Contraposição escrita por Blue Butterfly


Capítulo 16
Capítulo XVI


Notas iniciais do capítulo

2.550 palavras. Já consigo imaginar os comentários lol



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'Foi um passeio muito divertido, não foi Amanda?' Maura sorriu, tentando não rir. Agora ela se sentia vitoriosa porque se antes ela era alvo de toda provocação, agora Amanda tinha roubado seu posto.

'Eu odeio patos.' Ela resmungou baixinho, de cara fechada enquanto caminhava a passos duros na trilha, voltando para casa.

Jane deu um risadinha e passou o braço na cintura da loira. Ela não parecia muito preocupada em fazer comentários sobre a situação - hilária - de dez minutos mais cedo. Ela estava concentrada demais em Maura, no jeito em que a loira segurava sua mão, agora por vontade própria, e em como vez ou outra ela abraçava a cintura de Jane, ou a detetive abraçava a dela. Elas levariam um tempo maior para chegar de volta, considerando que preferiram percorrer toda a extensão da trilha. O contorno era um terço maior do que a parte que já tinham andado, e nesse ponto elas estavam cansadas até mesmo para sustentar uma conversa mais longa como tinham feita na ida.

Quando avistaram às últimas arvores do corredor na floresta, Maura suspirou em alívio. A noite já estava caindo - elas tinham passado mais tempo na beira do lago do que perceberam - e presenciar o cair da noite no meio de uma floresta não era exatamente o tipo de experiência que ela queria experimentar naquele dia. Agora, tudo o que elas precisavam fazer era percorrer o trajeto que as levariam primeiro à casa de Amanda, e depois à delas.

O vento frio da noite começou a soprar as folhas do chão, e Jane acariciou-lhe o braço. Ela lançou um sorriso para a morena e segurou seu olhar. Ainda que aquele momento tivesse sido interrompido, de volta lá nas rochas, elas tinham embarcado nessa doce sincronia de troca de olhares, toques e sorrisos. Algo estava, definitivamente, acontecendo entre elas. Ela não podia nomear, e nesse momento não podia fazer nada para se certificar de que suas impressões sobre o que era estavam corretas; elas não estavam sozinhas, afinal de contas. Era um assunto pessoal, referente apenas à Jane e ela, e delicado.

Marley latiu para uma moita tirando Maura de seus pensamentos. Ela diminuiu o passo ao observá-lo, e Amanda, em contraponto, apressou-se para tirá-lo de lá.

'Não de novo, Marley. Um pato correndo atrás de mim já foi suficiente por hoje.' Ela dizia enquanto colocava a coleira no cachorro. Agora com a guia ficava indiscutivelmente mais fácil controlá-lo.

Ao se aproximarem da casa da morena, elas pararam na varanda para se despedirem. Jane agradeceu por acompanhá-las até a lagoa, e por apresentar à elas o lugar magnífico. Amanda dispensou o comentário com um balançar de mão, e disse que estava mais do que feliz por ter passado a tarde com elas, e que poderiam repetir a jornada a qualquer hora, ou simplesmente escolher algo diferente para fazer.

'Posso estudar algumas opções. Temos um pequeno pub aqui, é bem calmo, como vocês já devem imaginar. Ah!' ela disse do nada, como se lembrasse de algo importante. 'Amanhã a noite tem uma pequena celebração na praça principal. Algo com música, barracas e comida. É uma cerimônia que acontece uma vez por ano, relacionada à exposição de... máscaras. E trajes singulares. Algo cultural.' Ela ergueu a mão para Jane quando a morena pareceu prestes à questionar. 'Não me pergunte.' Ela sorriu um sorriso misterioso, e Jane franziu o cenho.

'Máscaras!' Maura exclamou. 'Nós podemos ir, não podemos?' Toda empolgada, ela apertou a mão da detetive e seus olhos pareciam os de um cachorrinho sem dono.

Jane suspirou e balançou a cabeça de um lado para o outro, como se ponderando a questão, e finalmente se decidiu. 'Ok. Mas Maura, não fique muito empolgada, ok? E por favor, nada de aulas sobre origens, rituais, ou qualquer coisa do tipo.' Ela resmungou.

'Eu não posso prometer isso, você sabe.' Ela rebateu e sorriu para Amanda. 'Nos vemos às...?'

'Sete.' Amanda completou, logo respondendo a dúvida da médica.

'Perfeito. Sete.' Ela sorriu para Jane e a morena balançou a cabeça.

'Nos vemos amanhã, então. Até lá!' Ela acenou para Amanda e depois devolveu a mão na de Maura. Elas caminharam o resto do percurso assim, mão em mão, e a médica não conseguia tirar o sorriso do rosto, apenas porque havia surgido a oportunidade de visitar uma exposição.

Cansada, Jane se sentiu feliz ao colocar os pés na própria varanda. Ela parou ao lado da rede, considerando se sentar nela, mas Maura já tinha sido mais rápida e já havia se instalado ali - não que fosse um problema, a médica dividiria o espaço com ela mesmo que ela não pedisse.

'Esse é o celular tocando?' Ela franziu o cenho e ergueu um dedo, mas tão logo as duas tentaram ouvir, o som parecia ter sumido. Ela deu de ombros e sentou-se ao lado da médica. E então dessa vez o barulho confirmou sua suspeita. 'Ei, esse é o celular tocando.' Ela se levantou e indicou que Maura a esperasse ali. Ela voltaria para fora.

Depois de localizar o aparelho, ela franziu o cenho ao estudar o número desconhecido. Ela considerou não atender, mas a curiosidade e ansiedade aumentaram e ao traçar possibilidades em sua cabeça. E se elas estivessem correndo perigo mais uma vez?

'Alô?' Ela disse com a voz rouca, as feições duras.

'Jane?' A voz familiar veio do outro lado, e a detetive demorou a conectar um rosto à ela - apenas porque a probabilidade era de receber uma ligação ali, dela, era muito pequena, quase inexistente.

'Constance?' Ela murmurou, expondo sua incredulidade. Ela caminhou a passos rápidos de volta para fora, procurando por Maura.

'Onde está ela? Minha filha? Ela está bem?' A voz demandava uma resposta imediata, mas ao mesmo tempo parecia frágil. Preocupada.

'Sim, ela está.' Jane adiantou-se, e se agora ela havia entendido a razão da mulher parecer aflita. Ela provavelmente tinha tentado falar com Maura pelo celular pessoal dela, ou até mesmo no de casa, mas não conseguira. 'Ela está aqui comigo.' Jane afirmou, e ao sair na varanda apontou um dedo para o celular enquanto fixava seu olhar no de Maura.

A médica levantou-se em alerta, mas Jane fez um sinal para que se acalmasse.

'É a sua mãe. Ela quer falar com você.' Ela disse finalmente, atendendo ao pedido da mãe da loira.

Maura tomou com delicadeza e confusão o celular da mão de Jane e colocou-o no ouvido. 'Mãe?'

'Maura. Você está machucada?' A voz de Constance veio do outro lado, agora um pouco tremida, contudo contida.

'Eu não - mãe, você está bem?' Ela ergueu o rosto para Jane como se a morena pudesse lhe oferecer uma resposta, mas ela deu de ombros. Ela sabia tanto quanto Maura sobre a ligação - nada.

'Eu estou bem. O que me preocupa é você. Tenho tentado por dois dias te telefonar, e quando finalmente consigo que alguém atenda, é um homem. E ele me diz que seu celular é evidência de teu sequestro, Maura.' A médica ouviu as palavras e sentiu o sangue gelar em suas veias. Ela simplesmente não tinha pensado em avisar à mãe que estava bem. Não é como se elas se falassem tão frequentemente, e seria mesmo estranho se ela só ligasse para dizer-lhe isso - ela não se sentia disposta a falar sobre o restante acontecido.

'Eu...' Ela gaguejou. Como ela se explicaria agora? Adiantaria de algo se desculpar?

'Não me interrompa.' Constance disse e Maura se encolheu, sentindo-se como quando tinha cinco anos de idade. 'Eu tive que fazer ameaças para arrancar qualquer informação daquele policial. Acabou que o sargento Korsak foi colocado para falar comigo, e é graças à ele que ainda estou viva!' Ela continuou, exagerando um pouco na reação para o gosto de Maura, o sotaque carregado pela emoção, misturado entre o americano e francês. 'Você não pode desaparecer assim, sem me avisar de que está a salvo, depois de ser sequestrada! Desde quando você se tornou irresponsável desse jeito?'

'Mãe, eu sinto muito.' Ela murmurou, prevendo que o sermão, se ela poderia definir assim, ainda estava na metade. Jane ainda estava na sua frente, mas tudo o que via eram suas pernas e pés, porque sua cabeça estava baixa.

'Não me interrompa.' Ela disse de novo, repreendendo mais uma vez a mulher. 'Deus. Eu nunca estive tão preocupada. Eu não sabia se você estava bem ou não. Seu pai ficou uma pilha de nervos, Maura. Você é nossa única filha. Por que você não nos telefonou? Nós não conseguimos nem mesmo falar com Angela.' Ela agora tinha mudado o tom da voz, parecendo mais preocupada do que brava. Maura suspirou, ergueu os olhos para Jane, finalmente, e não soube exatamente o que responder. Constance nunca tinha demonstrado tamanha preocupação em relação à ela.

Até agora.

'Você pode falar agora, Maura.' Ela disse depois do silêncio. Com isso Maura sorriu e desviou o olhar do de Jane.

'Eu não pensei que chegaria ao teu conhecimento o que aconteceu nesses últimos dias. Eu sinto muito por não ter ligado, mesmo que para te informar de que eu ficaria fora de alcance por um tempo.' Ela disse, finalmente capaz de elaborar algo melhor do que um balbuciar.

'Eu quero me certificar de que você está e ficará bem. O que aconteceu você pode me contar outra hora - não é que eu não esteja interessada, é só que o seu bem-estar imediato me preocupa mais.' Constance agora estava calma novamente, até mesmo lógica. Ela aguardou pela resposta da médica.

Maura colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha e respirou fundo. 'Eu estou bem.' Com hesitação, ela lambeu os lábios e lançou um olhar para a detetive. 'Jane tem cuidado de mim. Nós estamos longe de Boston, num lugar seguro.'

A morena concordou com a cabeça e sorriu para ela, calmamente. Maura se sentiu mais relaxada ao receber o apoio - agora as mãos dela estavam em seus braços.

'Eu ouvi dizer.' Constance fez a pequena observação clinicamente. 'Eu gostaria que você me ligasse todos os dias, até que você esteja de volta à sua casa. Eu não gostei do que soube, Maura.' Como um ato rebelde, Maura revirou os olhos mas achou melhor não discordar da atitude super protetora da mãe - uma que ela nunca tivera.

'Eu posso te ligar, sim.' Ela disse franzindo o nariz.

'Eu estou feliz que você esteja bem. Seu pai está ao meu lado, e pede para que eu te diga que ele se sente aliviado também.' Ela adicionou, de novo, com uma voz mais carinhosa do que o normal.

Maura sorriu e balançou a cabeça, e depois se deu conta de que a mulher não poderia vê-la. 'Obrigada, mãe. Diga ao meu pai que eu disse olá.' Ela fez uma careta com o comentário pobre. Talvez ela devesse adicionar algo mais, apenas para não parecer muito fria. 'E... eu sinto muito, de novo.' E depois de hesitar... 'Eu amo vocês.' Ela quase sussurrou a última frase. Confessar seu amor aos pais era algo tão raro que sempre que o fazia, se sentia um tanto quanto tola. Eles nunca tinham sido de demonstrar esse tipo de afeto, afinal de contas, mas se Maura fosse ponderar, depois de ter quase morrido, talvez não houvesse hora melhor do que essa de agora para dizer tais palavras.

'Nós também te amamos, Maura. Cuide-se e fique à salvo. Você se importa se eu falar com Jane?' Maura mordeu o lábio inferior - tocada pelas palavras de Constance que soaram tão sinceras e saíram sem hesitação, diferente das dela própria.

'Claro, você pode. Até mais.' Ela disse e esticou o braço para a morena, que recebeu o aparelho de cenho franzido.

'Oi.' Sua voz soou um tanto incerta. O que Constance queria com ela, afinal de contas?

'Jane, eu estou confiando a vida de Maura à você.' Claro, sempre direto ao ponto. Jane meneu a cabeça e se tornou séria.

'Ela está à salvo comigo. Eu me certifiquei de que estivesse, e vou mantê-la assim.' Sua voz foi carregada com a mesma seriedade que alcançava quando conversava com familiares e amigos de vítimas com que ela trabalhava.

Maura revirou os olhos, adivinhando corretamente sobre o que o assunto era.

'Eu não poderia esperar menos de você. Obrigada, Jane. Até logo.' Constance disse, e depois de Jane se despedir, as duas finalizaram a ligação. Ela olhou espantada para Maura, e assobiou em perplexidade. 'Uau. Eu não sei se acabei de falar com a tua mãe ou com a minha.'

E com isso as duas começaram a rir, tomadas pela situação ridícula em que tinham acabado de se encontrar. Com as emoções ainda embaralhadas e se sentindo extremamente cansada por causa da longa caminhada, Maura voltou a se sentar na rede, Jane acompanhando-a em seguida.

'Eu não acredito que ela mandou você cuidar de mim.' A médica dizia enquanto deitava sua cabeça no ombro da detetive - o gesto agora era tão natural que não chegava a ser calculado, pensado.

'Não foi exatamente assim.' Jane disse abraçando o corpo da médica contra o seu.

'Ela te ameaçou?' Maura perguntou com certa ironia, ouvindo Jane arfar em seguida.

'Até parece.' Ela riu levemente e beijou a testa de Maura. 'Ela pediu gentilmente. Na verdade... Ela confessou que confiava em mim.' Ela fez um bico como se ponderando o acontecido. 'É meio que uma honra, se posso dizer.'

'Perdão?' Maura levantou a cabeça para encará-la, um olhar de incredulidade estampado no rosto.

'Você sabe, ela confiar em mim cuidando de você.' Ao mesmo tempo em que dizia as palavras, ela se deitava na rede, trazendo Maura consigo. Suas pernas e pés se entrelaçaram e a médica deitou a cabeça em seu peito, rindo.

'Você sabe que eu tive várias babás, certo? E que elas também cuidavam de mim, o que significava que minha mãe confiava nelas também.' Ela disse brincando, apenas para provocá-la.

'Mas é diferente, agora. Eu não estou sob o comando dela, e nem recebo pagamento.' Jane riu e correu os dedos pelo cabelo dourado.

Derrotada - agora ela já não tinha mais como cutucar Jane, e nem mesmo queria - ela encostou seu queixo no peito da mulher e observou-a por um instante. O mesmo tipo de sorriso brincava nos lábios das duas; algo de cumplicidade, um segredo não dito mas compartilhado mesmo assim. Era engraçado a forma como elas se conheciam e se entendiam tão bem, e se respeitavam em todas suas diferenças. Maura a admirava a capacidade de empatia dela, e também como Jane sempre era cuidadosa e carinhosa - a morena sempre a colocava em um lugar de imensa importância. Algo que Maura raramente recebera em sua vida. Ela deslizou um dedo no rosto de Jane e inclinou-se para frente.

'É por isso que, entre todas as pessoas, você é minha favorita.' E com um sorriso ela beijou com tamanho carinho o queixo anguloso da morena.


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