O Retorno dos Antigos escrita por João Victor Costa


Capítulo 14
Mundo de Fugitivos


Notas iniciais do capítulo

Recebi uma recomendação! *--*
Boa leitura!



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Daniel estava no telhado, observando o Sol se pôr, pensando no aviso que o prefeito havia dado a uns dias atrás, a respeito dos ataques. Havia sido advertido para que toda a cidade permanecesse em casa quando anoitecesse, devido a grande taxa de violência a partir daquele horário, por assim dizer. Isso fez Daniel lembrar as histórias sobre o povo do Sol, que fazia a mesma coisa. Se escondiam para dentro de suas casas quando o Sol fizesse o mesmo para o outro lado do mundo, como uma forma de se protegerem da noite e dos terrores que vinham com ela.

Tão perto do Sol, Daniel podia ver um pequeno filete de prata como uma foice, enquanto a parte escura da lua se erguia, invisível. Tão invisível e furtiva quanto aqueles que causavam o terror de noite na cidade de Lahmar. Servos da Lua e da noite, era o que diziam.

Daniel abriu os olhos. Estava bem escuro, mas sua visão de ajustava quase perfeitamente à falta de luz, como se enxergasse tão bem quanto de dia. Sentiu o vento refrescante que vagava pelo seu quarto e lhe roçava a pele, por debaixo de um lençol fino. Ele se levantou, deixando os pés tocarem o chão frio, e ameaçou uma olhada por detrás da cortina, pela janela, para o lado de fora. Os postes de luz estavam acessos, mas não havia ninguém lá. Porque estava com uma sensação tão estranha? Parecia que algo estava acontecendo, de novo.

Daniel costumava acordar durante as noite, em horários diferentes, mas julgava que fosse algo comum e logo se voltava a dormir. Porém, havia algo de diferente naquela noite, em especial.

Ele ouviu alguma coisa. Achou que estivesse enganado, mas o som se repetiu. Pareciam passos. Nunca vira ninguém de sua família andando pela casa durante a noite e isso o fez ficar desconfiado. E se...

Daniel se afastou da janela e seguiu para a porta do quarto, colocando o ouvido na madeira enquanto tentava escutar alguma coisa. Tum... Era lento e estava ficando mais alto. Isso significava que, seja lá o que fosse, devia estar perto, até que começou a se afastar de novo.

Daniel esperou um tempo e depois abriu a porta. Rezou mentalmente para algum deus qualquer que estivesse ouvindo. Isso para que a possível pessoa (ou coisa), na qual ele  já tinha um péssimo pressentimento, não estivesse ali, esperando para lhe dar um susto letal. Felizmente isso não aconteceu, mas ele continuou andando, a passos lentos, seguindo para o lado onde julgava que o som tinha ido.

Começou então a ouvir estranhos sussurros, a medida que se aproximava das escadas, passando pelo quarto da mãe, onde ela e seu pai estavam dormindo. Não parecia ser a voz deles lá embaixo e falavam com um sotaque esquisito.

— Ela não iria querer isso! - ouviu uma voz feminina, que foi aumentando a medida que Daniel caminhava em sua direção, colocando seu peso na ponta dos pés.

— Já temos motivos o suficiente. - disse outra voz masculina. Era grave e parecia se esforçar para fazer o máximo de silêncio possível. - Eles são livres. Isso não é motivo o suficiente? Estamos passando fome! Droga, as coisas estão um caos por lá. Virou uma completa anarquia.

— Nós precisamos encontrá-lo!

Daniel começou a descer as escadas. Parecia que a discussão estava ocorrendo na cozinha. Ele precisava ver quem era.

— Encontrá-lo? Isso é impossível. Não há sequer um herdeiro.

— As runas disseram que ele está perto. - disse a voz feminina, tentando convencer o outro.

— Ah, aquele velho e suas runas estúpidas. - retrucou o garoto. - Não seria mais fácil se eles nos dissesse a localização exata em vez de ficarmos vagando por aí a procura de alguém que nem sabe de nossa existência? Será que ele está sendo mantido preso pelos Solari?

Daniel se encolheu atrás da parede que dava para a cozinha, onde conseguiu ouvir tudo quase perfeitamente.

— Não tem como saber! Onde está o castelo deles? Só tem essas construções estranhas. Isso me confunde. Sabemos que ele está perto. Eu posso sentir.

Daniel ficou nervoso. Poderiam estar se referindo a ele? Não. Talvez não. Ameaçou dar uma olhada e notou que os dois agora olhavam para ele, quase tão surpresos quanto o garoto, com os olhos arregalados. A garota parecia ter a mesma idade que ele, embora parecia ter vindo completamente de outra época. Utilizava uma roupa de couro e uma longa capa negra que lhe cobria os cabelos completamente brancos. O garoto não era muito diferente, embora parecia notavelmente mais forte que Daniel, com cabelos curtos e brancos, assim como ele.

— Daniel, o que você está fazendo? - ele ouviu uma voz calma atrás dele e quando se virou, se deparou com a irmã, que foi andando tranquilamente para a cozinha e acendeu a luz. Ela arregalou os olhos ao notar os dois desconhecidos e tudo o que pôde fazer foi ameaçar um grito que acordaria toda a vizinhança, até que o garoto correu até ela e lhe segurou, tampando lhe a boca enquanto tentava desesperadamente gritar. Daniel saiu de onde estava escondido e ficou observando a cena.

— Ah, porcaria. - disse a garota de cabelos brancos. - Apaga essa luz.

Daniel obedeceu, com relutância, e tudo ficou escuro novamente.

— O que vamos fazer com ela? - perguntou o garoto, segurando a irmã mais nova de Daniel, que não se parava de contorcer nas tentativas de chutar o seu agressor, inutilmente. De algum lugar da roupa de couro, ele puxou uma faca e pressionou contra o pescoço dela. - Ela nos viu. Não podemos nos arriscar.

— Espera. - lançou Daniel. - O que vocês pensam que estão fazendo?

— Quem é você, por falar nisso? - perguntou o garoto, nervoso. - O que está fazendo aqui e porque usas essas roupas esquisitas?

— O que? - disse Daniel, apenas com medo de que algo acontecesse com sua irmã. - Essa é a minha casa.

— O que? - disse a outra garota, surpresa, parecendo raciocinar um pouco antes de balançar a cabeça. - Ah, não pode ser...

— De qualquer forma, temos de matá-la… - o garoto pressionou a faca contra o pescoço da garotinha.

— Não! - gritou Daniel e com a mão fazendo um movimento como se estivesse dando um tapa no ar, uma onda de energia invisível pareceu surgir e a faca voou para longe, clavando-se no concreto da parede. O garoto que a empunhava se afastou, perplexo. Daniel estranhou o que havia acabado de fazer. O garoto tentou avançar para ele, porém, Daniel lançou mais outro tapa no ar e o garoto foi golpeado e pressionado fortemente contra o armário atrás dele, amassando o metal com o impacto. O som foi bem alto e Daniel esperou alguns segundos, com a mão erguida enquanto o garoto fazia caretas, até notar que ninguém havia acordado enquanto o silêncio continuava a reinar.

— É ele mesmo. - disse a garota, sorrindo com um ar de contemplação.

— Do que você está falando? - perguntou Daniel.

— Não acredito. - o garoto riu. - Estávamos procurando por você?

Daniel se virou para a garota. Seu rosto pareceu se iluminar na escuridão.

— Você… Você é um dos herdeiros de Roselie. Você é o hospedeiro da Lua Negra.

...

Embora não conseguisse acreditar totalmente naquilo e ainda existisse uma pontada de dúvida, Henry não poderia ficar mais surpreso e chocado quando ele e Sig finalmente chegaram na praça, em um carro preto que atravessara lentamente o mar de pessoas para que o assistente finalmente entendesse o que estava acontecendo, o que demorou alguns minutos para que ele absorvesse completamente tudo.

Ah, não.

Ele estava preocupado demais com a possibilidade da família que, de certa forma, ele havia abandonado por motivos próprios, estar o assistindo na atual posição que ele havia conquistado, ao lado do líder da Cavalaria. Para eles, Henry não deveria se passar de um traidor e conseguiria aguentar com relutância seus possíveis olhares desaprovadores, de onde quer que viriam.

Entretanto, quando ele identificou as três silhuetas familiares e se deu conta, pareceu reconsiderar tudo. Sua mãe e seus dois irmãos. Ah, não. Aquilo não podia estar acontecendo. Não podia ser verdade.

— É, pessoalmente, parece que tem muito mais gente que o esperado. - disse o motorista enquanto dirigia calmamente. Seguranças os rodeavam do lado de fora, abrindo caminho e impedindo que as as pessoas se aproximassem demais e acabassem colocando algum pé embaixo das rodas por acidente (Era mais comum do que parece), o que não seria algo muito agradável.

— Sim, é verdade. - disse Henry, sentado no banco ao lado do motorista, quase como uma resposta automática, observando as pessoas ali reunidas do lado de fora, além da barreira humana. Percebeu então que estava quase se afogando nos pensamentos a respeito de sua família. A terrível imagem da garganta da mãe e dos irmãos sendo cortada enquanto seus corpos se debatiam inutilmente no chão enquanto a corda que lhes segurava a Vida desaparecia aos poucos, o fez engolir em seco. Já havia visto muita crueldade, mas nada algo como aquela possibilidade que podia vir a acontecer. Se já estava nervoso e suando frio quando os avistara, como poderia estar quando subisse ao palco e eles pudessem o ver bem de perto? Como ele poderia ficar lá, parado, apenas olhando, quando os últimos segundos deles chegassem, enquanto a multidão clamasse por sangue?

Henry não sabia de mais nada, porém tinha certeza de que deveria fazer alguma coisa. Entretanto, tentou se controlar utilizando o método de uma respiração profunda e regular. Sentiu o olhar do homem no banco de trás, como sempre costumava pressentir. Era como se estivesse sendo constantemente vigiado. Ele não podia falhar. Não naquele momento, depois de tanto tempo...

Minerva ficou feliz - mas não tanto, devido a situação na qual estavam - pela poção de cura que Lissandra havia feito ter dado consideravelmente certo. Ela não sentia mais as dores de sua fuga, entretanto, parecia que ainda não havia acabado, quando os homens entraram pelo salão principal abrindo as portas duplas com um pontapé, logo depois de terem invadido pelo quintal.

Ela havia tentado protestar, mas tinha de confiar nos dois porque eles provavelmente estavam certos. A não ser que eles não conseguissem escapar e a palavra gravada em suas costas na forma de cicatrizes não tivesse poder o suficiente para que os ajudasse com sucesso a fugir daquele batalhão. Esperava que tivesse errada.

Quando as portas foram abertas, Blake e Lissandra estavam agachados, um de cada lado, prontos para atacar quando os primeiros homens da Cavalaria aparecessem. Minerva conseguiu ver quando Lissandra, sob os efeitos da adrenalina causada por um pedido que lhe custara alguns dias de vida, assim como seu marido, dera um soco no segundo homem que entrou sem os ver, utilizando o corpo do mesmo como escudo humano para os tiros disparados pelos guardas que vinham logo atrás, enquanto Blake nocauteava o que viera na frente e o abraçava por trás para pegar sua metralhadora, disparando na direção dos outros na qual aqueles que tiveram a sorte de não terem tido partes de seus corpos perfurados pelas balas pularam para o lado, em busca de alguma cobertura para se protegeram, gritando advertências e palavrões sobre coisas óbvias que estavam acontecendo, como por exemplo, “Estão atirando!”. “Se protejam!”

O som dos tiros era ensurdecedor e fizeram com que Minerva, em um reflexo quase involuntário, abaixasse a cabeça e se agachasse parcialmente, antes do mordomo a puxar pelo braço para longe dali, como Blake e Lissandra os havia instruído.

— Não tenho como sairmos por lá. - dissera Blake. - Mesmo se conseguíssemos chegar no carro vivos, eles certamente estariam bloqueando a saída e aí sim que estaríamos todos mortos.

Eles haviam discutido brevemente um plano enquanto a Cavalaria avançava pelo jardim da frente. Basicamente consistia nos Bruhmar atrasarem a Cavalaria enquanto Minerva e Bernard fugissem pelos fundos, pulando o muro do jardim de trás, para a mansão vizinha, que tinha saída na outra rua, como estavam fazendo naquele exato momento. Era um bom plano e tudo o que restara era confiar que os dois pudessem escapar mais uma vez.

O muro era bastante alto, mas Minerva não teve dificuldade alguma de escalá-lo após uma breve corrida. Parou no topo para ajudar o mordomo a subir, pegando o pelo braço, levantando as sobrancelhas ao perceber a facilidade na qual Bernard havia subido, o que era algo difícil de se imaginar, considerando a idade dele e tudo mais.

Bernard pulou para o quintal da mansão do lado, com Minerva logo atrás. O som de tiros era constante, com breves pausa entre intervalos irregulares.

Os dois correram para onde deveria ser a possível garagem, onde felizmente havia um carro estacionado. Bernard entrou pelo lado do motorista e Minerva pelo do carona, após apertar um botão que fez com que a porta da garagem automática se abrisse.

— Algum problema se eu dirigir? - perguntou ele. Os dois colocaram os cintos.

— Claro que não.

Ela ficou feliz pela chave já estar dentro do carro, embora Minerva não tivesse problema algum em fazer ligação direta. Ficou um pouco mais aliviada ainda por não ter encontrado ninguém por ali. Certamente o pessoal daquela casa deveria estar na cozinha, se esgueirando para debaixo de uma mesa enquanto não paravam de ouvir os tiros, tão altos.

Bernard pisou fundo no acelerador e os dois saíram em disparada pelas ruas.

— Precisamos chegar no portal. - disse Minerva, se segurando firme enquanto o carro andava a sessenta quilômetros por hora em uma ruazinha na qual a velocidade máxima era trinta. - Fica na rua 12 com a 27, em uma loja de doces.

— Entendido. E sobre Katy? - perguntou Bernard.

Minerva havia pensado naquilo e não havia nada que pudesse fazer além de ter esperança de que tudo desse certo. Os dois poderiam até estarem com mais problemas que a garota.

— Precisamos confiar nela.

E, nesse momento, ouviram sirenes logo atrás. Pelo retrovisor, Minerva pode ver aquilo que seria uma manhã interessante.

Katy estava nervosa, mas com certeza havia entendido tudo a respeito do plano que ela ajudara Andrea e Arthur organizarem. Ela realmente estava feliz por não estar sozinha naquilo, o que parecia ser o único motivo na qual poderia se alegrar. Por enquanto, pelo menos, caso as coisas não dessem errado.

— Precisamos ser rápidos e cuidadosos. - disse Andrea, pacientemente, embora certamente estivesse altamente nervosa por dentro, assim como Katy. O hospedeiro da Chuva era o que parecia mais tranquilo, com o dedo nos lábios. - Arthur faz a chuva. Eu acabo com os guardas. Katy derrota Sig. Tudo entendido? - eles assentiram. Andrea deu um longo suspiro. - Ok. Então vamos lá.

Falando daquele jeito, até  poderia achar que fosse algo simples, salvar três pessoas de serem executadas em uma praça repleta de pessoas, com sei lá quantos guardas e homens armados montando a segurança exatamente para que nenhuma coisa desse tipo ocorresse, além do fato de Katy ter de enfrentar outra pessoa, o que era algo que ela não se imaginava muito fazendo. Será que conseguiria?

Detalhadamente, Arthur, o hospedeiro da Chuva, iria fazer uma das grandes. Uma chuva gigante, na verdade, que se Andrea estivesse certa, embora Katy não duvidasse nem um pouco dela, já trataria de causar o caos e a desordem alheia entre as pessoas lá embaixo. Considerando ainda que as pessoas estavam bem agrupadas, aquilo daria uma confusão das grandes. E, para isso, Katy desempenhou um papel importante na forma de simples palavras escritas no braço do hospedeiro: “Poder”.

— Parece simples, mas uma palavra pode mudar muita coisa. - disse Arthur, enquanto a garota escrevia em seus abraços, antes de escrever em Andrea e nela mesma.

— Seu poder tem tanta liberdade e possibilidade quanto o próprio hospedeiro da Magia. - disse Andrea, com um sorriso, embora Katy se culpasse por não ser lá uma pessoa muito evoluída, quando a questão se dizia respeito a seus poderes, por não ter tido oportunidade de treinar muita coisa. Imaginou Andrea falando algo como “Menina, seu poder é muito destruidor mesmo, sabia?”, mas não parecia lá muito a cara dela. Os dois hospedeiros a olharam quando ela esboçou um sorriso bobo que se desfez.

“Tudo bem. Foco!” Ela precisava focar no que iria fazer. Embora Andrea não tivesse dito nada, Katy sabia que teria de descobrir essas possibilidades de seu poder naquele dia ou então… Bom, nunca mais.

— Nos reencontraremos aqui ou no portal. - disse Andrea, por fim, quando sua águia se lançou ao céu, sem que ninguém mais pudesse distinguí-la por causa de suas penas que agora tinham a textura das nuvens escuras que ocupavam todo o céu visível. De repente, Andrea paralisou. Katy franziu as sobrancelhas.

— Ela só está vendo alguma coisa. - explicou Arthur, antes de Katy perguntar qualquer coisa. Andrea voltou ao normal logo em seguida, lançando e desviando um olhar a Katy.

— Não foi nada. - disse ela. -  Vamos lá.

E ali, Andrea e Katy seguiram para fora do beco vazio enquanto Arthur fez surgir um guarda-chuva cinza e turbulento, que se desprendia em fumaça, que o guiou para o céu, para o alto do prédio mais próximo.

Quando Andrea e Katy chegaram nas pessoas que se agrupavam cada vez mais, uma olhou a outra e se despediram, na esperança de se reencontrarem novamente, em breve.

— Boa sorte!

Katy caminhou por entre a vasta multidão com certa dificuldade de ver qualquer coisa por cima das pessoas, o que a deixou nervosa, fazendo a se obrigar a achar algum lugar mais alto na qual pudesse enxergar alguma coisa que não fosse o helicóptero que sobrevoava lá no alto. Enquanto andava, Katy conseguiu achar um ponto na qual ela pôde ver quase perfeitamente o horizonte e o palco, onde três pessoas estavam amarradas, de joelhos, em pedaços de madeira, antes de ser engolida pelas pessoas novamente diante de si. Foi por pouco tempo, mas foi o suficiente.

Da direita para a esquerda, a primeiro era Rose, pelo que se lembrava. Do lado estava Garret, irmão de Chris, com manchas por todo o rosto que só poderiam ser machucados ocasionados por um espancamento. Katy estremeceu quando notou Chris, em um estado não muito melhor. Parecia que haviam sido torturados e isso fez uma onde vermelha de raiva surgir dentro de Katy. Aquilo era sério. Ela fechou os punhos. Faria eles pagarem caro com dor por causa daquilo.

Sentiu uma pontada no cabelo ruivo e depois, mais outra. Olhou para o céu e notou os pingos fracos da chuva que começavam a cair, tornando-se eventualmente mais forte e frequente. Algumas pessoas já se adiantaram, pegando logo seus guarda-chuvas. A chuva lhe lembrava no dia em que ela fugira. Havia se passado pouco mais de uma semana depois daquele dia, mas parecia muito mais que isso. Tanta coisa havia acontecido. A chuva lhe lembrava momentos felizes, mas, naquele momento, ela só poderia parecer significar o que a maioria das pessoas achavam a respeito dela. A chuva lhe lembrava lágrimas.

Katy foi se aproximando cada vez mais na direção do palco, se espremendo entre as pessoas. Um mal estar de súbito a invadiu, certamente pelo enfraquecimento ocasionado pelos símbolos de proteção que montavam uma espécie de perímetro mágico ao redor da praça. Porém, a palavra “Poder”, escrita na sua barriga, por debaixo da blusa, lhe dava um pouco mais de força, o que era suficiente para considerar o enfraquecimento como um ligeiro incômodo constante, embora não sabia se o mesmo funcionaria com os seus poderes.

Bom, estava na hora.

Henry nunca havia controlado tanto suas emoções enquanto subia as tábuas de madeira do palco, na companhia de um pequeno grupo de guardas que rodeavam Sig, seu líder. Henry queria sair dali, mas não era tão simples. Ele não podia. Pelo menos, não ainda. Não antes de ter certeza que sua família estaria bem, o que era algo bem improvável àquela altura.

— Povo da cidade de Gali! - começou Sig, enquanto andava de um lado para o outro no palco, na frente dos três, que estavam ajoelhados e amarrados. Ele estava com seu típico paletó com gravata vermelha, todo arrumado com um ar notável de superioridade, o que o fazia aparentar bem menos que sua verdadeira idade. Sua voz estava quase perfeita, sendo reproduzida nas caixas de som nas extremidades do palco pelo microfone que estava embutido em sua orelha. - Obrigado por estarem reunidos aqui, nesse evento, que demonstra a nossa posição a respeito das práticas altamente proibidas que ameaçam a paz e o equilíbrio da nossa sociedade!

Enquanto Sig pronunciava seu discurso e a multidão aplaudia, Henry ainda tinha esperanças, mesmo pequenas, de que aquilo talvez não se passasse de um engano. Ah, não. Não. Não. Henry não conseguia mais e tudo ameaçou a desabar. Ele involuntariamente arregalou os olhos e sentiu suas pernas vacilarem. Parecia algo muito mais forte que ele.

O garoto na ponta, o que estava mais perto de Henry, que era seu irmão mais novo, notou a inquietação do homem pelo canto do olho que, como ninguém pareceu perceber, e virou o rosto para ele, exibindo uma expressão notável de surpresa tanto quanto seu irmão mais velho.

Os lábios rachados do garoto se moveram sem sair nenhum som que lhe fosse audível, mas o assistente do caçador de olhos conseguiu captar quase perfeitamente o que o irmão mais novo dizia.

— Henry?


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Notas finais do capítulo

Ah, mais um capítulo! Espero que tenham gostado! :D Próximo capítulo será uma completa explosão, porque será o decisivo e muita coisa vai acontecer. Tem a possibilidade de ser dividido em partes, porque sinto que será bem grande. Até mais!



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