O Retorno dos Antigos escrita por João Victor Costa


Capítulo 16
Mundo de Teceu [O Selo de Todos os Selos]- Parte 2


Notas iniciais do capítulo

Segurem os forninhos o/



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Katy não imaginava que aquele simples batom furtado poderia ser a diferença entre viver ou morrer naquele momento, enquanto escrevia a palavra “afastar” no ar. Se escrevesse “destruir”, certamente ela também estaria pelos ares em um monte de pedacinhos, considerando que estava bem perto de seu alvo. Quando as palavras atingiram o caçador de olhos, ele foi subitamente arremessado para o local de onde viera, a a cerca de uns sete metros de distância.

O homem se levantou cambaleante e ajeitou o paletó, como se estivesse apenas tropeçado no chão, o que levou a considerar apenas um gesto de desafio, levando em conta que também estava encharcado da chuva.

— Você é mais forte do que eu pensava. - disse Sig. - Já encontrei e enfrentei muitos hospedeiros como você. - ele pôs a mão dentro do paletó e tirou um par de luvas escuras, na qual colocou, sem nenhuma pressa, nas mãos. As luvas imediatamente ficaram transparentes, como se o acessório não estivesse lá. Invisíveis. Havia algo estranhamente suspeito nelas - Porém, nenhum deles teve a sorte de durar tanto tempo assim.

Tanto tempo? Mas eles haviam acabadora de começar a lutar. Katy engoliu em seco. Se convenceu em não se deixar abalar.

— Eu não sou como eles. - disse ela.

— Ah, sim. Eu sei muito bem disso. - disse Sig, caminhando pelo palco e dando uma olhada nos reféns amarrados, que apenas observavam tudo. - Estive esperando por você há muito tempo, hospedeira da Escrita e das Palavras. Você não tem ideia, não é? Do quão seu espírito é importante?

Katy franziu a testa. Não sabia do que ele estava falando, mas algo lhe dizia que aquilo se passava bem além de apenas um blefe. Ela sempre sentiu que havia algo a mais sobre ela que não sabia e que os outros se recusavam a lhe contar. Mesmo assim...

— Do que você está falando? - perguntou ela. O batom preparado para escrever no ar a qualquer momento.

— Você é a chave, garota. A chave para libertar uma grande reserva de magia. Uma reserva tão grande que ninguém mais precisaria usar o dízimo dos deuses supremos. Uma reserva tão grande que poderia ser usada para invocar feitiços incrivelmente poderosos. Coisas jamais sonhadas.

Katy olhou de relance a sua volta. As pessoas corriam, sem prestar qualquer atenção nos dois. Tiros altos poderiam ser ouvidos, mas Katy não pressentiu que algum seria disparado contra ela naquele momento, embora houvesse essa possibilidade.

— Meu mestre disse que eu deveria esperar, quando eu contei que havia a encontrado. - disse Sig, caminhando lentamente em sua direção. Katy não entendeu o comentário e o ignorou. - Mas eu sou muito capaz de acabar sozinho com você e conseguir o que ele quer.

Os olhos do homem mudaram de cor e se preencheram de escuridão. Katy cambaleou, sentindo uma dor excruciante em seu globo ocular, caindo de joelhos na madeira do palco. Ouviu Chris gritar seu nome, mas parecia distante. Ele continuava a gritar cada vez mais para que ela se levantasse. Parecia que estava tudo girando.

Droga, ele fez isso apenas com um olhar? Nossa, como eu sou estúpida. Deveria ter pensado nisso. Estava doendo. Doendo muito, ao ponto de se permitir soltar um grito agudo.

— Não se preocupe. - conseguiu ouvir o caçador de olhos. Conseguia ouvir apenas ele, nitidamente. Levantou o olhar e ele estava lá, alto, como se estivesse subjulgando-a antes de derrotá-la. Katy piscou involuntariamente como reação à água que caía da chuva. - Não são seus olhos que quero roubar, embora eles sejam fantásticos.

O homem pousou a mão com as gélidas luvas invisíveis que Katy sabia que estavam lá, cobrindo completamente seu rosto. Sentiu algo saindo dela. Algo que não era necessariamente físico, e que, de certa forma, lhe causou um estranho alívio. Era como se estivesse forçando Katy a gostar daquilo. A deixar que aquilo acontecesse...

Seus músculos haviam ficado estranhamente rígidos. Sig murmurou algumas coisas sem sentido que Katy não deu muita importância. A garota se esforçou para escrever algo na madeira molhada abaixo dela. Teve de se empenhar para conseguir concluir as palavras, como se estivesse espremendo uma fruta contra a parede, fazendo uma grande força. Quando acabou a última letra, com o batom completamente desgastado, a palavra “água” estava escrita.

Sig estava ocupado demais para perceber aquilo. Estúpido

Uma onda de magia percorreu todo o palco. Katy e Sig e os prisioneiros perderam o equilíbrio quando a madeiro abaixo se transformou em água, fazendo todos mergulharem. Katy ficou submersa por alguns segundos, mas, tempo depois, se levantou cambaleante com os cabelos grudados nos ombros, tossindo. Observou a água, que antes era o palco, escorrer para todos os lados da rua como se fosse uma tromba d’água, levando consigo as pessoas mais próximas. Chris e os outros haviam conseguido se soltar, começando a desamarrar as mãos. Katy foi até ele. Ambos completamente encharcados, sob o som dos trovões e as nuvens escuras do céu

— Vocês estão bem? - perguntou Katy, tentando não levar em consideração todos os seus machucados no rosto inchado. Ela lançou um olhar para Rose e Garret, e eles assentiram.

Na frente deles, Sig se levantara, emitindo uma risada maligna.

— Muito bom. - admitiu ele. - Mas eu já peguei… Hm... o suficiente.

Suas mãos balançaram e exibiram uma bruxuleante fumaça azul e espectral. Sig canalizou a magia para o chão e seu corpo começou a tremer, sentindo o poder percorrendo suas veias como uma droga. Da água do chão, formas surgiram como chafariz e se materializaram como grandes guerreiros azuis. Uma magia que Katy não havia visto. “Feitiços incrivelmente poderosos. Coisas jamais sonhadas”. Usavam incríveis armaduras medievais e espadas formadas completamente por gelo. Apareceu pelo menos nove deles e crescendo cada vez mais de tamanho, além do tamanho de um humano normal, se transformando em gigantes.

O grupo de Katy se afastou com aquela visão. Não dava para lutar contra eles.

Entretanto, algo totalmente inesperado aconteceu. Os guerreiros simplesmente se desfazaram novamente em água e, segundos depois, Sig caiu para frente, de joelhos, e em seguida tomba para o lado. Atrás dele, um homem segurando uma pedra, que certamente usara para nocautear o caçador bem na cabeça, respirava pesadamente.

Todos olharam, espantados. Chris esboçou um sorriso com a visão do irmão mais velho.

— Henry.. - sussurrou ele para si mesmo, mas Katy conseguiu ouvir muito bem.

— Precisamos sair daqui. - disse ele, se aproximando. Não aparentava estar muito abalado agora. Claramente ainda não era o momento de se abraçarem e matarem a saudade, por mais agradável ou não que isso fosse.

Igor e Renata certamente não imaginaram que atravessar aquela porta daria naquele lugar, na qual eles teriam de lutar contra um espírito enorme para libertar o Selo de todos os Selos e, consequentemente, aumentar o poder de todos os hospedeiros de Teceu de forma considerável, com a grande possibilidade de serem mortos.

— O que vocês estão esperando? - perguntou Alghar di Sawf, o espírito Guardião, que estava entre os hospedeiros e o selo, preso em uma pirâmide de gelo negro

— Hã, eu não tenho certeza se a magia da mente funciona muito bem com espíritos - murmurou Igor para Renata.

— Talvez. - sussurrou ela de volta, seguido de um suspiro. - Creio que vou ter um pouco de trabalho...

— Nesse, caso, acho melhor eu atacar. - disse Alghar, num tom muito mais alto. - Ah, sim. Claro que sim.

O espírito gigante avançou com sua lança enorme. Os tecidos amarelos e brancos que lhe cobriam e se soltavam ao longo de cada ombro balançaram por cima da armadura. Igor pulou para trás quando a ponta metálica da lança passou pelo chão como um cortante ponteiro de um relógio. Renata, entretanto, resolveu esquivar para frente, aderindo a sua postura de ataque, agachada, com uma mão no chão e, na outra, uma lâmina venenosa recém invocada pelo seus poderes estelares em um pequeno feixe de luz. Ela permitiu sua pele aderir a uma típica textura escamosa de serpente. Seus olhos se tornaram amarelos.

— Isso vai ser interessante. - disse Renata.

Alghar atacou novamente com sua lança em uma série de golpes. Renata pulou e desviou enquanto corria na direção do espírito gigante. Depois de desviar de mais outro golpe, Renata se agarrou no cabo da lança e quando Alghar a puxou de volta, a hospedeira da Serpente se lançou sobre seu ombro, apunhalando-o no pescoço. O espírito gritou e se balançou, atirando Renata ao longe, que se transformou em serpente em pleno voo, caindo como uma mola para reduzir a força do impacto, se transformando novamente em humana.

— AGH! Isso doeu! - rugiu Alghar, retirando a adaga e tacando-a para longe. - Mas não acho que seja o suficiente.

Igor balançou as mãos em uma forma circular a sua frente, fazendo sua magia púrpura assumir a forma de uma esfera, lançando-a imediatamente na face do espírito. A fumaça roxa entrou pelos seus olhos e os mesmos assumiram a sua cor, mas logo voltaram ao normal.

— Ah, não. - disse Alghar. - Claro que não. Sua magia não vai funcionar. Você não pode me controlar.

Igor sorriu.

— Eu não preciso.

Em seguida, ele lançou um filete de magia púrpura em Renata. Ela ficou paralisada por alguns segundos, surpresa, e, logo em seguida, retomou o controle.

Ela sorriu de volta. O símbolo de proteção contra o espírito Guardião estava bem nítido em sua mente. Havia sido fácil conseguí-lo.

Era assim que eles iriam derrotá-lo.

— Interessante. - comentou Alghar Di Sawf.

Renata fez retornar a sua adaga em mãos e avançou para cima do espírito, dessa vez, totalmente invisível. O espírito ergueu a lança e tentou atingir a mulher, mas não havia como saber exatamente onde Renata estava e, mesmo assim, ela era excelente em desviar. Renata pulou para as suas costas e, na altura do pescoço, onde não estava coberto por uma armadura, começou a desenhar na pele do espírito com sua faca. Os cortes irregulares se preencheram de sangue e Alghar se sacudiu. Renata deve de pular novamente para o chão para não ser derrubada.

O Guardião soltou um rugido e olhou novamente a sua volta. Tudo o que conseguia ver além do cenário do templo subterrâneo era Igor.

— Ah, droga. - exclamou ele quando percebeu a ideia do espírito de perseguir a única pessoa que conseguia ver.

Alghar correu e o chão tremeu com seus passos. Ele ergueu sua lança e a tacou. Igor desviou, cambaleando para o lado, e a lâmina se cravou no chão exatamente um pouco atrás de onde estava. Igor ficou com os olhos arregalados.

Renata tinha que se apressar.

Mal teve tempo de correr e o Guardião tirou a lança do chão para o lado. O cabo de madeira acertou Igor em cheio e o arremessou longe, girando ao cair.

Renata pulou novamente nas costas do Alghar. Não poderia deixá-lo ferir seu amigo. Ergueu e faca e continuou a cortá-lo. O espírito interrompeu seu avanço para cima de Igor e começou a se sacudir novamente, tentando agarrar a mulher que pendia nas suas costas. Quando Renata conseguiu cortar a última curva, o espírito gritou de dor e ela foi obrigada a se afastar, ficando visível novamente.

— Ah, o que você fez? - gritou o Alghar, largando a lança, enquanto tentava pôr as mãos nas costas, como se estivesse descontrolavelmente querendo se coçar.

O símbolo do pescoço dele brilhou e o guardião lançou um grito, se desintegrando em fumaça logo em seguida.

Igor e Renata respiravam pesadamente quando se aproximaram do centro do templo, onde a estalactite de gelo negro começava a derreter em uma poça de água, revelando o Selo de todos os Selos.

— Nós matamos ele? - perguntou Renata, olhando para onde Alghar Di Sawf estava. Não havia sequer sinal dele.

— Não. Espíritos não morrem. Ele vai reaparecer. - disse Igor, estendendo a mão para chave e pegando-a. Ele sentiu um estranho pensamento na sua mente, como se estivesse acabado de ser colocado lá. Pela sua experiência com coisas da mente, ele podia jurar que vinha da chave.

Ainda na mão de Igor, Renata pegou a chave. Os dois se entreolharam, sabendo exatamente o que fazer.

Eles ergueram as mãos, os dois segurando a chave, e disseram:

— Selo de Todos os Selos! Eu o quebro!

Arthur foi obrigado a pular para o lado quando os homens armados irromperam pela porta do terraço e começaram a atirar. O hospedeiro da Chuva teve que se jogar atrás de uma grande caixa metálica, que devia ser algum tipo de equipamento de ventilação, para se proteger. Os tiros disparados atingiram o metal de sua cobertura e Arthur se encolheu instintivamente ainda mais.

Estava encurralado. Os homens, vendo que ele aparentemente não tinha nada para fazer, avançaram. Arthur ergueu seu guarda-chuva e do céu caíram estalactites de gelo, que se estilhaçaram no local onde eles avançavam, fazendo-os recuar. Arthur aproveitou o momento para correr para a direção oposta, onde pôde ver a extensão do horizonte acima da cidade, com o vento batendo forte em seu rosto.

E pulou.

Os homens surgiram logo atrás, mirando nele, mas não ousaram atirar.

No momento exato em que ele pousou no chão da praça, perto de Andrea, que nocauteava um dos últimos guardas, não muito longe de onde Katy e os outros estavam, ele sentiu como se o mundo tivesse acabado de mudar, mais uma vez.

Eles não sabiam dizer exatamente o que era aquilo, mas era uma sensação boa. Uma sensação de força, antes jamais sentida por geração inteiras de hospedeiros. Era como se uma nova possibilidade dentro deles havia acabado de surgir. O rosto de Katy se iluminou, junto com Andrea e Arthur, que também pareciam sentir aquilo. Os outros pareciam estar indiferentes quanto ao que estava acontecendo.

— O que é isso? - perguntou Henry, o homem que golpeara Sig e agora estava junto com eles.

— O que? - perguntou Chris.

Henry tentou entender o que estava acontecendo. Andrea e Arthur se juntaram a eles. As pessoas ainda se esforçavam para se dispersar. O helicóptero ainda sobrevoava.

— Precisamos sair daqui. - disse Arthur. - Tem alguma coisa acontecendo. Os selos…

— Estão sendo libertos. - completou Henry. Katy e Chris franziram a testa. Como ele poderia saber daquilo? Por exemplo, Katy podia sentir. Apenas hospedeiros poderiam. Andrea pareceu notar isso também. A não ser que…

— Precisamos sair daqui agora. - Reforçou Andrea. - Temos que arrumar um lugar onde consigamos fugir. O portal de onde eu vim está destruído.

Andrea começou a andar e o grupo os seguiu.

— A loja de doces? - disse katy, se lembrando de quando Minerva a levara até lá, na qual as duas atravessaram a porta e foram parar em uma incrível casa de campo. - Está destruída?

— Aham. - concordou ela. Katy ficou preocupada. Se perguntando exatamente como havia sido destruído. - Não tem como saímos daqui a tempo sem um portal. - Andrea olhou para cima, onde sua águia voava alto. - Reforços da cavalaria de outras cidades estão chegando.

— Esperem! - disse Henry, e todo mundo parou. Ele olhou para Chris. - Tem mais um portal.

As memórias voltaram repentinamente na mente de Chris. Quando ele fora interrogado e torturado pelos policias, logo depois dele e de sua família serem pegos. Antes de serem amarrados e exibidos para toda a praça. Ele vira aquele velho, parado na porta. Tinha sido um sinal. Com certeza havia sido um sinal.

— A delegacia. - disse ele, arregalando os olhos. - Tem um portal na delegacia.

— Exatamente. - concordou Henry. - Eu já fui preso uma vez. - ele sorriu. - Vocês podem ir na frente. Eu vou ficar. Ainda tenho uma coisa para fazer aqui. - ele lançou um olhar para Andrea. - Você tem uma águia. Os selos estão libertos. É uma boa hora para usá-la.

Andrea assentiu e eles observaram Henry se afastar para o outro lado.

— Espera! - gritou Chris. - Como você sabia do portal?

Henry se virou e esboçou um sorriso.

— Porque eu sou o hospedeiro de Dáo Shigar.


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Notas finais do capítulo

~Um minuto de silêncio para absorver as informações~
Muahaha
Comentem!