Clair de Lune escrita por Lúthien


Capítulo 2
Capítulo 2


Notas iniciais do capítulo

Essa noite parisiense promete um encontro inusitado.



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Após caminhar por vários minutos sem rumo, Felix se viu em um bairro um pouco mais simples do que aquele em que ficava o hotel onde estava hospedado. O lugar era charmoso, e para todos os lados haviam lojas, cafés e bistrôs. A noite estava fresca e estrelas brilhavam no céu. Félix sentiu-se livre pela primeira vez desde que chegara à cidade. Na verdade sentiu-se livre como há muito tempo não sentia. Félix admirava a arquitetura dos velhos prédios parisienses com um sorriso singelo no rosto. Continuou caminhando até que foi parar em uma rua vazia e mal iluminada e ele se perguntava se tinha feito bem em ter ido para aquele lugar.

— Ah, mas eu devo apagado a estrela de Davi pra ter vindo parar num lugar tão escuro. Agora como eu vou voltar? Será que passa táxi por aqui?

Parou em frente a uma igreja antiga para observar arquitetura da construção. Pensava em como era bela aquela cidade e como eram talentosos aqueles que a construíram. De repente ouviu o sino da meia-noite tocar. Naquele instante um carro se aproximava.

“Espero que seja um táxi”- pensou.

Félix olhou para trás e estranhou ao ver um carro era do início do século XX.

Deve ser de algum colecionador, o papi com certeza iria adorar. Vou aproveitar para perguntar como saio daqui.— Félix pensava enquanto o carro parava na sua frente.

— Bonsoir Monsieur! – cumprimentou o chofer.

— Bonsoir

— Gostaria de um passeio, senhor?

— Não, na verdade eu gostaria que o senhor me dissesse onde posso pegar um táxi.

— Um táxi, monsieur? Por aqui não há táxi. Mas posso levar o senhor a um lugar para um passeio bastante agradável.

— Um passeio turístico por essas construções históricas a meia-noite? Foi o que imaginei.

— Não compreendo senhor. O que quer dizer?

— Não é nada. Ah, quer saber? Eu vou, preciso espairecer, conhecer gente nova. Eu aceito ir a esse passeio.

— Então entre.

Félix entrou no carro e o chofer o levou para um local ainda mais afastado. Ao se ver dentro daquele veículo do início do século anterior, Félix sentiu-se estranhamente acolhido. Não entendia o motivo, mas confiava naquele guia estranho que surgiu do nada naquela rua escura.

Nossa, mas é um carro bem elegante! Combina comigo.— Félix pensava enquanto analisava o veículo. Passou a olhar para o lado de fora através da janela, percebeu que as ruas agora eram iluminadas, o local lhe pareceu familiar, mas tinha um aspecto de cidade histórica, parecia algum lugar que conhecia por fotos. Havia bares com música e muitas pessoas andando por todos os lados, seus trajes antigos remetiam à década de 1920. Félix olhava tudo aquilo através da janela ansioso para descer e conhecer melhor aquele lugar. Mas que vilazinha charmosa! Não imaginava que havia esse tipo de serviço pra turistas em Paris. Tenho que trazer Mami e Paloma aqui amanhã, tenho certeza que elas vão amar...

— Chegamos, senhor. Aqui nos separamos.

— Oi? Como assim? O senhor não vai me levar de volta?

— O senhor sempre encontrará um caminho, mas antes há muitas coisas agradáveis para fazer. Tenha uma ótima noite, senhor.

— Então... boa noite!

Saiu do carro e ficou parado na calçada observando o veículo até ele sumir numa curva. De repente se deu conta de que o chofer não lhe cobrou pela corrida - Deve ser um serviço gratuito. E já que estou aqui, vou aproveitar.

Félix olhou bem a sua volta e viu que do outro lado da rua tinha o que parecia ser charmoso restaurante. Do lado de fora algumas pessoas conversavam animadamente. Homens e mulheres, todos usavam trajes de época. Se perguntava se aquelas pessoas eram turistas.

“Será que eu deveria providenciar um terno antigo também?”

Atravessou a rua e entrou no restaurante, lá dentro a animação era ainda maior,  uma música alegre embalava alguns casais que dançavam no meio do salão. Um jovem garçom apareceu para recebê-lo. Félix ficou extasiado com a beleza do rapaz. Era alto, tinha cabelos loiros e cacheados, a pele era alva, seu rosto tinha uma expressão serena que era acentuada pelos olhos verdes acolhedores e os dentes perfeitos, que exibia através de um sorriso doce, valorizavam ainda mais sua beleza.

— Bonsoir monsieur!

— Bonsoir.

— Vai querer uma mesa?

— Uma mesa?... Sim, quero sim - respondeu Félix ainda meio embaraçado, olhando para os lados, mal conseguia disfarçar seu encanto pela beleza do rapaz.

— O senhor pode me acompanhar? Tenho uma mesa especial. - O jovem guiou Félix até uma mesa de onde ele tinha uma visão privilegiada de todo o salão, ao mesmo tempo discretamente localizada

— Essa mesa é perfeita, eu adorei!

— Merci. Aqui está o cardápio. Posso lhe oferecer uma bebida enquanto escolhe o prato?

— Bom, é a primeira vez que venho aqui, você tem alguma sugestão?

— Eu percebi. Nunca vi ninguém como o senhor por aqui.

— Eu não sou francês, eu vim do Brasil.

— Fantastique! O senhor não possui sotaque que o denuncie, seu francês é excelente.

— Merci. Mas por favor, não me chame de senhor, sou Félix. E pode me chamar pelo nome. E você é?

— Nicola, muito prazer.

— O prazer é meu. Enfim, você tem alguma sugestão para mim?

— Se me permite, eu sugiro um coq au vin. E para acompanhar temos um vinho especial.

— Parece delicioso.

O garçom se retirou, não sem antes deixar Félix encantado com seu belo sorriso. Enquanto aguardava o pedido, Félix observava o local e o comportamento das pessoas ainda um pouco confuso. Pensava em como era estranho aquele lugar. Tudo ali, desde a decoração do estabelecimento as roupas das pessoas, as danças e a música lhe pareciam de uma época remota. Perguntava-se que local era aquele. Provavelmente seria uma espécie de “Parque Temático” onde as pessoas viviam como se fosse em outra época, mas nunca tinha ouvido falar de um lugar assim em Paris.

Momentos depois Nicola voltou com o pedido. Enquanto o garçom servia o prato, Félix não sabia se olhava para o comida - que além de um aspecto maravilhoso, tinha um aroma inebriante - ou se olhava para o garçom, tão atraente e gentil.

— Pronto Félix, aqui está. Espero que aprecie. Deseja algo mais?

“Que tal seu Whatsapp, endereço, ficha completa?”

— Não, obrigado Nicola.

— Então atenderei outros clientes. Com licença. Bom apetite! – O garçom se retirou educadamente e Félix o acompanhou com os olhos.

— Toda!

“Jesus de Nazaré, que gato!”

Félix provou o coq au vin e ficou extasiado com o sabor, em nenhum restaurante luxuoso dos quais já havia frequentado havia provado algo tão saboroso. Enquanto ele comia, tentava avistar Nicola em meio as outras pessoas. Algumas vezes o jovem passava por ele e abria um sorriso. Quando Félix terminou, nem precisou chamá-lo, Nicola se aproximou novamente com aquele sorriso desconcertante.

— Gostaria de sobremesa?

— Ah não, obrigado. Estou satisfeito. Nicola, será que eu posso cumprimentar o chef? Eu nunca comi algo saboroso em toda a minha vida.

O garçom abriu um sorriso de satisfação:

— Então pode falar comigo, eu preparei esse prato.

— Sério? Então você é garçom e o chef ao mesmo tempo?

— Não, quem cozinha é minha tia que é dona do estabelecimento, mas ela me deixa preparar alguns pratos. É que eu gosto muito de cozinhar.

— Jura? Nicola olha... você já é um chef pronto, o prato estava divino.

— Você acha mesmo? - perguntou o rapaz com uma expressão de contentamento no rosto - Estou realmente feliz que tenha apreciado, já que você aprovou fica por conta da casa.

— Mas Nicola...

— Vai me ofender se não aceitar.

— Está bem, você é muito gentil.

Félix permaneceu calado por alguns instantes observando aquele belo rosto, mordiscava levemente os lábios enquanto seus olhos expressavam o que não encontrava palavras para dizer. Nicola parecia sentir o mesmo. O olhar de ambos parecia ter certo magnetismo que atraía um ao outro.

De repente Félix resolveu quebrar o silêncio:

— Esse lugar é tão interessante, todas essas pessoas vestidas dessa maneira, não sabia que havia um lugar assim em Paris.

— Esse restaurante? Ele é um pouco simples de fato, mas aconchegante.

— Não eu falo de tudo, da rua, das construções, é tudo tão.. vintage.

Nicola o olhou com uma expressão confusa:

— Vintage? Não entendi. De onde você vem é muito diferente daqui?

— Hã? Ah sim, é muito diferente, no Brasil faz um calor infernal. Eu adoro a clima europeu. Mas há quem considere um país maravilhoso, apesar de todos os problemas.

— Entendo. Nós também temos enfrentado muitos problemas por causa da guerra.

— Guerra? Que guerra?

— Ora, a guerra! Onde você esteve nos últimos anos Félix? Claro que estou falando da guerra horrível que o mundo vivenciou na última década. Minha tia diz que a guerra mudou muita coisa.

Félix olhou para Nicola com uma expressão confusa “O que tem de lindo, tem de esquisito. Nada é perfeito”— Sei, as guerras sempre trazem problemas – desconversou.

— Mas apesar de tudo, temos vivido bons momentos. Veja só agora temos até avião. Quem imaginaria no século XIX que hoje poderíamos conhecer algo assim.

— Avião?!? – Félix quase engasgou com o vinho - Nicola, não precisa entrar tanto no clima do lugar tá? Pode conversar normalmente comigo.

— Estou conversando normalmente, Félix. Eu disse alguma coisa errada?

— Não, é que você fala como se estivéssemos na década de 1920.

— Ora, mas estamos, não? Em 1921 pra falar com exatidão. No seu país vocês usam um outro tipo de calendário?

— Hein? – perguntou Félix confuso.

— Anh! Olha Félix, acabaram de chegar dois clientes ilustres. Preciso ir recebê-los, minha tia exige que eles sejam bem tratados, fique aqui, volto em breve e nós continuaremos a conversar.

Nicola se retirou deixando Félix atônito na mesa

“Pelas barbas de Moisés, será que eu ainda tô dormindo? Esse lugar é muito estranho, eu vou sair daqui”.

Ao mesmo tempo relutante, mas sentido que aquilo era necessário, Félix deixou discretamente o restaurante. Do lado de fora saiu andando a passos largos enquanto refletia sobre os últimos acontecimentos.

“Será que foi muita grosseria sair assim, o rapaz foi tão simpático, me ofereceu um jantar e mal me conhece! Se bem que deve estar com segundas intenções, com aquele olhar de carneirinho. Ah, mas também é tão lindo, quem liga se ele é um pouco maluquinho? Tem seu charme. Vou voltar lá e me despedir”

Félix deu meia volta, mas percebeu que a rua estava praticamente vazia. Do outro lado passava um casal em trajes modernos, viu mais algumas pessoas mais a frente, todas com roupas normais. Olhou para o prédio onde estivera há poucos minutos e não viu o restaurante, mas sim uma loja de doces. Olhou de um lado para outro totalmente confuso. Momentos antes aquela rua estava cheia de construções antigas e pessoas vestidas com a moda dos anos vinte e carros antigos, agora ele via uma rua normal e moderna do século XXI. O que teria acontecido?

“Ok Felix, você bebeu um pouco antes de vir pra cá, mas não a ponto de ter alucinações. Pelas contas do rosário! Será que eu tô ficando maluco?”


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Notas finais do capítulo

Notas finais do capítulo: Terá sido um sonho de Félix?



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