Aos olhos de alguém escrita por Loressa G M


Capítulo 29
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O som das batidas ao caminhar das horas em um relógio ainda ressoa por minha mente, mas sinto que não é mais um sonho. Uma mão fria desliza por minha testa e acaricia meus cabelos, abro os olhos e pela segunda vez na vida consigo ver por mim mesma sem o auxílio de Natacha, rapidamente me ponho sentada na cama, a minha frente um homem de cabelos negros, caídos sobre seu rosto pálido e olhos como um lago de leve nevoeiro, me encara.

  Alinpç

  Ainda estou sonhando?

  Contradigo, jovem dama – a mente dele sussurra a minha, as palavras ecoam com o som dos ponteiros do relógio

  O relógio, Rafagh tem um em seus braços, um relógio de ouro puro com detalhes em azul safira, olho para ele, aquele era o azul escuro dos olhos de Alinpç, mas... agora, em minha frente, seus olhos estavam quase tão claros quanto neve, perdidos, sem a firmeza e confiança a qual sempre esbanjara nas histórias, nas ilusões de Natacha e nas lembranças de Konor.

  Ele continuava a me encarar, com um olhar gélido avançou meio passo em falso, depois recuou sem abrir a boca em nenhum momento, parecia que queria tentar chegar mais perto, parecia que iria... me matar.

  Se foste, nada fez. Rafagh virou-se, suspirou como quem não consegue executar uma tarefa, abriu os braços e ainda de costas para mim, olhando fixamente para frente, o irmão de Natacha foi aos poucos desaparecendo, até sua imagem sumir por completo de meu quarto.

  Confesso que esperei, por breves instantes, minha visão ir embora com ele, porém continuo a poder ver por meus próprios olhos. Corro, feliz, até a porta de meu quarto, tenho que contar a novidade a Ramon, a Vic, vou até a sala, porém ainda nas escadas sinto a presença de mais mentes do que o habitual nesta casa. Tento identifica-las, mas as cores dos moveis me distraem, da janela vejo um esquilo tentando atravessa-la, coitadinho...

  Concentre-se Davina!

  Não tenho outra escolha, fecho os olhos.

 

  Ouço a voz de Aurora Maikle.

  – Sofi Deverron, aqui?! – qualquer um percebe na própria voz da rainha, o quão inconformada estava.

  – Bom te rever também – responde Sôfi, com um sorriso sínico

  Todos as encaram.                  

  As quatro famílias estão sentadas em cadeiras organizadas em um enorme círculo, nunca havia visto aquela sala, parece feita especialmente para algumas certas reuniões, como essa. Diferentemente de onde foi a última reunião, esta sala tem as cadeiras contadas de acordo com a tradição, ao lado totalmente oposto a porta, estão quatro cadeiras de ferro e aço, duas maiores como a de reis e rainhas da idade média decoradas com ouro, na maior delas se senta Leonardo Wolf, ao seu lado esquerdo um trono um pouco menor está vazio, pertenceria a Lavine, nos outros dois tronos menores e decorados de prata estão Leandro ao lado de seu pai e Hayley ao lado do vazio. Sofi vê naquela cadeira enorme decorada com ouro uma oportunidade, ela estando de pé se recusa a sentar no chão como Letícia e Jacques, que não têm uma posição legal naquela reunião, minha irmã então escolhe o trono de Lavine para passar a reunião, ao sentar ela cruza as longas e lisas pernas e se endireita, fingindo ignorar o modo como Leonardo olhou para seu decote.

  – Você não tem o direito de se sentar aí – Carolyne se levanta de sua cadeira, idêntica à de seu marido e filhos, aveludada, roxa e de estilo um pouco mais novo que os Wolfs, da época moderna. – depois de tudo que fez não tem o direito nem de estar nessa reunião!

  – O que tanto Sofi fez a final? – questiona Ramon, ele está sentado ao lado direito de Vic e ao esquerdo de Sânia

  – Deve ser mais uma que pegou o marido de alguém – sussurra Jacques, o qual se encontra ao pé da irmã de criação, enquanto concentra todos os esforços olhando para uma caneta a sua frente

  – Oh, criatura! Você não era nem para estar aqui, fica quieto.

  – Ótimo! – diz ele finalmente olhando para os membros dos quatro estados – então alguém pode me explicar o porquê de eu ter que ficar aqui, no meio da roda como Leticia?

  – Jac... – Sânia toca no ombro do irmão abaixo dela, mas ele se encolhe, retirando a mão dela e saindo da sala

  – Jacques! – Leticia se levanta e corre atrás do garoto

  A sala toda é reprimida por um silêncio perturbador, até ser quebrado por Vic

  – Mas então.... O que minha hóspede fez criaturas? Vão me contar agora ou precisarei hipnotiza-las?

  – Minha história é muito interessante para começarmos com ela, que tal começarmos com uma de Konor? – Sofi olha para trás

  Não o tinha percebido ali, em um dos cantos da sala quadrada, fumando, com uma das pernas apoiada na parede, amassando ainda mais sua camiseta surrada.

  – Bom, por onde começo... não sou muito bom com palavras, prefiro ações – ele sorri maliciosamente para Sôfi, ela o ignora – Ah... tenho por volta de 500 anos de existência, nunca tinha participado de um grupo de apoio...

  – Cala a boca Konor – Ramon se vira para Sofi – O que vocês querem com isso?

  Ela não responde, apenas permanece encarando Konor, Sôfi não está mais naquele local, nem Leonardo, agora eram apenas uma ilusão, percebo pela mente de quem está na sala, há uma projeção falsa quando olham para aquelas cadeiras, além de que na mente de Konor apenas dois tronos vazios ocupam aquele local.

  – Tá, tudo bem, vou começar a falar de verdade. Fui criado por Alinpç, o famoso kirian desconhecido – ele sorri, dessa vez diferente, é mais parecido com saudades – ele foi apagado da maior parte da história por Ernesto, porém, antes disso, em seu auge me criou, de um simples humano, para uma criatura com todos os poderes aperfeiçoados de um vampiro, mas sem necessitar de sangue humano.

  – Nos diários de Rafagh, não se fala sobre você – Tayler troca olhares com Vic, desconfiados.

  – Falavam nos dois que as bruxas, antepassadas dos Mystics queimaram.

  – Mas elas queimaram sem nem antes ler? Não acho que eram burras assim. – Sânia encara Konor com a mesma desconfiança do irmão e de Vic.

  – Eu arranquei as páginas gatinha, acha mesmo que eu seria tão idiota a ponto de deixar que um bando de bruxas soubessem que existo e me caçassem? – Konor olha para Carolyne, percebendo o interesse dela sobre como Alinpç conseguiu tal façanha – Ou seja, tudo que ele fez para se concentrar, no que pensou, como o fez, tudo relacionado a minha criação foi rasgado dos diários e queimados junto aos dias felizes que passamos... e uns, traduzindo o “Alinpcês”, abre aspas, nem me lembro mais do porquê de ter dado poderes surpreendentes e imortalidade a esse idiota, agora ele está dando em cima de minha filha, Deverron, fecha aspas. O que é totalmente mentira eu nunca fiz isso... – Konor fez uma “cara de santo” propositalmente fingida

  – Só me responde uma coisa, por que você nunca me contou nada diss­­o criatura? – um tom sério, estranho a voz Vic, combinam com o semblante de perdida que minha mãe faz

  – Pelo mesmo motivo que Rafagh não transformou Clarice na mesma criatura que eu, você enfiou uma adaga em meu coração

  – Não fantasia....

  – Criatura? É isso que iria dizer né, não sou mais o seu amor, então você volta a me tratar como todas as outras pessoas, com esse mesmo costume que eu amava em você

  – Konor... – a voz de Victory sai quase que com um tom de preocupação

  – Você me trocou por outro Vic! – de repente, a reunião vira uma discussão amorosa – nem esperou que eu fosse embora para beijar aquele cara que não te queria nem para passar o tempo na minha frente!

  – Eu estava bêbada! Minha melhor amiga tinha acabado de ser assassinada por uma bruxa! – Vic se levanta – e nessa história quem se ferrou fui eu! Eu fiquei sem você, sem o cara, sem Maya...

  Konor direciona seu olhar para Tayler, que tentava não prestar atenção no passado da namorada.

  – Mas você foi capaz de amar outra vez – Konor diz a Vic, mas ainda olhando para o Mystic – mesmo que demorou, mesmo depois de tudo e das coisas que nem soube, você voltou a amar.

  Vic vai em direção a Konor e o abraça.

  – Interrompendo a “DR” do casal, mas podemos seguir com a reunião? – diz Raiane         

  – Tudo bem... Mas antes, podem me explicar qual é dessa frescura de cadeiras, olha a dos Maikles, querem ser tão diferentes dos Wolfs mas suas cadeiras, apesar de não terem a diferença de tamanho do rei pra rainha, apenas as dos filhos são igualmente menores, o que eu estava... ah é, são feitas de aço e cobre! E mais frescura ainda é isso de parecerem tronos de gelo cinza e alaranjado

  – Konor, prossiga... – Raiane parece começar a perder a paciência

  – Acho q os únicos sem frescura são os "dentucinhos" aí – Ele tenta conter um risinho, não consegue – que devem ter pegado essas duas de plástico da barraquinha de lanche

  – Não, as desse tipo não tem apoio atrás, e vai logo criatura! – Vic massageava as têmporas, mas sorrindo assim como ele, já em seu lugar

  Ele suspirou

  – Alinçp e eu...

  O barulho de um pássaro batendo contra o vidro da janela da sala e caindo quase morto me distraí, olho para ele, é um lindo pássaro azul, o que eu estava...

  Percebo que ainda estou na escadaria, desço então até a sala, consigo ver, nem acredito, eu pude ver a cor e o formato do que fez o barulho da janela, eu vejo as cores e formatos da casa, dos móveis nela presentes, eu vejo... Jacques.

  O garoto está na cozinha com Letícia, ambos no chão novamente, ele sentado agarrado às próprias pernas e se movendo para frente e para trás, ela ajoelhada ao seu lado, tentando falar com ele, os empregados vão e voltam desviando deles e continuando seus afazeres sem perguntas.

  – Jacques! Fale alguma coisa!

  Ele continua em seu estado de transe, ignorando-a. Ela então se curva para mais próxima de seu rosto e tenta beija-lo, porém o garoto reage imediatamente, segurando os lábios e bochechas dela fortemente com uma das mãos e a empurra. O sorriso fixo do rosto da menina desaparece, apertando até mesmo o meu coração, ela se vira e anda o primeiro passo, ele então balança a cabeça rapidamente, como se acordasse e a puxa pelo braço esquerdo, ela caí em cima dele e ele a beija assim, deitados no chão da cozinha.

  – Me desculpa, mas eu não posso, eu não te mereço – diz o garoto, trêmulo

  – Quem te disse isso? Jacques eu te am...

  – Não, você é apenas uma garota mimada que nunca conheceu a dor – Ele se levanta e sai em direção a sala.

  Na mente de Jacques, toda vez que ele pensa em Letícia, em agarra-la, em deixar ela o beijar, ele lembra de Jackson dizendo que ele não poderia ficar com sua filha, que ele não a merecia e logo em seguida, o garoto lembrava dos socos, chutes e de todas as agressões fixando de uma vez que ele não poderia ficar com "a mimadinha" da Letícia.

  Dessa vez foi ela quem reagiu, dizendo as costas de Jac

  – Leonardo dilacerou minha mãe por ela ter se deitado com outro homem – Jacques parou de andar e começou a prestar atenção em Letícia, ainda que de costas – Mas mesmo assim, ele nunca teria descoberto se eu não tivesse nascido e hoje Lavine estaria lá sentada naquele trono e ainda não teriam uma lobisomem, ou bruxa, ou seja lá a aberração que sou, sentada no chão daquela sala de reuniões.

  – E eu estaria sozinho, apenas um excluído, no chão pois não existe lugar que caiba a mim naquele reino, em nenhum reino. – diz Jacques, sem se virar

  – Eu também não Jac, eu também não – sussurra Leticia

  O garoto finalmente se vira e a beija, um beijo quase que por impulso, mas como se pudesse cicatrizar todas as feridas abertas, lá no fundo, na alma deles.

  Os empregados continuam desviando, como se nada estivesse acontecendo, até que um dos empregados joga um pacotinho e um cook a eles.

  – O que é isso? – Jacques quebra o cook de chocolate ao meio e divide com a garota

  – Um cook e um preser...

  Ela ri, ele também.

  – Você parece um pouco nervoso Jacques – a garota segura a mão dele e finalmente saem da cozinha.

 

  Tento sair da sala sem que eles me vejam, subo as escadas até meu quarto, fecho a porta e ando até a janela, esperando encontrar algum outro pássaro ou animais da ilha para observar, mas o que encontro abaixo, no quintal, é totalmente inesperado.

  Sofi.

  – Parabéns Nick, você conseguiu me fazer feliz, saiba que sem sua ajuda nada disso seria possível – ela não deveria estar com Leonardo?

  Porém vejo que Sofi está no quintal da mansão, a frente do loiro de olhos verdes, o mesmo homem do outro lado da janela da sala de jantar quando minha irmã matou os empregados usando poder um nível maior que o seu, poder dele.

  – Sabe que sou grato a ti, mas me diga Soffi, como consegue controlar tantas de si mesma simultaneamente? – o rapaz de aparentemente 22 anos tem um sotaque diferente, ele pronuncia o som de "f" mais prolongado e diz "ti" ao invés de "você".

  – É fácil, a "eu" na sala de reuniões fica vegetando, não preciso me preocupar com ela, pelo contrário, ela me descansa. A que está com Olory é meu charme, meu lado sedutor e conquistador. Aqui sou eu mesma, tenho apenas que me desfazer dessa logo. O problema mesmo é a que está procurando Yasmim – paro de ouvir

  Tinha me esquecido completamente da caçada a caçadora, tenho que entrar na mente certa de minha irmã.

  É tarde.

  Sofi está com Yasmim amarrada e amordaçada tentando fugir de seus braços, ela deve ter usado o Nick mais uma vez, caso contrário não conseguiria apenas controlar a mente de Yasmim, ela é neta de Natacha, tem algum poder kirian.

  – Calma gracinha, minhas garras são cumpridas mas não arranham não... só quando eu quero.

  Ela entrou com a caçadora se remexendo contra o corpo da outra mulher, minha irmã usava claramente os poderes nível dois de Nick para isso também. No momento em que ela pôs os pés na madeira da mansão, as outras Sofis se desfizeram, inclusive a que estava na sala de reuniões, a esse ponto, ela já tinha colocado Leonardo de volta em seu trono do mesmo modo que o tirou.

  – Alguém pode me dizer que brincadeira é essa? – Henrique Maikle se pronuncia pela primeira vez hoje – onde está a mulher de quem tanto falaram? E como ela desapareceu?

  – Calma boys — a porta se abre, Sofi reaparece na reunião já com Yasmim grunhindo e chutando o ar – podem me ajudar um pouco?

  Leonardo, Henrique e Aurora vão até a garota de olhos como uma poça de chocolate, com blueberrys ao centro. Ramon corre até o trono de Lavine, enquanto levam a garota até lá. Os cinco juntos conseguem amarra-la com as cordas que Sofi envolvera na caçadora, já presa e amordaçada, a jovem para de resistir, ela sabe que não seria tão fácil escapar de um trono pesado de ferro e aço.

  Todos de volta aos seus lugares, Vic, que permanecia sentada, se levanta e juntamente a Konor, Aurora, Leandro e Carolyne, retiram o pano que impedia a caçadora de falar e permanecem no meio do círculo, a frente de Yasmim.   


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