Diário de Brandee

Hoje fizemos mais um ensaio. A história a ser contada é sobre uma mulher que sofre alucinações e vê o mundo constantemente de uma forma diferente. Ela vê coisas inanimadas se mexendo e figuras irreais andando pelas ruas como se fossem pessoas normais. Eu faço o papel dessa mulher. Nunca fiz um papel como esse.

A trilha sonora foi toda composta pelo Friedric. A coisa mais linda e melodramática que já ouvi. Por meio das músicas dele consigo alterar minhas emoções nos atos. Elas traduzem sonoramente a situação de cada cena. É como um roteiro a ser seguido.

Falei com Friedric hoje. Ele é sempre muito quieto e reservado, mas também é muito educado e sabe dar atenção a todos. Seus olhos pareciam brilhar para mim quando o encarei. Senti um gostoso perfume ao me aproximar. Tive que me controlar para não o abraçar naquele momento.

A cada dia parece que me apaixono mais.

Diário de Nicoleta

A peça que estamos a ensaiar há duas semanas é a peça a qual mais me dediquei desde que comecei a atuar. É sobre uma mulher que tem o que parece ser esquizofrenia. Sempre me dediquei ao máximo em todas as atuações, mas essa é especial, pois o que a mulher vive se parece com o que eu vivo.

Sou a alucinação constante da mulher.

Sei muito bem como é viver sem saber o que é real e o que é fantasia, pois convivo com isso todos os dias da minha vida.

Hoje o vi novamente e ele me perguntou:

–Nicoleta, Nicoleta, onde está o seu coração?

Nunca compreendo o que ele quer dizer. Respondi que meu coração estava num rapaz, que estava inteiramente num rapaz que eu sei não sentir o mesmo por mim. O amo em segredo, embora até hoje tenha dito para mim mesma não se tratar de amor, mas de uma paixão, uma profunda simpatia.

–Nicoleta, Nicoleta, quantos anos tem a cacatua?

Silenciei quanto a esta pergunta e resolvi ir até o teatro mais cedo para não ter que lidar com ele por mais tempo. Ele, por sua vez, acompanhou-me durante todo o trajeto da minha casa até o teatro, ficando do lado de fora quando cheguei.

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Mais uma vez Brandee atuou com maestria. Sua entrega à personagem é sempre intensa e seus sentimentos legíveis. Como diretor, fico muito feliz. Como produtor, mais ainda, já que ela dá uma vida muito real às minhas personagens.

Confesso que considero essa a melhor peça que já escrevi na vida e devo tudo à Nicoleta. Quando tomei conhecimento do distúrbio que ela tem, comecei a pesquisar mais sobre distúrbios psíquicos. Conversei com pessoas com os mais variados transtornos, conversei também com psicólogos e com familiares de pessoas com transtornos. Convivi com algumas dessas pessoas. E foi a experiência mais estranha que já tive na vida.

Meu momento mais medonho foi quando visitei um hospício. Senti-me agonizando naquele ambiente. Observei a rotina de muitos pacientes e fiquei pasmo com alguns comportamentos que vi. Pasmo, de fato. E escrevi esse roteiro. E me apaixonei.

O toque final veio de você, meu caro compositor. Suas composições para essa peça são simplesmente perfeitas. São majestosas e perfeitas. Agora, mude essa aparência tétrica, ponha um sorriso no rosto, e vamos aos ensaios.

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