Internados escrita por Rosa Negra


Capítulo 3
A Cicatriz


Notas iniciais do capítulo

Um capítulo maiorzinho, e, para minha surpresa, que eu achei que ficou razoável.
Enjoy!



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Aster me acompanhou até o interior do grande casarão com porte de castelo, puxando assuntos comigo. Depois de ter contado inúmeros fatos sobre a história e lendas do local, ele se contentou em me fazer perguntas sobre a minha vida. Me perguntou onde eu cresci, como era a minha casa, se eu tinha muitos amigos na minha cidade natal, etc. Apesar de gostar de sua companhia, eu anciava por entrar logo no lugar, mas parecia que nunca chegaríamos lá. O terreno era estupidamente grande.

–Nossa. - Foi a primeira coisa que ele me disse, logo quando demos o primeiro passo para dentro do meu novo ''lar''. - Eu não sei como alguém como você não seria rodeada de amigos, principalmente meninos. - Eu havia terminado de lhe dizer que eu não tinha muitos amigos, exceto por alguns colegas de estudo.

–O que quer dizer com isso? - Questionei, desconfiada, levantando uma sobrancelha. Ele deu um sorrisinho acanhado.

–Bom, você sabe... É a sua aparência. Você é muito bonita, chama bastante atenção. - Disse.

Não tive tempo de lhe dizer que precisava de óculos, pois uma mulher com feições carrancudas se dirigiu à mim, por traz do balcão da recepção.

–Pois não? - Perguntou, somente. O tom de voz dela soava entediado, combinando com seu rosto. Ela mascava um chiclete ruidosamente, enquanto lichava suas unhas. Seus cabelos que, provavelmente, eram tingidos de ruivo, estavam presos em um coque alto no topo da cabeça. Seus olhos negros eram emoldurados por uma maquiagem preta e forte, e seus lábios apresentavam um tom de vermelho ligeiramente vulgar.

–Ela é a nova paciente. - Disse Aster por mim. - Luna Ashwood, pode procurar aí no registro.

A mulher colocou, de má vontade, a sua licha de unha de lado e começou a procurar algo em uma grande pilha de papéis. Logo, pareceu achar o que estava procurando, pois ergueu um papel no ar, colocou um par de óculos de leitura retângulares e, depois de ler rapidamente o que estava escrito, virou-se novamente para mim.

–Luna Ashwood, né? - Ela me olhou com seus olhos entediados e mascou seu chiclete por um instante. - Qual a sua idade?

–17. - Respondi rapidamente.

–Dia e mês de nascimento?

–Cinco de Março.

–Nome dos seus pais?

–Elizabeth Ashwood e Daniel Ashwood.

Ela me fitou por um longo tempo, depois de checar cada detalhe no papel em sua mão. Finalmente, me lançou sua pergunta final.

–Razão pela qual foi internada?

Hesitei. Não sabia o porquê, mas não conseguia achar a coragem e determinação para abrir a boca, então fiquei muda por um instante, mas Aster logo me socorreu.

–Ela gostaria de manter essa informação privada, Rosalie. - Ele disse para a recepcionista, que virou o seu olhar em direção à ele. Depois de mascar despreocupadamente por alguns segundos, ela pegou uma das inúmeras chaves num dos ganchos atrás de si, e estendeu-a para mim.

–Ala A, dormitório 354. - Disse somente, antes de retomar a sua atenção para sua licha de unha, ignorando-nos completamente.

Depois de me olhar com alívio, Aster me guiou até o meu quarto, que, segundo ele, ficava no mesmo edifício em que estávamos. Enquanto andávamos pelos inúmeros corredores, eu observava atentamente a decoração rústica do local. Me sentia, mais do que nunca, em um castelo medieval. Os quadros eram todos originais, pelo que Aster havia me contado, e cada móvel de cada cômodo continha enfeites de ouro, ou pedras preciosas.

–Então... Quer dizer que estamos na ala A? - Perguntei, enquanto admirava cada detalhe.

–Sim. Este prédio em que estamos é a ala A. Aquele ali - Ele apontou para o prédio ao lado, quando passamos em frente à uma janela. Era do mesmo estilo que o que estávamos, mas parecia ligeiramente mais desgastado. - é a ala B. A ala C fica ali. - E apontou para um outro prédio. Este me deixou muito intrigada. Parecia mais com um forte militar do que com um hospício. Todo o exterior dele parecia ser feito de metal, e havia cercas de arame farpado ao redor.

–Por que a ala C é assim? - Perguntei, curiosa, enquanto Aster olhava distraidamente para os gramados do lado de fora da janela. Ele se virou para mim com uma expressão que eu não consegui decifrar, e franziu as sobrancelhas.

–Os pacientes de lá não são como nós. - Ele disse, de uma forma sombria. Depois de um tempo, sua expressão tornou a ficar feliz e simpática, me deixando curiosa e desconfiada. - Bem, vamos seguindo em frente? Seu quarto é logo ali.

Tentando deixar de lado o que ele havia acabado de dizer antes de misteriosamente mudar de assunto, segui-o pelo corredor. Logo, paramos em frente à uma porta com o número 354 na frente, pintado de vermelho em uma caligrafia fina e bonita.

–Chegamos. Está com a chave? - Ele me perguntou, e eu logo tirei a chave de dentro do bolso do meu vestido e a pus na fechadura. Girei-a e abri a porta. - Primeiro as damas. - Aster disse, enquanto a segurava para eu passar.

Entrei no quarto e fiquei impressionada. Era muito bonito, e as decorações seguiam o padrão do resto do prédio: elegantes e rústicas. Me senti nos aposentos da rainha, e logo me joguei na minha nova cama de casal com roupas de cama de seda vermelha. Aster entrou logo depois de mim, rindo da minha reação.

–Parece que gostou. - Ele disse, enquanto colocava a minha maleta, que ele havia insistido em carregar, encima da cômoda. Eu já havia jogado a minha sacola florida no chão, na urgência de pular na cama.

Me ajoelhando no colchão e o olhando com uma expressão igualmente divertida, respondi.

–Amei. - Mas logo me toquei de um detalhe perturbador. - Mas... Aster. Estamos em um hospício. Como é possível nos tratarem tão bem assim, nos expondo à esse luxo?

–Bem... - Ele começou, e parou para pensar um instante. Logo, pareceu ter uma resposta. - Eles aparentemente querem que a gente fique à vontade, acomodados. Mas do quê está reclamando? Preferia um hospital sujo e macas cheias de sangue? - Perguntou, se sentando ao meu lado na cama, com uma expressão brincalhona.

–Com certeza que não! É só que... eu não esperava por tudo isso. - Respondi. Passou um tempo em que ficamos em silêncio, olhando para o vazio. Logo, deixei que minha curiosidade tomasse conta e lhe perguntei algo um tanto quanto inapropriado. - Aster... Qual é o motivo de estar aqui?

Ele suspirou e levantou a cabeça para mirar o teto, numa posição que deixava a cicatriz em seu pesoço muito mais vísivel. Tentei não olhar para ela, e desviei minha atenção para suas mechas loiras, que caíam no seu rosto e desciam até os seus ombros.

–Digamos que as pessoas não gostassem muito de mim. - Ele disse, depois de um tempo em silêncio no qual eu pensei que ele não fosse responder minha pergunta. Ele continuou mirando o teto, e eu, os seus cabelos. Meu olhar agora estava focado numa trancinha, que terminava com alguns enfeites e miçangas. Logo deixei escapar mais uma pergunta inapropriada.

–É por isso que você tem essa... cicatriz? - No segundo em que as palavras deixaram minha boca, eu percebi que devia ter segurado a minha curiosidade. O olhar de Aster escureceu e suas sobrancelhas franziram. Olhei para minhas mãos e engoli em seco.

–Desculpe, não quero me intrometer. - Disse, somente. Realmente, eu não devia ter começado aquele assunto no primeiro lugar. Eu mal o conhecia!

Quando me dei conta, percebi que Aster estava olhando para mim. Sem dizer uma palavra, ele pegou o meu pulso com firmeza e o ergueu até o seu pescoço. Sem que eu pudesse reagir, seus dedos guiaram os meus pela cicatriz. Logo, eu estava passando-os livremente ao redor de seu pescoço, sentindo-a. Era fina e afiada, perfeitamente delineada como uma tatuagem. Antes que eu me desse conta, a mão de Aster estava na minha cintura e ele me olhava profundamente nos olhos enquanto eu examinava o seu pesocoço. Quando percebi, olhei-o de volta nos olhos e corei levemente. Agora me encontrava hipnotizada por seus olhos azuis.

Ficamos ali, em transe, olhando um para o outro por um tempo, até que eu decidi reunir coragem para falar. Quando as palavras saíram da minha boca, estavam desajeitadas e hesitantes.

–B-bem, acho que eu deveria começar a me organizar agora. - Disse, enquanto tirava a mão de seu pescoço. Hesitante, ele imitou o gesto, tirou a mão da minha cintura e ficou de pé, olhando para o chão.

–Está bem. - Ele disse, passando a mão pelos cabelos para tirá-los dos olhos, mas eles voltaram imediatamente. - Quando terminar, vá até o meu quarto. O número é 211. - E me olhou com uma certa malícia, ainda que sua voz soasse inocente. - Podemos continuar nossa conversa lá.

–C-claro. - Me peguei aceitando, embora não estivesse muito certa do quê ele se referia. Me lançando um último olhar, ele deixou o quarto, fechando a porta atrás de si.

Sozinha, suspirei, me jogando novamente na cama, somente para voltar a me levantar rapidamente e andar em direção a minha sacola, que jazia caída no chão. De dentro dela peguei meu diário, também enfeitado com uma estampa de rosas vermelhas, e o abri na página do dia 22 de Setembro. Saquei minha caneta de tinta preta preferida e comecei a escrever.

Diário,

Eu não conseguia imaginar como um hospício poderia ser tão esquisito. É irônico, na verdade, que a imagem que eu tinha do lugar fosse mais metódica, normal. Eles me receberam muito bem aqui, o que é estranho, mas deve ser porque eu sou nova. Porém, todos os quartos são excessivamente luxuosos, o que me força a pensar que esta não é a verdadeira razão. Bem... Só me resta esperar para ver.

Olhei para o papel e pensei se deveria adicionar algo mais. No final, para a minha própria surpresa, acabei fazendo um desenho de Aster, com seus cabelos loiros caindo aos ombros, e sua cicatriz inesquecível. Ao lado, escrevi:

''O garoto com um corte profundo ao redor de sua garganta.''


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Notas finais do capítulo

Tensão emocional danada hein...
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