Nascida á meia Noite escrita por Anfiguri
Notas iniciais do capítulo
Espero que Gostem
— Isso não tem graça! — resmungou o pai.
Não, graça nenhuma — pensou Dulce Saviñón abrindo a geladeira para pegar uma bebida. Na verdade, tão pouca graça que ela gostaria de poder se esgueirar para dentro da geladeira, se encolher entre a mostarda e cachorros-quentes bolorentos e fechar a porta para não ouvir mais as vozes irritadas que vinham da sala.
Lá estavam seus pais brigando de novo!
Não que aquilo fosse durar muito — pensou ela enquanto observava o vapor escapando pela porta da geladeira. Hoje ela sabia que o pai iria embora!
Dulce sentiu um nó na garganta. Engoliu a emoção em seco e se recusou a chorar. Aquele devia ser o pior dia da sua vida. E ela já vinha tendo alguns muito ruins ultimamente. Um cara desconhecido na sua cola, Alex terminando o namoro com ela e os pais anunciando o divórcio — caramba, era desgraça que não acabava mais! Seria então de admirar que seus terrores noturnos tivessem voltado com tudo?
— O que você fez com a minha cueca? — o grito do pai penetrou na cozinha, meteu-se pela fresta da porta da geladeira e ficou pairando em volta dos cachorros-quentes.
A cueca dele?
Dulce pressionou uma latinha gelada de refrigerante contra a testa.
— O que eu iria fazer com a sua cueca? — perguntou a mãe com aquela voz de “não estou nem aí”. Era bem sua mãe, ela nunca estava nem aí. Fria como gelo.
Dulce olhou pela janela da cozinha o quintal, onde há pouco tinha visto a mãe. E ali, da grelha da churrasqueira ainda fumegante, pendia a cueca do pai.
Que beleza!
A mãe tinha feito churrasco da cueca do pai. Só isso. Dulce nunca mais comeria nada do que fosse assado naquela grelha. Tentando conter as lágrimas, ela devolveu a latinha ao refrigerador e foi até a porta da sala. Talvez, se a vissem, parassem de agir como crianças e deixassem que ela fosse a adolescente ali. O pai estava no meio da sala, segurando na mão uma cueca. A mãe, no sofá, bebericava com a maior calma um chazinho quente.
— Você precisa de tratamento psicológico! — gritou ele para a mulher.
Dois pontos para o pai — pensou Dulce.
A mãe realmente precisava de ajuda. Mas então por que era Dulce que tinha de ficar estendida no divã da analista, duas vezes por semana? Por que o pai — o homem de quem, todos juravam, ela conseguia tudo — é que precisava ir embora, abandonando-a?
Dulce não o censurava por querer deixar sua mãe, a Rainha do Gelo. Mas por que não levava Dul com ele? Outro soluço sufocado na garganta.
O pai virou-se e a viu; em seguida, entrou no quarto, obviamente para guardar o resto de suas coisas — menos a cueca, que naquele momento fazia sinais de fumaça na churrasqueira do quintal.
Dulce ficou parada olhando a mãe, que remexia em pastas de trabalho como se aquele fosse um dia igual a qualquer outro. As fotos emolduradas de Dulce e o pai, na parede acima do sofá, chamaram sua atenção e encheram seus olhos de lágrimas. Tinham sido tiradas durante as excursões anuais que os dois faziam juntos.
— Você tem que fazer alguma coisa! — implorou.
— Fazer o quê? — perguntou a mãe.
— Convencê-lo a ficar. Peça desculpas por ter assado a cueca dele...
Que lamenta ter água gelada nas veias — pensou.
— Faça qualquer coisa, mas não deixe que ele vá embora.
— Você não compreende — e com isso a mãe, sem um mínimo de emoção, voltou aos seus papéis.
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COMETEM....