – perguntou ela, a voz preocupada, suas mãozinhas calejadas pelo trabalho limpando meu rosto.

- Ah Zaxy! – eu a puxei para mais perto e a abracei, deixando as lágrimas virem sem resistência.

Demorou longos minutos até que eu me acalmasse. Zaxy permaneceu calada, apenas acariciando minhas costas e mexendo em minhas mechas ruivas. Quando senti-me mais forte, soltei-a e limpei o rosto com as mãos.

- Desculpa. – pedi por tê-la puxado tão abruptamente para abraçá-la.

- Não há o que desculpar. – disse ela, sorrindo carinhosa.

- Lá em Oxford, eu vi minha... – interrompi-me e xinguei em pensamentos – Vi Alice. – corrigi tão logo pude.

A reação da elfa foi de espanto.

- Não ela de verdade, mas uma ilusão. Muito forte e realista. – expliquei, minha voz rouca por ter chorado – Isso me abalou, muitíssimo.

Ela assentiu com a cabeça e deu-me seu sorriso mais carinhoso.

- Você sente falta dela e se arrepende da escolha que tomou. – concluiu ela.

Eu neguei veemente com a cabeça.

- Sinto falta dela sim, mas não me arrependo do caminho que segui. Snape vai pagar pela morte de Dumbledore, pelo que ele fez comigo antes e depois de ter me capturado. Ele vai pagar por tudo. – falei o mais séria que pude, deixando claro para a elfa que não estava mentindo.

Zaxy suspirou e ajeitou uma mecha rubra que estava fora do lugar.

- Você sabe que as coisas só vão piorar, não sabe?

Eu assenti, séria e triste.

Em Hogwarts eu veria meus amigos e sentiria o mesmo que sentira aquele dia. Eu só teria que ser mais forte do que havia sido e lutar contra os sentimentos que nutria para com eles.

- É capaz até de ser mais fácil lidar, Zaxy. – afirmei, considerando a hipótese de repente, e assustando-a – Meus amigos são o motivo por eu não poder matar Snape. Por causa deles eu ainda não cumpri minha vingança e deixei de ser um anjo vingador. Eu estou sofrendo todo esse tormento para mantê-los a salvo do Grayback. – conforme ia falando, minha voz ganhava força e uma pequena fagulha de raiva acendeu no meu peito – Tenho certeza que vou conseguir manter-me afastada deles, estou com tanta raiva de cada um que seria capaz de azará-los.

Os grandes olhos castanhos da elfa estavam assustados sobre mim. Ela parecia até estar com medo de mim e perceber isso fez a chama de raiva se apagar. Eu fiquei assustada também.

- Estou descontrolada Zaxy. – confessei, escondendo o rosto nas mãos.

Ela se aproximou de mim e envolveu minha cabeça com seus braços pequenos.

- Tudo vai terminar bem. Pode demorar muito e ser muito sofrido até lá, mas acredite nisso. – disse-me ela, beijando meus cabelos e começando a cantarolar uma música de ninar.

=.=.=

Na manha do dia 1º de Setembro, acordei muito cedo tamanha era minha expectativa. Permaneci deitada na cama, olhando para o teto. Fiquei pensando sobre o que aconteceria aquela noite.

Durante aquele tempo presa e atuando com Snape eu notara que sabia fazer isto muito bem, agir como outra pessoa. Estava sendo fácil porque eu não era a mesma de antes e, principalmente, porque o odiava, então mentir era natural.

- Mas, será que a raiva que eu tenho deles é suficientemente forte para que a mentira seja natural? – eu me preocupava com meus amigos, naquele momento e em todos os outros.

Eu nunca conseguira mentir para nenhum deles, meus olhos me traiam sempre. Eu temia que minha nova aparência e personalidade não fossem o bastante para enganá-los. Por maior que fosse a raiva que tinha deles, eu ainda os amava, se não, já teria atacado Snape, levando Greyback ao encalço deles. Eu me importava com a segurança deles e teria que mentir e atuar para que não notassem quem eu realmente era e, assim, ficarem longe de mim.

Ergui-me quando o dia já estava mais claro e tomei um bom banho. Enquanto me lavava, toquei o pingente em forma de lua que carregava no pescoço. Ele era a prova da nossa amizade, entre as meninas, e era outra coisa que eu deveria rejeitar.

Para o bem deles, eu rejeitava a amizade, carinho e amor que nos unia.

Depois de me secar e me vesti, arrumei as mechas ruivas que Lílian Potter me emprestara e retirei o colar do pescoço. Segurei-o firmemente na mão, a tensão de abandoá-lo oprimindo-me.

Desci até a sala e fiquei surpresa ao ver Snape ali, em pé ao lado da janela, olhando através dela com os braços cruzados em suas costas. O barulho sutil que a porta fez ao fechar foi o suficiente para que ele se virasse. Nós nos olhamos em silêncio por algum tempo.

Aquela última semana havia sido a pior de todas. Ele havia me infernizado de todas as maneiras que podia, questionando sobre Laureen Ebony, sendo sarcasmo, irônico e incrivelmente arrogante. Fazendo ameaças quando eu ficava irritada, jogando-me no chão e humilhando brutalmente. Tudo o que ele fizera apenas alimentara meu ódio por ele e meu desejo pelo seu sangue jorrando pelo chão.

Desviei os olhos dos dele e foquei-os no colar em minha mão. Minha decisão já estava tomada, só precisava pô-la em prática. Sendo assim, caminhei até Snape, fazendo-o erguer uma sobrancelha. Ao parar na frente dele, estendi a mão com o colar. Ele estendeu a dele e eu soltei meu amado objeto, recolhendo o braço antes que me arrependesse.

- Guarde junto das minhas adagas. – pedi, enquanto ele olhava o que havia lhe dado.

- Certeza? – ele perguntou.

Eu confirmei com a cabeça.

- Isso mostra quem sou. Se algum deles ver isto, tudo o que estou fazendo será inútil. – disse eu, afastando-me em direção à cozinha.

Apesar de Zaxy ter voltado para Hogwarts na noite anterior, ela deixara meu suco matinal pronto. Completei minha refeição com torradas feitas de pão seco.

O relógio da cozinha marcava nove horas quando voltei para a sala. Snape continuava no mesmo lugar, olhando pela janela, perdido em pensamentos. Eu andei até a mesinha que usara durante aquelas semanadas e me sentei na cadeira que a ladeava.

- Como vai acontecer? – perguntei, encostada na cadeira, os olhos e atenções na mecha ruiva que enrolava no dedo.

- Irei para Londres às dez horas. Você irá para Hogwarts via Chave de Portal, que será ativada às oito horas da noite. A chave te levará aos portões de entrada, onde Filch estará te esperando. Ele vai te acompanhar ao Salão Principal. – explicou ele – Lembre-se que você é uma aluna nova, não conhece o castelo e muito menos o zelador.

- Já entendi. – disse-lhe, soltando a mecha que me distraía e o olhando – Onde está a chave?

Ele apontou para sua poltrona, onde havia um rolo de pergaminho.

- É o último documento necessário para a transferência de um aluno e deve ser entregue pelo mesmo. Filch vai querer vê-lo, deixe-o conferir, mas pegue de volta. Isto deve ser entregue a mim. – explicou ele.

- Ok. – levantei-me e peguei o pergaminho lacrado com um brasão do Ministério da Magia.

- Mais uma coisa. – disse ele, atraindo meu olhar enquanto dirigia-se à uma estante de livros.

Ele pegou um livro grosso de couro negro e o estendeu para mim. Fiquei paralisada, os olhos vidrados no objeto.

- É o livro que está faltando. – explicou ele como se eu já não soubesse apenas por sentir a energia maligna que aquilo emanava – Vou te emprestar esse meu exemplar.

Forcei minhas pernas a se moverem até Snape. Involuntariamente, minha mão tremia quando a ergui para segurar o livro.

- O que você sente? – perguntou ele, detendo meu movimento antes que eu tocasse o objeto.

- A maldade que as palavras escritas representam, a crueldade dos feitiços ensinados. – respondi, fria e tensa, sentindo um arrepio fazer meu corpo tremer; e meus olhos saíram do livro e fixaram-se em seu dono – Eu sinto a Magia Negra banhando cada página desse livro e é como se a mais terrível das mortes se deitasse sobre mim.

Eu peguei o livro e o tremou em minha mão e corpo piorou. Dei as costas para Snape e saí da sala o mais depressa que minhas pernas deixaram.

Ao entrar no meu quarto, respirei fundo e abracei aquele livro infernal. Fiquei arfando enquanto tentava dominar o que aquele livro emanava. Mesmo quando a Força me habitava era difícil para eu eliminar más sensações e pensamentos porque eu convivia constantemente com um diabo, Allison.

Então, quando tentei suprimir a energia daquele livro, mesmo sabendo que a Força não estava mais comigo, tinha esperanças de conseguir, pois Allison também havia partido e isso devia significar muito. E, de fato, o que eu pensava tornou-se real. A ausência de Allison permitiu-me dominar a energia maligna daquele livro e ignorá-la, mesmo sem a ajuda da Força.

Suspirei aliviada, sem mais sofrer com o objeto em mãos. Caminhei até meu malão, agora gravado com as letras LE, e guardei o livro junto dos outros. Pouco depois comecei a ter dor de cabeça, fraca, porém, irritante.

Desci novamente para a sala, encontrando-a vazia. Fui para a cozinha e Snape também não estava lá.

- Caramba! – exclamei ao ver pelo relógio da cozinha que já passara das dez horas da manhã.

“Fiquei lá em cima por mais de uma hora?! Nem pareceu tanto tempo.” – pensei, espantada, voltando para a sala.

Passei o tempo terminando de ler um livro, ou tentando terminar. Minha atenção oscilou muito entre o livro, a janela, os móveis e meus cabelos. Resumindo, não consegui me concentrar em nada, como acontecera na semana anterior.

=.=.=

Faltavam alguns minutos para as oito horas da noite quando eu já estava pronta, vestindo as vestes negras de Hogwarts. Tentara disfarçar minha imagem idêntica à de Lílian Potter adicionando uma forte maquiagem negra nos olhos, realçando-os e tornando-me ainda mais sombria e, por que não, mais bela.

Olhei-me no espelho uma última vez.

“Agora sou Laureen Ebony, sangue-puro e americana, cujos pais apoiavam os ideais de Voldemort.” – relembrei- incorporando a personagem – “Fria, arrogante e orgulhosa.” – dei uma risada – “Se eu fosse realmente ela, certamente seria Sonserina.”

Saí do banheiro e segurei o rolo de pergaminho e o malão com força.

Não demorou muito para a Chave de Portal se ativasse.

=.=.=

Ao abrir os olhos avistei Filch em frente aos portões e sua gata, Madame Norra, em seus braços. Fiquei séria, o olhar superior sobre ele.

- Laureen Ebony? – perguntou ele, irritado.

Confirmei com a cabeça e me aproximei. Ele esticou a mão, exigindo o pergaminho como Snape dissera que faria. Entreguei-lhe o que pedia e aguardei.

- Tudo certo, acompanhe-me. – disse ele, enrolando o pergaminho.

- Com licença, senhor. – falei com frieza e arrogância ao vê-lo tentar guardar o rolo de pergaminho – Isto fica comigo. Eu devo entregá-lo ao diretor ou minha transferência não será completada.

Ele me encarou com prepotência, como se perguntasse “quem você pensa que é?”.

- Acredito que o diretor tenha lhe dito isto. Meu padrinho não ficaria contente em se desobedecido, quanto mais em não ser concluída a transferência de sua adorada afilhada. – argumentei, o tom claramente ameaçador.

Filch ficou pálido e me devolveu o pergaminho.

- Venha. – disse ele, rangendo os dentes.

Ele me deu as costas e cruzou os portões. Eu o segui, incerta sobre o que aconteceria dali em diante. Guardei o pergaminho no bolso interno do sobretudo, reparando que o lacre do Ministério da Magia havia sido refeito magicamente.

Enquanto cruzávamos os terrenos em direção ao grande castelo, lancei um olhar atento para a construção. Muitas janelas estavam iluminadas, jorrando luz sobre o gramado. Tudo parecia normal, como se Dumbledore não tivesse morrido, como se Voldemort não estivesse no poder, mesmo que implicitamente, e como se Snape não fosse diretor e Comensais da Morte, professores, porque eu sabia que pelo menos a nova matéria, Artes das Trevas, seria ministrada por um deles.

Pisar no Saguão de Entrada trouxe uma avalanche de lembranças e emoções. Agradeci à Merlim e Yoda por Filch não olhar para mim por sequer um instante, pois demorou para que eu conseguisse recolocar a máscara de frieza e sarcasmo de Laureen Ebony.

Deixei meu malão junto ao dos primeiro-anistas, conforme instruída pelo zelador e continuei a segui-lo.

- Espere aqui. – ordenou ele ao chegarmos às portas do Salão Principal.

Ele entreabriu a grande porta e, depois de cruzá-la, fechou-a novamente.

Fiquei ansiosa, respirando profundamente para manter-me controlada. Eu sentia o ar acolhedor do castelo, da minha verdadeira casa, onde passei os melhores momentos de minha vida. Hogwarts era minha casa e eu voltara para ela.

“Então, por que não consigo me sentir completamente bem como antes?"


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Revenge Angel" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.