Shadows of the past escrita por larissabaoli


Capítulo 7
Capitulo 7




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Semanas se passaram e pelo menos uma vez na semana eu recebia coordenadas do Abe pelo celular, sempre me pedindo para ir a algum lugar, até que eu decidi que viajaria novamente e dessa vez eu deixei um recado para meus pais, dizendo a cidade para onde iria e pedindo desculpas. Também precisei avisar ao Abe sobre minha próxima cidade, para que ele pudesse me arranjar um carro e documentos, além de uma lista de lugares aonde eu poderia ficar, mesmo ele sabendo que eu sempre preferiria ficar em uma pousada ou hotel e uma quantia que ele insistia em dizer que era um “dinheiro de precaução”.

Minha nova cidade seria Novosibirsk e eu sabia que iria precisar ter um cuidado extra enquanto estivesse lá. Aparentemente essa era a nova área de caça dos Strigoi e eu teria que arranjar um emprego no turno da manhã, por ser mais seguro. Talvez uma cafeteria ou uma livraria, se eu tivesse sorte.

Quando desci do trem, pude absorver a breve sensação de liberdade de chegar a uma cidade e poder explora-la – pelo menos até que Abe me dê uma missão ou eu vá atrás de um emprego e me estabilize em um lugar.

Depois que arranjei um quarto de casal, com uma cama grande e confortável em uma pousada e tomei um banho, me senti mais disposta e depois de trocar de roupa, tranquei o quarto e fui explorar minha nova cidade. As mensagens que recebi, me diziam aonde eu encontraria um carro, dessa vez um Honda Civic 2008 azul marinho, que parecia muito elegante para alguém que precisava ser invisível como eu. É claro que fui atrás de um restaurante primeiro e depois de ter almoçado, deixei o carro estacionado ali próximo e andei por um tempo até achar uma banca, onde comprei uma revista de guia turístico que mostrava os pontos mais bonitos da cidade.

Comecei a visitar os que estavam mais próximos do centro onde eu estava, até que vi a paisagem de uma ponte alta que atraiu minha atenção para a revista. Olhei no relógio achei que ainda tinha tempo para chegar até lá e olhar o por do sol lá de cima e pensar nisso me fez querer ir imediatamente até lá.

Antes de ir passei em uma confeitaria, que me trouxe uma memoria doce amarga do quanto minha mãe estava sendo amigável comigo enquanto estive lá e me permiti ficar triste por tê-la deixado para trás novamente. Comprei alguns cupcakes, entre outros doces e entrei no carro, me perguntando se um dia meus pais teriam a oportunidade de vir comigo em minhas viagens. Parecia algo tão impossível quanto eu finalmente conseguir minha liberdade e conhecer outros países.

Enquanto eu dirigia, não vi quanto tempo havia passado ou o quão enganada eu estava sobre a distancia que eu percorreria até a ponte. Aparentemente a revista possuía um erro de digitação ou algo assim, pois a noite tinha chegado e eu ainda estava indo em direção a bendita ponte. É claro que seria mais seguro eu ter voltado à cidade, mas mesmo de noite, eu achei que a ponte ainda seria um atrativo, já que na foto, ela parecia dar uma vista de toda Novosibirsk.

Quando percebi que já dirigia por mais uma hora e a noite havia chegado, trazendo uma chuva fina que prometia aumentar, eu senti um certo medo e considerei parar o carro e ligar para minha mãe ou algo assim. Claro que me senti ridícula por ao menos pensar nisso e me forcei a parar o carro para me acalmar e pensar melhor. E ao ligar os faróis, vi alguém sentada no chão da estrada e quando as luzes a encontraram, eu reconheci o par de olhos assustados de Rose e saí do carro sem pensar duas vezes.

Ela estava ensopada e com roupas sujas, seu cabelo desgrenhado e seu olhar trazia um pânico e uma tristeza que eu pensei serem totalmente anormais para alguém como ela. Rose se levantou e ao me reconhecer desabou a chorar, eu percebi que seu tornozelo estava inchado e que esse era só um dos vários machucados que haviam nela.

– O que você está fazendo aqui? Achei que você tivesse ido embora! – eu perguntei. O vento e a chuva me deixando no mesmo estado que Rose.

Ela não falou nada e eu sem pensar a abracei e a trouxe para o carro.

Eu não fazia ideia do que ela estava fazendo ou como ela havia parado ali, mas eu sabia o que importava agora era tira-la de lá.

Quando a trouxe para o quarto, ela ainda parecia em estado de choque, mas aparentemente havia se posto numa espécie de piloto automático que a levou a entrar e ir mancando até o banheiro. Tratei de conseguir mais toalhas e deixei na porta junto com roupas minhas para que ela usasse, esperando que tivéssemos as mesmas medidas.

Esperei que ela saísse do banheiro e troquei de roupa, me enrolando em uma manta e ligando o aquecedor um pouco mais alto que o normal (não é por sermos mais imunes a maioria das doenças que não poderíamos acabar com uma hipotermia.) e quando ela saiu do banheiro, já totalmente vestida, sentou na cama.

– Eu o encontrei, mas ele não era mais quem eu esperava – ela começou me dizendo e então me contou toda sua historia do começo, enquanto eu dei a ela comprimidos para dor.

Quando ela terminou, eu não consegui achar palavras para explicar o quanto eu me sentia triste por ela e ao invés disso eu preferi entregar a ela um cachecol para que cobrisse todas as mordidas que tinha em seu pescoço. Ela viu o que eu estava lhe oferecendo e foi até o espelho do banheiro, aparentemente não percebendo quantas marcas trazia no seu pescoço até a clavícula, mas quando os viu eu também vi chegar a vergonha além do entendimento em seus olhos.

– Não é culpa sua – eu afirmei – uma vez mordida, você passa a querer mais e enquanto isso estiver acontecendo você vai estar dependente e...

Eu parei de falar por não saber mais como argumentar.

Ela enrijeceu e me encarou, finalmente percebendo onde estava indo minha linha de pensamento.

– É isso, não é? Isso foi o que aconteceu com você! Foi o Roland, não foi? Isso explica muita coisa. – ela disse mais para si do que para mim.

Eu assenti e fiquei em silencio por um tempo, até que criei coragem para falar, afinal se Rose foi capaz de contar toda a sua historia para mim, eu também contaria a minha historia para ela.

– Eu comecei as minhas fugas quando tinha uns dez anos. Primeiro eu simplesmente não aparecia para dormir em casa, preferindo dormir na casa de Yeva ou vagando por aí e voltando no outro dia. Depois eu conheci uma moça dhampir, o nome dela era Aleksandra e hoje em dia ainda trabalha lá naquele armazém, eu disse a ela que tinha treze anos e ela começou a me dar uns trocados para que eu a ajudasse a ir por o lixo para fora, lavar a louça ou algo simples assim. Na verdade, eu tinha acabado de fazer onze anos e tinha pedido meus pais uma viagem para Inglaterra de presente. Nem lembro o porquê, mas estava fascinada pelo país e fiquei bem chateada quando eles me explicaram que por eu ser adotada e possuir documentos falsos, não era seguro para eu sair do país. Então o trabalho que aquela moça me ofereceu, pareceu tentador para que eu começasse a economizar dinheiro para ir aonde eu quisesse.

“Foi lá que Roland me viu pela primeira vez. Quase todas as noites eu o via com uma garota diferente e ele me pagava mais para que eu trouxesse comida e bebida para as garotas humanas ou dhampirs que ele trazia para um dos quartos. Eu era inocente ainda e não fazia ideia do que estava acontecendo ali e uma noite eu o vi entrar sozinho no quarto e mesmo assim ele me pediu para que eu trouxesse algo para ele e eu sem entender acabei indo.”

Eu pausei e olhei para Rose que parecia chocada, com a boca aberta e me encarando. Eu respirei fundo e continuei.

– Não lembro quanto tempo eu passei dentro daquele quarto. Todas as noites ele passou a vir, me usar, se alimentar de mim e depois me deixava trancada ali. Mas devido ao tempo em que ele passou em posse do quarto e eu não ter mais aparecido para trabalhar, Aleksandra começou a desconfiar já que ela era a responsável pela “organização” daquele lugar. Quando ela veio bater na porta do quarto, eu me movimentei o mais rápido que pude para bater de volta, pedindo socorro. As endorfinas já não eram o suficiente para me manter pacificada, por eu estar com fome e fraca e a escuridão ter começado a tomar conta de mim, me trazendo as dores de cabeça. Quando Rolan viu que eu estava tentando pedir ajuda, ele me pegou pelos cabelos e se mostrou muito pior do que já havia sido enquanto me batia.

“É difícil saber quanto tempo permaneci naquela situação, mas a dor era algo que eu nunca havia sentido daquela forma, em todos os lugares do meu corpo e foi um alivio quando ele cessou de me bater e eu percebi que alguém havia arrombado a porta. Esse alguém era na verdade Abe e seus seguranças e então Abe me tirou dali enquanto mandava seus seguranças retribuírem o que Rolan havia feito comigo. Precisei de uma semana inteira para me recuperar e quando voltei duas semanas depois para casa, minha mãe ficou tão desesperada que entrou e minha mente e em seguida ficou em estado de choque. Eu precisei acalma-la e impedir que meu pai fosse até a cidade para matar Rolan. Desde então minhas fugas se tornaram mais constantes e eu ainda possuo alguns traumas do que passei, mas não é nada demais.”

Eu percebi que estava encarando a janela e que a chuva continuava torrencial lá fora e então olhei para Rose que continuava a me encarar em choque.

– Nossa, se eu soubesse que era isso que levaria você a ficar calada, eu já teria tentado lhe contar – eu tentei falar num tom brincalhão, mas não funcionou.

– Você sabe o quanto eu quero voltar para a Baia e mata-lo eu mesma agora? – ela me disse apertando o copo vazio que eu havia lhe entregue nas mãos.

Eu me movi para perto e tomei o copo de suas mãos. Ela não precisava de mais um corte ou arranhão.

– Já passou, Rose – eu segui em frente – de alguma forma. E eu tenho certeza que Abe não deixaria que nada acontecesse com Viktoria, não enquanto eu estava ali o encarando. Você só cedeu a uma falsa barganha.

– Não importa, eu já ia embora de qualquer maneira – ela disse dando de ombros.

O silencio se instalou até que Rose começou a me falar que precisava voltar para casa e eu peguei meu celular e liguei para Sidney que atendeu no segundo toque e eu pedi para que ela viesse ou mandasse ajuda para Rose, explicando a situação.

– E agora...? – Rose me perguntou enquanto nós sabíamos que estávamos presas ali até que ajuda aparecesse para leva-la para o hospital e para casa.

– Agora nós esperamos, mas primeiro eu vou sair e comprar comida. – eu respondi enquanto pegava as chaves e depois perguntei o que Rose queria.

Quando voltei, tive que acorda-la e depois que comemos eu liguei a TV, mas não assisti por muito tempo e logo caí no sono junto a Rose.

Quando acordei, achei que estava em um sonho ou em alguma experiência extracorpórea onde o que estava a minha frente somente eu estava vendo. No quarto, Rose já estava acordada e conversava com Abe e atrás dele estavam meus pais que me olhavam com expressões neutras.

– Eu acho que você me superou quando se trata de passar de fininho por cantos escuros. Eu pensei que você estava a caminho de Montana. – disse ele com um sorriso triste enquanto falava com Rose.

– Da próxima vez, se certifique de escrever alguns detalhes a mais em sua barganha. Ou só arrume minhas coisas e me mande para os EUA de verdade. – rebateu Rose.

– Oh – ele disse – é exatamente isso que pretendo fazer – ele continuou sorrindo enquanto falou isso, mas havia algo ali que dava a entender que agora Rose iria mesmo voltar para casa, o que no momento era exatamente o que ela queria e precisava, na verdade.

Essa – eu pensei – seria provavelmente a ultima vez que eu veria Rose.


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