Poemas ou Travessuras? escrita por Bianca Fiats


Capítulo 17
Capítulo 17 - Danças dos Dragões




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Sabia que Libusee estava me evitando. Não sei quando isso aconteceu, talvez tenha sido por causa do dia no armário, talvez tenha sido o poema. Mas era como se ela me temesse. Eu não sabia o que era pior, saber que ela amava meu melhor amigo (que por acaso a tratava como irmã) ou não aguentar que ela chorasse por ele e por isso a consolar sem nunca poder passar disso.

Eu ainda me lembrava do gosto de sua pele, quando beijei todo seu rosto naquela noite em que a Sala Precisa se transformou no armário. Por pouco não a beijei de vez. Não o fiz porque iria me aproveitar de seu momento frágil. E também não queria que ela sempre que lembrasse de meu beijo, fosse no dia em que ela descobriu que não teria chance com o amor de sua vida.

Estava novamente na Sala Precisa, aguardando. Fazia alguns dias em que ela não aparecia. Eu dizia a mim mesmo que era natural. Afinal eu tinha sugerido o baile de máscaras. Teria sido melhor se eu tivesse apenas apoiado a ideia e Albus tivesse escolhido o tema. Quando entrei pensei em algo diferente, um grande salão com uma vitrola tocava músicas de baile. E eu estava aqui, sozinho.

O ambiente esfriou, e eu soube que não estava mais sozinho.

"No que posso ser útil?"

"Acha que não sei o que está aprontando?" A Dama Cinzenta parecia furiosa. "Eu conheço seu tipinho e vai corromper uma jovem tão delicada"

Dei risada. "Jovem tão delicada? Então acho que é você que não a conhece. Libusee é perfeita, no ponto certo, nem muito delicada, nem muito travessa. Eu tenho as melhores intenções para ela. Só quero que ela seja feliz. Se não com Albus, ao menos lhe darei pequenas alegrias"

A Dama circulou o salão e se não soubesse melhor acharia que estava dançando. Mas ela avaliava o que minha criatividade tinha criado. Um brilho de adoração surgiu em seu olhar, mas logo partiu.

"Sabe o que aconteceu quando um homem de Sonserina amou uma mulher de Corvinal?" Ela virou-se para me olhar. "Quer que a história se repita?"

Apertei meus punhos. Eu não iria repetir a história. Jamais ousaria tocá-la, não mais. Eu tinha prometido nunca a tocar porque sabia que seria intenso. E todas as poucas vezes que isso acontecia eu sempre me excedia. Afinal, eu não era de ferro. Mas me exceder a ponto de matá-la? Jamais.

"Conheço sua história com o Barão. Ele já me contou. E antes que implique qualquer coisa. Sei que não será a mesma, porque há muito que nos difere"

"De verdade rapazinho? Não cometera os erros do seu pai? Ou de seu avô?"

Estremeci, pois ela acertou em cheio no meu maior medo. Porém, eu tinha um ponto. E a faria entender.

"Eu amo Libusee e daria minha vida por ela. Sei que ela não me ama, mas nunca a forçaria a nada. Você fugiu pela insistência do Barão, eu jamais vou me impor ou os meus sentimentos para Libusee"

A Dama agora estava perto de mim.

"E por que isso seria?"

"Já disse, ela é perfeita. E eu não mereço a perfeição."

Isso fez com que a Dama exclamasse e se afastasse. Por instantes ela ficou apenas me encarando. Então ela assentiu com um gesto de cabeça.

"Você não cometera os enganos de seu pai. Nem os enganos do Barão. Você é único. Mas diga-me, conseguirá manter sua promessa de não colocar seus sentimentos sob ela?"

Senti meu coração falhar um pouco. Tentei lembrar de quando eu comecei a gostar dela. Tinha sido no dia da seleção. Quando ela mostrou o que eu queria ser. Acho que foi apenas admiração, mas com o tempo, virou algo mais. Eu sabia todos os seus trejeitos, suas manias (apenas agora), seus desejos, seu maior medo, sua força de vontade... E quanto mais passava, mais gostaria de saber. E ainda assim, se eu resisti esses longos quatro anos, eu poderia resistir por mais dois ou três.

"Sim, eu posso prometer"

Ela sorriu e se aproximou. Seu frio era intenso. Já havia me acostumado com alguns fantasmas por causa de Libusee, mas sabia que o que ela fazia agora era intencional.

"Ótimo. Mas fique sabendo que se você quebrar essa promessa, farei de tudo para impedir que fique com ela".

Um estrondo e o som de correntes me fez pular longe.

"E eu juro que se assim o fizer, a impedirei" o Barão sobrevoou para cima dela. "Posso não ter conseguido um final feliz, mas não permitirei que tire o desse rapaz"

Os dois fantasmas se encararam antes de sair da Sala Precisa, deixando-me sozinho com meus pensamentos. Olhei para o relógio que o salão tinha conjurado. Quando percebi que logo iria dar o horário para que os alunos se retirassem para os dormitórios fui em direção a porta. Ela não viria.

A porta se abriu e dela Libusee entrou. Toda a minha conversa com a dama veio a minha cabeça. E a ideia de ensiná-la a dançar não soou tão boa quanto eu tinha pensado. Eu teria que tocá-la.

Libusee fechou a porta e olhou para o cômodo. Viu a vitrola, o salão encerado e as velas que faziam o lugar da iluminação, deixando o salão todo dourado. O céu estava encantado com uma abóbada em tons de rosa e laranja. Ela olhou para tudo, menos para mim. E isso comprovava que ela estava me evitando.

"O Elysium está bem diferente hoje".

"Elysium?"

"Oh! É o nome que dei a essa sala."

Parei de andar em sua direção, temendo que ela recuasse.

"É um bom nome"

...

Libusee finalmente me olhou depois de um tempo. Seus olhos passaram para o relógio atrás de mim. Se não nos apressássemos, poderíamos receber penalidades (isso se nos pegassem, o que era improvável, já que podíamos sempre contar com os quadros e os fantasmas).

"Por que disse aquela sugestão para o baile?"Ela finalmente perguntou.

Como responder sem assustá-la?

"Não posso?"

"Não é isso... É que, bem, depois daquela conversa.... Só estranhei que..."

"Eu acho que posso me candidatar a Padrinho de Bruxas. Já dei o baile para Rose. Porque não posso fazer o mesmo por você? Toda garota que conheço quer ir ao menos a um baile."

Libusee pareceu avaliar minhas palavras. Até que a máscara de desconfiança caiu de seu rosto. Ela abriu um sorriso e foi só então que percebi que estava segurando a minha respiração.

"Mas eu não sei dançar. Do que adianta ir se não participarei do baile?"

"Permita-me a honra de ensiná-la? Temos tempo até o dia do baile"

Ela pareceu refletir por um tempo.

"Sim, mas... Acho que hoje não dará." Ela apontou para o relógio. "Já estamos fora do horário permitido"

Eu tinha andado até estar a um palmo de distância de Libusee. Não sei como fui parar lá. Era como uma atração natural. Eu concordei com um aceno as suas palavras. E ela não tirava seus olhos dos meus. Prata no ouro.

"Mas seria um desperdício não aproveitar uma sala tão adorável como essa que você criou"

Ela continuou, tão hipnotizante que achei que estava em um lago sendo atraído pelo canto de uma sereia. Concordei novamente com um aceno de cabeça. Agora a alguns centímetros de distância.

"Nós sempre podemos voltar um pouco mais tarde."

Ela concluiu quando eu tinha passado minhas mãos em sua cintura. Eu a ergui e ela arfou. Não tinha encontrado minha voz ainda, por isso concordei de novo. Coloquei seus pés sobre os meus e ela se aproximou de mim de uma vez. Apoiou seu rosto em meu peito e comecei a me mexer. Não foi uma valsa, nem poderia ser considerada uma dança. Não estávamos sequer no ritmo da música. Apenas ficamos balançando de um lado a outro.

♦♦♦

"Eu adorei dançar com você"

As palavras dela estavam na minha cabeça o tempo inteiro. Estava sentado sobre minha cama olhando para o teto e lembrando da noite anterior.

"Onde diabos você se meteu ontem à noite? E por que não desceu para o café da manhã?"

Albus parecia irritado. Olhei para ele com minha melhor cara de tédio e encolhi os ombros. Não interessava para ele. Não quando ele já estava correndo atrás de Rose.

"Fiquei preocupado, ainda mais depois do nosso acerto de contas... Achei que ainda estava zangado e... Você acabou de suspirar?"

Dei minhas costas para ele.

"Não."

Eu quase podia ouvir o sorriso se formando no rosto de Albus. Ele se jogou contra mim o que me fez cair da cama.

"Mentiroso. Onde esteve?"

Sai do chão com a maior calma do mundo. Então num impulso empurrei Albus da minha cama, dessa vez fazendo com que ele caísse no chão.

"Você tem sua própria cama. E para sua informação, não interessa onde."

"Mas me interessa com quem. Estava com Lib? Devo me preocupar com a inocência dela?"

Revirei meus olhos.

"Ela não é sua filha. E não me interrompa, não é sua irmã também. Mas sim, estava com ela."

Voltei a me ajeitar na cama. Antes que Albus perguntasse, me vi contando. Ainda achava que foi um sonho, então precisava colocar em palavras o que aconteceu.

“Nós dançamos a noite toda. Começamos bem no horário de recolhimento. Mas ela quer ir no dançar no baile. Só ia ensiná-la os passos bases, mas quando vi estava apenas balançando com ela. Era para sairmos um pouco mais tarde, mas sempre tinha a próxima música, e a próxima, e a próxima… Ela começou a ficar cansada, e fiquei preocupado em deixá-la voltar para sua própria casa. Disse que ela deveria ficar na … Lá. Eu iria voltar para acordá-la de manhã. Mas…”

Eu parei e Albus parecia ansioso pela resposta. Não era nada muito drástico do que ele poderia estar pensando. Para mim foi tudo. A confiança explicita naquele gesto me enlaçou e perdurava até agora.

“Ela me pediu para ficar. Disse que não queria ficar sozinha, então eu fiquei. Deitei-a nas almofadas e, ela me puxou e me abraçou. Eu não consegui dormir, passei a noite toda olhando-a dormir. E quando ela acordou, era como um raio de sol...Lindíssima”.

“Invejo-o” Albus finalmente falou quando percebeu que eu não iria continuar.

“O que?” Ergui-me da cama

“Calma, não quis dizer que invejo-o por estar com ela… Mas daria tudo para poder ter Rose dormindo em meus braços.” Albus pareceu pensar um pouco “Ela deve gostar muito de você, para deixar que dormisse ao seu lado”.

Balancei a cabeça. Eu sabia porque ela confiou em mim, não era ingênuo. Eu sabia que ela apenas permitiu por que ela achava que eu era como um irmão. Albus me puxou quando viu que eu me fechei para uma conversa.

“Vem, vamos comer algo na cozinha”

♦♦♦

Minhas noites se tornaram o momento que eu mais ansiava no dia. Ao término das aulas eu ia a para o banheiro da Murta. Quando estava a estação de trem me despedindo pela primeira vez dos meus pais, meu pai me confidenciou ao ouvido 'Visite-a todos os dias se possível. Nos dias em que mais precisar ela irá ajudar'.

No começo eu fazia porque meu pai pediu. Aos poucos, passei a ansiar pelas tardes de conversa. Tirando quando ela estava chorando, era uma boa confidente. E adorava contar histórias da época em que meu pai estava no colégio. Depois dessas tardes de conversa eu subia para o sétimo andar. Sempre cortando caminho. Sempre protegendo meu maior segredo. Minhas tardes ou noites com ela. Era a única coisa que teria de Libusee e temia que chegasse o último ano e tudo iria acabar.

Agora mesmo quando ela ia primeiro, sempre havia música e as vezes uma salinha a parte, onde vestidos de festa surgiam. De várias formas, cores e épocas. Ela dizia que os usava nos treinos porque não ali ela não precisaria usar máscaras. Seria ela mesma.

Então, como todo bom cavalheiro, a acompanhava. Ela passou a escolher meu guarda roupa. Nunca mais adormecemos na sala, mas não importava. A lembrança daquela noite (e os vários desenhos que fiz) permaneceriam sempre comigo. Ouso dizer que tenho um caderno apenas com desenhos dela.

Libusee contou aos fantasmas sobre as aulas, e eles como bons adoradores de bailes, passaram a aparecer nas aulas também. Teria ficado chateado se não fosse ter visto o sorriso dela, com a presença de todos. Afinal, parecia um verdadeiro baile com todos eles rodopiando ao nosso redor.

Hoje, depois de fugir de balões mágicos que explodiam em feijõezinhos mágicos (Albus estava ficando cada dia mais pobre), ao chegar na Sala Precisa quase deu um pulo para trás. Quase. O salão que estava representado era o mesmo do salão principal. Ele estava todo arrumado como um baile oficial. Os fantasmas estavam formando uma fileira que levavam diretamente para Libusee. Ela estava parada no centro do salão, com um vestido que a fazia parecer um pássaro branco. As barras pareciam penas e quando chegava na cintura uma faixa azul e cobre delineava seu corpo. Na parte de cima usava gola rainha e os cabelos presos com vários brilhantes. No rosto uma máscara branca imitando o bico de um pássaro.

Um fantasma me passou uma máscara negra mais masculina, mas que lembrava um pássaro também. Sem perguntar porque ou como, coloquei-a e avancei até Libusee. Ela sorriu quando me aproximei e a puxei para dançar. Estávamos na quinta dança quando não me aguentei mais de curiosidade.

"O salão principal?"

"Você me disse uma vez que fez um baile em especial só para Rose. Então você realmente é um Padrinho de Bruxas, por que pra mim você realizou vários e vários... queria dançar com você com o vestido que usarei no baile. Para que saiba quem sou eu"

Eu não ia no baile, mas agora... Quem sabe?

"Eu quero que você seja feliz Campbell. Se para isso ser preciso montar um baile toda noite eu farei. Até uma estrela traria se isso a fizesse sorrir"

Ela sorriu e pareceu pensar um pouco.

“Qualquer coisa?”

Afirmei com um gesto de cabeça antes de rodopiá-la. Ela rodopiou rindo e quando voltou parecia sem fôlego.

“Posso te contar um segredo?” Libusee se aproximou e ficou a centímetros do meu rosto.

De rabo de olho vi a Dama Cinzenta aproximar-se. Ela não faria isso na frente de todos, faria?

“Sempre. Seus segredos estarão bem guardados comigo”.

“Eu sempre quis voar em um dragão”.

Por que ela não poderia pedir algo mais fácil como ter um cavalo alado de estimação? Então me lembrei de algo que precisaria confirmar com Albus.

“E se eu dissesse que posso talvez conseguir isso, mas…” Lembrei do dia dos escorpiões “Você não tem medo de voar?”

“S-s-im” Ela corou, então começou a morder seus lábios. Com a mascara mostrando apenas essa região, ficou muito mais atraente do que o normal. “Mas é que o dragão é uma criatura tão forte e parece que o ar é merreca para ele. Não sei se conseguiria subir nas costas de um também, mas… quem sabe”

Eu acenei um acordo, quando a ideia veio a minha mente. Era ousada e poderia me trazer muitos problemas. Talvez para ela também, mas ao menos, ela poderia não ter que usar uma peruca de trouxa. Parei de dançar e isso a deixou interrogativa.

“Se eu conseguir com que voe em um dragão, você iria ao baile comigo?”


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