Adeus, Viajante escrita por MogeBear
Denver, Colorado, 2015 – Lottie
Ruby me convidou a comer na cafeteria, mas eu dispensei. Precisava chegar rápido em casa.
Fui correndo, mesmo. Minha casa não era assim tão longe da escola, e quando chegasse, teria uma desculpa para ir direto para meu quarto.
Direi Jane que vou tomar banho, pensei. Então, vou direto para meu quarto, falar com Jonny.
Deixá-lo em meu quarto foi uma péssima ideia. E se Jane decidisse fazer uma faxina? E se Oliver entrasse lá sem minha permissão, como sempre faz? E se Jonny se entediasse e saísse pela casa, correndo o risco de ser visto?
Eu não estava preocupada com isso até me lembrar que Oliver e Jane estariam em casa, por conta de Maggie.
Pelo menos Maggie não será um problema. Ela nunca entra no meu quarto, pensei.
Cheguei rapidamente em casa. Abri a porta e não encontrei ninguém.
— Eles ainda não voltaram? — Perguntei a mim mesma, fechando a porta.
— Não, ainda não. — Me assustei ao ouvir uma voz familiar. Virei-me e deparei com Jonny sentado na escada.
— Que susto, Jonny! — Eu disse, irritada. — E por que está sentado na escada? E se fossem eles abrindo a porta?
— Me dei conta de que eles ainda não tinham voltado a alguns minutos. — Ele disse. — E eu sabia que era você.
— Como sabia disso? — Perguntei largando minha mochila no sofá.
— Não vou te dizer.
Dei de ombros, fingindo não me importar.
— Tenho algumas perguntas para te fazer. — Eu disse.
— Antes de responder qualquer pergunta, quero que você responda a minha. — Ele disse enquanto se levantava da escada.
— Isso não é justo. — Eu protestei. — Eu falei primeiro!
— Suas perguntas podem esperar. — Ele disse. — Quando vai me levar até Gabriel Smith?
Abri a boca para responder, mas logo a fechei por falta de uma resposta.
Quando eu o levarei até Gabriel Smith?, perguntei a mim mesma. Não posso sair sem avisar Jane e Kile. Não posso sair com Jonny sem avisar Ruby.
— Eu não sei. — Eu disse. — Quanto tempo vai demorar para que sua máquina seja consertada?
— Se eu soubesse o tempo de conserto, eu provavelmente saberia como consertar e não estaríamos tendo essa conversa, não acha? — Ele disse, irritado.
— Não posso sair sem avisar meus tutores. — Eu disse. — E também não posso faltar na escola.
— Claro que pode. — Ele disse.
— Sou menor de idade e quero um futuro, então não posso. — Eu disse. — Minha ajuda, minhas regras. Sempre foi assim, e não há razão para mudar essas regras agora.
— Por que você não esquece dessas regras ridículas, me ajuda a voltar ao ano de 3002, e volta para sua vidinha sem graça? — Ele perguntou, impaciente.
— Minha ajuda, minhas regras. — Repeti, ignorando o comentário sobre minha vida ser sem graça. — Agora, Viajante, vou tomar um banho.
Eu disse e subi as escadas, tentando conter minha raiva.
— Eu preciso voltar! — Ele me seguiu até meu quarto, insistindo.
— Ok, então, faremos o seguinte: — Eu comecei. — Amanhã, sábado, vou te levar até Gabriel Smith. Direi a meus tutores que vou viajar com Ruby, e pedirei que ela nos ajude.
Sentei em minha cama, tirando os tênis.
— Hoje iremos até a cidade, onde você fará uma carteira de identidade. — Eu disse. — Conheço um cara que pode fazer uma certidão de nascimento falsa.
— Você conhece gente muito suspeita. — Jonny disse.
— Tem razão, eu te conheço. — Disse. — Não me interrompa quando eu estiver falando.
Peguei uma roupa qualquer em minha gaveta e fui ao banheiro, fechando a porta. Continuei explicando meu plano a ele:
— Compraremos roupas para você. Depois disso, alugaremos um carro. — Eu disse alto enquanto me despia. — Aí começaremos nossa viagem.
— É muito longe? — Ele perguntou quando liguei o chuveiro.
— Não muito, mas são seis horas de viagem. — Respondi, me lembrando da vez em que minha mãe me levou até aquele lugar, me contando a história de como ela e papai se conheceram. Eu reclamava de cinco em cinco minutos, dizendo que estava demorando muito para chegarmos. Ela sempre ria quando eu perguntava se já tínhamos chegado, e então, me falava com um sorriso: “Ainda não, minha filha. Mas já estamos quase lá. Sei que vai gostar muito. ”
— Não vejo defeitos no seu plano. — Jonny disse depois de alguns segundos.
— Que bom. Se você encontrasse algum, iria ficar me enchendo o saco por horas. — Eu disse.
— Eu nunca fiz isso com você. — Ele disse.
— Mas eu sei que você faria isso. — Retruquei.
Sorri ao perceber que o deixei sem resposta. Isso indicava que eu estava certa.
— Quando vamos sair? — Ele perguntou.
— Depois que eu tomar banho. — Eu respondi. — Vai ser meio complicado voltar, já que minha família vai estar aqui, provavelmente.
— Na verdade, nem tanto. — Ele disse. — Se eles tiverem chegado, eu entro pela janela. Não vai ser tão complicado assim.
— Então tudo bem. — Dei de ombros, e depois me senti idiota, pois Jonny não poderia ver.
Desliguei o chuveiro e me enrolei na toalha, secando meu corpo. Jonny permaneceu em silêncio enquanto eu vestia minhas roupas.
Abri a porta do banheiro, deixando o vapor entrar em meu quarto. Ele estava deitado em minha cama, olhando para o teto.
— Ruby mandou desculpas. — Eu disse, procurando minha escova de cabelo.
— Diga a ela que eu não me importo e que não preciso das desculpas dela. — Ele respondeu.
— Ok, eu digo que você aceita as desculpas dela. — Disse olhando em baixo da cama. — Achei!
— Por que você guarda sua escova debaixo da cama?
— Não guardei ela aí. — Eu respondi, começando a pentear meu cabelo. — Ela simplesmente estava aí. Não quer dizer que fui eu quem coloquei.
— Que seja. — Ele deu de ombros. — Termine logo.
— Gosta tanto assim de comprar roupas? — Brinquei.
— Como eu já disse, cada minuto que eu passo no passado é um suplício. — Ele se levantou da cama. — Quero voltar logo para casa.
— Eu já disse que não me importo? — Perguntei.
Ele suspirou, impaciente.
— Te espero na sala. — Jonny disse e correu para baixo.
Que exagerado, pensei. Eu estava só brincando.
Pensei em como me sentiria no lugar de Jonny, e me perguntei se não fui meio cruel e insensível com ele.
Ele tem família para voltar, lembrei-me. Provavelmente uma namorada, amigos... Ele tem uma vida para voltar, Lottie, e está ansioso para fazê-lo.
De repente, me senti mal. Senti como se tivesse machucado alguém que não podia se defender. Era como dizer à Maggie que ela nunca poderia entrar numa briga porque não tinha o movimento de um dos braços. Era como dizer à uma criança que o Coelhinho da Páscoa não existia. Era como jogar sal numa lesma e assisti-la derreter.
Abaixei a cabeça, me sentindo a pessoa mais horrível do mundo.
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