Sete escrita por Jhope
Notas iniciais do capítulo
Bem, espero que a história agrade a todos os leitores, se não agradar, comentem o que não lhe agradou, assim poderei aprender com os erros e tal, pois bem, chega de enrolação! Boa leitura!
Capítulo 1 - Gula: O desejo insaciável
Pedro, ainda tonto, abriu os olhos.
Acordou com uma dor de cabeça insuportável, ainda com imagens da festa de Amanda rodando em sua cabeça; algumas poucas coisas vinham com nitidez à memória do mesmo, lembrando do ritmo de algumas músicas, das luzes neon que se encaixaram muito bem naquela simples casa do subúrbio e dos rótulos desgastados de algumas bebidas que resultaram no enjoativo e repulsante gosto seco de álcool agora em sua boca.
— Merda... - Ele falou com dificuldade, franzindo as sobrancelhas em enxaqueca, fazendo força para se erguer. - Bebi demais. - Ele repousava a mão em sua cabeça na tentativa de amenizar a dor.
Levantando-se da cama numa velocidade quase mórbida, pôs os pés no chão frio de madeira, sentindo a dormência de todo seu corpo percorrer seus membros que fraquejavam levemente junto às pontadas incomodas em seu ombro esquerdo. Parou catatônico no centro do quarto, virado para a parede e sem nenhum pensamento nítido em mente; uma manhã normal de domingo.
Preocupado com a incomoda dor, foi em direção ao espelho ao lado de sua cama. Sua aparência estava medíocre; seu cabelo curto cabelo castanho desgrenhado não estava mais bagunçado que o normal, seus olhos de mesma cor envoltos em olheiras escuras...
Mas o susto ao ver o número "7" em seu ombro fez com que o moreno despertasse por completo.
Um número, tatuado em preto na altura de sua clavícula, passando precisamente pelo ombro e chegando até parte do peito...
Pedro entrou em pânico.
— Eu vou morrer. Minha mãe vai me matar. Eu vou morrer. - Ele fitava perplexo seu tatuado ombro enquanto repetia as duas frases em forma de mantra. - Eu vou morrer...
Ele sentou-se na cama com as duas mãos em reza sobre a boca, que logo as usou para esfregar o rosto na tentativa de expressar o quão perplexo estava. Tentava se acalmar; respirava fundo, contava alguns números, repetia "Meu Deus" mais vezes que o mesmo podia contar. Ficando em silêncio, começou a olhar ao redor do quarto e, logo, pegou seu telefone bruscamente e discou no mesmo tão agressivamente quanto.
— São duas e meia da tarde, Pedro. - Amanda atendeu com uma voz grogue, ainda sonolenta. - Por que ligou tão cedo?
— Eu fico "alto" na festa e vocês me tatuam? - Pedro começou a ficar histérico e raivoso. - Vocês tem algum tipo de demência? Eu vou...!
— Ei! Calma aí! - Amanda retrucou, interrompendo-o antes de ouvir poucas e boas. - Eu também fui tatuada, algum retardado deve ter feito isso.
— Eu acordei com um número tatuado no meu ombro. - Pedro disse - E cara! Essa porra dói muito! - Ele esticou o braço tentando amenizar o incomodo.
— O seu também foi um número? - Amanda disse preocupada porém não muito surpresa. - Eu acordei com o numero "3" tatuado na minha coxa; bem perto da virilha.
Pedro desfez sua seriedade, deixando escapar um breve riso.
— Na sua coxa? - Ele se conteve. - Será que a pessoa que tatuou não se aproveitou e...? - Ele não teve coragem de completar a frase.
— Não, seu idiota! - Amanda respondeu envergonhada - Está tudo intacto, ou seja... - Ela respirou fundo, não deixando claro se era de alivio ou de desapontamento. - Continuo intocada.
Pedro voltou ao tom sério, tentando focar-se no problema.
— O André! - Amanda exclamou em tom de descoberta. - Ele foi à festa, não foi?
— Sim! O André! - Pedro concordou no mesmo tom. - Do jeito que ele é, com certeza ele deve ter visto quem foi que fez.
Pedro olhou para o relógio da parede e tomou-se como atrasado.
— Amanda, vou desligar. Tenho que arrumar umas coisas por aqui e tentar esconder isso. - Ele disse mais tranquilamente. - Hoje eu vou à casa do André. Seus pais estão em casa?
— Dessa vez, só vão chegar daqui a duas semanas. - Amanda respondeu com desdém. - Minha mãe quem deve custar pra vir e demorar mais do que isso, pra variar.
— Então eu vou passar aí logo depois de falar com o Zero Quilômetros, tá legal?
— Pode vir sim. Nos vemos depois. Tchau.- Ela desligou o telefone.
Pedro revirava sua gaveta de cima a baixo, procurando qualquer camisa ou casaco que conseguisse cobrir o suficiente para cobrir a tatuagem para que ninguém conseguisse vê-la. Vestiu uma camisa preta com mangas compridas brancas, vestiu suas jeans escuras rasgadas nos joelhos, pegou um sapato preto qualquer e saiu de seu quarto, andando pelo curto corredor e descendo as escadas.
Atravessando outro curto corredor e chegando à cozinha, sentou-se ao lado esquerdo da mesa no centro do espaço, pondo a mão sobre o rosto em sinal de cansaço...
Sua cabeça doía.
— Bom dia. - Sua mãe disse sorridente enquanto lavava a louça com luvas amarelas de borracha e um lenço branco na cabeça que segurava seu não-muito-longo cabelo castanho. - Dormiu bem? Não te vi chegar ontem da casa de Amanda.
Seu irmão caçula, Lucas, fazia algazarras brincando com uma bateria de brinquedo ao lado da mesa de jantar; se achando um astro punk com seu pequeno cabelo castanho todo arrepiado, cantando músicas infantis como "A dona aranha" fora de ritmo.
— Bom dia... Ou melhor: Boa tarde. - Pedro pôs ênfase na palavra "tarde".
— Dormiu bem?
— Não, acor-... - A cantoria de seu irmão abafou o som da sua voz
— Veio a chuba folte e a delubou! - Lucas cantava em alto e bom som, quase em histeria; fingindo como se estivesse em um show.
Carla virou-se de costas e olhou para Lucas com olhar repreendedor, suavizando o mesmo com um sorriso compreensivo.
— Luquinhas, tente cantar mais baixo, filho. Eu estou falando com seu irmão. - Ela voltou sua atenção para Pedro.
Lucas assentiu com uma mexida positiva de cabeça e logo continuou a brincar, sem mudança de tom.
— O que foi filho? Parece doente ou algo do tipo. - Sua mãe reparou no moreno. - Não vá me dizer que você bebeu noite passada.
— Mãe, eu apenas-... - A brincadeira de seu irmão o interrompeu novamente.
— Avião sem asa, fogueira sem blasa... — Lucas continuava a cantar alto, o que fazia a cabeça de Pedro latejar.
Pedro deu um soco na mesa de jantar, voltando toda atenção do ambiente para o mesmo.
— Dá pra calar a maldita boca, Lucas? - Pedro disse em tom autoritário.
Lucas parou a brincadeira imediatamente, fitou paralisadamente o irmão por alguns segundos e correu para a sala como quem recebera uma ordem; Carla olhou para Pedro, repreendendo-o.
— Que bicho mordeu você? - Ela disse franzindo a testa. - O que deu em você pra você ser tão arrogante com seu irmão.
Pedro olhou nos olhos dela.
— Arrogante? Eu? - Pedro impôs a voz pondo ênfase na palavra "arrogante", mas logo se arrependeu.
A campainha tocou, o que desviou a atenção de ambos.
— Atenda pra mim, por favor. - Ela desprendeu o cabelo e respirou fundo como quem quer chegar a uma conclusão. - E evite agredir quem quer que seja que esteja na porta.
Pedro saiu da cozinha, atravessou o curto corredor e foi em direção à porta. Olhou pelo olho mágico e viu um jovem loiro, de estatura mediana para um adolescente; o jovem vestia uma camisa social azul que parecia ser grande de mais para o mesmo e um cachecol envolto em seu pescoço que fez Pedro reagir.
— André.
Ele abriu a porta e olhou para o loiro, que estava com a mesma expressão pesada.
— Preciso falar com você. - Os dois disseram uníssono.
Os dois se fitaram novamente, como quem se comunica só pelo olhar e, com perfeição, compreende um recado. Pedro assentiu com a cabeça e, logo, André entrou.
— Quem é na porta, Pedro? - Carla perguntou da cozinha.
— É André. - Ele disse em alto e bom som enquanto olhava para o mesmo. Pedro, logo em seguida, gesticulou S-U-B-A, e o loiro assim o fez.
— Olá, André! - Ela disse ainda da cozinha enquanto o loiro subia o mais rapidamente para o quarto do moreno.
— Oi, Tia Carla. - André disse já na porta do quarto de Pedro, não hesitando em entrar no mesmo.
***
Assim que chegaram no quarto, Pedro trancou a porta com rapidez. Os dois pararam por mais alguns segundos, olhando um para o outro com a mesma expressão aflita que, logo, se rompeu em uma sessão de perguntas.
— Você sabe o que aconteceu na festa? - Os dois perguntavam simultaneamente. - Aconteceu com você? Também aconteceu com você? O que fizeram com você?
Os dois arfaram em frustração, demonstrando insatisfação com o rumo das perguntas uníssonas.
Depois de um breve momento, André se acalmou. Olhou para o chão por alguns segundos, fitou seus pés, o chão de madeira, o tapete empeirado...
Segurando precisamente seu cachecol cinza, engoliu em seco e, hesitadamente, o tirou, deixando exposto o número 1 que estava em seu pescoço, bem a cima do seu Pomo-de-Adão.
— Você também acordou com isso em você? - Ele disse triste e ofegante com seus olhos marejados.
— Cara... - O moreno deixou escapar, preocupado.
Não muito diferente da hesitante ação de André, o moreno tirou sua camisa preta e o olhou compreensivo, provocando um olhar espontâneo de André para o número em seu ombro.
— Na festa, alguém tatuou o número 7 em mim e o número 3 na Amanda. - Pedro olhou para André - Você sabe quem... - A histeria de André o interrompeu.
— Eu vou morrer! - Ele pôs as duas mãos na cabeça, em desespero. - Pedro, minha mãe ainda não viu isso! - Ele segurou o moreno pelos ombros e o sacudia freneticamente. - Eu vou morrer! Eu vou morrer! - Ele pôs ênfase na palavra morrer, repetindo-a lenta e consecutivamente.
— Se você continuar me sacudindo assim, eu quem vou morrer. - Pedro dizia enquanto sacolejado.
André, parando os movimentos bruscos e descontrolados, fechou os olhos e respirou o mais fundo que conseguira, acalmando-se.
- Você tem alguma ideia de quem possa ter feito isso? - Pedro disse tonto, mas ainda sério.
André se virou para o espelho na porta do armário de Pedro, cutucando levemente o número em seu pescoço.
— Se eu soubesse, não estaria aqui... - Ele disse cabisbaixo. - Estava na esperança que você soubesse.
— Espera ai - Pedro mudou o tom de voz. - Mas isso aconteceu na festa enquanto eu e Amanda estávamos bebendo. Você não conseguiu ver quem foi?
— Na festa? - André perguntou confuso. - Eu fiquei na festa uns trinta minutos e tive que sair correndo. Minha mãe me ligou e tive que me afastar do som; aproveitei e fui embora.
O telefone de André tocou em seu bolso.
— Falando nela... - O loiro disse revirando os olhos. Depois de suspirar de desgosto, atendeu o mesmo. - Alô?
Pedro ficou pensativo, coçando sua cabeça tentando puxar alguma ideia para fora.
— Se aquilo não aconteceu na festa, como aconteceu? André não ficou na festa e, mesmo assim, acordou com o número... - Ele pensava baixo. - E por que números?
— Tem certeza? - André aumentou o tom de voz e exclamou como quem não entendera a pergunta. - Eu não conseguiria e acho que muito menos alguém entrou em casa só pra isso, Mãe. - Ele esfregou a mão em seu rosto e sacudiu a cabeça. - Olha... Eu estou voltando pra casa, tá legal? Te amo. Tchau. - Ele encerrou a ligação.
— Algum problema? - Pedro perguntou franzindo a testa.
— Alguma coisa aconteceu com o estoque de comida do armazém lá de casa. - Ele respondeu ainda confuso. - Parece que alguém comeu tudo; condimentos, temperos, massas, carnes... Tudo! - Ele pôs ênfase em tudo.
— Você não quis dizer "Roubar" ao invés de "Comer"? - Pedro sugeriu.
— Não! - André continuava perplexo. - Comeram! Consumiram! Usufruíram! As embalagens estão rasgadas por todo o chão e fazendo um rastro até a rua.
— Talvez tenha sido só um animal. - Pedro sugeriu novamente. - Ratazanas fazem um tremendo estrago se... - Ele grunhiu junto a uma cara feia, interrompendo-se.
Pedro sentiu seu ombro latejar, o que fez seu rosto contrair levemente em dor.
— Tudo bem? - André perguntou enquanto repousava a mão por cima de seu pescoço.
— Tá tudo certo. - Pedro respondeu. - Vou te levar até a porta e roubar a base da minha mãe pra você passar por cima desse vandalismo.
***
Já eram cerca de 19h30min e chuviscava levemente na rua.
Pedro, mesmo não fazendo tanto frio, insistia em por casaco preto e calça comprida ao invés de levar um guarda-chuva. Se preparando para ir até a casa de Amanda, ele ainda estava pensativo sobre os números.
— Tchau, Mãe - Pedro se despediu, pegando a chave ao lado da porta. - Volto às onze! - Ele bateu a porta.
Andando pela extensa rua que dava na casa de sua amiga, Pedro sentia as gotas de chuva tocarem seu rosto, o que não era de incomodo algum para o moreno. Erguendo levemente sua cabeça para clarear as ideias enquanto a fria chuva torrencial caia sutil e brevemente, ele pensava.
As ruas, por mais que iluminadas, estavam bem desertas; o que era estranho para um horário daqueles.
Um relâmpago seguido do estrondo de um trovão anunciaram a chuva que começou a cair mais vorazmente.
— Porcaria... - Pedro revirou os olhos e continuou a andar no mesmo passo. - Vou ficar encharcado.
Ele olhava de um canto para outro, procurando algum lugar coberto para se proteger da chuva que caia sem cessar e, logo, achou um beco; um beco escuro, apertado, um espaço entre dois prédios de 4 e 5 andares onde o terraço de ambos eram mais avantajados e bloqueavam a chuva.
O moreno não pensou duas vezes em se esconder no mesmo até que a chuva passasse.
Chegando no mesmo, ele o fitava como um abrigo; a lixeira pública à frente, tampando a visão dos demais da rua, o entulho mais a fundo do mesmo que provavelmente pertencia aos moradores dos dois prédios e um velho e acabado sofá, onde um homem loiro e alto se afundava no pescoço de uma mulher que estava com seu tomara-que-caia quase dando jus à torcida para que o mesmo escorregasse pelos ombros da mesma
— Ninguém merece... - Ele revirou os olhos, virando sua atenção para a calçada molhada.
Misturada à clara e cristalina chuva torrencial que caia sobre o concreto da calçada, um rastro vermelho e escuro seguia até dentro do beco em questão. Ele percebeu aquele escuro e abundante rastro seguir, atravessando todo seu caminho.
O vermelho percorria ao lado da lixeira, adentrando o escuro do beco. O mesmo passava por baixo dos pés do moreno que fitava assustado e ofegante o rastro do mesmo; a curiosidade o deixava trêmulo...
E aquela situação instintivamente o apavorava.
O rastro seguia. Passava pelo entulho jogado perto do casal que Pedro, por agora, tinha medo de levantar a cabeça para o olhar com clareza a cena.
Ele ouviu um rosnado, o que fez um arrepio percorrer por toda sua espinha e toda saliva em sua boca secar.
Seguindo o rastro, passando pelo entulho, havia carne. Carne vermelha. Carne molhada...
Carne fresca.
Pedro tomou coragem e olhou rapidamente para o sofá desgastado e acabado. O homem, loiro e com a camisa aos trapos, segurava-a pelos pulsos enquanto sangrava os braços, pernas e, agora, pescoço.
O resto da mulher morta já se fora há muito tempo para reagir.
Pedro fitava aquilo paralisadamente; assustado, com medo e trêmulo dos pés à cabeça. O homem loiro era curvo, quase corcunda. Muito magro, era possível ver as elevações dos ossos da sua coluna e suas costelas expostas até às costas. Ele estava sujo e quase deformado, tão ensanguentado quanto a mulher que ele devorava incessavelmente.
Ele se virou, vendo o moreno o olhar paralisado e com medo. Largou o que sobrara da mulher para apodrecer ali mesmo, ficando de quatro no chão.
O loiro o olhava, mesmo que sem pupila ou iris em seus olhos completamente brancos. Ele o olhava. Se aproximava lenta e sutilmente, não fazendo movimentos bruscos. Uma mão de cada vez. Um pé, uma mão, um pé, uma mão... Ele seguia aproximando-se enquanto abria a boca pronto para dar o bote. Movimentava estralando os seus ossos, rangendo os dentes e girando lentamente a cabeça; vendo sua caça de outro panorama.
André estava pronto para pular em cima de sua presa.
— André? - O moreno perguntou gritante e histérico, deixando o medo nivelar seu tom de voz.
O loiro, em resposta ao grito de Pedro, rugiu. Rugiu, alto e penetrante, como um Leão, fazendo Pedro ir para trás enquanto colocava mãos em seus ouvidos que bipavam agudo.
André pulou.
Pedro fechou os olhos e se encolheu na tentativa de se defender do mesmo.
Um vulto, escuro e dono de calor, tomou a frente do moreno que, após alguns segundos, tomou coragem para abrir os olhos.
— Corre, garoto. Corre! - O homem gritou autoritariamente, o que fez Pedro levantar-se e seguir o que foi lhe dito, correndo desesperadamente pela rua até chegar à casa de Amanda.
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