Me toca, delírio

Me aperta, loucura

Me abraça, suspiro

Me beija, ternura

Me olha, clareia

Me enxerga, profundo

(Jamz)

Depois da aula, na entrada da Ribalta, João encontra Pedro e questiona o amigo.

– E ae meu querido amigo cabeludo, não te vi no colégio direito hoje. Por onde se esconde?

– Johnny Johnny, minha situação não ta nada boa... Minha nota no simulado foi péssima, dona Delma não curtiu, agora preciso cumprir a promessa que fiz de me dedicar mais. Tinha matérias pra atualizar, sorte que a Esquentadinha me ofereceu ajuda.

– Então estuda mesmo porque fazer promessa pra mãe e não cumprir pode ser pior do que possa imaginar. Palavra de quem já sofreu, e muito, com esse tipo experiência.

João se refere aos castigos recebidos ao longo de anos devido a carga de chateação que sempre deu a mãe pelas promessas não cumpridas de jogar menos. No entanto, não era mais tão viciado em games como antes. A vontade de jogar tornou-se muito pouco atrativa depois de Bianca e da Ribalta.

– Sorte a sua ser nerd e continuar com boas notas mesmo depois de faltar tanta aula...

– Tenho sorte mesmo... Mas por ter uma namorada gata e que ta na minha. Prevejo meu namoro mudando de fase!

O nerd não esconde a felicidade, tem um sorriso largo no rosto, e não consegue tirar as palavras que ouviu de Bianca se repetindo em looping na sua cabeça.

– To sabendo, a Karina comentou comigo o papo que ela teve com a Bianca.

– Mas já?

Os dois riem. João não escutou por completo a conversa das irmãs Duarte, quando realizou a aproximação da sua primeira vez com Bianca, além dos movimentos das pernas também se pegou surdo, cego, sem ar.

– Ah moleque! Quer dizer que agora vai ser garoto transante?

– Assim espero porque nem eu nem o Steve aguentamos mais os livros de colorir... [pausa] Isso se o Mestre não grudar muito no meu pé, e pra isso conto com a ajuda da minha mãe.

João entende como a mãe pode ajudá-lo em relação a Gael, porém sofre ao pensar nas alternativas que a ela provavelmente utilizaria para ter essa ajuda.

– É, o mestre não dá trégua, mas morando na mesma casa deve ser mais fácil.

– Não sei não... Não sei mesmo...

No banheiro da Ribalta, Bianca conta a Bárbara sobre seus sonhos na esperança de que a amiga possa lhe dar alguns bons conselhos.

– Amiga, com o tempo que você namora o João não deveria estar tendo esse tipo de sonho envolvendo o Duca. O que sente quando está com o João?

– Eu adoro estar com o ele, mas não sei explicar que sentimento é esse. Pelo Duca sentia amor, meu primeiro amor, era louca por ele desde o dia que entrou na academia do meu pai, sempre tive certeza dos meus sentimentos por ele.

Bianca parece estar separando um do outro em sua mente, organizando os pontos de cada, sejam positivos ou negativos.

– Mas com o João é diferente, eu gosto dele, é bom estar com ele, me da segurança, e ele, bem diferente do Duca, entende e apoia o meu sonho, a minha carreira. Tem mexido comigo de várias maneiras, se mostrando mais maduro, super parceiro, envolvido, envolvente...

Bárbara detecta o interesse nas palavras da amiga, apesar de toda a confusão expressada em seu rosto, mas de que maneira pode aconselhar uma pessoa cheia de conflitos consigo mesma?

– Então me fala, já rolou algo a mais entre vocês?

– Ainda não, teria te contado.

– E o que falta pra riscar esse “ainda”? Rola atração?

– Me sinto atraída sim. Acho que nem tinha me dado conta disso antes. Ontem percebi o quanto essa atração é forte. Ele já tinha tentado algo no início do nosso namoro, mas na época pedi um pouco mais de tempo e calma. O João é virgem, também tinha que me preparar pra ser a primeira dele.

Babi tinha esquecido desse detalhe. Uma menina virgem ter sua primeira relação com um cara experiente pode ser bem diferente da situação contrária, e Bianca nem tinha tanta experiência assim. Era romântica e almejava um momento especial para dois.

– Então deixa rolar amiga, sem medo de ser feliz. Da um jeito, cria uma oportunidade. Na minha opinião, só depois de se entregar totalmente ao amor que o João tem por você, que a sua história com o Duca e todos esses sonhos ficarão onde deveriam estar desde o dia que vocês terminaram: no passado.

Bianca assente a tudo que a amiga ruiva diz. Ela tem um cara maravilhoso do seu lado, que só deseja sua felicidade e já demonstrou tudo que é capaz de fazer para provar seu sentimento. Sendo assim, conclui que não tem mais o que esperar.

Após a conversa, Bianca foi com a amiga para mais uma aula de teatro, onde passou todo o período da tarde. Depois ajudou o pai na academia e no início da noite voltou para casa. Jantou junto do namorado e de Dandara e ao organizar a parte da louça destinada a ela pôde, finalmente, relaxar num longo banho.

Ao retornar à sala encontrou o nerd estirado no sofá assistindo televisão e decide fazer-lhe companhia. João esta deitado reto de barriga para cima, então Bianca passa por cima do namorado aconchegando-se na lateral do corpo do namorado com a cabeça sobre seu ombro e posiciona uma das pernas por cima de suas pernas.

Desde a noite anterior, carícias, beijos ou qualquer tipo de toque tinha se tornado eletrizantes. Choques surgiam formando um clima gostoso e incontrolável ao casal. Eleva o calor, a vontade, o risco, a adrenalina, a excitação... Outra vez as mãos se inquietam curiosas um no corpo do outro, carícias, nuca, puxadas de cabelo provocantes, arrepios.

Novamente não percebem a chegada de Gael com Karina, porém desta vez João e Bianca tem como amiga a distração do Mestre ao deixar suas chaves caírem de sua mão cortando o clima e alertando o casal. Com alguns segundos de vantagem, Bianca escorrega do colo do namorado para o sofá acomodando-se ao seu lado e ajeitando sua camisola no lugar, enquanto João disfarça seu estado com o auxílio de uma almofada. O desespero do casal chama atenção do lutador que levanta os olhos do chão para o sofá e a raiva toma seu olhar.

– Mas não é possível... Agora vai ser isso todos os dias?

– Isso o que paizinho?

Gael não agüenta mais o quanto Bianca pode ser dissimulada, e o quanto reagir assim pode aumentar a tensão e a raiva que está sentindo. Karina ao mesmo tempo que tenta se manter séria também se concentra no clima tenso recém criado.

– Que-que isso mestre? Não tem nada demais aqui. Só namorando um pouquinho... Beijinho e TV...

O vermelho toma lugar no rosto do Mestre, contrai o corpo, fecha os punhos e os olhos. A veia destaca na testa...

– DANDARAAAA!!!

– Ah pai, deixa de ser exagerado. A Bianca e o João nem tavam fazendo nada demais.

– Não fizeram porque eu cheguei, que se não fosse isso... Não quero nem pensar.

Apesar de tentar Karina reconhece que na hora da raiva só uma pessoa consegue acalmar o Mestre. João esboça uma tentativa de falar algo, mas receosa, com uma das mãos Bianca tampa a boca do namorado. Enquanto isso, a única que pode amenizar a tensão finalmente aparece assustada e com as mãos sobre a barriga.

– O que foi isso Gael? Quase me matou de susto. Quer que o nosso filho nasça antes da hora?

– São esses dois. Agora é todo dia esse agarramento aqui no meu sofá...

– Não exagera Gael, os dois são namorados. Vai dizer que nunca namorou no sofá?

– Namorei. Namorei igual esses dois e quando vi tinha a Bianca nos braços.

Dandara desacredita nas palavras do companheiro, apesar de achar graça de seu desespero. O casal também desacredita, mas Bianca não vê graça e João engole o riso.

– PAI.

– Oh Gael, vai lá pra dentro tomar um banho antes de falar mais bobagem. E vocês também meninos, vão deitar. Já ta tarde e eu não quero confusão.

Sobre algum protesto o casal se levanta, se beijam rapidamente e entram para os seus respectivos quartos. Enquanto Karina senta a mesa para comer antes de recolher-se.

Mais uma vez, mais um sonho...

“Bianca se diverte com João. Cócegas. Risadas. Sofá da sala. Felicidade!

Toque. Choque. Elétrico. Quente. Queima.

Sente. Delicia! Excita.

Encara. Olhos verdes. Lindos olhos!

– Sempre foram tão verdes?

Verdes, profundos, envolventes, quentes...

Pisca. Encara. Castanhos?

– Pra onde foi?

Não tinha João. Tinha Carlos Eduardo.

ACORDA!!!

>>>>

Bianca acorda assustada, alterada, confusa. Era bom sonhar com João! Quer ver os olhos verdes. São como nos sonhos? Tem sede. Sem barulho, levanta da cama e deixa o quarto. Um turbilhão de pensamentos enquanto bebe um copo d'água.

Ao se dar conta, está na porta do quarto dos fundos da qual nunca mais tinha entrado. Lembrava da bagunça de antes, porém agora havia uma pequena bagunça de papéis e livros em cima de uma pequena mesa de estudo improvisada, um armário de duas portas e uma cama de solteiro. João tem sono tranquilo. Entra e ao fechar a porta dá uma pequena, mas forte, batida. João desperta assustado e sonolento.

– Bianca?

Esfrega os olhos, não sabe se está acordado ou sonhando, acende uma luminária ao lado de sua cama. Bianca tranca a porta e se aproxima. O encara.

– O que aconteceu?

– Preciso conferir uma coisa...