Étreser escrita por LittlePercy, Rosalie Potter


Capítulo 7
7. Um velhinho sinistro e uma mulher gigante


Notas iniciais do capítulo

~ Percy ~
* renascendo do vale das fics enterradas *
E, aí gente?! Nossa, já foi muito tempo desde a última vez, né? Muita coisa mudou, mas Étreser renasceu de novo. Eu adorei escrever esse capítulo e comecei a ficar muito animado no final. Muitas coisas tão começando a fazer sentido na história e os personagens estão começando a criar sua personalidade. Tô muito ansioso pra saber o feedback de vocês sobre o capítulo.
Não me matem, eu sei que tinha prometido esse capítulo há muito tempo. Mesmo assim, tá incrível e espero que vocês gostem.
Continuem acompanhando, vai ficar mais e mais legal.
~ Abraços azuis



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VII                                                                           Tyrion

Eu comecei a repensar minha decisão de seguir aqueles monstros no segundo após tomá-la.

Os dois percorreram mais ou menos um quilômetro e desceram uma encosta que dava acesso a um vale seco. A discrição tornou-se cada vez mais difícil à medida em que avançávamos, uma vez que não havia muitos elementos que pudessem ser usados como esconderijos. Apesar disso, eles não perceberam nossa presença.

— Talvez seja melhor ficarmos aqui. — Draegon rompeu o silêncio quando chegamos à beira da encosta. — Se acompanharmos mais, eles podem nos descobrir e, pior, fugir vai ser bem complicado.

O garoto tinha razão. 

O local em que os neflin se posicionaram era cercado por escarpas de ambos os lados e alguma coisa me dizia que correr não seria tão eficaz com as direções reduzidas. 

Mesmo assim, a visão que tínhamos era um tanto quanto privilegiada. Era possível enxergar as criaturas de longe, sem que elas nos vissem abaixados, o que, de fato, se mostrou bastante útil no quesito segurança.

Apesar disso, eu sentia que meu coração pularia para fora todas as vezes que escutava um sussurro ou percebia alguma movimentação abaixo. O mesmo parecia acontecer com o menino, que mantinha os ombros tensos e os olhos atentos.

Essa tensão, porém, não era nada se comparada àquela que nos inundou quando vimos o que os neflin esperavam.

A criatura se parecia com um mago muito, muito velho. Trajava uma túnica roxa adornada com marcações douradas, sobreposta por algumas peças de armadura no tronco e nas pernas. Ele tinha uma estranha coloração azulada e uma boca anormalmente pequena, entretanto cheia de dentes pontiagudos que eram exibidos quando falava. Seus olhos eram brilhantes num tom esverdeado, a mesma coloração que parecia emanar do cetro que empunhava. Por fim, apresentava um chapéu de corpo cilíndrico e pontudo no final, também permeado por símbolos dourados.

— Vocês estão atrasados, Ara'had! — sua voz ecoou, fazendo com que meu corpo todo entrasse em um estado de torpor. Não era uma voz comum, era literalmente um eco permeado por outros sussurros, sibilos e gemidos, todos saindo da boca de um único ser.

Os neflin abaixaram a cabeça e se curvaram, o que agravou ainda mais minha confusão mental. Quem era aquele sujeito para fazer com que os piores monstros se sujeitassem?

— Perdoe-nos, meu duque. — a forma pequena começou, com sua voz doce.

— Solace está com segurança máxima, meu senhor. — a serpente continuou — Precisamos tomar alguma cautela para não sermos vistos.

— Ainda mais com um grupo de pirralhos tão próximo. — ela completou a frase do parceiro. 

— Não se preocupe com eles, Ara, tomei algumas medidas para ocupá-los e não atrapalharem o ritual. O crocodilo vai impedi-los de avançar. — o mago ecoou.

Por um segundo, meu coração parou. O guarda não me atacara por conta própria, ele fora controlado. 

Draegon me olhou com os olhos atormentados, como tivesse pensado a mesma coisa que eu. 

— Já é tempo, — disse ele erguendo as mãos — do retorno de Lorde Aaron. — à medida que sua voz ecoava, os símbolos de seu traje começavam a incandescer e ele se levantava no ar. 

Eu não havia percebido até então, mas o vale era milimetricamente entrecortado pelo que pareciam leitos de rio secos. Um canal principal abria uma bifurcação, formando um círculo  e depois se juntava novamente uns dez metros adiante. O círculo era cortado no meio  por um terceiro ramo do canal principal, do qual partiam inúmeros pequenos afluentes que serpenteavam e riscavam toda a figura. 

Todos esses leitos, naquele momento, pareciam se encher. O canal principal trazia uma espécie de líquido translúcido que preenchia o desenho entalhado no chão. O mais estranho, porém, era que, no líquido, várias cenas começavam a se formar. Elas tremeluziam, desapareciam e reapareciam repetidas vezes ao longo do percurso. 

Aquilo se parecia…

Se parecia com as cenas do mosaico no subterrâneo da capital. 

Agora, todavia, os episódios pareciam diversificados e aleatórios. Pude perceber a cena de uma mãe abraçando seu bebê numa casa incendiada, um casal em frangalhos que se beijava sobre uma balsa de gelo e várias pessoas empunhando armas ao fundo, a cena de dois jovens que corriam por uma campina verdejante, mas que, após um forte terremoto, foram separados.  

As subsequentes cenas iam passando uma a uma e mostravam pessoas em agonia, com feições de horror e desespero. Na mesma medida, o bizarro sacerdote ia ganhando poder e ascendendo aos céus.

Ele murmurava algo bem baixo e em outra língua. Assim que juntou as mãos, um círculo roxo se projetou à sua frente. Esse era permeado de escritas antigas, cujo signos nada tinham de sentido para mim. Ainda, havia alguns padrões desenhados que giravam em sentido horário, revolvendo toda a forma. 

Tão logo o círculo sumiu, linhas daquela mesma cor envolveram os punhos da criatura. 

Sob nosso olhar de pavor, a realidade à nossa volta parecia tremeluzir e se fragmentar. Edifícios de mármore branco, imensos,  emergiram em todas os lugares. Ruas, passarelas e avenidas começaram a serpentear pelos espaços. Boulevards, fontes e estátuas se estendiam pelo vale abaixo a perder de vista. 

Por um momento pude perceber até vultos, um tanto quanto fantasmagóricos, andando e conversando em algumas calçadas.

— A grandeza do Reino do Tempo! — exclamou a criatura

Naquele momento, eu juro, era possível sentir cada célula do meu corpo gritando para que saísse desesperadamente de lá.

Pude sentir a mão de Draegon encostando no meu ombro e  quase dei um salto para trás. Ela estava trêmula e era possível sentir a perturbação nos seus olhos.

Cada vez mais aquela realidade ia se sobrepondo à outra. Entretanto, uma coisa me causava estranheza: aquilo não parecia natural. Quer dizer, até mais do que  uma magia sinistra pudesse ser. A projeção que o ser fazia parecia incompleta. Parecia bruxulear.

—  A gente tem que dar o fora daqui. —  sussurrei para ele, com os olhos tão perturbados quanto.

— Se tiver alguma ideia de como distrair o circo de horrores abaixo de nós, talvez nós conseguimos descer a colina pelo sul e correr até achar alguém. —  comentou Draegon, com uma voz ligeiramente trêmula.

— E-eu… —  tentava pensar em todas as possibilidades para sairmos e não chamar atenção. 

Meu coração quase parou quando um estrondo emergiu exatamente pelo lado em que iríamos usar como rota de fuga.

O sacerdote pareceu perder a concentração e, cada vez mais, a realidade que ele havia criado bruxuleava mais e mais.

— O que é isso?! — grunhiu o sacerdote.

Sons de rugidos se aproximavam mais e mais de nós.

Para minha surpresa, aparentemente não eram mais aliados dos neflins e seu senhor.

Ele titubeou e parou seu encantamento. Baixou as mãos e a luz e a luz que emergia de seus punhos cedeu. Ele retornou ao solo com uma feição de mais pura raiva.

A essa altura, os estrondos, repetidos, estavam tão perto que era possível sentir a vibração em meus ossos.

— Nossa deixa! — puxei Draegon pela gola e seguí arrastando-o por uns cinco metros.

Ele começou a relutar.

— Você ficou louco?! —  seu tom de voz fez questão de enfatizar a última parte da frase. —  Eu não vou para esse lado!

Explicar demandaria tempo que nós não tínhamos. Entretanto, eu tinha a sensação de que seria a saída mais rápida. Então continuei arrasando o garoto para lá.

Não foi preciso dizer nada.

Uma figura de aproximadamente cinco metros surgiu a esquerda, trazendo consigo quatro formas menores, mais ou menos da nossa altura. À princípio, não pude distinguir as formas e discernir quem era. Meu coração quase saltava pela boca. No entanto, passados alguns segundos de estupefação, tudo ficou bem claro. 

Era Wyr!

Ou melhor: cinco Wyrs!

Nós continuamos correndo, agora com a segurança — ou nem tenta —  de que não seríamos mortos escolhendo aquele caminho.

Os neflins sibilaram e avançaram na direção da mulher de água.

Eu sempre soube que Wyr era uma das mais hábeis dominadoras de Mistion, fato pelo qual era a chefe da segurança do castelo. Apesar disso, não tinha a exata certeza da extensão dos seus poderes. E, realmente, ela me surpreendeu.

Os monstros eram rápidos, mas a velocidade com que Wyr — as cinco—  conseguiam se adaptar e prever os golpes era tão rápida quanto. 

Ara, a neflin menor, fazia uma dança macabra enquanto saltava de um lado por outro, atirando as suas flechas nas Wyrs pequenas. A mira dele era macabra, atingindo as quatro, ao mesmo tempo, no peito.

Eu prendi a respiração por um momento, pela tensão da situação. Achei que a nossa inspetora seria seriamente machucada, mas ela simplesmente ignorou o ataque.

As quatro Wyrs pequenas arrancaram as flechas do peito e prepararam o contra-ataque. Elas conseguiam retirar água do ar e das nuvens e começaram a lançar jatos de alta pressão em Ara. 

A neflin quase que debochava da mulher, fazendo algumas acrobacias tão rápidas que era possível acompanhar apenas o seu vulto. 

Um dos jatos, dos quais Ara desviou, atingiu uma pedra de dois metros, partindo-a no meio. 

Draegon soltou grunhido de surpresa, expressando também o meu assombro.

Acima das nossas cabeças, a maior Wyr lutava contra Had, o neflin maior. 

Ele se enroscava pela forma gigante da mulher, entretanto, parecia não ter a mesma sorte da sua companheira.

A maior Wyr conseguia facilmente mudar de forma, tornando todas as investidas de Had inúteis. Ele tentava usar suas presas para ferir a mulher, mas todas as tentativas fracassaram.

Ela contra-atacou, envolvendo parte da criatura com suas mãos gigantes, atingindo-o com um turbilhão de água.

Ele rugiu e se debateu, procurando um jeito de escapar. Had ia de um lado pro outro, balançando a tenebrosa cabeça em todas as direções.

Por um segundo ele parou.

Draegon apertou meu braço com tanta força que tive que me conter para não urrar de dor.

Had havia nos visto.

O monstro soltou um sibilo mortal e conseguiu se enroscar em uma das mãos da mulher. Ele, ainda se debatendo, conseguiu um bom ângulo de ataque e, com as suas presas, conseguiu cortar uma das mãos da maior Wyr e se libertar.

Ela cambaleou para trás e sua antiga mão se transformou em uma massa de água, que se juntou novamente ao corpo e regenerou o membro perdido. Esse processo, no entanto, foi suficiente para conceder à criatura uma brecha. 

Ele disparou em nossa direção e, percebendo o que estava prestes a acontecer, ela arregalou os olhos e deixou escapar um alto e sonoro “Droga!”.

Nós tentamos correr na direção contrária à do monstro, mas ele era rápido demais.

Um dos clones menores de Wyr, tentando nos ajudar, fez um laço de água e conseguiu atrasar Had, que estava pouco mais de três metros de nós.

Ara, que continuava desviando dos jatos pressurizados dos outros três clones, percebeu o que estava acontecendo e mudou também sua atenção para nós.

Ela soltou um riso, com sua voz inadequadamente doce, e murmurou algo. Naquele instante, seu arco ficou energizado, empunhando uma flecha diferente das outras. A raposa tomou um impulso por uma rocha que estava à sua direita e ascendeu aos céus, mirando em nós dois.

A maior Wyr antecipou o ataque da pequena neflin, e, antes de que ela disparasse, a mulher de água conseguiu colocar-se entre a flecha e nós.

O efeito, porém, foi diferente das outras flechas. Assim que tocou Wyr, a flecha abriu um buraco gigantesco no peito da mulher, fazendo que ela caísse no chão como uma grande poça d’água. 

As Wyr pequenas soltaram um guincho de dor, porém continuaram de pé.

Ara preparou um novo lançamento, apontando para a Wyr que prendia Had com um laço. 

Eu e Draegon tentávamos disparar a correr, mas os neflins eram muito mais rápidos.

Para impedir que Ara acertasse seu alvo, dois clones de Wyr atiraram uma esfera concentrada de água na pequena neflin, sob tanta pressão que, assim que chegou perto dela, explodiu e jogou Ara dois metros para trás.

Naquele mesmo momento, porém, o clone que segurava Had não conseguiu mais contê-lo. A corrente de água se partiu e, com um olhar de desespero, a mulher lançou dois jatos de água em mim e em Draegon, o que nos jogou a alguns metros de Had. 

Ela correu, preparando um pulso de água, o mesmo que havia sido jogado em Ara anteriormente. 

Alguns metros atrás, Ara também se dirigia a nós, sem mais sinal dos dois clones que antes haviam tentado contê-la. Ela estava arquejando um pouco, com alguns sinais de laceração no corpo. Um líquido dourado parecia escorrer dos seus ferimentos. O olhar mortal de seus olhos estava acentuado e as garras balançavam de um lado para o outro ansiando pelo nosso sangue.

Minhas mãos tremiam e eu conseguia ver que as de Wyr também. 

Agora, havia uma única manifestação da presença de Wyr conosco. Ela, que sempre estava imponente, mostrando tempestades e furacões em seu corpo de água, estava com a água calma. Cambaleava um pouco e tinha uma feição de dor, estava suspirando e seus olhos pareciam um pouco opacos, sem o brilho e a determinação corriqueiras.

Apesar disso, conseguiu lançar o pulso d’água em Had, antes que ele chegasse até nós. Ele, porém, reagiu tão rápido quando e usou sua cauda para atacá-la lançando-a para perto de nós.

A essa altura, Ara já havia nos alcançado, trazendo um sorriso debochado no rosto.

— Tsc, tsc, tsc —  Ara estalava os lábios. —  A grande general Wyra morta protegendo dois pirralhos. — O tom de deboche dela se acentuou.

Wyr tentava se levantar, assim como nós, mas suas energias pareciam ter sumido.

— Uma pena que você não poderá ver o que acontecerá em breve, Tyrion. — ela murmurou enquanto olhava para as próprias garras. 

Eu arregalei os olhos. 

Meu coração parecia estar descompassado.

Uma vertigem sem precedentes havia me tomado.

Como ela sabia quem eu era?

O sentimento de estupefação parecia ser compartilhado entre mim, Draegon e Wyr.

Ara preparou três flechas enfeitiçadas e mirou em nós. Eu fechei os olhos, esperando o fio daquela arma me atingir.

— Você me subestima, Ara! — Era possível ver que sua voz estava embargada, mas com uma determinação típica dela. 

Eu ouvia o som do arco sendo puxado e a respiração ofegante de Had, que fazia alguns grunhidos periódicos. Eu sentia a terra seca e sem vida sob meu corpo. Não havia brisa, não havia movimento no ar.

Depois de algum tempo, não conseguia ouvir mais nada. Ara havia tido um surto de misericórdia e nos deixado viver?

O ar se tornou pesado e frio.

O chão começou a se tornar fofo e gelado.

Abri um olho para tentar espiar se ela ainda nos tinha na mira.

O cenário estava completamente diferente. A terra, antes desolada estava coberta de gelo e uma fina nevada acontecia. Era possível ver o ar quente da minha respiração. 

Ara’had estavam congelados, imóveis. Estátuas de gelo sinistras para falar a verdade.

Levantei em um impulso e fui até Draegon. Ele tinha alguns cortes e um pouco de neve no cabelo loiro, mas parecia bem no geral. Estava com as bochechas vermelhas e os olhos marejados. 

Eu olhei para Wyr e a reação foi a mesma do garoto. 

Ela estava imóvel, com os olhos fechados e uma feição de paz. A água que antes circulava freneticamente pelo corpo da mulher havia congelado. 

Eu e Draegon apoiamos a mulher nos ombros e saímos em disparada para Solace novamente.


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Notas finais do capítulo

~ Percy ~
AAAAAAH! O que acharam? Eu amei essa batalha, sério. Espero que os golpes tenham ficado legais na imaginação de vocês também, porque eu adorei o rumo que tudo tomou. Quando a Wyr, até uma lágrima escorreu aqui. Espero que o próximo capítulo venha logo, estou curioso pra saber como a história vai seguir.



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