Felicity Smoak

Acordei com o barulho irritante do maldito despertador.

Não sei o que me deu noite passada, para onde tinha ido o meu juízo e senso de responsabilidade? Definitivamente perdidos no fundo de uma dose de vodka, por isso bebi tanto tentando encontrá-lo naquele pequenos e perigosos copinhos. Ou então vai ver que deram as mãos e fugiram, abandonando-me quando eu mais precisava deles.

Sabe o que não havia me abandonado?

A ressaca.

Agora eu estava com uma puta dor de cabeça e um estômago revoltado, e ainda tinha que terminar de me arrumar e organizar as coisas porque em poucas horas eu voltaria para a minha cidade natal. Só de pensar nisso meu estômago deu mais outra volta, mas dessa vez não tinha nada a ver com a ressaca.

— Fel levanta já está tarde, você vai se atrasar... — ouvi a voz de Caity, mas apenas me virei de lado desligado o despertador com uma mão e usando a outra para puxar a coberta e cobrir meu rosto com ela. Eu iria apenas ignorar o mundo por enquanto, eu não estava fisicamente pronta para ele ainda. — FELICITY MEGAN SMOAK — chamou meu nome, mais audível dessa vez  e naquele tom de quem exigia ser obedecida.

— Você é muito mandona. — resmunguei, me encolhendo mais na cama.

— Levanta agora se não eu vou te jogar um balde de água bem gelado... — ameaçou — Não reclama, foi você quem pediu.

— Oh, que merda, Caity, já levantei não precisa agir tão drasticamente. — falei me sentando imediatamente na cama, minha amiga já tinha um balde de água ali. Ela viera preparada.

Mas com Caitlin Snow, não tinha dessas de brincadeiras, quando ela dizia algo pode ter certeza que era sério. Lembrei-me das outras vezes que não levantei quando ela "exigiu" e recebi um balde de água bem gelada como incentivo.

— Você devia me tratar com mais delicadeza Sra. Caitlin Snow, já que hoje é meu último dia na cidade. — a lembrei — Não deveria estar mimando sua melhor amiga e me implorando para que não te deixasse, porque você nunca vai encontrar uma companheira de apartamento como eu?

— Não mesmo! Ontem você já teve sua noite de farra, eu te avisei para não beber tanto, você devia ter escutado sua melhor amiga, que é também sua médica particular, e além disso, você só vai ficar longe de mim até finalizar a faculdade. — disse colocando ambas as mãos na cintura. — Ou já se esqueceu que vou atrás de você assim que me formar daqui seis meses? — sorri com as palavras dela. — E quando eu for, eu vou querer ser mimada e meu lugar reservado no seu novo apartamento.

Ainda não sabia como sobreviveria seis meses sem a minha melhor amiga. Cait tinha sido, muitas vezes meu porto seguro em Central City, eu sequer teria sobrevivido um mês nessa cidade se não fosse por ela. E ironicamente, aqui estava eu, deixando meu porto seguro para trás.

— Lógico que não me esqueci! Se finalmente aceitei a proposta do Tommy de trabalhar na empresa do pai dele é porque você vai comigo. — vi um sorriso surgir nos lábios de Caitlin. — Do contrário, preferia viver aqui, trabalhando naquela empresa que desprestigia meu currículo, mas ao menos eu tenho você pra me jogar baldes de água fria toda a manhã.

— É fofo, mas você acabou de dizer que teria um futuro de merda aqui, apenas porque eu estou aqui. Algo está errado nisso, no fundo eu não acho que sou eu que te prendo aqui, mas sim algo que te afasta em Star... — me remexi, incomodada com a mudança de assunto.

— Por que você acha isso?

— Porque  eu conheço você bem o suficiente para saber que você é uma cabeça dura e não sabe perdoar! — suspirei, não querendo ter aquela conversa outra vez. O passado estava morto e enterrado, e no que dependesse de mim, eu estaria dançando em cima da cova. — Agora já chega de papo furado e levanta esse seu traseiro dessa cama! Vamos terminar de empacotar suas coisas ainda temos muito que fazer! Barry ligou quase agora falando que daqui a pouco chega — olhei para ela e vi seu rosto se iluminar ao falar em nosso amigo Barry Allen. —, mas você o conhece. O "logo" dele não é tão "logo" assim, então trate de levantar e tomar esse remédio, não quero escutar você reclamando o resto do dia que está com dor de cabeça.

O resto do dia passou voando fiquei a maior parte dele separando o que levaria comigo de volta para Star City e o que doaria. Tantas lembranças. Era estranho fazer isso outra vez, eu estava deixando o lugar que foi meu lar pelos últimos anos, e indo para o lugar que um dia já foi. Ele voltaria a ser? Depois de tudo?

Como o esperado, Barry chegou atrasado.

E como sempre, chegou bem na hora do almoço.

Faltando quatro horas pra eu ir embora, já estava quase tudo pronto. Após comermos lanches naturais preparados pela minha melhor amiga/médica que quase nunca me deixava comer besteiras, terminei de me arrumar e despachar meus pertences para Star City, fomos para a estação de trem.

Meu trem partiria às cinco horas em ponto, seria quatro longas horas de viagem. Sim, seria mais rápido de carro, e sim, também haviam voos que me levariam em questões de minutos para o meu destino. Então porquê eu teimosamente escolhi o meio de transporte mais devagar?

Nunca pensei que fosse tão difícil me despedir dos meus amigos. Nesses três anos morando em Central City, Barry e Caity se tornaram muito mais que meus amigos, eles eram como irmãos para mim. Foi nos ombros de Cait que chorei quando a saudade estava grande de mais, e seu coração que ouviu todas as dores do meu. E foi Barry quem me fez rir nas noites chuvosas, me fez muitas vezes esquecer o passado e apenas apreciar o presente.

Não consegui conter as lágrimas. Estava indo embora, deixando o lar que me acolheu e voltando para aquele que deixei para trás. Entretanto deixava um pedacinho do meu coração aqui com eles, do mesmo modo que havia deixado um em Star City. 

— Felicity não chora, — Caity disse com olhos cheios de lágrimas também. — Juro que antes de terminar a faculdade, eu vou te visitar, vou sentir muito sua falta. — me deu um abraço que logo correspondi já caindo em lágrimas outra vez.

Barry logo em seguida se juntou ao nosso abraço.

E nós três ficamos assim nos abraçando, sentindo um ao outro. Eu não sei por quanto tempo, apenas que não foi tempo o suficiente.

Foi muito difícil deixar os meus amigos e partir de volta ao meu passado, de volta para uma cidade que tanto me fez muito feliz, mas ao mesmo tempo me trouxe muita tristeza.

Assim que embarquei no trem e ele começou partir rumo a minha antiga cidade, finalmente eu percebi o porque tinha escolhido o caminho mais longo. Bastou deixar meus olhos se perderem na paisagem de prédios que aos poucos eram substituídos por árvores, minha mente se viu divagando, sendo inundada por lembranças que eu tanto queria apagar da minha memória, mas das quais jamais consegui fugir.

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— Felicity, vamos vai ser divertido, você sempre promete de ir com a gente e não vai! Tommy está esperando a gente lá embaixo e falou que não aceita não como resposta! O carinha que estou afim vai estar lá e você precisa arrumar um namorado, Cooper vai estar lá. — Sara falou sugestivamente, sempre detestei essa mania que as pessoas tinham de querer me arrumar um namorado. — Você ainda é apaixonada por ele não é?

— Não Sara, não sou e nunca fui. — respondo convicta. — Não sei porque você e o Tommy, se importam tanto se eu estou namorando ou não. — falei em um tom ácido.

— Olha só quem está de mau humor hoje! A gente se preocupa com você loirinha! Não só porque te amamos e desde que seu pai foi embora, — Tommy me olhou com olhar de quem pede desculpa pelo que falou, mas continuou — Você não quer sair e não fala mais com ninguém fora eu e a Sara. — falou num tom preocupado e senti minhas bochechas arderem com o comentário dele.

Principalmente porque eu sabia que era verdade, pois havia me isolado desde que meu pai partira. E  a percepção disso me deixou com ainda mais raiva.

— É melhor você sair do meu quarto agora, Tommy Merlyn! Senão você... — comecei num tom repleto de raiva.

Eu não pude terminar de falar porque assim que ele percebeu o quão irritada eu estava saiu batendo a porta.

Sorri vitoriosa e levantei para me arrumar.

Aqueles dois não iriam me deixar em paz enquanto eu não fosse com eles. Então era melhor eu ir, além disso eu não queria mais me isolar. Eu odiava que meu próprio pai tivesse me deixado, mas odiava ainda mais permitir que ainda longe, suas escolhas me privassem de algo que eu amava: meus amigos.

Fui para o banheiro fechando a porta e logo escutei a voz feliz de Sara falando comigo:

— Fel, eu que vou escolher sua roupa.

Apenas concordei, mas não sei porque tive um péssimo pressentimento com isso, amo a Sara mais ela tem um gosto bem extravagante para roupas.

Enquanto ela ama roupa coladas, decotadas e sapatos super altos, eu preferia roupas mais simples, soltas sapatos mais confortáveis. Mas quem sabe, talvez fosse hora de começar a mudar.

Liguei o chuveiro, fui tomar meu banho e quando sai dele, percebi que estava certa.

Sara escolheu um vestido vermelho super curto que minha mãe me comprou no ano passado de aniversário e que nunca usei, e um sapato de salto tão alto que eu não sabia como iria me equilibrar nele.

— Sara você não acha que exagerou um pouco? — falei observando aquelas peças, aquilo era tão diferente de mim.

— Não mesmo Felicity e não começa. — seu tom era imperativo — A gente vai para um clube, eu amo seu estilo nerd, é fofo e bonitinho, mas para um clube não rola,  e você é linda. Estou cansada de ver você se escondendo atrás dessas roupas de meninos. — não me convenci — Se você for diferente de todo mundo vai chamar ainda mais atenção.

Ok, ela me convenceu.

Sorri para ela e fui me vestir.

Sabia que aquela era uma batalha perdida, e também sabia que Sara estava certa sobre me destacar no meio da multidão.

Quando terminei de me arrumar usando o tal vestido vermelho, olhei no espelho gostei do que vi, o vestido caiu com perfeição nas minhas curvas, acentuando e favorecendo as melhores partes do meu corpo, e não era tão curto quanto eu pensei que fosse. A cor também me fazia parecer vibrante.

Os saltos altos deixaram minhas pernas em evidência para finalizar o look, Sara fez uma maquiagem bem leve e uma trança lateral, me dando um ar "doce e fatal" palavras dela, não minhas.

Quando terminamos fomos ao andar de baixo, onde Tommy nos esperava. Vi meu amigo ficar com um sorriso bobo no rosto e me olhar de um modo diferente, contudo não dei importância. Eu ainda me sentia eu mesma, não havia razão para agitação.

— É, né! Vamos, então vamos! — falou todo atrapalhado, me olhando novamente e suspirando. 

Sorri com aquilo,  finalmente entendendo, Tommy Merlyn achava que eu estava bonita.

Seguimos para o clube, chegando lá a fila estava imensa, porém como o dono do clube era o melhor amigo do Tommy, que tinha voltado pra cidade há pouco tempo e estava inaugurando a boate, não precisamos ficar na fila.

O local estava tão lotado que não sei como cabia tanta gente lá dentro e ainda havia mais esperando na fila.

Nos dirigimos para ala vip, onde tudo estava um pouco mais calmo.

No caminho para a nossa mesa sem querer esbarrei em um corpo forte, me virei para pedir desculpas, mas as palavras desapareceram da minha mente quando me deparei com aqueles olhos azuis penetrantes.

Aquela foi a minha perdição.

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Despertei dos meus devaneios quando um o passageiro ao meu lado me cutucou, avisando que o trem já tinha chegado ao destino, Star City.

E então eu estava de volta.

De volta ao lugar que nunca mais pensei que fosse voltar.