A Dream Twice escrita por laurakr


Capítulo 17
Capítulo 16


Notas iniciais do capítulo

Gente primeiramente, mil desculpas pela demora! Sem contar as coisas que me ocuparam - na minha escola há algo chamado feira de projetos - esse foi o capítulo que eu mais custei a escrever, e olha que nem está tão bom assim :( Quando não era falta de tempo, era falta de inspiração D:
Em segundo lugar, mas não menos importante, desculpa também as pessoas que me mandaram reviews (L) e eu não respondi, não é que eu sou mal-educada ou algo do tipo, eu tava realmente sem tempo... >.
A música que eu ouvi conforme o escrevia é Find a Way - Safetysuit, mas acho que a que mais combina mesmo, seria The only exception - Paramore :)



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– Tony...

– O quê?

– Sabe... É que ontem eu estava conversando com a minha mãe, e ela me perguntou o que eu esperava do meu futuro...

– Hum... Acho que é normal os pais fazerem esse tipo de pergunta para os filhos. Isso te preocupou?

– Um pouco.

– Por quê?

– Ah... Como posso explicar? Quando eu olho pro meu futuro... Tudo fica branco e eu não consigo ver nada. Estranho, não?

– Nem tanto. Talvez isso aconteça porque você nunca pensou realmente sobre isso.

– Mas eu não sinto que seja assim.

– O que você sente então?

– Eu não sei. Talvez eu goste demais do presente pra conseguir enxergar outra coisa além disso.

– Entendi. Mas se formos ver... Não há mesmo motivos para nos preocuparmos com o futuro. Porque uma vez que ele chegue, já terá se tornado o nosso presente. Deveríamos mesmo é nos importar com o passado, porque ele constrói quem nós somos, e o presente, um dia se transformará nele. Isso sim é que é preocupante.

– Como assim?

– É porque as coisas passam Kate. Esse momento, por exemplo... Será que daqui a dez anos você conseguirá se lembrar dele? De uma conversa tão comum como muitas das quais ainda farão parte da sua vida?

–...

– A verdade é que não dá pra lembrar tudo e seria humanamente impossível fazê-lo. Os pequenos momentos que passamos com as pessoas são os mesmos que vão construindo o que sentimos por elas. E quanto mais importante a pessoa se torna para nós, mais comuns se tornam esses momentos. E então chega uma hora em que tudo isso começa a se acumular no nosso inconsciente, formando uma mistura de sentimentos e lembranças. Sabe aquele amigo de longa data que você nem se lembra direito de como o conheceu, mas que faz parte da sua vida e você se importa mais do que deveria?

– Não sei se entendi o que você está querendo dizer...

– O que eu estou querendo dizer é que no fim, aqueles pequenos momentos sem importância se transformarão em uma lembrança só. A lembrança que você tem daquela pessoa. E um dia, conforme o tempo passar, aquela pessoa se tornará uma lembrança também. E como lembrança, conseqüentemente poderá ser esquecida.

– Você tem medo de que eu te esqueça?

– Sim, o futuro é um pouco assustador e eu tenho medo de que a vida acabe nos separando, afinal nós só temos quatorze anos.

– Isso me irrita, sabe? O futuro é muito incerto, é por isso que eu não sei o que esperar dele.

– Você pode não saber sobre o seu futuro, mas quando olhar pra trás – para o seu passado - eu espero que você se lembre de mim. Espero que possa se lembrar das pequenas coisas que passamos juntos, como uma parte de você. Como algo que você não trocaria por nada.

– Eu faria isso mesmo se você não me pedisse.

– É mesmo? Então só pra me certificar, transmita a seguinte pergunta a Kate de daqui a dez anos: “Quando você olha para o seu passado... O que você vê?”

– Idiota... Se você quer se certificar, então fique ao meu lado e pergunte você mesmo.

– É... Essa não é uma má idéia. Desse jeito eu aproveito pra perguntar a mesma coisa sobre o futuro e o presente.

– Eu tenho certeza que mesmo daqui a dez anos, a resposta para essas três perguntas... Será a mesma.

Sabe... Há certos tipos de sentimentos que não podem ser mudados. E embora eu acreditasse que poderiam ser evitados, percebi que nem sempre temos o controle dos nossos pensamentos. Quando você conhece uma pessoa, por exemplo, e sabe que ela te fará sofrer. Você faz o possível para ficar longe dela, porque sabe das conseqüências que ela pode trazer pra sua vida. É esse o tipo de armadura que eu tenho usado egoístamente para me proteger. Até agora eu tenho feito o possível para fugir e evitar tudo o que eu sei que me fará mal. Mas os pensamentos têm sido traiçoeiros comigo ultimamente, e quando se trata dessa pessoa eu não consigo mudá-los. Por isso eu decidi que se não consigo odiá-lo, deveria pelo menos evitar de pensar nele. Porque embora eu não queira admitir, eu tenho medo. Medo de que, se eu parar realmente para pensar nessa pessoa, as coisas saiam de controle.

– Kate? – Meus pensamentos foram interrompidos pela voz de Leonard, me chamando da outra ponta da sala.

O sinal para o intervalo já havia batido. Laila estaria provavelmente chegando, então eu deveria sumir da vista dela. Essa fora uma das condições que ela dera em troca de seu silêncio. Eu deveria ficar longe dela, de Leonard, de Lucas e principalmente de Annie. A verdade é que ela havia proibido Lucas e Leonard de ficarem perto de mim e da Annie também. Provavelmente para me isolar e para que não contássemos nada a Annie, estragando assim o seu joguinho de ameaças do qual eu já estava extremamente cansada. Levantei-me e fui até Leonard – pois ele sentava ao lado da saída – e agradeci por ter me tirado do mundo da lua.

– Não foi nada... Mas acho melhor você se apressar porque senão, já sabe a encrenca.

Mas era meio tarde pra isso. Porque Laila estava parada na porta, seguida das duas garotas que sempre andavam com ela, – parecia até cena de filme – com uma expressão nada agradável em seu rosto.

– O que ainda está fazendo aqui? – Ela disse irritada.

– Nada demais, eu já estava de saída.

Mas ela não fez menção de que me deixaria passar, então Leonard tentou distraí-la.

– Você vai ficar aí parada na porta Laila, quando seu querido namorado tá aqui te esperando?

– Por quê? Estava com saudades da encrenca? – Ela o alfinetou.

– Claro – ele sorriu – já que eu não te vejo mais de final de semana. Por algum motivo você parece evitar a minha casa.

Se ele tentava bajulá-la, definitivamente esse era o modo errado. Vi o ódio arder nos olhos dela por um instante, mas então Laila me fitou e sorriu desagradavelmente. Começou a caminhar em direção a Leonard e sentou-se em seu colo. Como eu odiava ver aquilo e ela havia me mandado ficar longe, caminhei em direção a porta, mas parei logo em seguida ao ouvir sua voz carregada de veneno dizer:

– Eu tenho uma idéia melhor Kate.

Dei as costas a saída da sala e a fitei. Laila estava sentada sobre as pernas de Leonard e seu braço direito o envolvia pelo pescoço. Um sorriso vingativo em seus lábios.

– Porque você não fica?

Eu não entendia qual era a dela, mas obedeci. Continuei estática enquanto ela se aproximava de Leonard para beijá-lo. Não tinha porque me sentir mal com isso afinal, ele não era o Tony. E ele também não gostava dela, só estava se sujeitando a isso pela Annie.

Essa última afirmação me deixava mais tranqüila e ao mesmo tempo aterrorizada, porque ele não precisava fazer aquilo. Continuei observando, enquanto Laila o abraçava juntando seus lábios com os de Leonard. Enquanto ela se atracava nele, fazendo questão de mostrar que nos tinha em suas mãos, Leonard abriu os olhos e me fitou. Ele me fitou e sem importar o que Laila fizesse, não desviou o olhar de mim uma única vez sequer. E eu que até o momento pensei estar aceitando tudo aquilo numa boa, senti como se fosse enlouquecer por vê-lo naquela situação. Era injusto e a vontade que eu tinha era de arrancá-la de cima dele e levá-lo para um lugar bem longe dali.
E conforme ele me fitava, um desconforto enorme ia surgindo no meu estômago e no meu peito, cada vez mais forte e inquietante. Eu me senti uma criança mimada que fora contrariada pelos pais.

Então a porta - que havia sido fechada pelas "capangas" de Laila - abriu-se fortemente enquanto um Lucas desesperado adentrava a sala, chamando a atenção de Laila que levantou-se do colo de Leonard, interrompendo assim o que estava fazendo.

– Kate? Kate, está tudo bem? - Lucas colocara a mão direita sobre o meu ombro enquanto a esquerda pousava em minha testa - Porque está tão pálida?

Eu não respondi. Leonard continuava a me fitar e eu não tinha vontade de desviar meus olhos dos dele.

– O que é que você fez agora Laila? - Lucas se dirigiu a garota.

Ela então se aproximou e me encarou. Sorriu e então soltou, cinicamente:

– Nada demais Lucas, eu estava apenas beijando o meu namorado.

Dessa vez eu não tive escolha a não ser desviar meus olhos de Leonard e fitá-la. Sentia meu sangue ferver, e estava estranhamente débil.

– Porque ela está tão pálida então?

– Não sei Lucas, porque você não pergunta pra ela? - Laila então me fitou e sorriu, vingativa - Vamos Kate, nos responda. Você está assim porque me viu beijando seu namoradinho morto ou está afim do Leonard mesmo?

Ah... Novamente aquela sensação no estômago... Como um embrulho. Incomodava... E doía.

– Ou será que é pelos dois? - O meu silêncio parecia tê-la motivado a continuar.

Lucas provavelmente a teria feito calar a boca a força se eu não tivesse colocado uma das mãos em sua frente quando ele fez menção de voar no pescoço dela, impedindo-o silenciosamente. Mas isso também pareceu motivar Laila ainda mais.

– Qual é a sensação hein? - Ela se aproximava - A de ver outra garota beijando a pessoa que você gosta e não poder fazer nada sobre isso... Principalmente quando essa pessoa é irmão gêmeo do grande amor da sua vida? Trágico, não?

E o embrulho no estômago só aumentava. A vontade de chorar ficava cada vez mais proporcional ao ódio que eu estava sentindo agora. Ódio de mim mesma, ódio de Laila, ódio da situação em que me encontrava. Ódio de Deus por tirar o Tony de mim e que não satisfeito em me ver sofrer, trouxera Leonard pra minha vida. E ódio por me sentir tão confusa e me deixar afetar com tudo isso.

– Ué, não vai falar nada? Vamos Kate, diga alguma coisa.

Apesar de seu tom triunfal, Laila parecia estar se frustrando com o meu silêncio. Mas eu não pretendia dizer nada. Não tinha esse direito. Porque o pior de tudo é que ela estava certa. Eu era a errada. Eu é quem não deveria estar ali, se sentindo tão absurdamente atormentada por vê-la beijando o Leonard. Eu é quem não deveria me sentir bem ao lado dele, eu é quem não deveria ter me aproximado. E acima de tudo, eu não tinha o direito de me sentir confusa sobre ele. Porque ele não é o Tony.

– Mas é muito convencida mesmo... - Laila parecia estar a ponto de explodir - Sempre tão indiferente... Se achando superior, não é? - Eu não fazia idéia do porque, mas era como se a minha existência em si, a irritasse - O que há de tão bom em você, pra agir dessa forma hein? O fato de seu namorado ter morrido em um acidente de carro? - Seu tom de voz aumentava, pouco a pouco - Ou o fato de que ele era o Tony? Você se acha melhor só porque dentre todas as meninas que gostavam dele, ele escolheu a mais patética de todas, que é você? Haha, ele deve é ter ficado com pena mesmo, da besta que você é...

– Não fale sobre o que você não sabe. - As palavras simplesmente saíram da minha boca. Ríspidas e quase num sussurro.

– Não fale você sobre o que não sabe! - Ela havia perdido seu controle de vez - Você se sente tão especial assim por ter sido namorada dele? Pois deixe-me te contar uma coisa queridinha, se VOCÊ não tivesse sido namorada dele, ele estaria vivo até hoje. Ele não teria se envolvido com pessoas como vocês, ele não teria feito viagem nenhuma! Se existe alguém que é culpada pela morte do Tony, essa pessoa é você!

Laila havia surtado. Eu nunca a vira daquela forma, totalmente descontrolada e desesperada. Pensei que ela fosse pular em cima de mim e me matar, mas ao invés disso ela apenas começou a gritar mais e a chorar. Enquanto eu permanecia paralisada e sem ação, apesar de suas palavras me machucarem tanto, eu sentia que merecia ouvir tudoaquilo.

– E você ainda tem coragem de andar por aí toda depressiva, como se fosse a vítima da história... A única vítima dessa história é o Tony! Você é quem deveria ter morrido naquele acidente... !

– Você é louca. - Lucas constatou.

Mas isso não fez com que Laila parasse.

– Agora você acha que pode chegar aqui e fazer de Leonard um substituto da pessoa que você matou? Não satisfeita em acabar com a vida de um, agora você quer a do outro também?

– Quem é você pra falar isso?

Leonard que estava sentado até então, levantou-se e caminhou até a garota descontrolada.

– O que pensa que está fazendo Leonard? - Ela ficara chocada por vê-lo interferindo em seu discurso.

Pra falar a verdade, eu já havia me culpado antes. Eu já havia pensado em mil e uma coisas que, se tivessem acontecido de maneira diferente, teriam evitado a morte de Tony. Mas provavelmente, a maior causa disso tudo, fora o meu namoro com ele. Não sabia o porque de Laila estar me falando aquilo, era como se ela o conhecesse, mas eu certamente me lembraria dela se fosse o caso.

– Estou perguntando, quem é você pra dizer essas coisas? - Leonard continuara - Você, que nem conhecia o Tony, falando que se não fosse esse namoro dele com a Kate ele estaria vivo até hoje? Então deixa eu te contar uma coisa Laila. Tenho certeza de que se tem algo que ele não mudaria na vida dele, definitivamente é esse namoro. Eu tenho certeza de que ele preferiria morrer a ter que abrir mão dos momentos que passou com ela.

Laila abriu a boca para protestar, mas Leonard a interrompeu.

– E quer saber? Eu já to de saco cheio dessa merda toda e de você.

Então ele se aproximou de mim e envolvendo meus ombros com seu braço direito, tirou-me da frente de Laila e me guiou em direção a porta. A garota até então chocada finalmente reagiu e segurou-o pela manga da camisa.

– Você esqueceu que eu posso contar tudo pra Annie, Leonard?

Eu sabia o que ela diria e sabia que o ato de Leonard poderia trazer grandes conseqüências, mas não pude deixar de sentir uma paz e um alívio imenso quando ele disse aquelas coisas sobre o Tony e me defendeu. E também não pude evitar que o leve frio na barriga que surgira, fosse preenchido com o calor de seu corpo devido a proximidade em que nos encontrávamos. De certa forma era como se eu tivesse tomado uma xícara de capuccino em um dia de muito frio - e sim, eu adoro capuccinos.Mas de qualquer forma, eu já tentava me desvencilhar de Leonard para evitar maiores problemas quando vi Lucas puxar Laila pelo braço, fazendo-a soltar a camiseta de Leonard e olhar irritadiça para ele.

– Não se preocupe Laila, eu mesmo faço questão de contar tudo pra Annie.

– O que?! - Ela o fitou incrédula.

– Qual o problema? Não era você que queria tanto revelar esse segredo? Pode deixar que eu mesmo faço isso, afinal quem começou com essa história fui eu.

Leonard então, aproveitou que Lucas a estava mantendo ocupada, para me tirar dali. Nós saímos abraçados da sala de aula e seguimos assim até o páteo onde a supervisora de alunos nos parou e começou a perguntar o que fazíamos ali, já que o sinal para as aulas batera a pouco tempo atrás.

– Ela está passando mal, então eu vou levá-la para tomar um ar até que melhore. - Disse Leonard.

Eu tinha certeza de que isso não colaria, mas a mulher se aproximou e ao me ver fez para Leonard uma expressão de "oh, entendo" e nos deixou em paz. Fomos então para a parte de trás da escola, onde ficava o antigo campo de futebol. O local quase não era mais utilizado, devido a construção da quadra coberta na parte da frente. Nos sentamos na pequena arquibancada de três degraus que havia somente de um lado do campo e ficamos em silêncio.

Então eu me perguntei o porque de estar ali sentada perto dele. Me perguntei o porque de querer estar ali e me perguntei o porque de sua presença ter me feito tão bem naquela hora.

É engraçado... Não é Tony? A vida realmente pode nos surpreender. Naquela época eu tinha certeza de que a pessoa que estaria sentada ao meu lado hoje em dia, seria você. E quando eu te disse, que toda vez que eu pensava no futuro tudo se tornava branco, no meio de tudo aquilo... No meio de toda a incerteza de como a minha vida seria, a única coisa que eu conseguia enxergar... Era você.

Eu estou com medo. E me sinto sozinha.

E eu tinha certeza de que quando você me fizesse aquelas perguntas, a resposta para todas elas seria a mesma. Mas se você me perguntasse hoje... O que eu vejo quando olho para o presente... Eu não saberia o que te responder.

Então eu comecei a me perguntar o porque de Leonard estar ali comigo. Porque ele não deveria estar, e eu não deveria querer que ele estivesse.

Me desculpe Tony, talvez seja porque vocês se parecem tanto, mas ele... Faz com que a solidão não seja tão assustadora. Ele me traz um pouco de esperança. Ele me traz um pouco de você.

Eu sei que deveria ser ao contrário, mas as coisas têm ficado mais calmas quando ele está por perto. Talvez seja por tudo o que ele fez por nós. Talvez porque agora eu saiba que ele não é uma má pessoa... Mas eu sinto que naquela escuridão toda que a nossa vida se tornou depois que você partiu.... Pouco a pouco... Eu consigo ver uma luz piscar esporádicamente. Embora ela seja pequena... Embora eu não a tenha percebido até agora... Talvez a luz se torne maior no futuro.

– Kate... Posso te perguntar uma coisa?

Ei Tony, me responda... Desde quando eu me sinto dessa forma?

– Afinal de contas, porque você olha tanto pro céu?

Ah... Então eu estava fazendo aquilo novamente não é? Tinha virado um costume e eu nem percebia mais quando fazia isso.

– Porque deve ser bom ser um pássaro.

Leonard sorriu de canto, calmo, porém um pouco surpreso. Não o culpo, é realmente um motivo idiota.

– Pensei que fosse por causa do Tony. Então na verdade você só queria voar.

– Talvez no começo fosse por causa dele. Achava que se ficasse mais perto do céu, ficaria mais perto dele. Mas ultimamente... Comecei a pensar em como deve ser bom poder sair voando por aí e deixar seus problemas para trás.

– Mas sabe... Isso não mudaria nada.

– Sim. Toda vez que eu olhasse para o céu, eu me lembraria dele.

Apesar da presença de Leonard tornar a solidão menos assustadora, ela ainda existia. E doía.

– Você nunca vai conseguir voar do jeito que está agora, sabia?

Conforme falava, Leonard me olhava de um jeito calmo e sorria.

– E se você continuar a viver do jeito que veio vivendo nesses últimos dois anos, não vai ser capaz de voar nunca.

– Que jeito?

– Triste e pessimista.

– Pessoas não podem voar. - Constatei o óbvio.

Então ele me olhou reprovadamente.

– "Pense em uma coisa bem boa, que num instante você voa".

Eu o fitei.

– Ou você se esqueceu?

Então eu sorri.

– Peter Pan.

E ele retribuiu o sorriso.

– Que bom que se lembra.

Sabe... As coisas seriam mais fáceis se eu pudesse odiá-lo. Daí eu não teria que sentir essa culpa por tê-lo tratado mal e por não suportar ficar perto dele. Porque o problema não é que eu não o queropor perto. Isso seria a solução. O problema em si é que eu o quero por perto. Eu só não sei se isso é por ele ou pela aparência dele. Então seria melhor, se ele tivesse ficado longe.

– Obrigado Leonard.

– Pelo quê?

– Por tudo que tem feito por nós.

– Eu não fiz nada demais.

– Fez sim. Você nos ajudou e nem mesmo tinha um motivo pra isso, pelo contrário.

Leonard que até o momento me fitava, desviou o olhar para algo no horizonte, pensativo.

– Eu tinha sim.

Antes que eu dissesse alguma coisa ele me fitou, e nossos olhos se encontraram novamente. Sabe... Por um instante eu fiquei presa. E agora que penso melhor sobre isso... Talvez eu tenha ficado mesmo. Talvez a palavra pronunciada em seguida de modo tão seguro e certo, tenha me atado a ele para sempre.

– Você.

Mas naquele momento o único sentimento que eu conseguira discernir era indignação.

– Não é justo você dizer essas coisas quando tem a mesma cara que a dele.

– Porque não?

Leonard ainda estava me olhando daquela forma, e antes que não conseguisse mais evitá-lo eu me levantei da arquibancada e comecei a correr até atravessar o campo de futebol. Mas ele me seguiu e como o campo era um tanto extenso, só consegui chegar até o outro lado, sendo alcançada. Como não tinha mais forças para fugir, deixei-me encostar na parede da parte de trás da escola, e fiz a única coisa que não deveria ser feita em uma situação dessas: enfrentá-lo.

Juntei todas as forças que tinha para encará-lo, mas quando o fiz, só consegui ser sincera.

– Sabe... Isso me afeta mais do que você pode imaginar. Me deixa confusa e eu fico a ponto de enlouquecer quando você faz essas coisas!

Foi então que uma expressão travessa surgiu em seu rosto e ele se aproximou, maquiavélicamente me prendendo entre ele e a parede. Sua mão esquerda se posicionou um pouco acima do meu ombro, impossibilitando minha fuga. Aí, com o sorriso mais sedutor de todos, Leonard aproximou-se lentamente e sussurrou em meu ouvido:

– Deveria eu então... Ser um pouco mais injusto?

Eu sabia que aquilo não era sério e sabia que estava demorando até ele fazer algum tipo de gracinha, mas mesmo assim eu não consegui pensar direito. Aquilo me deixara tonta. Então com a expressão mais irritada que consegui fazer, o empurrei o mais forte que pude, a fim de afastá-lo.

Ah... Foi aí. Foi exatamente que eu falhei miseravelmente em enfrentá-lo. Primeiro de tudo: ele é mais alto. Consequentemente tem mais massa muscular do que uma garota de um metro e sessenta. Segundo: eu já havia corrido e perdido toda a força - se é que havia alguma - física que eu tinha. Terceiro: consequentemente eu só consegui afastá-lo uns três passos de mim, e só pra deixar claro, um deles foi porque - após uma expressão de surpresa - ele começou a rir da minha cara.

Daí já podem imaginar. Fiquei lá parada, morrendo de vergonha e de raiva de mim mesma por ter tentado algo tão idiota.

– Dá pra parar de rir?!

Leonard então, com algum esforço, parou de rir e se aproximou novamente, voltando a posição em que estava, mas mais relaxadamente dessa vez.

– Desculpe. - Ele ainda demonstrava vontade de rir.

Estava muito perto, e eu poderia me enxergar nos olhos dele se tivesse coragem pra fazer isso. Mas em seguida veio o golpe final. Pra acabar com qualquer controle que eu achava que tinha sobre a confusão toda que estava sentindo naquele momento. Leonard sorriu - encantadoramente - e disse:

– É que eu não esperava uma reação tão fofa vindo de você. - Então ele começou a rir - Se eu não te conhecesse, diria até que ficou nervosa com aquilo.

Ele se afastou e continuou rindo mais um pouco, até perceber que nenhum insulto ou reação haviam saído da minha boca. Isso é porque eu estava muito ocupada tentando usá-la pra respirar. Por algum motivo sinistro a palavra "fofa" na voz de Leonard, teve um efeito eletrizante sobre mim. Quase como um choque. Sem contar a visão daqueles perfeitos dentes brancos se abrindo em um sorriso bem ali, na minha frente, junto com o azul de seus olhos que uma hora estiveram tão próximos. Mas foi tarde demais quando eu me dei conta de que estava me deixando perder e que deveria sair dali. Porque aquele sorriso - ah, aquele sorriso - havia se aberto ainda mais encantadoramente do que antes.

– Você ficou nervosa! - Ele constatara surpreso.

Enquanto isso eu tentava formular qualquer tipo de resposta ou explicação para aquilo, mas estava difícil de organizar um pensamento com Leonard naquele estado.

– Não. - Foi a única palavra que eu conseguira emitir.

– Sim, você ficou sim!

Então ele se aproximou mais ainda para ver a minha reação, como se tivesse testando um truque novo que descobrira. E mais uma vez, eu fiquei sem saber o que fazer.

– Tá vendo só? Ahahahaha, você está nervosa!

Tudo bem que era tudo muito surreal e que ele não estava sendo sarcástico ou debochado ao dizer aquelas coisas - estava mais pra uma criança boba que ganhara um brinquedo novo - mas pra mim já havia passado dos limites. Então o fitei seriamente ao dizer:

– É porque você não está sendo justo novamente.

Ele sorriu.

– Acho que vai ser meio difícil eu não ser injusto a partir de agora então.

– O q-quê você...

Eu podia sentir o corpo dele colando no meu, e sabe o que eu falei sobre a xícara de capuccino? Pois é, esquece a xícara agora. Tinham jogado o bule todo em mim. O meu coração estava batendo tão rápido que parecia que ele ia sair pela minha boca e eu estava com medo, muito medo. Porque? Bem, você lembra o que eu disse sobre evitar certos tipos de pensamentos para não perder o controle das coisas? Pois é, o controle havia ido pro espaço também. Porque como eu conseguiria evitar esses pensamentos quando eles estavam todos misturados e eu não conseguia discernir nada que não fosse aquele sorriso estonteante a minha frente que se abria cada vez mais ao ver que a confusão em que eu me encontrava só aumentava, conforme ele se aproximava de mim? Mas então, toda aquela confusão na minha cabeça se anestesiou. O sorriso se aproximou demais. E aquela boca sorridente estava agora colada na minha, me tirando o fôlego junto com a razão, que tava quase indo pro espaço também, pra fazer companhia ao controle que eu já tinha perdido. E se eu achava que estava em uma confusão antes, com certeza não se comparava ao fato de que um calor eletrizante que começara no meu peito quando senti meus lábios se chocando com os de Leonard, passeava agora feliz pelo resto do meu corpo se juntando ao enorme frio na barriga, fazendo com que minhas pernas ficassem bambas e eu tivesse que me segurar nos ombros dele para não cair vergonhosamente no chão. Ele pareceu bastante feliz com a minha atitude, pois começou a sorrir conforme aprofundava cada vez mais o beijo. E eu enquanto isso, tentava entender o porque desse turbilhão de sentimentos e sensações, já que eu não sentira nada disso da primeira vez em que ele me beijou. Dessa vez, eu sentia como se fosse derreter e quando percebi já estava correspondendo-o. Foi só quando me dei conta disso que tentei afastá-lo, e para minha surpresa, ele me obedeceu - mas não o bastante ao ponto de descolar seu corpo do meu - e sorriu.Seus lábios estavam avermelhados devido ao contato e eu me assustei comigo mesma ao constatar que a culpada disso era eu.

– Me solta Leonard. - Eu tentava não surtar.

– Porque eu deveria? - Ele parecia estar se divertindo muito com as minhas reações.

– Você está se aproveitando de mim. - Disse séria.

– Eu acho que é o contrário...

– Me solta! - Ok, eu parecia uma criança birrenta.

– Não.

O fitei com cara de piedade, mas ele sorriu mais ainda.

– Olha só, você não disse que ia ficar longe? Não disse que ia me respeitar? Porque está fazendo isso então, hein Leonard?

– Como é que eu posso respeitar alguém que não é sincera com os próprios sentimentos? Você tem certeza de que não me quer por perto?

– Tenho.

– Então porque está nesse estado?

– Eu já disse, é porque você se parece com o Tony.

Mas antes que eu pudesse entender o porque de ter contado uma mentira tão descarada, fui pega desprevenida. Leonard me atacara novamente. E novamente, eu perdi o fôlego e não consegui resistir. O capuccino, o calor, a confusão... Tudo isso voltou e se foi, assim que o beijo rápido de Leonard terminou, mas voltou um pouco quando ele sorriu.

– Eu duvido que você tenha pensado no Tony em um momento sequer desse beijo.

– Tem razão, eu não pensei sobre ele durante o beijo. Mas depois que ele acabou, minha cabeça se encheu de pensamentos sobre o Tony. É isso que eu quero que você entenda. Eu nunca vou conseguir esquecê-lo.

– Mas eu não estou pedindo que você o esqueça. Eu também não estou pedindo pra que você me considere um substituto dele só porque somos parecidos.

– O que você quer então, Leonard?

– Você tem existido por esses dois anos Kate, sem realmente viver.Eu só quero que você viva, e de preferência, do meu lado. Você não precisa se esquecer do Tony pra isso, você não precisa fingir que ele não fez parte da sua vida, pra você ser feliz novamente.

– Eu não sei mais, como fazer isso.

– Eu te mostro.

O que é isso? Esse sentimento nostálgico... Hein?

– Eu não quero Leonard, eu não preciso desse tipo de coisa. No dia em que essa felicidade for tirada de mim novamente, talvez eu não consiga suportar, eu sinto que eu vou me despedaçar de um modo que nem o melhor jogador de quebra-cabeças saberia como consertar. Desculpe.

Desvencilhei-me delicadamente de Leonard e dei as costas a ele. Eu estava certa da minha decisão. Embora eu tenha me sentido viva depois de tanto tempo, eu sabia que uma vez que eu deixasse a felicidade entrar na minha vida novamente, estaria dando brecha pra tristeza que virá logo em seguida. Com passos firmes, segui em frente e tentei ignorar as palavras audíveis de Leonard que ecoavam as minhas costas:

– Eu não vou desistir de você, Kate.


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