Eyes escrita por Brooklyn Baby


Capítulo 2
Um erro que vale a pena


Notas iniciais do capítulo

Sem muito o que dizer, apenas a questão do 11, da qual dou crédito ao filme - a situação acontece no filme. O número 11 é um número importante no estudo da numerologia. Principalmente a hora, 11:11. Segundo a wikipédia: "Os numerólogos acreditam que os eventos ligados ao tempo 11:11 aparecem com mais frequência do que pode ser explicado por acaso ou coincidência. Esta crença está relacionada com o conceito de sincronicidade. Alguns autores afirmam que, ver 11:11 em um relógio é um sinal auspicioso. Outros afirmam que 11:11 sinaliza uma presença espiritual. A crença de que a hora de 11:11 tem poderes místicos tem sido adotada pelos crentes em filosofias da Nova Era. No entanto, os céticos dizem que os exemplos de fenômenos 11:11 em eventos mundiais de Uri Geller (ilusionista e auto proclamado psíquico) são exemplos de raciocínio "post hoc" e predisposição para a confirmação."



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/637994/chapter/2

O que ela chamaria de destino, eu chamo de uma série de eventos estranhos. Fazia exatamente uma semana desde a festa de Halloween, e eu jamais me sentira daquele modo antes. Apesar de mergulhado no trabalho e nos livros, eu ainda pensava na garota de olhos coloridos. Heterocromia central, é o nome exato. Quando a íris tem cores distintas, e uma delas se desenvolve em torno da pupila. Parece com uma explosão. Uma galáxia. É uma anomalia linda, na minha opinião. Desde que ganhei minha câmera fotográfica, ainda um garoto de uns treze anos, tudo o que fiz foi fotografar olhos. Todos eles possuem uma beleza especial que eu gosto de admirar, mas nunca fiz isso durante uma semana. O tempo inteiro. Na tela de descanso do meu computador. Todo o tempo, ela estava lá.

Naquela manhã de segunda-feira, entrei acabado numa pequena loja que ficava ao lado do meu prédio e comprei um bilhete de loteria, como sempre fazia. 11, era o primeiro número no papel. Levei também uma caixinha de chicletes, e o total foi US$ 11,11. O relógio digital acabava de marcar onze e onze. Normalmente, iria a pé para o trabalho, porque sempre acordo na hora e gosto da caminhada. Não era o caso daquele dia, já que havia passado a noite praticamente em claro por simplesmente não conseguir encontrar uma posição confortável na minha cama outrora tão acolhedora. Peguei um ônibus de número 11. Enquanto eu estava em pé ali no corredor, um cachorro começou a latir insistentemente para mim, como se quisesse me expulsar. Todos os olhares estavam sobre mim, e já que faltava pouco menos de um quarteirão, eu decidi simplesmente descer mais cedo. Estava andando na direção do meu caminho costumeiro, quando congelei e vi. Acima de mim. Olhando para mim. Os gigantes olhos que eu vinha admirando, estampados num outdoor. Apenas os olhos e duas palavra, uma marca. Devone Paris. Um anuncio de uma linha de cosméticos sutil e belo.

Coincidentemente, naquela mesma semana, Lucy também começou a trabalhar comigo. Ela era dois anos mais jovem, mas era brilhante. Eu a via me espiando na biblioteca e no laboratório às vezes, e nós não falávamos muito quando estávamos trabalhando. Ela mostrou interesse pela minha pesquisa, e não era como as outras assistentes que pareciam não fazer ideia do por quê estavam ali. Agora percebo que sempre a admirei. Lucy espiava por cima do meu ombro, consciente de que eu não estava trabalhando com aquelas pesquisas. Entrei no site da marca de cosméticos e procurei pela foto, pelo fotografo e enfim pela modelo. Então seu rosto completo, sem máscaras, brilhou na tela diante de mim. Eu não me lembrava da última vez em que me senti tão animado, tão cheio de adrenalina quanto naquele dia. Aime. Aime Marvel. Encontrei um blog pessoal, e mais fotos. Muitas mais. Alguns poemas, alguns trechos de músicas e comentários sobre lugares. “Meu café favorito na terra”, e uma foto de um balcão da cafeteria com vários quadros emoldurados presos por toda parede do outro lado.

— Eu conheço esse lugar — Lucy falou. — Fica no Queens.

Ela perguntou, casualmente, quem era a garota. Fui sincero quando respondi que não fazia ideia. Mas, ainda naquela tarde, eu pegaria o metrô em direção à cafeteria favorita de Aime na terra.

Agora o que tenho é um sentimento quase nostálgico, como se estivesse voltado à dezesseis anos atrás, e estivesse tentando encontrá-la de novo. Quase a mesma adrenalina. Só que parece um pouco mais deprimente. E de fato, é.

Tudo começou com meu filho recém-nascido, Jacob Saunders Dewes I. Poucas pessoas sabem, mas a íris ocular é como uma impressão digital: Ninguém possui íris iguais, nem mesmo irmãos gêmeos. O sistema de escaneamento de íris é muito popular hoje em dia, e foi usado no pequeno Jacob quando ainda estava na maternidade. Eu e minha esposa acompanhamos o processo. Estranhamente, o primeiro resultado mostrou um registro já existente, de um fazendeiro de Ohio chamado George Frey, um homem negro de olhos castanhos, aparentando ter por volta de quarenta anos. Semanas depois, uma equipe de uma clínica ligada a maternidade onde meu filho nasceu pedira que levássemos nosso filho para a realização de exames pendentes. Acontece que os exames não passavam de o pequeno bebê confinado numa sala branca, enquanto duas imagens lado a lado eram apresentadas à ele. Todas as suas reações estavam sendo filmadas, o entusiasmo e preferência por uma foto específica. Ao fim do “exame”, onde uma senhora branca apareceu ao lado de uma senhora negra, Jacob ficou visivelmente interessado na segunda, fazendo com que eu e minha mulher o tirássemos dali aos prantos. Intrigado, decidi investigar, usando como base o nome de um restaurante localizado em Ohio, que fora exibido em uma das imagens em que Jacob se interessara. E fora a viagem mais assustadora de toda a minha vida.

O restaurante me levou até o próximo lugar. Lá estava o beagle da foto para qual meu filho sorrira, latindo para mim nos portões da fazenda. Uma garota que me informou que ali fora o lar do grande e recentemente falecido fazendeiro George Frey, seu pai. E, o que me deixou sem fôlego: A velha senhora que levara meu pequeno filho aos prantos. Uma gentil mulher que também veio me recepcionar. A mãe de George.

Aqui vai uma coisa que precisa saber sobre mim: Sou ateu. Minha pesquisa - e vida - inteira teve como função derrubar a tese de um designer superior inteligente. Porém, eu estaria mentindo se dissesse que todas essas experiencias não estão mexendo comigo, profundamente. Deixando-me terrificado. Lembro que Aime avisou que isso aconteceria. E eu não consigo mais enxergá-la como um fantasma, desde a descoberta de Mia. Foi fácil, muito fácil. Gael tinha todo o programa e o acesso ao banco internacional de registro de escaneamento de íris. E eu tinha milhares de fotos de olhos, convenientemente. Tentamos meus pais, meus avós. Os pais de Lucy, os avós de Lucy. E fora ela quem deu a ideia de tentar por Aime. Eu me senti furioso na hora, sem realmente entender o porque. Talvez eu já sabia o que estava por vir. Um registro fora encontrado.

— Claro — eu disse. — Faz todo o sentido. Aime era uma nômade, provavelmente fez o escaneamento para entrar na América.

Foi quando Gael se virou para mim, com o mais estranho dos olhares, e anunciou que os registros constavam a data do escaneamento há apenas seis meses atrás, na Austrália. “Impossível.” Todos nós ficamos em silêncio.

Aquela descoberta tornou-se um assunto proibido, uma vez que sempre que minha esposa o abordava acabávamos discutindo. Como já disse, não estou pronto para retornar à esse ponto da minha vida. Mas, em uma noite, Lucy pareceu realmente empenhada em me fazer desvendar essa história. Enquanto eu continuava a repetir que aquilo era um erro, ela agarrou o telefone sem fio e ergueu-o diante do meu rosto.

— Eu posso soltar esse telefone no chão. Um milhão de vezes. E, se em uma dessas vezes, ele não cair… Se ele simplesmente flutuar, mesmo que por milésimos de segundos… É um erro que vale a pena ser estudado.

As palavras dela eram minha única motivação enquanto estava preparando a partida e enquanto estava no avião. Agora, na longa viagem de carro até a vila onde a jovem garota vive, sua descrição feita por Erin é um acréscimo à minha curiosidade. Ela está contando sobre como a menina lidava com os outros jovens do lugar. Sobre como é tímida com desconhecidos e como não conhecia muito mais o mundo além da pequena comunidade onde vivia. Tão diferente de Aime. É estranho como minha mente fica brincando comigo, me jogando de um lado para o outro. Uma hora eu tenho tanta certeza de que isso tudo é um erro, na outra, já existem margens para dúvidas. De qualquer forma, aqui estou eu. Deixando o táxi para trás, rumando para dentro da grande e velha construção do centro comunitário de Dunbry. Parece que meus pés estão imersos no concreto.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Me deixe saber se gostou, até a próxima.