O Máscara escrita por MileFer


Capítulo 19
Implacável


Notas iniciais do capítulo

Olá meus amores ♥

Capítulo novinho!!!!!

Espero que gostem desta belezura rsrs foi escrito com muito carinho.
Ah, tenho uma sugestão lindíssima de musica para acompanhar: No Light, No Light - Florence And The Machine. Achei a letra muito semelhante a relação entre Adélia e Rafael e, se quiser entender melhor, dá uma pesquisada para conferir, pois vale muito a pena ;)

Enfim, mil beijos para vocês!

Boa leitura ♥



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Jeniffer havia perdido o pouco de juízo que lhe faltava. Ela encarou a si mesma diante do espelho, escondido detrás da porta de seu quarto, enquanto massageava os braços onde ele a arranhara.

Seus olhos queimavam por conta das lágrimas fervidas pelo ódio, e seu rosto guardava uma marca leve da violência que induzira seu pai a cometer contra si. Como sempre, ele tinha um jeito peculiar de transformar-la em culpa com poucas palavras e atitudes.

Mesmo sobre tudo aquilo, ela ainda sentia o prazer de ter suas unhas cravadas na carne de Adam, enquanto seus dedos apertavam seu pescoço com tanta força que resultara em uma dor incômoda. Ela nunca tentara matá-lo antes, mas nunca evitou o pensamento. Ela deliciou-se a cada pequeno momento de deleite dele, enquanto se debatia debaixo dela tentando se livrar do aperto e do sufoco. Até que seu pai os interrompera.

Parecia que o velho sabia de seus planos, pois mal Adam desmaiara e o próprio já a puxava de cima dele com violência, expulsando-a aos sussurros ferozes para fora dali. Depois de tantos anos, e da aparente fragilidade, ela impressionou-se com a força do velho quando tentou atacá-lo cegamente, defendendo-se com agilidade do ódio dela. Bastou-lhe uma tapa no rosto para desarmá-la.

Jeniffer estava com tanto ódio agora que chorava, sufocada no próprio desgosto. O simples prazer que sentira ao tentar matar Adam havia desaparecido, dando lugar a mais raiva, angústia e desespero.  

E tudo aquilo por causa de Rafael.

Ela queria dar-lhe paz. Queria mostrar-lhe que o amava e que odiava o que fizera. Queria mostrar-lhe que estava ao seu lado.

Ela fechou os olhos com força, enquanto respirava fundo e preparava-se para o trabalho. Embora tivesse uma regra de vestuário, Jeniffer preferiu usar uma camisa de mangas longas e um pouco mais de maquiagem que o normal.

Não queria que Adélia fizesse perguntas sobre aquilo, muito embora não tivesse tanto problema em contar a verdade. Tudo o que a impedia era seu pai, que dava situações catastróficas se Jeniffer revelasse o mínimo dos mínimos.

Depois de se assegurar que havia escondido muito bem as feridas, Jeniffer saiu de seu quarto de empregada, em direção ao seu trabalho.

Adélia já estava prontamente parada em seu quarto, esperando por ela. Estava em pé ao lado da janela, usando um vestido florido e colorido demais para os olhos de Jeniffer, enquanto a observava, imóvel, se esgueirar pelo quarto com seu café da manhã em mãos.

Um segundo mais tarde, Adélia se dera conta da dificuldade da mulher de equilibrar uma bandeja enquanto, ao mesmo tempo, tentava segurar a porta, e correu para ajudá-la.

Depois de cumprimentá-la com um aceno, Adélia levou a bandeja para a mesinha que ficava no centro do quarto, sentindo sua barriga doer de fome. Ela lançou um olhar para a comida disposta, e outro para Jeniffer, que estava agora recolhendo as poucas roupas que Adélia já usara.

Mesmo quieta, a garota estava sendo inconveniente com Jeniffer, que tentava ignorar o olhar pertinente dela. Ela ficou um tempo encarando-a, esperando que fizesse algo, ou falasse.

—Algum problema, minha querida? - Perguntou docemente, observando Adélia se remexer desconfortavelmente e sentar-se na poltrona, ereta.   Ela negou, enquanto trazia para perto de si uma xícara de café com leite. Embora já houvesse declarado que não gostava muito da bebida, Jeniffer estranhou o fato da garota parecer estar aliviada ao tomá-la, inspirando o cheiro levemente adocicado do líquido.

—Foi apenas um pesadelo que tive esta noite - ela disse, encarando algo em sua frente. Parecia ter os olhos vidrados na bandeja, como se falasse com ela e não com Jeniffer.

A mulher parou o que estava fazendo e a encarou, curiosa. Sempre tivera um apreço por pesadelos alheios, e os de Adélia eram particularmente perturbadores.

Jeniffer esgueirou-se para perto da garota, pondo uma mão sobre seu ombro para tranquilizá-la. Não precisaria de mais nada para fazer Adélia falar.

—Foi um dos mais estranhos que tive com ele— murmurou, bebericando o café.

Jeniffer franziu a testa e, em tom de brincadeira, murmurou de volta:

—Sonhou com ele? - Disse, deixando transparecer em sua voz a quem se referia.

Adélia, porém, contorceu o lábio em um sorriso forçado. Aquilo indicou a Jeniffer que o problema era mais sério do que se pensava. Ela se preparou para o desabafo infinito da garota.

—Não foi um sonho — ela disse, apenas para Jeniffer, como se apenas ela pudesse saber do que se tratava. - Foi a coisa mais assustadora…

E se calou com o auxílio de um bolinho. Estava fazendo mais mistério do que Jeniffer esperava.

Ela nunca parara para pensar muito bem sobre o quê Adélia sonhava ou coisa do tipo. Sabia que as consequências do seu dia a dia naquele lugar desconhecido lhe causavam certos assombros, mas nunca ouvira muito bem. Agora mesmo pouco se interessava, porém, pelo menos, estava com mais paciência do que o normal - levando em conta tudo o que acontecera na noite anterior.

—Diga-me, Adélia - ela sentou-se ao lado da garota, abraçando seus ombros. - O que anda lhe atormentando durante o sono?

Adélia pensou por um momento. Ela encarou Jeniffer, depois seu colo. Ela deixou o bolinho mordido de lado, enquanto respirava fundo.

—Eu estava em um lugar muito escuro - começou, contorcendo os dedos sobre o colo. - E ele estava lá. Quero dizer, o máscara

—O máscara? - Jeniffer sentiu vontade de rir daquela definição.

—Sim - Adélia respondeu, séria. Não parecia ter se dado conta da ironia na voz da mulher. - Estávamos sozinhos lá, e ninguém conversava. Eu estava nas escadas, tentando fugir dele, mas eu não conseguia correr e… - Ela parou, respirando fundo. Ficou calada por um momento, pensando. Jeniffer a apertou mais contra si, tentando tranquilizá-la. - Houve um momento em que ele parecia pairar sobre mim, e tinha algo preso no meu pescoço, me sufocando - ela imitou o gesto, segurando o próprio pescoço. - E então ele tirou a máscara, enquanto sussurrava coisas horríveis.

Jeniffer atentou os ouvidos, pronta para descobrir o que Adélia havia visto.

—O que você viu? - Questionou, quando a garota calou-se. - Não tenha medo, Adélia.

Adélia assentiu, petrificada.

—Eu vi Adam - disse, encarando-a. Jeniffer refletiu por um momento, pensando no significado daquilo. - Era ele quem estava escondido pela máscara. - Adélia engoliu em seco, antes de continuar: - Era ele quem estava me atacando.

Jeniffer franziu os olhos, vendo pela perspectiva dela.

—Adam? - Repetiu, desta vez em voz alta. Então era isso?

—Sim - respondeu. Depois disso, calou-se.

Jeniffer levantou-se vagarosamente, pensando na situação. Aquilo explicava muito o fato de Adélia ter tanto medo de Rafael.

—Você acha que Rafael é Adam? - Jeniffer perguntou, pensando no sentido daquilo. Não era segredo para Adélia o fato de que ambos eram pai e filho, mas a semelhança a qual a garota acreditava existir entre os dois fora o suficiente para prender a atenção da mulher. - O que a faz pensar desta forma?

Adélia hesitou um momento, pensando nas poucas vezes que tivera contato com Rafael.

Muito embora ainda parecesse intimidador, Rafael fora muito gentil na noite passada. Não era o que ela esperava dele; embora o conhecesse pouco, Adélia já acreditava que não era do feitio dele agir de tal maneira - e, levando em conta os primeiros e desastrosos encontros, também não lhe era comum a paciência, a humildade, ou até mesmo a inconveniência de certo alguém.

Com Adam, a coisa era muito mais complicada. Também não o conhecia muito, mas, levando em conta os horrores que ouvira sobre ele através de seus pais, Adélia já podia decretar que o odiava.

—Não sei explicar - ela disse, remexendo-se nervosamente na poltrona. - Eles me parecessem… Iguais. De certa forma. - Ela calou-se, voltando para o seu bolinho.

Jeniffer voltou ao que estava fazendo, deixando que Adélia voltasse também ao seu café. Não iria pressioná-la mais; ela falaria quando quisesse.

Mas, ainda assim, aquele ponto de vista intrigava-a.

De todas as vezes que Jeniffer vira Rafael, ele agira de forma muito distante, ignorando-a ao máximo e sendo rude sempre que se via obrigado a falar com ela. Aquele tipo de comportamento, aquela arrogância, era uma característica muito particular de Adam.

Quando o conhecera, há vinte anos, Adam era muito diferente do que era agora. Mesmo que ainda tivesse ar arrogante, não era tão desumano. E aquilo também era culpa dela. Mesmo sob quase todos os aspectos, Rafael ainda tinha algo diferente do pai - e esse “diferente” era o suficiente para manter Jeniffer por perto, esperançosa. Talvez pudesse salvá-lo com aquilo.

Após separar as poucas roupas que Adélia usara, ela se aproximou da garota novamente, investigando-a com o olhar atento.

—O que vai fazer hoje? – A mulher indagou, em seu melhor tom amigável.

Adélia balançou os ombros, em duvida.

—Rafael propôs que conversássemos, ontem à noite – murmurou, envergonhada. – Mas continuo insegura quanto a isso.

Jeniffer resistiu à vontade de revirar os olhos, o que resultou em um suspiro audível. Adélia a encarou, curiosa e com um olhar questionador.

—Se tem tanto medo dele, – a mulher falou, usando um sorriso para amenizar a rudez causada pela impaciência – por que o abraçou ontem à noite?

Adélia ergueu as sobrancelhas, pausando a xícara de café na frente do rosto, como uma estátua.

Claro que sabia que Jeniffer havia captado o momento, que estava ali o tempo todo em que ela e Rafael conversavam. Mas não conseguia entender o motivo pelo qual Jeniffer parecia usar aquilo contra ela, naquele momento.

Adélia abriu e fechou a boca várias vezes, sem saber muito bem o que argumentar. Era verdade, o que Jeniffer falara; se ele a intimidava, se tinha medo dele, por que abraçá-lo?

—Eu não sei – respondeu, corando. Ela lembrava-se da familiaridade que aquilo lhe proporcionou. Lembrava-se da segurança, do frescor... – Por favor, não fale nisto. – Disse, queimando de vergonha. – É embaraçador.

—Ora, Adélia! – Jeniffer reclamou, batendo de leve nas coxas, impaciente. – Por que o odeia?

Adélia piscou, recuando na poltrona. Por que Jeniffer estava agindo daquela maneira? O que Adélia havia feito de errado?

—Eu não o odeio! – Disse, exaltando-se também. – Por que vivem dizendo isso? – Ela murmurou.

Ela encarou Jeniffer, que retribuía seu olhar com uma expressão exigente. Esperava que a garota falasse tudo, pressionava-a silenciosamente. Depois de respirar fundo, Adélia desabou em lágrimas.

—É só que...  – ela fungou, enxugando as lágrimas. – Ele é tão difícil! – Ela soluçou, escondendo o rosto nas mãos. Jeniffer ficou calada, pensando se havia sido uma boa ideia insistir no assunto. – Em alguns momentos, ele parece-se tanto com Adam... E não há nada mais aterrorizante do que isso. Mas ao mesmo tempo...  – Ela pausou, engolindo a bile que se formava em sua garganta. – Ele foi gentil comigo. Prometeu-me que faria qualquer coisa para que eu ficasse. – Ela respirou, fechou os olhos e sorriu rapidamente, como se estivesse meditando. – Oh, Jeniffer! Ele disse que poderíamos ser amigos... Disse que me deixaria falar com meus pais outra vez.

Jeniffer ficou surpresa.

Durante todo o momento em que Adélia e Rafael conversavam, ela pouco se interessou pelo assunto. Mas agora, diante de tais confissões, ela mais do que nunca desejou saber sobre o que mais ele havia falado.

—Ele disse isso mesmo? – Cética, ela franziu os olhos. Era a coisa mais estranha que havia acontecido até agora.

—Sim – a garota afirmou, com convicção. – Mas não sei se devo confiar nele. – Adélia havia parado de chorar, mas seu peito ainda estava apertado. Havia um frio insistente em sua espinha, fazendo-a ficar desconfortável na postura ereta que mantinha.

—E por que não confiaria?

—Acho que a pergunta certa deveria ser - Adélia disse - por que eu confiaria nele. 

Jeniffer calou-se. O argumento dela era bom, mas ao mesmo tempo irritante.

Adélia tinha algo que Jeniffer nunca tivera durante vinte anos: Rafael. De certo, era aceitável que a garota desconfiasse dele, ou algo do tipo. Mas havia uma persistência nela de evitá-lo que matava Jeniffer por dentro, de pura inveja.

Ela tinha inveja de Adélia, profundamente. Até gostara da garota durante alguns momentos, mas na maior parte dele aquele sentimento a invadia – principalmente quando Rafael estava por perto.

Adélia não conhecia Rafael como Jeniffer; não sabia metade das coisas que a mãe do mesmo sabia - e aquilo Jeniffer até perdoava. Mas não suportava vê-la se referir a ele como se ele não passasse um cara assustador. Não suportava a falta de esforço dela para entendê-lo ou a falta de criatividade em relação ao que pensava sobre seu filho.

O que tornava a inveja um sentimento totalmente impiedoso. Também não suportava a inocência da garota.

Adélia era docemente inocente em relação aquilo tudo, e sua inocência despertava em Jeniffer uma voracidade para mudar aquilo. Desconfiava profundamente que a garota não passasse de uma sonsa.

—Bem colocado, minha querida – Jeniffer concordou, com um sorriso adocicado. – Afinal, você mal o conhece!

Era ironia, mas Adélia assentiu, concordando.

—Você parece conhecê-lo muito bem – ela rebateu, aparentando tranqüilidade.

Jeniffer sorriu ainda mais, balançando a cabeça.

—Sim – disse, simplesmente. – Conheço-o muito bem.

Adélia franziu a testa, desconfiada. Seus olhos estavam um pouco inchados e avermelhados, mas franzidos de tal forma que pareciam querer falar algo que não conseguia dizer. 

—Confie em mim, Adélia – a mulher tranqüilizou-a, muito embora seu pedido não devesse ser aceito. – Conheço-o melhor do que imagina.

—É por isso que o defende a todo o momento?

O sorriso de Jeniffer desapareceu, dando lugar a uma expressão séria.

—Defendo-o, pois sei que é uma boa pessoa – não era exatamente aquilo que queria confessar, mas preferiu não contar a verdade. Adélia poderia por tudo a perder, principalmente naquela noite, se fosse ao encontro dele. – Sei que não merece ser tratado de tal maneira.

—Eu não o trato mal — Adélia rebateu, impulsivamente. Um segundo mais tarde, pensou melhor.

Havia sido rude com ele, julgando-o mentalmente e completamente impiedosa com sua suposta situação. Havia chamado-o de mentiroso, gritara com ele e desfizera-se dos pedidos de desculpas e dos presentes que mandara. Se isso tudo não significasse ser , ela não sabia o que era.

— Ele também não era muito simpático comigo – defendeu-se. – Acho-o arrogante, às vezes. – Ela parou, pensando por um momento. Jeniffer não disse nada; ficou apenas encarando distraidamente as nuvens pesadas que se formavam no céu, anunciando chuva. – Eu não consigo entendê-lo.

—E por que você não tenta? – Jeniffer rebateu, minuciosamente.

—Porque eu não quero! – Adélia confessou.

Nenhuma das duas percebera quando assunto virou uma discussão sentimental. 

Jeniffer levantara-se de onde estava sentada e, irritada, apontou um dedo para ela.

—Consegue ver o problema? – Disse, tentando manter-se calma. – Você não está nem tentando! Você não está nem aí para nada – disse, pausando para respirar. – Está fazendo todos nós perdermos tempo, principalmente Rafael. - Jeniffer observou uma lágrima solitária escorrer pela bochecha da garota, mas não calou-se. – Chega de drama, Adélia! Chega de reclamar.

Adélia nunca se sentira tão mal como naquele momento. Seu coração estava pesado dentro do peito, e sua garganta doía por conta dos soluços reprimidos.  Ela encarou Jeniffer, tentando entender aquilo tudo.

O tempo todo, Adélia pensara que era amiga da mulher, mas agora sentia-se como um encosto importuno em suas costas. Sempre pensara que Jeniffer a tratasse bem porque acreditava que a mesma gostasse dela. Pensava que Jeniffer fosse a única a preocupar-se verdadeiramente com seu bem-estar, tanto físico quanto mental.

Adélia não conseguia pensar direito. Estava tão magoada que mal se dera conta quando Jeniffer recolhera suas roupas e saíra do quarto, deixando-a sozinha.

Rafael andara de um lado para o outro em seu quarto, enquanto pensava em possíveis teorias sobre o passado de Adélia.

Tudo o que sabia era que ela fora adotada. E aquilo não chegava nem perto do que gostaria de saber.

—Por onde esteve? – Indagou ao velho que arrastara-se para dentro do quarto, com uma bandeja nas mãos.

—Bom dia para o senhor – Fordy respondera, bem humorado. – Já de pé? Que surpresa!

Rafael suspirou, impaciente.

Fordy colocou a bandeja no lugar de costume, antes de virar-se para encarar Rafael.

O velho parecia cansado, como se não dormisse há muito tempo. Tinha um sorriso persistente no rosto, aparentando estar tudo bem.

—O que há de errado com você? – Rafael indagou, observando o velho sentar teatralmente em sua poltrona.

—Absolutamente nada, meu senhor – disse, cruzando as pernas e relaxando na poltrona. – Aparentemente não posso dizer o mesmo de você, estou certo?

Rafael franziu a testa, embora já estivesse acostumado com a inconveniência do velho.

Ele aproximou-se do mesmo, sentando-se na poltrona oposta, de frente para ele.

—Onde esteve?  - Perguntou, receoso. Fordy havia sumido durante a noite passada inteira, sem nenhum sinal de vida. A única noticia sua que Rafael tivera fora daquela criada que aparecera em seu quarto, com o bilhete de Adélia, supostamente a mando do velho.

—Estive ocupado – respondeu, naturalmente, como se sumisse todos os dias e Rafael fosse um tolo por não saber daquilo.

—Ocupado? Com o quê? – Rafael sabia que Fordy cuidara de Adam, depois do ocorrido. Queria saber o que acontecera depois. – Ele ainda está aqui?

Fordy ergueu-se da poltrona, encarando fixamente Rafael.

—Não se preocupe mais com ele. – Disse, num tom sério. Um segundo mais tarde, ele recostou-se outra vez, fechando os olhos e soltando um suspiro relaxado.

Rafael estava quase enlouquecendo. Queria poder fingir que estava tudo bem assim como Fordy, mas sequer conseguira pregar os olhos.

—Eu preciso saber – insistiu. – Ele foi embora?

O suspiro de Fordy, desta vez, fora de frustração. Ainda de olhos fechados, o velho apenas balançou a cabeça, afirmando.

Pela primeira vez naquela semana, Rafael suspirara de alívio.

— Seu pai estava tão bêbado que acabara desmaiando no processo de subir as escadas – o velho explicara. – Não tinha condições de voltar sozinho. Deixei-o em um quarto de hóspedes... - Fordy observara Rafael inquietar-se com aquilo. – Bem longe do dela, claro. – Tranquilizou-o. – Ele está bem, se é o que deseja saber.

—Não ligo para o bem-estar dele – Rafael confessou. Seu pai já devia estar fora dali há muito tempo, o que o tranqüilizou de certa forma. Mas aquilo era o que pouco desejava discutir. – Eu a visitei ontem à noite. – Murmurou, esperando do velho uma expressão de surpresa. Mas o mesmo continuou de olhos fechados, fazendo com que Rafael quase acreditar que estava dormindo. – Fordy!

Ele o cutucara, mas o velho apenas soltou um resmungo e arqueou as sobrancelhas em resposta. Rafael respirou fundo, embaraçado. Talvez fosse melhor deixar o assunto de lado naquele momento, mas a pertinência da situação exigia medidas drásticas.

—Eu fiz algumas promessas – ele disse, acanhado. Estava realmente muito envergonhado para falar mais alto do que um murmúrio.

—Hum – Fordy respondeu, ajeitando-se na poltrona. – E como pretende cumpri-las?

Rafael suspirou, frustrado.

—Eu não sei – disse, encarando o velho, que não reagia.

Fordy ficou quieto, enquanto Rafael agitava-se ainda mais.

—Fui um idiota – ele continuou, como Fordy esperava. – Não deveria ter falado nada. Não deveria ter prometido nada.

—O que diabos o levou a agir de tal maneira? – Fordy tinha um pequeno e discreto sorriso no rosto, como se estivesse se divertindo com a miséria do garoto.

—Ela me pediu... – Rafael engoliu em seco. – Ela me pediu que a deixasse ir embora.  – Ele calou-se, engolindo a bile que esgueirava-se em sua garganta. - E eu implorei que não fosse.

Vagarosamente, Fordy abriu um dos olhos e encarou o garoto, que parecia um animal recém- atacado. Tinha uma expressão nos olhos alarmante, e o encarava petrificado.

Depois de analisar a situação mentalmente, Fordy abriu o outro olho e sentou-se ereto, encarando o garoto.

—O que você prometeu? – Perguntou, fingindo tranqüilidade. Estava preocupado, e sua cabeça começava a doer com aquilo.

—Disse que faria qualquer coisa – ele começou, realmente muito envergonhado. – Que daria o meu melhor e... – Ele engoliu em seco, antes de continuar: - E que a faria se comunicar com os pais outra vez.

Fordy piscou vagarosamente, reavaliando a situação.

—E o que ela disse? Ela acreditou em você?

— Ela me abraçou – respondeu, rapidamente. Sua voz subiu um oitavo nas últimas silabas da palavra “abraçou”, denunciando sua inquietação.

Fordy ergueu as sobrancelhas e depois as abaixou como se estivesse lendo algo surpreendente e complexo ao mesmo tempo.

—Boa, garoto – foi tudo o que disse, antes de recostar-se novamente na poltrona e fechar os olhos. - Muito bom mesmo.

Rafael ficou confuso, esperando que ele dissesse algo mais, mas o velho aquietou-se novamente, suspirando de vez em quando.

—Não há nada de bom nisso, Fordy – rebateu, tentando mostrar com aquelas poucas palavras a gravidade da situação. – Você não entendeu? – Ele observou, indignado, Fordy apenas balançar a cabeça, concordando. – Leve-me a sério, velho.

 Com um suspiro frustrado, Fordy ergueu-se novamente do encosto e encarou o garoto.

—Tudo o que tem para fazer é cumprir suas promessas – respondeu, como se fosse a solução mais óbvia.

—Eu não sei como! – Rafael rebatera, cerrando os dentes. – É tão difícil de entender assim?

—Então porquê prometeu? – Fordy disse, com um sorriso.

Estava zombando dele.

Irritado, Rafael levantou-se e pôs-se a caminhar pelo quarto. Estava na cara que Fordy estava fazendo descaso de sua situação, mas como poderia culpá-lo? Rafael havia se metido naquilo, era obrigação sua resolver o próprio problema.

—Escute, garoto – Fordy começara, naquele tom que indicava a vinda de um sábio conselho. Rafael atentou os ouvidos, mas não o encarou. – Admiro sua coragem de prometer coisas do tipo. Não há nada de errado em querer dar o seu melhor para ela – ele disse, tranquilamente, embora firme. – Não é tão difícil assim quando gostamos da pessoa.

—Eu não gosto dela – ele rebateu, indignado com aquela suposição. Quem Fordy pensara que era para deduzir algo do tipo?

—Então a mande embora – ele disse, solucionando o caso. – Pensei que fosse o que você mais queria.

Rafael abriu e fechou os lábios, mas não tinha argumento. Lembrou-se dos dias em que implorara para Fordy organizar sua partida, assim que ela chegou. Não queria conhecê-la de forma alguma. Mas agora...

—O que está acontecendo comigo, Fordy? – Havia medo em sua voz, e surpresa.

Ele encarou o velho, que estava recostado na poltrona o encarando, tranqüilo.

—Eu não sei – respondera, apenas.

Rafael parou de frente para a janela, distraindo-se com os pingos de chuva que começavam a cair.

—Preciso conhecê-la de verdade – decidiu, virando-se para encarar o velho atrás de si. – Eu quero conhecê-la de verdade.

—E o que está te impedindo?

Rafael pensara por um momento, desviando o olhar novamente para a paisagem cinzenta do lado de fora.

—Isso é perigoso – disse, num murmúrio sério e alarmante.

—Acha que ela esconde segredos sombrios? – Fordy soara mais irônico do que desejara, mas aquilo não apareceu incomodar Rafael.  Ao invés disso, o garoto deu de ombros.

—É uma possibilidade.

Fordy assentiu, de forma motivadora.

—E como pretende fazer isto? – Perguntou, curioso. – Vai chamá-la para jantar?  Ou tomar um chá, talvez. Assim seria a melhor forma de conversar com alguém...

—Não – respondeu. – Vou perguntar a você.

—Ah! – O velho exclamou, achando graça. – A mim? O que o faz pensar que sei alguma coisa sobre ela?

Rafael o encarou de forma ameaçadora.

—Imagino que Adam o tenha passado algumas informações importantes – deduzira, pressionando o velho inabalável. - De onde ela vem... – Sussurrou. – O porquê está aqui...

—Engana-se, garoto – o velho rebatera, interrompendo-o. – Não sei de absolutamente nada sobre ela.

Rafael quase acreditou naquilo, se o mesmo não houvesse desviado o olhar para qualquer outro lugar que não fosse ele. Era um sinal claro de que estava mentindo.

—Por quê ela foi escolhida, Fordy? – Pressionou, enquanto aproximava-se do velho.

Fordy, outrora tranqüilo e relaxado, estava ereto na poltrona, agitando as pernas em sinal de impaciência.

—Tsc,tsc – ele revirou os olhos quando Rafael se aproximou dele, sentando ao seu lado. – Tenho o direito de me manter calado.

Rafael suspirou, irritado com teimosia do velho.

—Vou descobrir de qualquer forma – disse, levantando-se e pondo-se a caminhar novamente pelo quarto.

—Tem algo importante que você precisa saber – Fordy chamou sua atenção, fazendo-o encará-lo intensamente. Rafael ficou à espera, sentindo a ansiedade subi-lhe pela espinha e atingir seu peito, fazendo seu coração bater mais forte com a expectativa. – O seu café vai esfriar.

Com isso, o velho recostou-se na poltrona, fechando os olhos enquanto tentava controlar o sorriso que brotava em seu rosto.


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Notas finais do capítulo

Ah, e não esqueçam de dar uma conferida no Tumblr da Fic, onde acabei de postar o capítulo extra prometido.

Está muuuuuuuito emocionante (e quente)! RSRS

Vale a pena conferir ---> http://milefer-r.tumblr.com/



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