Os segredos mais bem guardados escrita por magalud


Capítulo 2
Parte Dois




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Capítulo 4 – Na calada da noite

Lentamente, Rebeca foi se recuperando. Na verdade, foi se recuperando tão bem que os pesadelos diminuíram sensivelmente. Mas ela ainda ouvia a estranha respiração profunda em seu quarto, e podia sentir a mão acariciando-lhe os cabelos.

Ela achava aquele o sonho mais lindo do mundo, e a sensação de ser cuidada era inigualável. Sentindo-se sozinha durante o dia, à noite ela parecia estar sob o olhar vigilante de um anjo da guarda.

Até uma noite que ela percebeu que não era um sonho.

Havia alguém no seu quarto, alguém que lhe acariciava os cabelos todas as noites.

E de repente Rebeca teve medo, muito medo, ao se dar conta de que estava sozinha no quarto com uma pessoa que insistia em ficar invisível no escuro.

Com voz trêmula, no meio da escuridão, ela indagou:

– Q-quem está aí?

O barulho de respiração parou de repente. O quarto ficou num silêncio total. Trêmula, encolhida na cama, Rebeca insistiu:

– Não adianta se esconder. Eu sei que você está aqui. Por favor, não me machuque.

Por alguns minutos, nenhum ruído pôde ser ouvido, e Rebeca quase duvidou de seus próprios ouvidos. Mas finalmente, uma voz aveludada soou ao lado dela:

– Não precisa ter medo.

Ela reconheceria aquela voz em qualquer lugar. Pois era a voz de seu herói, do homem que salvara sua vida daqueles homens horríveis de Voldemort, do homem que povoava sua mente, e do qual ela nada sabia.

Seu herói.

Ela se sentou na cama, estendendo as mãos no escuro, em direção à voz, animada:

– Você!... Eu conheço você! Você me salvou. Eu nunca pude agradecer.

– Isso não será necessário.

– Mesmo assim, eu lhe sou grata, senhor... senhor... Eu sequer sei seu nome.

A voz parecia relutante:

– Escute, senhorita. Não era minha intenção ser descoberto. A poção deveria fazê-la dormir.

– Eu me esqueci de tomar uma poção essa noite.

– Isso explica tudo. Agora se me der licença...

– Por favor, não se vá – ela pediu – Você se preocupa comigo, vem velar meu sono todas as noites. Quem é você? Por que não queria que eu o visse?

– Eu... não sou uma boa companhia. Acredite: estará melhor sem me conhecer.

– Por favor, me diga seu nome. O meu é Rebeca.

– Sim, eu sei quem você é. É sobrinha de Artêmio Gall – ela ouviu um barulho de vidro tilintando, depois sentiu que ele punha algo em suas mãos – Beba isso. Precisa voltar a descansar.

Rebeca pediu:

– Então me dê seu nome. Por favor, senhor.

Pausa.

– Severo Snape.

– Obrigada por tudo... Severo Snape.

Rebeca tomou a poção e devolveu o vidro. Depois, ouviu o ruído da cadeira se arrastando e os passos em direção à porta, que se abriu e fechou.

Ela ficou no escuro, sozinha, imaginando o que ela teria feito para desagradar tanto um homem que estava tão intensamente vivo na sua imaginação.

Regra número um de todo espião: jamais se envolver emocionalmente enquanto estiver numa missão. Essa era uma regra de ouro, a diferença entre vida e morte para qualquer um no perigoso ramo da espionagem. Ela valia em dobro no caso de Lord Voldemort estar envolvido.

Ele tinha que ter ignorado justamente essa regra.

Estúpido!

E depois, para piorar a situação, persistira no erro.

Estúpido! Estúpido!

Snape tinha ido contra todos os seus instintos ao salvar aquela mulher de uma típica sessão de interrogatório dos Comensais. Mas... ele não conseguira se conter. Ele simplesmente agira num impulso, e continuava a agir no impulso.

Tinha sido sua a idéia de colocá-la nas masmorras, ao lado de seus aposentos. Na hora, pareceu-lhe a coisa mais natural a fazer. Todas as noites ele ia vê-la. Não que ela pudesse vê-lo, e era assim que ele queria. Por isso mesmo ele dava poções fortíssimas para que ela não acordasse durante a noite nem sentisse quando ele acariciava-lhe os cabelos.

Porque ele não queria admitir que estava apaixonado.

Perdidamente.

Ele não se dera conta de que isso tinha acontecido, mas agora só no que ele podia pensar era nela.

Rebeca Gall.

Era um amor impossível, especialmente depois que o Lord das Trevas acreditara que ela tinha morrido na mão daqueles dois incompetentes. Antes de saber da "morte", o Senhor das Trevas tinha planos para ela, planos que não tinham nada a ver com Artêmio Gall, mas Snape não conseguira descobrir que planos eram esses.

Isso só fazia aumentar sua afeição por Rebeca. Ele também queria muito protegê-la. Esse tinha sido seu primeiro instinto, desde que a vira presa em sua própria casa, brutalizada por aqueles homens. Ele continuava querendo protegê-la de seus pesadelos, e arriscava-se a viver esse sentimento cada vez que tocava nos cabelos, à noite, geralmente depois de se encontrar com o círculo de Comensais da Morte.

Toda essa paixão não podia ter vindo em hora mais imprópria. Voldemort ainda não estava muito convencido das explicações de Snape sobre sua lealdade, e ele tinha que provar ser um servo fiel – espionando Dumbledore. Este tinha sido o trato que ele obtivera com o Lord das Trevas: enquanto ele pensava que Snape espionava Dumbledore, Snape na realidade, espionava Voldemort para Dumbledore. Um jogo perigoso, mas ele mesmo tinha armado essa cama anos atrás.

Pior do que os riscos que corria, havia algo acontecendo com respeito aos Comensais da Morte, uma coisa que a Ordem iria precisar saber e muito. A movimentação deixada Snape apreensivo, muito mais porque ele não conseguia obter a informação. Isso lhe deixava na dúvida sobre o motivo. Estaria ele fazendo todos os esforços, investindo todos os seus instrumentos na obtenção daquela informação? Ou estaria ele distraído com essas frivolidades do coração?

Jamais tinha imaginado que numa hora tão crucial quanto a volta de Voldemort, ele estaria apaixonado. Bom, se fosse ser honesto consigo mesmo, ele jamais tinha imaginado se apaixonar, especialmente com essa intensidade, daquela maneira – à primeira vista, por uma total desconhecida. Parecia um pesadelo, um pesadelo tão doce que ele não tinha certeza de que tudo era mesmo um pesadelo.

Imprudente.

Insano.

Impensável.

Irresistível.

Snape respirou fundo, procurando se concentrar no som de seus passos ecoando no corredor de pedra. Quando ele se viu frente a frente com a gárgula de pedra, disse a senha:

– Drops de limão.

A imensa estátua de pedra moveu-se para o lado e Snape subiu até o escritório do Prof. Dumbledore com o coração pesado. Havia tanta coisa para se preocupar e só no que ele pensava era naquela moça, naquele diálogo estranho, na péssima primeira impressão que causara e na esperança que ela parecia ao menos simpatizar com ele.

Mas Snape não ousava pensar que pudesse ser correspondido. Uma vez que Rebeca soubesse quem ele era, quem ele tinha sido, ela jamais iria querer vê-lo de novo. Ele seria tolo se pensasse diferente: ele não era atraente fisicamente, com o cabelo ensebado, os dentes amarelados e um rosto marcado por suas nada agradáveis experiências em seus mais de 40 anos. Não bastasse isso, ele era uma pessoa amarga, sarcástica, irritável, mal-humorada e ligeiramente cruel. Qualquer um de seus alunos confirmaria isso. Desde quando aquela moça delicada e gentil que ele vira no quarto das masmorras iria querer qualquer coisa com ele? No máximo, por educação, ela lhe agradeceria pelo que fez e o cumprimentaria se o encontrasse.

Ah, sim, sem mencionar o fato de que ele era um espião, alguém que era reconhecido como ex-Comensal, talvez de volta à ativa como adorador do Lord das Trevas.

Um currículo e tanto.

Amar não era um verbo que o destino quisesse ver Snape conjugando.

A voz de Alvo Dumbledore devolveu-o à realidade:

– Ah, Severo, sente-se. Bolinho de chuva?

– Não, obrigado, diretor – ele se sentou e viu a bandeja de bolinhos bem na sua frente, como que o desafiando a pegar um – Queria falar comigo?

– Sim, na verdade, sim. Estava apenas curioso para saber se obteve algum progresso naquele... assunto sobre o qual falamos anteriormente.

– Infelizmente não – ele sentiu um rubor no rosto ao admitir a sua própria falha – Mas posso sentir que existe algo grande sendo preparado. Já ouvi o Lord das Trevas mencionar vagamente "a arma", mas ele não dá pistas sobre o que poderia ser. Também está claro que para chegar a tal arma, ele precisa de alguma outra coisa, que ainda não obteve e isso o está deixando muito irritado.

Dumbledore acariciou Fawkes, que estava encarrapitado no seu poleiro e disse, numa voz enganosamente doce:

– Isso quer dizer que temos tempo de tentar frustrar os planos de Voldemort.

Aquilo atingiu fundo Snape.

– Estou tentando ao máximo, diretor. Mas o Lord das Trevas ainda não confia totalmente em mim.

– Não foi uma crítica a você, Severo – garantiu Dumbledore – Absolutamente. Sua postura em relação à Srta. Gall foi louvável. A Ordem está em dívida com você – assim como a Srta. Gall.

Aquilo desconcertou Snape. Era um assunto delicado e mal-resolvido dentro dele. Ele se sentia desconfortável ouvindo-o sendo mencionado de maneira tão displicente pelo diretor de Hogwarts. Aparentemente alheio ao silêncio, Dumbledore foi para sua cadeira e disse, sentando-se:

– Aliás, já que estamos no assunto, Rebeca disse ao tio que gostaria de agradecer ao homem que a salvou. Por que não faz uma visita a ela, Severo? Tenho certeza de que ela adoraria.

Snape perdeu o pouco de cor que tinha no rosto. Fawkes olhou para ele, como se estivesse interessado em sua resposta.

Se esse era o caso, o pássaro deve ter ficado decepcionado, porque a resposta não foi nada animadora:

– Não, obrigada. Tenho mais o que fazer.

Os olhos de Dumbledore brilharam:

– Como visitá-la durante a madrugada?

Snape sequer alterou seu padrão respiratório:

– Isso me poupa desses diálogos constrangedores que você estava sugerindo. Posso garantir que estou zelando pela saúde da sua protegida.

O diretor de Hogwarts suspirou e sorriu:

– Faça como melhor lhe aprouver, Severo. Mas Rebeca com certeza apreciaria sua companhia.

O Mestre de Poções pigarreou:

– Diretor, eu certamente gostaria de me concentrar no fato de que o Lord das Trevas está se empenhando em preparar uma ofensiva que ele acredita ser definitiva na batalha que virá. Desviar-me desse caminho...

– ... pode ser produtivo por vários aspectos, sem falar que isso pode ajudar na recuperação da jovem senhorita – completou Dumbledore – Mas eu deixo isso a seu critério, Severo.

Snape agradeceu o chá que não tomou e saiu, sentindo um peso no estômago que nada tinha a ver com refeições passadas ou futuras.

Capítulo 5 – Conversas na madrugada

– Pensei que você não viesse.

A voz de Rebeca cortou o silêncio da noite no quarto escondido nas masmorras, causando uma ligeira alteração no coração de Snape. Ele disse:

– A senhorita deveria estar dormindo.

– Pedi a Madame Pomfrey que diminuísse a quantidade de poção para dormir – Ela se sentou na cama – Eu queria ficar acordada para poder falar com você.

– E o que poderia ser tão importante a ponto de fazer a senhorita mentir para sua curandeira?

– Queria combinar com você para que nós nos falássemos todas as noites. Se quiser, é claro. Eu me sinto muito sozinha, sem ninguém para conversar.

– E sobre o que gostaria de falar?

– Qualquer coisa. Como já disse, eu me sinto sozinha. Você podia me falar sobre você. Posso te chamar de Severo?

– Não estou certo de que essa seja uma boa idéia. Sono é fundamental para sua recuperação.

Ela ficou chateada, mas disse:

– Tudo bem, eu disse que não precisa falar comigo se não quiser.

Num impulso, Snape disse:

– Eu não disse que não queria falar com a senhorita. Mas estou preocupado com sua saúde. A senhorita ficou muito doente.

– Você me salvou, Severo. Por que fez isso, se nem me conhecia?

Ele gostaria de saber a resposta àquela pergunta.

– Porque você precisava. Iria morrer nas mãos daqueles dois.

– E você faz isso sempre?

Outra daquelas perguntas embaraçosas. Droga, a garota sabia fazer perguntas.

– Não. Mas você não tem poderes, portanto, não tem como se defender.

– Eu já lhe agradeci por isso, mas mais uma vez obrigada. Foi muito heróico da sua parte.

– Apenas fiz o que precisava ser feito.

– Posso perguntar o que estava fazendo ali?

"Pronto", pensou Snape. "Agora é que meus sonhos começam a desmoronar."

– Eu sou um espião da Ordem. Trabalho infiltrado entre os Comensais da Morte.

Rebeca respirou fundo, impressionada.

– Oh. Mas que perigo!

Ele deu um riso autocomiserativo:

– A senhorita faz soar como se fosse grande coisa.

– E como não é? Você faz um trabalho importante, sem mencionar o salvamento de moças em perigo.

– Como disse, apenas fiz o que precisava ser feito. Não é nada demais.

– Quando não está espionando para a Ordem, o que está fazendo?

– Sou Mestre de Poções em Hogwarts.

– Mestre de Poções? – ela repetiu – Então é professor na escola?

– Exatamente.

– E isso faz muito tempo? Talvez tenha conhecido meu irmão Cygnus. Ele tinha 15 anos quando foi morto.

– Lamento. Eu não era professor nessa época. Não conheci seu irmão.

– Ele parecia ser um bom aluno. Todos na família se orgulhavam muito dele. Quando ele morreu, todos lamentaram. Acho que lamentaram mais por ter sido ele e não eu.

– Não diga isso.

– É a pura verdade. Nascer sem poderes numa família bruxa é pura crueldade. A discriminação é muito grande. Por isso eu procurei viver como trouxa e esquecer o mundo bruxo. Pelo menos, até agora.

– Receio que isso seja impossível daqui para frente. Você não pode voltar nem para o mundo bruxo nem para o mundo trouxa.

– O Prof. Dumbledore me explicou que a Ordem teve que fazer os Comensais acreditarem que eu estava morta. Eu tenho que ficar em Hogwarts, em completo segredo. Por isso sua companhia me é tão preciosa. Poucas pessoas podem saber de minha existência. E quando eu me mudar para fora deste quarto, isso ficará ainda mais difícil.

– Mudar-se para fora desse quarto? – Snape franziu o cenho – Isso seria muito arriscado. Para onde você iria?

– Para uma cabana na beira do lago. Mas isso só acontecerá quando as aulas começarem.

– Então não vai demorar muito.

– Espero estar recuperada até lá. Vou precisar de minha saúde, se é que vou me virar sozinha numa casa no campo.

– Como estão seus olhos?

– Estou começando a enxergar formas. Antes eram apenas vultos. O progresso é lento, mas gradual.

– E as pernas?

– Ainda estou mancando, mas bem menos. O que realmente me dói muito é o braço. Felizmente é o braço esquerdo, e eu sou destra.

– Pomfrey deu uma estimativa de quando você recebe alta?

– Uma semana depois da mudança para a nova cabana – a voz de Rebeca denunciava o desânimo – Ela explicou que os danos foram muito grandes, e eu não tenho mágica própria para ajudar no processo de recuperação. Mas o Prof. Dumbledore disse que é possível eu me recuperar até lá.

– Mas para isso acontecer, você precisa descansar. Eu posso pegar uma poção para você dormir aqui mesmo, nas masmorras. Espere-me um pouco

.

– Não, não precisa. Eu... posso dormir sozinha. Você... poderia ficar aqui até eu adormecer?

– Está bem.

– Obrigada, Severo. Boa-noite.

– Boa noite.

Na noite seguinte, Rebeca falou a ele sobre a vida de trouxa. Na que se seguiu, Snape lhe falou sobre Hogwarts, e ela confessou seu sonho de um dia cursar a escola.

Depois, na outra noite, Snape falou sobre poções. Rebeca ficou entusiasmada e a conversa durou quase três noites – com Snape garantindo que iria recomendar literatura para que ela se aperfeiçoasse. Rebeca informou-lhe sobre o conhecimento trouxa de ervas e plantas – fitoterapia e medicina tradicional.

Na semana seguinte, quando Rebeca já podia ver quase tudo, Snape viu-se falando sobre sua infância infeliz, e descobriu que os dois tinham muito em comum nessa área: ela também não tinha boas lembranças.

Os dois criaram uma rotina gostosa de longas conversas na alta madrugada. Rebeca parecia bem à vontade em conversar com Snape, e ele imaginou por quanto tempo mais isso duraria. No momento que ela recobrasse a visão e desse de cara com aquele Mestre de Poções alquebrado, velho, amargurado e odiado, tudo estaria encerrado. A moça certamente merecia coisa melhor do que ele.

Mas ele a amaria em silêncio.

– Pode acender aquela vela, por favor?

Snape obedeceu com a varinha:

Incendio! Pensei que gostasse da penumbra.

– Preciso me acostumar com luz. Meus olhos precisam se dessensibilizar – Rebeca olhou para ele – Você está sempre vestido de preto ou é impressão minha?

Ele ficou sem graça:

– Er... sim.

– Legal – disse ela – Eu acho muito chique. Elegante. Aliás, eu acho você muito charmoso, Severo. Se me permite dizer.

– É muito gentil de sua parte. A senhorita também é muito... simpática.

– Você é muito reservado, Severo; quase nunca fala de sua família. Deve ser difícil para eles ter você aqui em Hogwarts todo esse tempo.

– Eu... não tenho família. Meus pais morreram e não tenho irmãos.

– Não, falo de sua esposa e filhos.

– Não sou casado.

– Puxa, é difícil acreditar. Um homem como você... Mas não se preocupe, logo vai encontrar uma mulher e começar sua família.

– Não é uma de minhas prioridades, eu lhe asseguro.

– Eu tenho vontade de ter uma família, criar filhos... Mas com tudo o que aconteceu, eu não sei como vou fazer isso. Bom, talvez não seja para eu ter essas coisas.

– Rebeca, você pode ter tudo que quiser. Você pode fazer o que você quiser. É jovem e forte. Está se recuperando muito bem do que lhe aconteceu.

Ela sorriu para ele:

– Estou, não estou? Eu já ando praticamente sem mancar.

– Isso é muito animador. E quanto aos pesadelos?

– Eles voltaram – ela confessou – Com força.

– Talvez você devesse voltar a tomar a poção. Ela vai ajudar você a descansar. Isso é importante para sua recuperação.

– Eu me sinto tão bem melhor depois que passamos a conversar. Você não se importa de fazermos isso, não é? Digo, eu sei que você preferiria estar dormindo a uma hora dessa, mas...

– Não seja tola – disse Snape – Se eu não quisesse estar aqui, eu não estaria.

– Você é um homem bom. Espero que continue a me visitar quando eu estiver morando na tal cabana perto do lago. Até lá, eu estarei boa e poderei fazer pelo menos um chá para tomarmos. Quem sabe poderemos discutir sobre ervas e ingredientes mágicos?

– Eu gostaria muito. Pena que meus horários em Hogwarts sejam tão exigentes.

Ela lembrou:

– E você também é um espião. Você faz tanta coisa, Severo, é um homem tão ocupado. Eu sou mesmo muito egoísta de lhe tomar esse tempo.

– Não diga isso. São horas agradáveis. Mas você tem razão sobre o que falou. Eu estive pensando.

– Não entendo.

– Você precisa se acostumar com a luz. Hum, acho que tenho exatamente o que você vai precisar.... Me diga o que você acha disso.

Mesmo com a visão precária que tinha, Rebeca pôde ver que ele agitou as mãos em direção à parede oposta à cama dela, murmurando algumas palavras em latim, e ela sentiu o estalido de magia no ar. Fazia tempo que não sentia um tão forte.

Snape parou e voltou-se para ela:

– Consegue ver ali adiante?

– Não. O que você fez?

– Você vai ver de manhã.

De manhã ela realmente conseguiu ver. Afinal de contas, tinha amanhecido.

Severo Snape tinha lhe dado uma janela mágica em plena masmorra.

Capítulo 6 – A mudança

Quando Rebeca menos esperava, chegou o dia de se mudar. Sim, ela já estava esperando por isso e tinha sido alertada, mas ainda assim parecia que tudo tinha acontecido de repente.

Ela entendeu que a cabana onde ia morar tinha sido construída por Hagrid e era usada por ele durante o verão, mas que na verdade ele morava em outra cabana, uma mais perto da escola. Naquela cabana perto do lago ele costumava pescar e tinha uma oficina de consertos de gaiolas para os animais e outras atividades. Rebeca calculou que não fosse uma cabana muito grande, já que só era usada três meses no ano, quando os alunos não estavam ali – por isso eles não sabiam de sua existência.

Madame Pomfrey tinha esperanças de que Hagrid tivesse chegado de sua viagem para ajudar na mudança, depois disse que a presença dele não era realmente necessária. Rebeca não conhecia Hagrid, mas pelo que entendeu, ele era um homem grande e forte, que podia ajudá-la em trabalhos manuais ou no caso de alguma coisa não funcionasse bem na cabana. Sem contar que ele era o seu vizinho de porta – quer dizer, de lago.

A saúde dela estava bem melhor, a visão tinha sido totalmente restabelecida e a perna ainda estava dando um pouco de trabalho, mas o braço era o pior. O Prof. Dumbledore achou melhor que ela recebesse ajuda para se mudar, mesmo que sua bagagem fosse somente a roupa do corpo e uma muda doada por Madame Pomfrey.

Portanto, um dia antes de as aulas começarem, Rebeca fez uma trouxinha com sua muda de roupas extras e foi levada por um pequeno comitê rumo ao outro lado do lago. Madame Pomfrey, o Prof. Dumbledore e Minerva McGonagall lideraram o cortejo, e Rebeca se decepcionou por não ver Severo Snape entre eles.

Enquanto atravessava Hogwarts, ela tentou reparar nos corredores, nos retratos, na luz que o sol da tarde de verão trazia; enfim, em toda a atmosfera da escola onde ela tanto quisera estudar. Como todos estavam andando devagar por causa de sua perna ferida, ela teve tempo de olhar em volta e reparar em tudo que lhe chamava atenção, nas salas de aulas, nas tochas eternamente acesas, e até no Salão Principal já sendo decorado para a chegada dos alunos. O Prof. Dumbledore ia mostrando alguns dos locais por onde eles passavam.

Depois, a passos lentos, o grupo foi em direção a uma grande árvore que parecia dominar um campo ao lado do castelo. Aquele deveria ser o Salgueiro Lutador, calculou Rebeca, que ouvira as histórias sobre a árvore. Além dele havia alguns penhascos. Todos desceram as pequenas colinas escarpadas, por uma estradinha quase imperceptível ao olho destreinado. Alguém que estivesse passeando por ali certamente não teria visto o caminho.

A passagem descendente os levou a uma margem distante do lago e lá eles

continuaram a andar. Rebeca sentiu a perna machucada arder de dor, mas não reclamou. Depois de tanto tempo trancada num quarto, ela não iria desperdiçar a oportunidade de esticar as pernas e apreciar a natureza maravilhosa ao redor do Castelo de Hogwarts em plena tarde de verão.

Após caminharem uns poucos minutos, a estradinha se afastou da margem do lago e embrenhou-se por uma mata que parecia fechada, mas estava bastante iluminada pelo sol entre os galhos. Rebeca reparou que o lago continuava à vista.

De repente, lá estava ela: uma cabana de madeira, com uma varanda pequena. A relva estava na frente da soleira, e havia muito espaço verde – felizmente as árvores não atulhavam o local. À primeira vista, Rebeca pensou que se tratava de uma casinha de bonecas, de tão pequena.

Lá dentro, ela mudou de idéia. Ela viu que a porta era larga e a janela também. Quando ela entrou no local, viu que era maior do que aparentava. Havia uma lareira de tamanho bem razoável, lenha para um ano inteiro, uma poltrona que podia acomodar duas pessoas e uma mesa que parecia caber seis pessoas, mas só havia duas cadeiras grandes. O teto era muito mais alto do que aparentava, e estava cheio de material de pesca, bem como armadilhas e cordas variadas. Rebeca se perguntou o que faria com tudo aquilo.

Havia um outro aposento, um quarto pequeno, mas que parecia ainda menor por causa da cama imensa. Um pequeno armário para roupas e uma cômoda, todos de madeira rústica, compunham a decoração. Rebeca ainda estava impressionada com o tamanho dos objetos.

O Prof. Dumbledore disse:

– Construímos uma pequena sala de banho temporária do lado de fora até que a reforma possa ser feita para incluir um banheiro interno na casa. Lamento por esse incômodo.

Rebeca estava sorrindo:

– Professor, isso é muito bonito. O senhor não me disse que era tão bonita.

– É claro que você pode fazer as modificações que quiser. Basta me dizer o que deseja mudar e eu providenciarei. Ah, eu já ia me esquecendo – ele agitou a varinha. - Winky! Venha aqui, por favor.

Do ar, surgiu uma elfa doméstica. Ela parecia assustada, os grandes olhos verdes arregalados, um vestidinho surrado cobrindo-lhe o corpo pequeno. Dumbledore chegou perto dela:

– Venha, por favor, Winky, eu quero que você conheça sua nova amiga. Esta é Rebeca Gall, e ela vai morar nessa cabana. Eu gostaria que você a ajudasse com a limpeza e manutenção da cabana, e que trouxesse as refeições da cozinha de Hogwarts para ela todos os dias.

Rebeca arregalou os olhos:

– Uma elfa doméstica? Professor, eu não posso aceitar! Desculpe, Winky, não quis ofender. Eu é que não sou digna de ter uma elfa. Não sou bruxa.

– Bobagem – disse Dumbledore – Winky é necessária. Você não pode se manter sozinha. Winky terá a responsabilidade de cuidar para que você fique confortável na cabana.

Rebeca olhou a elfa e indagou:

– Você quer fazer isso, Winky? Não quero que se sinta obrigada.

A elfa olhou para o Prof. Dumbledore, depois para Rebeca e perguntou:

– Mestra quer saber se Winky quer ajudar?

– Isso mesmo.

Winky soltou um longo uivo e depois tapou o rosto com as mãos, chorando:

– Jovem Mestra é boa demais para Winky! Tão boa quanto Harry Potter! Winky não merece! Oh!

Rebeca se assustou:

– Desculpe, Winky. Não quis fazê-la chorar... Olhe, esqueça que eu falei alguma coisa.

Winky assoou o nariz na manga do vestidinho e disse:

– Jovem Mestra muito boa para Winky. Winky vai cuidar de Jovem Mestra!

Dumbledore bateu palmas:

– Excelente! Isso me tira uma grande preocupação da cabeça. Winky, você também vai ser um importante meio de comunicação de Rebeca com Hogwarts. Se bem que quanto a isso, eu estava esperando um outro fato.

Minerva McGonagall apertou os lábios e disse a Dumbledore:

– Ele disse que viria mais tarde, Alvo.

– Ah – Rebeca não entendeu nada, mas Dumbledore explicou – O Prof. Snape quis lhe dar um presente para facilitar sua vida, mas parece que ele se atrasou. É melhor eu deixar que ele mesmo lhe explique quando chegar. Enquanto isso, deixe eu lhe explicar algumas coisas sobre a cabana. Como você sabe, ela era uma cabana de verão para Hagrid, e muitas coisas aqui ainda são dele. Eu não quis tirar nada para que ele pudesse achá-las quando voltasse. Mas se você não quiser alguma coisa dele, pode separar e Winky se encarregará de levar até a cabana onde Hagrid mora.

– Está bem. Será bom conhecer um vizinho. Quando ele volta?

– Er... Isso ainda não é conhecido, mas você não deve se preocupar com isso. Minerva está aqui para ajudá-la com os móveis.

– Os móveis?

– Hagrid é um tanto quanto volumoso, e os móveis que ele construiu tendem a ser um pouco espaçosos demais. Imaginei que talvez você quisesse substituí-los. Minerva pode fazer isso.

– Oh, eu adoraria.

Minerva disse:

– Mas seria bom que você verificasse seu guarda-roupa antes de trocá-lo. Todas as roupas, sapatos e acessórios que estão lá dentro são seus e servem em você. Se por acaso você não gostar de alguma coisa, podemos trocar também.

– Claro – Rebeca sorriu – Uma professora de Transfiguração pode ser muito útil.

Madame Pomfrey disse:

– E pensem numa mesinha alta para os remédios, por favor. A Srta. Gall ainda está sob cuidados médicos.

Winky indagou, preocupada:

– Jovem Mestra está doente?

O Prof. Dumbledore explicou:

– Isso mesmo, Winky. Por isso Rebeca precisa tanto de sua ajuda. Ela não pode fazer tudo sozinha.

Os grandes olhos verdes se voltaram para Rebeca e a elfa acenou a cabeça:

– Winky ajuda Jovem Mestra! Jovem Mestra pode descansar agora.

Rebeca pediu:

– Winky, por favor, pode me chamar de Rebeca.

– Jovem Mestra quer que Winky chame Jovem Mestra de Jovem Mestra Rebeca?

– Não, Winky, só Rebeca.

– Mestra Rebeca?

Rebeca deu de ombros:

– Acho que é o máximo que vou conseguir.

Dumbledore sorriu com os olhos e disse:

– Vejo que as duas já estão se dando bem. Espero que você seja muito feliz nessa casa nova, minha criança. Talvez goste de saber que essa casa tem um feitiço para desencorajar alunos curiosos a virem para esses cantos do lago. Eles não sabem o contra-encantamento para fazê-la visível. Estará protegida aqui. Já sabe que estarei à disposição para qualquer coisa que você precisar.

– Professor, eu nem tenho palavras para agradecer. Tudo parece ótimo.

– Madame Pomfrey vai arrumar seus remédios e dar-lhe todas as recomendações necessárias. Infelizmente tenho que voltar ao castelo para preparar a chegada dos alunos e dos novos professores para o ano letivo.

– Eu entendo, professor. Mais uma vez, obrigada por tudo.

– Boa sorte, minha menina. E não se esqueça de que Hogwarts fará de tudo para ajudá-la.

Dumbledore se foi, mas Rebeca ficou ocupada durante muito tempo com as duas matronas de Hogwarts, ajeitando sua casa e recebendo instruções sobre os remédios que ainda deveria tomar.

A animação da novidade e a excitação a fizeram esquecer um pouco do desapontamento que sentia por Severo Snape não ter aparecido num momento tão importante para ela.


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