Ilha de Esme por Edward Cullen da Lua de Mel até a Gravidez escrita por csb


Capítulo 6
CAPÍTULO 06 - PARAÍSO




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6. PARAÍSO

 

Não consegui desgrudar os olhos do teto. Talvez porque as cores vibrantes que eu ainda enxergava misturadas ao escuro — fruto de meu delírio continuado de formas e desenhos — fosse algo muito próximo de um sonho. E sonhar, mesmo ao meu jeito, era extremamente bom.

Embora não fitasse Bella, eu podia senti-la em mim, seus braços procurando um abrigo protetor como borboleta no casulo. Ela dormia atravessada em meu peito nu, e pareceria completamente estática aos olhos limitados de um humano qualquer. Os únicos sons e movimentos que me vinham dela eram conseqüentes das contrações involuntárias de seu organismo: a respiração tranqüila e ininterrupta, o coração satisfeito, sem a mínima batida de angústia, o sangue que escorria lentamente nas veias, permeando os músculos. Perguntei-me se ela estava tendo sonhos bons ou se os pesadelos eram suficientemente fortes para espantar a alegria de sua alma. Pouco provável...

Eu nada sabia sobre as marcações do relógio. Fiz algumas poucas tentativas, avaliando o ritmo do barulho das ondas, o farfalhar longínquo dos pássaros e a direção da brisa forte que batia nas portas entreabertas da varanda. Até a intensidade do escuro, ainda que ofuscada pelas cores delirantes, eu tentei considerar. Mas não consegui encontrar absolutamente nada, nenhuma informação concreta que me ligasse de alguma maneira ao tempo — e tampouco me importava essa frustração. O amanhecer poderia estar próximo, quem sabe... Ou talvez ainda tivéssemos umas boas horas da madrugada total.

Eu não costumava me sentir seguro sem me ajustar aos ponteiros do tempo. De alguma forma, porém, a cegueira temporal não me incomodava agora. Nem um pouco. A verdade é que eu poderia permanecer assim para sempre... Esperando pela hora em que a escuridão — ou a alucinação — me engolisse de vez.

Não tive nem mesmo vontade de me levantar para avaliar os estragos pelo quarto. Até minha desmedida curiosidade estava amortecida pelos prazeres que eu ainda absorvia. Certamente, eu teria de arranjar um canto qualquer para colocar os pedaços de madeira que eu havia arrancado da cabeceira da cama. E eu também não saberia dizer agora se os nacos de tronco eram consideráveis. Talvez nem restasse uma migalha para contar história...

Continuei absorto às inúmeras e diferentes sensações que iam deixando rastros moderados de espasmos ao percorrerem meu corpo com lentidão. Seria similar ao prazer dos humanos? Tão forte e prolongado? Eu jamais teria essa confirmação e também não me incomodei: o encanto, para mim, já era inexplicável; os melhores minutos de minha longa existência.

Era curioso pensar que, em comparação à primeira vez, os efeitos tinham se multiplicado. Fiquei inteiramente satisfeito com essa verificação. E, principalmente, eu estava pasmo e extremamente feliz comigo mesmo por ter encontrado um jeito seguro de canalizar os excessos — o que significava que eu não precisaria mais negar minhas vontades e desejos com tanta obstinação. Um excelente e maravilhoso avanço.

Eu admirava um tipo interessante de ilusão que havia se formado no teto — semelhante a uma flor vermelha — quando meu telefone tocou; o barulho intermitente vindo da cozinha. Por sorte, mesmo em contraste com o silêncio profundo, o som não foi o bastante para abalar o pesado sono de Bella. Ainda assim, desamarrei-me rapidamente de seus braços e corri o mais depressa possível, costurando o breu escada abaixo.

No instante em que peguei o celular e notei que a chamada não possuía identificação, fiquei levemente irritado. Só podia ser um engano... Quem nesse universo teria me arrancado de minha cúpula particular de frenesi? Por um segundo, desejei nem saber, temendo que eu pudesse derramar meu veneno pelo próprio telefone.

Mas então minha venerável consciência, amiga e inimiga de todas as horas, não me deixou outra opção senão atender:

— Alô... 

Primeiro houve o silêncio, depois a resposta veio numa espécie de suspiro de decepção. Apenas isso.

— Alô? — insisti, aborrecido. Outra vez o silêncio. Mas que chateação! — Se não quer se identificar, serei obrigado a desligar o telefone. Tenha uma boa n...

Espere!

Então reconheci a voz.

Eu estava preso em uma névoa tal de loucura que meu cérebro imediatamente enviou comandos precisos ao olfato. Praticamente, todos os outros odores foram abafados por um cheiro forte de cachorro, como se imbecil estivesse ali, bem na minha frente.

— Jacob... — sussurrei.

Do outro lado da linha, veio o som gutural, rouco, que pouco combinava com a voz de um garoto:

— Lamento que Bella não tenha atendido ao telefone, assim ela teria me poupado de ouvir sua voz melodiosa. Que nojo! Argh!

Limitei-me a um rosnado baixo quando o ouvi simular um cuspe. 

— Preciso dizer que quero falar com Bella? — continuou ele. — E, por favor, se puder fazer isso o mais silenciosamente possível, ficarei grato. Já ingeri doses exageradas de sua voz por hoje... Uma palavra a mais e poderei ter uma crise de overdose de açúcar!

Mas que coisa “romântica”! Ele só podia mesmo ter passado por uma boa lavagem cerebral ou algo do tipo... Quem desperdiçaria um espaço valioso da cabeça guardando tantas palavras de “gentileza”? Era até “invejável”...

Derramando seu monte de bobagem, ele continuou:

— Que foi? Ela não pode atender? Está agonizando em cima de uma cama, curtindo seu processo de transformação? Quantos dias ainda restam? Dois, três? Ou está se recuperando dos traumas que sua ideiazinha irresponsável provocou em seu corpo? Ela quebrou o braço? A coluna? Está ao menos conseguindo respirar? Hein, seu idiota! Se alguma coisa acontecer a Bella eu mato você!

Precisei controlar meus nervos para não esmagar o telefone com apenas um simples movimento.

Permaneci em silêncio, os olhos fechados, observando até que ponto de idiotice sua mente — menor que um grão de arroz — era capaz de chegar.

— Chame logo a Bella, seu monstro sanguessuga! — gritou ele.

Pensei demoradamente e então pigarreei, falando na maior calma que consegui juntar:

— Você sabe que existe uma diferençazinha de fuso-horário, não é? Ou sua professora de geografia não lhe ensinou? Sabe, pensando bem, acho que esse é um assunto que só se aprende na oitava série. Em que série você está?

Ouvi seus dentes trincarem. Fiquei satisfeito. 

— Ah, seu cara-pálida fedorento! Guarde seus comentários atrevidos para quando estivermos frente a frente, porque nem mesmo seus milhões, ou sei lá quantos anos você tem, serão capazes de fazê-lo vencer a disputa! Não posso nem imaginar em que lugar do mundo vocês estão...

— É um argumento relevante. Ah, e quando estivermos cara a cara, terei um imenso prazer de repetir tudo o que acabei de dizer, palavra por palavra. — Sorri intimamente. — Bom, vou me privar de maiores explicações, mas aqui ainda é madrugada. Ou pelo menos está bem escuro... Sabe, na verdade, estou sem noção de tempo. A felicidade e o prazer em excesso fazem cada coisa com a gente! Você devia experimentar... É como estar no paraíso...

Ouvi um soco forte, talvez o imbecil tivesse arrebentado o tampo da mesa de Billy — o outro animal. Depois, houve o silêncio... Quem sabe sua demasiada irritação o tivesse levado à condição de lobo... Nesse caso, ele estaria impossibilitado de falar. Confesso que eu não acharia ruim.

Então bufou, soltando as palavras entre os dentes:

— Chame a Bella! A-go-ra!

— Você ainda não entendeu? Bella está dormindo neste exato momento e não vou acordá-la por um motivo tão idiota como falar com você. Então, Jacob, se você baixar a guarda, se tiver o mínimo de educação e disser ao menos um “por favor”, direi a Bella que ligou assim que ela acordar. Ela deve saber seu número de cor...

Ele rosnou e disse em seguida:

— Ela não vai me encontrar. Não estou em casa. Ligarei outra hora.

Não tive tempo de rebater a falta de educação, pois ele já havia desligado o telefone antes que eu pudesse articular uma agressão inteligente.

Larguei o celular sobre a bancada da cozinha com tanta raiva que ele quicou duas vezes antes de se estabilizar — não sei como não quebrou de vez.

Argh!

O que esse infeliz podia querer com uma esposa em lua de mel? Mas que cara de pau! Fiquei estarrecido de tanto ódio. Meu reflexo no vidro da janela era apavorante, até para mim: as pupilas arregaladas, a respiração entrecortada, aflita, as narinas abertas, os dentes afiados à mostra, os braços rentes ao corpo, as mãos fechadas em um aperto inumano...

Que sujeitinho irritante, um completo babaca! E eu ainda o deixara entrar em meu casamento! Pior: eu havia insistido para que ele fosse. Eu só podia mesmo ser um poço transbordado de estupidez ou um completo cego dado às loucuras absurdas da paixão. Por motivos óbvios, essa segunda opção era a que mais me convencia.

Corri pelas escadas feito um louco, deixando uma bruma de aborrecimento por onde passava. Mas quando cheguei ao quarto e ouvi o coração suave de Bella — meu anjo particular de tranqüilidade —, toda a raiva se esvaiu como fumaça. Cada pedaço de meu corpo em que o ódio se instalara, cicatrizou-se numa fração de segundo — na verdade, era como se a ferida nunca tivesse existido.

Fiquei parado feito um bobo na soleira da porta, completamente embriagado pelo encanto ingênuo de minha amada — os sons que ela ninava eram como sinos adocicados em meus ouvidos. Ninguém, nem mesmo Jacob — com sua carcaça de petulância fedorenta—, teria o poder de arrancar o sorriso de meu rosto agora.

Novamente, a noção de horário ficou perdida num imenso buraco que se abriu em meu cérebro, em algum lugar paralelo e distante. Não me importei... Quem se importaria?

Senti-me inteiramente livre das correntes do tempo — foi praticamente uma inversão de lugares, uma mudança nas posições: eu é quem havia acabado de amarrar o tempo com firmes nós e o colocado dentro de uma cúpula de vidro, feita só para mim. A impressão que eu tinha era de que o universo me pertencia — eu, dono de tudo, ditando as regras como bem entendesse.

O que eu mudaria?

Bom, eu agigantaria as horas, alargaria os segundos e inverteria a rotação da Terra a cada fim de tarde, só para que a claridade nunca deixasse de exaltar as belezas de Bella — uma vez que estivéssemos na ilha, evidentemente, livre dos poderes reveladores dos raios de sol, cintilando cada mínimo pedaço de minha pele.

Eu poderia voltar rapidamente ao passado, simplesmente para corrigir o maior erro de toda a minha vida — pelo qual eu não me perdoaria jamais: ter abandonado Bella depois do incidente no dia de seu aniversário. E, principalmente, eu adiaria a transformação de minha amada. Quem sabe por anos... Bastaria por enquanto.

Meus devaneios eram tão inconcebíveis que não me contive e ri de mim mesmo — a ilha de Esme era o próprio paraíso e cada célula do meu corpo lutava insistentemente para que, dali, eu não fosse embora nunca mais. Poderíamos ficar mais uns meses, ou um ano talvez.

Eu ainda estava rígido, congelado no mesmo lugar, os pés descalços cravados no chão, os olhos fixos na direção dos sinos, quando tomei consciência do ambiente outra vez.

A brisa que entrava pela porta da varanda soprava mais intensa e fresca, balançando as cortinas e arrepiando levemente o corpo de Bella — eu ouvia os tremores de sua pele. Interessante como suas percepções de frio eram tão relativas — perto de mim ou colada em meu corpo gélido, Bella chegava a queimar.

Aproximei-me da varanda e encostei um pouco a porta; meus olhos fitando o exterior. No horizonte, raios de sol começavam a surgir, brilhando tímidos no infinito, encontrando a linha distante do mar negro. Dentro do quarto, os objetos, antes invisíveis, começavam a ganhar uma coloração pálida.

Agora, além de ouvir os sinos, eu também enxergava Bella, perfeitamente, dormindo como uma deusa esquecida da beleza, o corpo nu coberto apenas por um fino lençol. Seu cheiro inebriante se espalhava pelo quarto, espiralando no ar, acertando em cheio a direção de meus sentidos.

Meu corpo oscilou agitado.

Fui tomado por uma vontade insana de acordá-la, pegá-la nos braços e sair em disparada pela praia — para qualquer lugar onde só haveria a natureza e nós dois, no meio dela, completamente dispostos à entrega. Quem sabe nas pedras, ao nascer do sol... — sem as privações de nossa última e frustrada tentativa. Gemi só de imaginar...

Balancei a cabeça e tentei me focar nas prioridades mais urgentes — eu teria bastante tempo para saciar minhas fantasias pessoais agora que “sexo” já não era um assunto problemático em nossas vidas.

De esguelha, fitei o relógio sobre a mesinha, ao lado da cama. Ainda me restavam algumas horas até que Bella resolvesse acordar.  Do jeito que dormia, densamente, eu não duvidava que ela pudesse cruzar o dia todo em estado de sonolência. Nesse caso, eu não a atrapalharia.

Eu já sabia que o corpo de Bella estava perfeito — por lembrar exatamente como tudo se desenrolara. Mesmo assim, aproximei-me dela para verificar sua pele minuciosamente. As únicas manchas leves, quase imperceptíveis à meia luz, eram as mesmas da semana passada. Excelente.

Aproveitei para avaliar os estragos pelo quarto. No chão, perto do guarda-roupa, abaixei para analisar a camisola de rendas pretas, ou melhor, os pedaços de pano agora sem utilidade. Isso era lamentável... Não consigo descrever sequer um terço dos efeitos que aqueles tecidos rendados provocavam em mim! Deixei os retalhos como estavam — depois de sorver demoradamente o perfume adocicado, ainda misturado às tramas de fibras. Bella certamente se divertiria ao ver o resultado de sua premeditada sedução.

Em seguida, recolhi os nacos de madeira e os deixei encostados na quina entre as paredes. Fiquei até surpreso ao notar que oitenta por cento da cama estava em perfeito estado. Os quatro pés estavam ali, intactos, o estrado em condições normais de reaproveitamento —bom, eu ainda teria a chance de destruí-lo mais tarde... Eu não me importaria de comprar mais duzentas camas para Esme se preciso fosse.

Comemorei intimamente meu inegável sucesso.

Com cuidado, levantei os pulsos de Bella, alocando-me novamente no espaço mais aconchegante do mundo. Ela pareceu nem perceber. Continuou imóvel e pesada, como se cada dedo de sua mão carregasse vinte quilos, embora não conseguissem afundar sequer um milímetro de meu peito de mármore.

Coloquei meus braços atrás de minha cabeça e continuei fitando o teto na intenção de que meus delírios ressurgissem. Abri e fechei as pálpebras. Várias vezes. Estreitei os olhos, levantei as sobrancelhas e sacudi a cabeça.

Mas nada aconteceu.

Não culpei Jacob. Porque, de fato, as ilusões já tinham se estendido além do esperado. Era óbvio que tudo aquilo se acabaria em breve — eu não alimentara esperanças de ver borboletas douradas, cores e flores se desenhando na parede acinzentada pela vida inteira, embora desejasse que o motivo de tanto delírio, o prazer inenarrável do amor, se alargasse por toda a eternidade. Quem me dera...

Esperei então.

O sol aparecera por completo, as ondas batiam violentas na encosta, o pedaço de céu desvelado na varanda era de um azul esmaltado, cintilante de tanta beleza.

Esperei mais um pouco e quando Bella se mexeu suavemente —tentando inutilmente ludibriar minha capacidade primorosa de percepção — notei que ela acordara enfim.

Meu dia finalmente começava...

Eu tinha absoluta certeza de que Bella evitava abrir os olhos, temendo meus desagrados, minhas desculpas ou o que quer que fosse... Preferi ficar calado e deixar que as coisas se desenrolassem sozinhas. Completamente estático, pálido e frio como gelo, eu fazia minha cenazinha de suspense com louvor. Valia à pena...

— Estou muito encrencada? — Sua voz era um misto de satisfação e medo.

— Muito — menti, virando um pouco a cabeça, meus dentes mordendo levemente o canto do lábio inferior.

Ela suspirou profundamente e continuou:

— Eu lamento muito... Não queria... Bom, não sei exatamente o que aconteceu ontem à noite. — E sacudiu a cabeça.

Como Bella mentia mal! Quer dizer que ela lamentava? Não queria? E o mais absurdo de tudo: não sabia exatamente o que havia acontecido? Então era fruto da inocência sua aparição espetacular dentro de uma micro-camisola de rendas na noite passada... Eu tinha cara de bobo ou o quê?

Não me contive e sussurrei em tom de deboche:

— Você não queria... Essa é boa...

Ela apenas levantou as sobrancelhas, resignada, e sorriu.

—Tudo bem — continuei. — Você não me contou de que se tratava o sonho?

— Acho que não, mas de certa maneira eu mostrei a você de que se tratava... — disse ela, visivelmente nervosa.

Bella ficava uma graça quando tentava se justificar; preocupada com minha opinião... Eu poderia estender o momento de tensão propositalmente só para apreciar sua timidez e embaraço mais um pouco.

— Ah! — eu disse com os olhos arregalados. — Interessante...

Interessante era pouco, mas por enquanto bastava. Lutei comigo mesmo para não revelar todos os meus sentimentos de uma só vez —perderia o encanto.

— Foi um sonho bom — murmurou ela. — Eu... eu estou perdoada? — E apertou a boca, fazendo um biquinho apaixonante.

Ai que lindinha! Bella era mesmo incrível e eu a amava tanto que até doía...

— Estou pensando nisso — insisti na farsa, louco para que ela ficasse toda dengosa e irresistível outra vez.

Ela se sentou rapidamente, cuidando em ajeitar os lençóis que tapavam seu corpo — minhas vistas saltaram da face, mas não conseguiram enxergar quase nada.

De repente, porém, eu a vi oscilar. Ela tremeu e caiu molemente no travesseiro; empalidecendo em meia fração de segundo. Fiquei nervoso e a envolvi em um abraço. Seu corpo vibrou outra vez.

— O que aconteceu, meu amor?

— Caramba! Fiquei tonta...

— Você dormiu por muito tempo... Suspeito que por umas doze horas. — Eu não sabia dizer ao certo. Havia uma janela aberta em minha cabeça por onde parte de minha contagem temporal se perdera...

— Doze?

Tentando ser discreta para não me desagradar, Bella avaliava o próprio corpo enquanto falava. Espreguiçou-se, contraindo e distendendo os músculos da perna, olhou seu reflexo no espelho, disfarçadamente.

Quando percebeu que tudo estava inteiro — e no devido lugar—, não ocultou o sorriso de satisfação.

— O inventário está completo? — perguntei com ironia.

Ela assentiu, tímida, fingindo não entender corretamente a pergunta.

— Bom, todos os travesseiros parecem ter sobrevivido.

— Infelizmente não posso dizer o mesmo da sua, hã, camisola. — Fiz um gesto com a cabeça, apontando o pé da cama, onde vários pedaços de renda preta se misturavam ao lençol.

Com a expressão de surpresa, ela mirou o chão, avaliando os cortes de tecido espalhados por todos os lugares.

— Isso é péssimo — disse ela. — Eu gostava dessa.

— Eu também — Sorri. Seu coração vacilou no mesmo instante.

— Mais alguma baixa?

Apontei a cabeceira da cama.

Ela virou o pescoço e, chocada, olhou os nacos de madeira encostados na quina.

— Hmmm. — Franziu a testa. — Acho que eu teria ouvido isso...

— Você parece extraordinariamente alienada quando sua atenção está em outra parte.

— Fiquei meio absorta.

Suas bochechas se avermelharam. Não resisti e toquei seu rosto com afeto, encaixando minhas mãos em volta de sua cabeça, os dedos tocando a orelha.

— Vou sentir muita falta disso.

Ela me encarou, os olhos indecifráveis, e então notei a pergunta escapulir de sua boca, quase sem querer:

— Como está se sentindo?

Haveria uma maneira de explicar em palavras a maravilhosa noite de ontem? Apenas ri.

— Que foi? — perguntou ela.

— Você parece tão culpada. Como se tivesse cometido um crime.

— Eu me sinto culpada — murmurou.

— Você seduziu seu marido louco para ser seduzido... Isso não é um pecado capital — disse em tom de brincadeira.

Sua pele sob meus dedos ficou ainda mais ardente. Queimava, mas era bom.

— A palavra seduziu implica certo nível de premeditação — disse ela.

E não havia sido premeditado?

— Talvez essa fosse a palavra errada. — Preferi deixar para lá.

— Não está com raiva?

— Não estou com raiva — respondi.

— E por que não?

Eu tinha um milhão de respostas. Todas insuficientes para externar o turbilhão de prazeres que eu sorvia por dentro, sentimentos claros e conhecidos, outros novos e inalcançáveis.

— Bom... — pigarreei, minhas mãos escorregaram por seu braço. — Eu não a machuquei, para começar. Foi mais fácil desta vez me controlar, canalizar os excessos. — Mirei a cabeceira da cama. —Talvez porque eu tivesse uma idéia melhor do que esperar. 

Ela riu sem esconder a felicidade.

— Eu disse que era uma questão de prática. Então está tudo certo... Você não me machucou. E destruiu... bom, o que são alguns pedaços de madeira, não é mesmo? Apenas supérfluos...

— E uma camisola! Nada supérflua por sinal — acrescentei.

— Sim. Cabeceira e camisola. Duas perdas? Sucesso total então...

Fiquei em silêncio. Seu semblante desfaleceu:

— O que foi? Você destruiu alguma coisa considerável e está escondendo a informação?

Pensei demoradamente sobre o telefonema de Jacob enquanto ela esperava a resposta sem tirar os olhos de mim.

— Hmmm — disse, enrolando.

— Era importante demais? Algo da coleção de Esme. Edward, me desculpe. Você pode dizer a ela que foi tudo cul...

— Shiii... — Toquei seus lábios com a ponta dos dedos. Ela perdeu a respiração. — Nada muito relevante... É só que...

O que vou dizer a ela? Contar ou não contar?, perguntei a mim mesmo. Embora tivesse um século de vivência, eu ainda não possuía diploma em situações embaraçosas de mentira ou omissão.

Ela levantou a sobrancelha, depois desamarrou os dedos dos meus.

— É só que... — insistiu. — O que aconteceu? Fale logo, estou ficando nervosa.

Preferi manter o assunto “Jacob” em segredo por um tempo.

— Bom, ainda não houve uma baixa terrível...

— Não? Graças a Deus.

— Mas poderá haver... Você sabe como Esme é detalhista. Ela não vai gostar nada da idéia de ter uma cama meio quebrada.

— Essa cama era especial? — perguntou, sem compreender.

Fiquei quieto por um tempo até que uma linha perspicaz de sorriso se desenhou em seus lábios. Enfim, Bella entendera:

— Você quer dizer...

— Quero dizer que, neste caso, seria melhor se concluíssemos o serviço... Terei de comprar outra cama de qualquer maneira.

Inclinei meu corpo para beijá-la. Ela respondeu, colando seu rosto no meu. Por cima do lençol, minhas mãos fizeram o caminho de suas costelas até o quadril, passando pela cintura. Seus lábios tocaram minha orelha:

— Edward? — sussurrou em meus ouvidos.

— Diga. 

— É que eu preciso saber... como... foi para você? Sério...

Balancei a cabeça, desacreditado, e comecei a rir.

— Por que está rindo? — perguntou ela, afastando o corpo e cruzando os braços, aborrecida.

— Bella, você subestima demais sua capacidade de enlouquecer um homem. Por exemplo agora: está me deixando alucinado. Não tem medo de ficar sozinha, presa entre quatro paredes com um vampiro insano e descontrolado?

Ela bufou.

— Então?

— Eu... nem sei expressar em palavras. Mas posso dizer que acho pouco provável que exista paraíso mais perfeito...

Nossos olhos se encontraram por um longo tempo, hipnotizados, como se fossem as duas extremidades distintas de uma corrente elétrica.

Milhões de idéias atravessaram minha mente. Fantasias, delírios. Meu corpo se alterou, respondendo depressa aos inúmeros e diferentes pensamentos.

Quando a conexão do olhar se quebrou, envolvi a cintura de Bella com apenas um braço e a arrastei para mim. Quis beijá-la, possuí-la novamente, sem medos ou pudores. Mas fui traído por uma das necessidades humanas que eu tanto venerava: seu estômago roncou.

Rimos juntos da situação. Ambos decepcionados.

— Hora do café da manhã da humana — sussurrei.

— Por favor — disse ela, pulando da cama, enrolada ao lençol. Eu a vi se mexer rápido demais. Suas pernas cambalearam e antes que ela tropeçasse na beirada da cômoda, eu a peguei no colo.

— Está tudo bem?

— Se eu não tiver senso de equilíbrio melhor em minha próxima vida, vou exigir reembolso.

— Estou preocupado com você.

— Não se preocupe... Eu gastei muita energia ontem — ela riu para mim —, depois dormi como um bicho preguiça, acordei morrendo de fome e ainda me levantei depressa demais. Acho que isso explica tudo, não?

— É, acho que sim. De qualquer maneira, faço questão de carregá-la.

— Assim?

— Assim como?

— Edward, eu... eu estou nua por debaixo deste lençol.

— E isso é ruim?

— Bom, para mim é... Tenho vergonha.

Balancei a cabeça.

— É uma pena, mas não vou insistir.

Suas bochechas se avermelharam.

— Gasto menos de um minuto, prometo... — disse ela, fechando a porta do banheiro.

Com Bella nos braços, desci as escadas em direção à cozinha. Não corri, para que ela não se sentisse enjoada outra vez. Deixei-a em frente à bancada — seu corpo deslizou pelo meu até seus pés tocarem o chão.

— Eu amo você — murmurou.

Apenas sorri enquanto ela ajeitava os materiais para fritar alguns ovos.

De esguelha, mirei o telefone e logo me senti excessivamente culpado. Princípios inabaláveis e eu: outro eterno casamento. Por vezes, eu desejava ser um pouco menos criterioso, temendo que minha cabeça pudesse explodir de repente de tanto matutar!

Mas como eu não mantinha qualquer esperança de fugir de mim mesmo, comecei a refletir sobre as alternativas em silêncio.

Se eu contasse a Bella sobre o telefonema, ela ficaria preocupada com o que quer que pudesse ter acontecido em Forks; e de qualquer maneira, ela teria de esperar até que o infeliz resolvesse ligar outra vez. Nesse caso, seria prudente que eu permanecesse em silêncio — e eu ainda teria uma boa desculpa quando o fato viesse à tona, estando completamente desobrigado a revelar a verdadeira motivação: limar qualquer menção de Jacob em minha lua de mel. Talvez ele nem voltasse a ligar. Ótimo.

Por outro lado, eu detestava esconder as coisas de Bella, independente das razões que eu tivesse. Isso incomodava tanto minha venerável consciência que chegava a pesar o cérebro...

— Edward?

Meus pensamentos foram afugentados instantaneamente.

— Estou aqui, amor.

— Mas parece estar viajando... Algum problema?

— Nenhum. Sabe, não posso negar que o cheiro de comida me desagrada, mas ao vê-la preparar tudo com tanto gosto, fico me perguntando como é para você. — Aproximei-me do fogão, abraçando-a por trás.

Seu coração vacilou; os braços amolecendo sob os ombros. Em menos de meio segundo, Bella perdeu completamente a noção dos sentidos e inclinou o corpo perigosamente para frente.

— Ops! — Evitei que sua mão tocasse a frigideira quente. —Cuidado...

Ela bufou, levando o braço à testa.

— Será que me acostumarei com isso quando a transformação ocorrer? Que deixarei de ficar tonta nas vezes em que me tocar?

— Sinceramente, espero que não... — Encostei os lábios em sua orelha, sem largar a frigideira.

Sua respiração parou por alguns segundos e eu me afastei.

— Vou deixá-la terminar isso aí em paz. Tenho certeza de que não aprecia alimentos queimados.

Ela assentiu com a cabeça, mostrando um largo sorriso no rosto e virou os ovos no prato no mesmo instante — a parte de cima da omelete estava visivelmente crua.

— Ei, desde quando você come ovos fritos de um só lado? —perguntei, sentando-me à mesa.

— Desde agora.

— Eu estava brincando: a omelete estava longe de queimar.

— Eu sei, mas estou com muita fome.

— Sabe quantos ovos você comeu na última semana? — Apontei a lixeira debaixo da pia; estava lotada de embalagens vazias.

— Que estranho — disse ela antes de engolir um pedaço generoso. — Este lugar está bagunçando meu apetite. Provavelmente vamos embora logo para chegar a Dartmouth a tempo, não é? Acho que precisamos encontrar um lugar para morar e outras coisas também.

Bufei. Como Bella podia ser tão teimosa?

— Pode desistir dessa história falsa de faculdade... Você já conseguiu o que queria e não fizemos um acordo, então não existem pendências.

— Eu não estava fingindo, Edward. Não passo o meu tempo livre tramando, como algumas pessoas fazem.

— Jura que não? Não tramou nada durante todos esses dias? Nem um pouquinho mínimo assim? — Juntei o polegar e o indicador para expressar a quantidade.

— Mas... mas é bem diferente.

— Bem diferente? — Franzi a testa. — Isso merece um bom esclarecimento. Não me decepcione: nada de respostas vagas.

Ela pensou.

— Eu... sigo meus instintos, o que é muito diferente de arquitetar coisas ou calcular movimentos friamente. O que posso fazer para esgotar a Bella hoje?

Ri descaradamente da péssima imitação que ela fez de minha voz. Bella pareceu nem se importar e continuou:

— Eu realmente quero um pouco mais de tempo como humana. — Ela se levantou da cadeira e veio se sentar em minhas pernas. Depois pousou os dedos delicadamente em meu peito nu. Estremeci. — Eu ainda não tive o bastante.

Fiquei surpreso com sua ousadia... Bella estava bem entendida do assunto. Se ela não encontrasse um limite para isso, se continuasse se aperfeiçoando em jogos de sedução, eu estaria completamente liquidado.

Sua mão deslizou graciosamente até minha barriga.

— Então o sexo era a chave o tempo todo? — perguntei, revirando os olhos. — Por que não pensei nisso antes? Podia ter me poupado muitas discussões.

Ela riu.

— É. Talvez pudesse mesmo.

— Você é tão humana — repeti.

— Bom, achei que você gostasse disso...

— Eu amo tudo o que é humano em você, Bella. Não se cansa de ouvir?

— Por quê? Por um acaso está cansado de saber que eu amo tudo o que é inumano em você?

Não contive a gargalhada. Ela passou os braços em volta de meu pescoço.

— Não estou cansado, mas sempre fico admirado com a dimensão de sua loucura... Como deixou se envolver tanto com alguém como eu?

— Não tive escolha. Você não faz idéia de como é irresistível...

Ela riu pretensiosamente e apertou meu pescoço com mais força.

— Explique-se — insisti.

— Para começar, você é lindo... Não, lindo é pouco, você é o absurdo da perfeição. É misterioso na medida certa, inteligente — a cada palavra ela beijava meus lábios demoradamente —, romântico, tem um cheiro estonteante e...

— E...

— Bom, e agora eu ainda descobri mais uma qualidade, como se as outras não bastassem.

— Qual?

— Ainda precisa dizer?

Estremeci. Uau! Ela estava mesmo demais.

— E é por isso que quer continuar humana. Por conta de minha nova qualidade. — Não era uma pergunta.

— Não é só por isso. Acho que seria uma boa experiência passar um tempo em Dartmouth.

Levantei a sobrancelha, duvidando. Ela continuou:

— Não me olhe assim, estou falando sério, embora provavelmente eu vá tomar bomba no primeiro semestre.

Então comecei a acreditar em suas reais intenções e até me animei.

— Vou ser seu professor particular. Você vai adorar a faculdade.

— Professor particular? — Ela riu. — Isso jamais daria certo.

— Por que não?

— Ora por que, Edward? Quando você está perto de mim, não consigo me concentrar em quase nada. Só em sua presença. Não consigo sequer respirar normalmente...

Beijei seus lábios com delicadeza.

— Está bem. Alice pode lhe ajudar.

— Essa é uma idéia coerente. Acha que podemos encontrar um apartamento assim, tão em cima da hora?

— Bom, nós já temos uma casa lá. Sabe como é, só por precaução. — Fiz uma careta temendo o impacto daquela revelação.

— Você comprou uma casa? Só por precaução?

— Os imóveis são um bom investimento.

Fiquei esperando mais questionamentos, mas Bella apenas apertou os lábios e se deu por satisfeita.

— Então estamos preparados. Quanto tempo ainda podemos ficar aqui?

Fiz uma rápida contagem mental.

— Estamos bem de tempo. Mais algumas semanas se você quiser. E depois podemos visitar Charlie antes de irmos para New Hampshire. Podemos passar o Natal com Renée...

Seus olhos brilharam à idéia.

Primeiro, Bella ficou completamente abstrata; pensando em tudo aquilo. Depois, os contornos de seu rosto foram se alterando em diferentes expressões: sucesso, alívio e até decepção — perguntei-me se seria por Jacob. Provavelmente sim. Quando Bella pensava em Jacob, seu semblante era um livro aberto: eu não precisava ler sua mente para alcançar seu sofrimento. E embora eu ainda detestasse aquele cachorro, a angústia de Bella — buscando insistentemente o ponto de equilíbrio entre amizade e amor —, feria-me tanto que amenizava a aversão que eu sentia por ele e seu bando fedorento.      

— Algumas semanas — concordou, enfim.

— Algumas semanas. Então, hoje você ficará por conta da programação?

— Não me permita essa gentileza...

— E por que não?

— Porque vou querer ficar em casa. O dia todo. Estou tão preguiçosa hoje... — Ela estendeu braços e pernas e bocejou. — Temos tantos DVD’s na estante. É até um desperdício... O que acha?

— Por mim, tudo bem.

Bella se animou, correu para sala e começou a procurar pelos títulos. Sentei-me no sofá.

— Você tem preferência por algum gênero? — perguntou.

— Não. Pode escolher o que quiser.

— O que acha de um musical? Muito entediante?

— Tédio é uma palavra inexistente em meu vocabulário quando estou com você.

Ela corou e mordeu os lábios delicadamente.

— Bom, então vamos ver este aqui...

Liguei a televisão pelo controle remoto enquanto Bella colocava o DVD no compartimento do aparelho. Depois ela saltitou até o sofá e se aninhou em meus braços. Fitei-a de canto de olho. Ela percebeu:

— Por que não presta a atenção no filme?

— Porque o filme por si só é enfadonho...

— Viu? Então você mentiu ao dizer que tédio é uma palavra inexistente em seu vocabulário.

— Não menti não... Eu disse que o filme por si é enfadonho... Mas olhar para você não é... Nunca será.

— Hmmm. Entendo. Se importa se eu assistir? Eu realmente estou bastante curiosa...

— Não. Mas ficarei olhando você.

— Isso me incomoda. Não consigo me concentrar...

— Então não existe outra solução.

Desliguei a tevê.

— Por que fez isso, Edward? — perguntou, assustada.

— Bom, eu não consigo parar de olhar você. E você não consegue se concentrar por causa disso. Acho que podemos encontrar algo que agrade a ambos.

Ela sorriu.

— Qual é a dimensão de seu cansaço? — perguntei.

— Depende...

— Então com você é assim? Dois pesos, duas medidas?

— Digamos que se você me convidasse para dar uma volta pela ilha, debaixo do sol quente, eu diria que estou extremamente cansada.

— Sei...

— Mas se me chamasse para terminar o serviço que ainda temos de concluir lá em cima, eu diria que meu cansaço é bem superficial, coisa à toa...

Ela se ajeitou no sofá para me encarar — sem disfarçar a expressão de desejo. Inclinei-me em sua direção, nossos olhos conectados, meus dedos se fechando em seus pulsos com firmeza.

— Adoro quando faz isso... — murmurou.

— Isso o quê?

— Quando me segura com mais intensidade. Você é sempre tão cauteloso, suave...

Instantaneamente, meus dedos experimentaram um pouco mais de força. Bella sorriu, lançando-me o olhar de aprovação. Senti seus ossos sob a pele, o sangue escorrendo quente e contínuo pelas veias. Vagarosamente, massageei seus músculos, cada toque carregado de cuidado. Ela fechou os olhos, curtindo sensações que eram um mistério para mim.

Seu delicado coração arfou quando pousei a ponta do nariz em sua bochecha, desenhado formas circulares até o pescoço. Por um segundo, senti o compasso de seu sangue ralentar sob meus dedos, ainda presos a seus pulsos. Ela soltou a cabeça para trás — o cheiro subitamente estonteante submergiu minhas narinas aguçadas. Meu rosto se ajustou ao espaço que ela mesma havia me oferecido. Sua pele quente e arrepiada era ainda mais macia na região ao redor da orelha, feita de algodão. Encostei os lábios e sua respiração hesitou.

— Estou loucamente apaixonado por você — sussurrei, estremecendo, completamente embriagado à intensidade daquela declaração.

Bella permaneceu quieta por um tempo, oscilando, talvez sem fôlego para dizer qualquer palavra. Desejei que ela recuperasse os sentidos, dissesse alguma coisa, compartilhasse suas emoções —embora eu mesmo não fizesse esforço algum para ajudá-la: meus lábios pareciam colados à sua orelha e continuaram se confessando.

— Amor e paixão: as duas faces da mesma moeda —murmurei. — Plena paz de espírito e inteira perturbação. Brisa matinal e furacão impulsivo. Matizes suaves e cores vibrantes. Sanidade e loucura... E tudo isso se mistura em mim de forma tão inesperada. — Fiz uma pausa. Ela gemeu. — Eu, apenas um vampiro, naturalmente dado aos instintos de destruição, construí bases tão sólidas de valiosos sentimentos, que poucos humanos, aparentemente os únicos seres dotados de almas, sequer experimentarão um dia...

Bella estremeceu, seu corpo amolecendo, visivelmente desnorteado.

Eu não disse mais nada: temia que, dizendo apenas mais uma palavra, eu pudesse para abalar as estruturas necessárias à manutenção de sua vida. Eu acabara de atravessar um limite perigoso e era necessário recuar.

Esperei. Não sei quanto tempo.  

Houve um silêncio profundo e demorado, até que ouvi seus batimentos se ajustarem devagar, sua respiração entrecortada diminuir os intervalos de ausência.

Suspirei aliviado. Afastei meu rosto para admirá-la. Linda... As bochechas ainda vermelhas, a bruma de calor envolvendo seu corpo.

De repente — e eu não esperava mesmo por isso —, uma gota de lágrima se desgarrou de seus olhos. Foi apenas uma, mas ela carregou toda a beleza do instante. Não soltei seus pulsos, apenas sorri — meu melhor sorriso torto — para que ela se sentisse confortável novamente.

— Edward... — A voz era melodiosa, um suave sopro se embaralhando ao ar.

— Estou aqui, amor.

— Sabe, eu posso dizer mais uma vez o quanto amo você e também que sou uma louca apaixonada...

Seus olhos fixaram-se nos meus. Ela continuou:

— Mas não há nada que exprima meus sentimentos com exatidão. Nada. As palavras já não bastam para nós. Se antes elas pareciam insuficientes agora são praticamente dispensáveis por tentarem definir sentimentos tão inalcançáveis...

Pensei sobre o assunto. Bella estava certa. Eu também havia perdido a expressão, havia muito, e fiquei desconcertado com essa confirmação... Eu precisava compartilhar — porque possuía uma necessidade absurda de me fazer entender — e nada parecia ser suficiente.

Eu acabava de me descobrir sentimentalmente mudo.

Fiquei nervoso. Com agonia, pensei nas palavras, procurei nos cantinhos da mente, tentei articular novas frases. Não consegui. Era como se eu estivesse correndo, correndo muito para alcançar o fim de uma pista que eu suspeitava ser infinita.

— No que está pensando agora? — perguntou.

— Estou angustiado por concordar plenamente com suas constatações.

— Não temos mesmo mais palavras.

— Podemos criar um novo dicionário.

— Ele se esgotaria em meio minuto.

— Então vamos desenvolver habilidades artísticas, desenhar os sentimentos, compor canções...

— Edward, não existiriam cores, formas, traços, notas e tons suficientes. Você ainda não percebeu?

— Então como vamos fazer? Acho que vou explodir se não encontrar uma maneira eficiente de me expressar.

Bella me olhou intensamente e então compreendi o que essa novidade significava para nós: desde que nossos corpos conheceram a perfeição ao se conectaram pela primeira vez, só havia uma única forma de comprovar e extravasar tanto amor e paixão que queimavam juntos debaixo do peito.

— Bom — continuou. — Por que não analisamos melhor o quanto ainda resta da cabeceira da cama?

— Você não está enjoada?

— Não...

Apenas desenhei um sorriso sugestivo na boca, impossibilitado de dizer qualquer outra coisa. Levantei-me num rompante e a peguei em meus braços. Meus lábios insistiram em silenciá-la enquanto eu a carregava para o quarto a uma velocidade inumana.


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Notas finais do capítulo

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