Trazia em seu encalço duas das novas líderes que são as empregadas da vez, e que seguravam o que me pareciam panfletos.
— Meus lindos - e parou ao meu lado tampando minha visão dos livros - Vim aqui em primeira mão, como responsável do grêmio estudantil, informar-lhes do baile dos alunos no mês que vem. - esta manhã seu cabelo mega loiro estava em ondas, com certeza já se cansara do estilo liso. Para minha infelicidade ela percebeu que a encarava, e sorriu convidativamente; olhei pro Carlos, pro chão, pro passarinho que passava acima de nós só pra não encara-la de novo. - Meninas - cantarolou - os folders ! - ordenou furtivamente para logo voltar a sorrir como se não houvesse acontecido nada de errado.
Peguei o meu.
— Como podem ver é o baile ao contrário, onde as meninas convidam os meninos. - o papel rosa com as letras pretas explicava como seria, onde seria, a hora, somente com o tema em aberto. - Então... nem precisem se preocupar, - continuou - porque se tratando dos mais bonitos da escola terão muitas meninas aos seus pés, disso todo mundo tem certeza. - explicou chutando meu pé por baixo da mesa, incomodado permaneci olhando para menina ao seu lado que estava a ponto de faze-la comer todos aqueles papéis que carregava.
— Oba Baile ! Até que enfim um pouco de movimento nessa escola. - comemorou Diego.
— Já estava massante essa vida de estudos direto. - foi a vez de Carlos se pronunciar. Será que só eu gostava de estudar por aqui ?
— Temos só dois meses pra decidir qual garota levar ? - perguntou Oliver, sem tirar os olhos do seu folder.
— Exactement. - respondeu a loira em francês. - Mas se tratando de você não vai precisar desse tempo todo não, criança, se tiver que decidir entre duas já vai ser grande coisa. - falou acariciando o rosto do menor e sendo grosseiramente repelida. Silvana sendo Silvana, a arrogante. - Desculpa fofinho, só digo a verdade. - Acrescentou voltando a atenção para o grupo ao mesmo tempo que jogava o cabelo para o lado de forma rude e travou ao se deparar com minha cara nada agradável. A verdade sei, e a mentira, ordens, ofensas, ordens, arrogâncias, e ordens, ordens, ordens, eu já disse ordens ?!
Ela sorriu para mim, pedindo desculpas com o olhar.
— Aqui o tema está em incógnita. - apontou Schneider, mostrando no folheto.
— O que ? - ela torceu o pescoço de lado.
— Quer dizer que está escondido, não foi informado, é mistério. - expliquei gesticulando, três anos com Schneider me fez aprender um pouco do seu "Matematiguês" que quase sempre fala.
— Ah. - respondeu confusa. - Isso é segredo até a sexta- feira, lindo, a rádio da escola junto com o jornal fizeram questão de revelar o tema, então vai demorar um pouquinho. - piscou para ele, e logo olhou para mim, uma clara tentativa de me fazer ciúmes, fingi estar mais interessado em ler o papel do baile. - Agora deixa eu ir que tenho mais mesas pra avisar, divos. - avisou não sem antes passar sua perna na minha mais uma vez. - Qualquer dúvida é só perguntar pra mim. Bessitos.
E se foi acompanhada "das sombras", sendo seguida pelos olhares dos marmanjos da mesa, com exceção de Oliver, que parecia abismado.
— Gostei dessa nova proposta de baile, as meninas que vão correr atrás da gente esse ano. - falou Carlos, sorrindo.
— Imagina a fila de garotas que vai se formar. E a gente só sentado como jurados escolhendo as melhores, tudo o que eu sempre sonhei. - foi a vez do Igor viajar. - É o paraíso! - e sorrindo levou as mãos atrás da cabeça.
— E se ninguém quiser ir comigo ? - ouvi meu irmão mais novo questionar cabisbaixo. É isso que a galera "estrela", pelo menos a grande maioria, faz com os "cometas", fazem eles se sentirem um nada, e o Oliver era um "cometa" até o ano passado, então sua fama ainda não mudou de status completamente. Eu o chamei para o time, quase me mataram por isso, porém mesmo os "estrelas" não discordam da decisão de um líder de um grupo "estrela", e eu sou o líder dos atletas.
— Caro aprendiz, você tá com a gente agora ! - afirmou Igor fingindo dar uma chave de braço nele, e bagunçando seu cabelo. - Se chove mulher na nossa horta, vai chover na sua também! Porque você é um estrela.
— Pegou mal esse "você é um estrela", cara. - deu um sorriso de lado Schneider.
— Ah, você entendeu o espírito da coisa.
— Olha pra sua frente, - contribuiu Diego, o menor acatou o pedido mesmo estranhando - Você tem só aqui nesta mesa, um engraçado, - apontou para o Igor que mandou um beijo pra ele, que franziu o cenho - um bom de papo, olha eu aqui - se apontou, fazendo o menor rir - um romântico - e o virou para o Carlos que fez um coração com as mão, dessa vez até eu ri. - um inteligente barra fofo, meu amigão cara de mal ali, zoa, boa pinta, é assim que as garotas dizem né ?
— Só se for no século passado. - interveio Schneider. - É charmoso ! - falou apoiando o queixo numa espécie de "L" deitado feito com o polegar e o indicador, e piscou pro já risonho Oliver.
— Você são malucos. - proferiu, negando com a cabeça.
— Pera, tem o nosso atleta galã gostosão ali. - se referiu a mim. - Tudo o que você precisa ser e entender sobre mulheres está bem aqui nessa roda.
— O que? É só isso? Gostosão? - protestei, proferindo a última palavra de forma estranha, não é todo dia que eu me chamo de "gostosão", na verdade nunca fiz isso. - Todo mundo ficou com um adjetivo maneiro e sobrou para mim uma coisa supérflua de gostoso ?! Eu tenho conteúdo pô ! - coloquei a mão no peito fazendo drama e zoei entrando no clima, mas 50% do que falava era verdadeiro. Era isso que todo mundo me achava, um corpo bonito ? No fundo era isso que as garotas queriam ? Uma noite e nada mais ?
— Desculpa aí, deixa eu pensar... 
— Pensar ?! - bufei. - Anda Diego, desembucha ! Você que fica naquele troço de jornal lá e monitora as votações femininas, que que elas falam de mim ? - normalmente eu pouco me ferro para opinião dos outros, principalmente da mulherada, só que naquele momento a curiosidade ou outra coisa, ego abalado talvez ?, era maior do que eu.
— Galera, me ajuda aqui pra achar uma qualidade pro capitão. - retraiu-se sem saída.
— Maneiro. - arriscou alguém.
— Confiável ?...- chutou outro.
— Bom de bola. - falou cheio de certeza o Igor, a taxa de "engraçadice" dele está demais hoje.
— Quer saber, esquece, tô saindo daqui. - revoltei-me pegando minha mochila.
A gargalhada foi geral, menos do pequeno que olhava de um para o outro na mesa tão perdido quanto eu. Riam feito hienas soltas na selva.
— Era sacanagem, Pierre! - gargalhou o Carlos batendo na mesa. O que era tão engraçado?
— 'Ces viram a cara que ele fez ?! Impagável, impagável !! - até o Schneider sabia da armação. Ah entendi, tiração de sarro com a minha cara. Tudo bem.
— Ok, Ha-ha-ha. Pronto, estou morrendo de rir. - ironizei, retornando ao meu lugar fazendo cara de poucos amigos, impaciente. Adorava quando eles tiravam o dia para pregar peça em mim, pra não dizer o contrário. - Como todos estamos bem humorados hoje, e cheios de disposição, não é?! - perguntei, cheio de ironia na voz. - Vamos começar a esta semana com a sessão de resistência que eu tô prometendo já faz algum tempo. - se vamos brincar, vamos brincar direito, vou descer o nível. Agora é a minha vez de zoar, no melhor estilo "vingança é um prato que se come fervendo", essa eu aprendi no tempo que estive com a Silvana. O silêncio pairou sobre a mesa como um raio, sendo ouvido somente as conversas das outras mesas e um rock do Nirvana vindo de um violão mais ao longe.
Da mesma forma que as gargalhadas vieram elas se foram, dando lugar ao espanto, suas caras de incrédulos eram tão hilárias que foi difícil segurar o riso. - Com sequência de corridas, abdominais, e principalmente a nossa maratona que é a melhor ! Todo mundo ama, adora, dá até vontade de repetir ! - sorri falsamente, e morrendo de rir por dentro.
— Isso é brincadeira, não é ? - questionou Schneider ao meu lado, querendo que eu desse, somente a ele, algum vestígio de que aquilo fosse mentira.
"Só que não, cara, você vai sofrer igual a eles. Você foi condescendente no plano, vai pagar junto deles." - pensei vingativamente.
— Brincadeira ? Claro que não. - sorri da forma mais inocente possível, igual a Ally quando faz alguma merda e quer pôr a culpa em mim. Esse vai ser o preço pela brincadeira de mal gosto que eles fizeram comigo. Fechei a cara.
Como um estrondo todos falaram ao mesmo tempo, atropelando uns aos outros pedindo perdão (não, não era desculpa) pelo ocorrido.
— Calma, cara, foi só brincadeira, não precisa usar artilharia pesada !! - brandou Diego.
— Pra que esse espírito de vingança todo, mano? Cadê seu senso de humor ? - perguntou assustado Igor. - Ai meu Deus do céu! Já consigo até sentir as dores de depois do treino.
— Pelamordedeus, eu não tive nada a ver com isso !!! - choramingou Oliver, desesperado. - Vou ficar todo quebrado de novo !!
— E lá vou eu comprar a remessa de Cataflan de novo ! - resmungou Schneider com a mão no rosto.
— Nããão !!! Ainda sinto as dores no joelho que ganhou artrose depois da última maratona !! - surtou Carlos pegando-me pelo colarinho. - A dor, não sei viver com ela, cara ! Não é pra mim ! Faço o que você quiser, bem quase, mas não me manda fazer a maratona nããão !!!
Não consegui mais me segurar, e cai na gargalhada, deixando-os com cara de ponto de interrogação.
— Isso foi tudo armação, não foi ? - Schneider perguntou assentindo.
— Claro que foi ! - e sequei as lágrimas.
— Não teve graça. - chateou-se Igor, pegando a mochila.
— Não pra vocês que foram o alvo da zoação. Mas antes estava engraçado, não é ? Senhor "piadista".- fiz aspas com as mãos, vendo-o amarrar a cara.
— Bem, então está empatado de novo. - calculou nos dedos o Diego.
— Tá certo, mas quero revanche. - Igor se conformou levando as mãos pra trás da cabeça.
— Vamos lá, tem aula de filosofia agora. - informou Schneider se levantando sendo seguido pelos outros.
— Maravilha. Depois de quatro tempo seguidos de estrofes, versos, sonetos, dormir um pouquinho vai aliviar a tensão. - disse Carlos, na outra ponta do grupo.
— Descansem bastante, que a moleza no treino acabou na sexta passada, quero todo mundo ligado !
— Quando você diz "ligado", quer dizer "ligado" mesmo ? Tipo... - perguntou sério o Diego.
— Não. Nada de drogas! - captei seu pensamento no ar, fiquei enojado com a ideia de algo ilegal e altamente destrutivo no meu grupo. - Aquele que eu souber que está usando isso é automaticamente cortado do grupo. Vocês cinco e os outros cinco sabem muito bem disso. - falei firme.
Seguimos para sala de aula cortando o pátio sob os olhares fuzilantes das garotas mais atiradas, e do das mais tímidas também só que de forma mais sutil e disfarçada, elas realmente levarão essa história de baile ao contrário a risca. Estou perdido, vem dor de cabeça por aí. É complicado pra mim falar "não" pra uma garota, principalmente quando o assunto é baile.
A não ser que... que eu já tenha alguém pra ir, desse jeito não tenho que despedaçar um monte de corações esperançosos. Não diretamente pelo menos, poupando-me da consciência pesada que sisma em me acompanhar.
Adentramos na sala e o professor de geografia já se arrumava em sua mesa para começar a aula. Novamente os olhares nada disfarçados das garotas recaíram sobre mim me deixando desconfortável, sorriam de forma convidativa como se uma placa grande de luzes verde-neon estivesse sobre suas cabeças gritando "ESTOU DISPONÍVEL, PODE ME CHAMAR PARA O BAILE."