Na cidade de Himmel havia um bairro frequentado, em sua maioria, pela elite. Porém, dinheiro e piscinas no quintal não significam exatamente uma boa educação ou, pelo menos, uma cara ótima pela manhã, pensando bem, pelo resto do dia.
Naquele bairro existem três grandes famílias e uma em particular que simplesmente dera a sorte de morar ali.

Os Harryinson eram os vizinhos mais irritantes e petulantes que ocupavam grande parte das casas, e entre esses indesejáveis, morava Rallyem Lockwil, na menor e mais simples "mansão " que ali havia. E antes que pergunte, os Harrynson odiavam os Lockwill, odiavam a todos os seres que, denominam eles, "inferiores de baixo nível " que moravam por ali, muito bem, obrigado.
Naquela manhã, Rally fingia um enjôo para não ter que trabalhar na velha biblioteca da cidade, um lugar que ela adorava, então, a coisa estava realmente séria.
Assim que sua mãe sai de casa, sua melhor amiga, Luna, entra pela janela da sacada e se joga na cama arrumada à cinco minutos atrás.
"Sabe que sua mãe vai te matar se descobrir, não sabe? "
"Ela não vai descobrir" riu Rally
"Mas e se ela desco... "
"Ela não vai, Luna, sai daí"
Luna se levantou de má vontade da cama e foi mexer nas roupas da amiga.
"Nós não devíamos fazer isso" suspirou
"Você sabe que eu gosto de nadar, a única piscina aquecida fica no 3' prédio da escola"
" Isso é tecnicamente invasão, não podemos entrar lá, não tem como, os alunos não usam a piscina de sexta"
"Mas a gente sim. " Disse Rally com um sorriso maléfico nos lábios e a chave do prédio da escola girando em seus dedos.
"Onde conseguiu isso? " perguntou uma Luna muito surpresa, Rally era a pessoa mais certinha que conhecia, e não era de seu feitio furtar chaves de escolas.
"Vamos logo"
Trancaram tudo, pegaram suas mochilas e sairam de casa, sendo seguidas pelo mau olhar da velha Harryinson e o grande cartaz no seu quintal, que dizia "FESTA DE FOGOS DE INVERNO HOJE". O caminho até a escola era longo e não podiam ir de carro, a neve fofa amortecia a caminhada mas não impedia as dores nas pernas, que surgiram ja no começo do trajeto.
Pegaram um atalho que levava a principal estrada da cidade, a neve cobria o asfalto possibilitando futuras quedas. Depois de andar um pouco Rally parou e olhou para trás, Luna não saíra do lugar e seu cabelo ruivo estavam começando a ficar encharcado de neve derretida.
"O que é está fazendo? Anda, está congelando. " reclamou Rally
"Eu não vou por ai"
Rally demorou um tempo para perceber que a amiga estava falando da floresta que ficava do outro lado da estrada cuja aparência era ainda mais sombria no inverno.
Os habitantes de Himmel a chamavam de Floresta Negra. Acredita-se que todo tipo de coisa já acontecera ali. Boatos de assassinatos e suicídios ou até mesmo seres sobrenaturais rondavam pela cidade, as pessoas nunca entravam ali; mães, assim como a de Luna, proibiam seus filhos desde cedo a sequer chegar perto do local, pessoas que entravam nunca mais foram vistas, aumentando o medo da população. Ninguém se atrevia a entrar la, o quão valente fosse.
"Não vamos voltar, estamos quase chegando" Rally recomeçou a andar
"Eu não devia ter vindo com você " choramingou Luna, andando devagar e o mais longe possível da floresta, que parecia uivar com os ventos.
Chegando na escola, algumas crianças se divertiam no parquinho, fazendo bonecos de neve e guerrinhas. A inspetora estava distraída, então aproveitaram a oportunidade e abriram a porta do prédio da piscina , entrando logo em seguida.
A piscina ficava em um enorme salão e ecupava apenas 1/3 dele. A maior parte do salão era composta pela sala de armários e os chuveiros, um verdadeiro labirinto cinza e azul, já que o lugar não possuía janelas.
Rally adentrou local seguida de Luna, que fechava a porta com cuidado. Ascenderam as luzes e ligaram o aquecedor da grande piscina azul refletida dos azulejos.
Tiraram as roupas, revelando por baixo os maiôs de ambas e mergulharam; a água aquecia seus corpos enquanto as maçãs do rosto sentiam o ar gelado do inverno rigoroso.

Os corpos magros e pálidos eram distorcidos na água, o cabelo ruivo de Luna dançava como labaredas de fogo embaixo d'água e as madeixas loiras de Rally desapareciam quando mergulhava.
Nadaram por muito tempo até chegar a hora da escola ser fechada. Não queriam sair da água quente mas os inspetores poderiam aparecer a qualquer momento.
Saíram da piscina e se secaram, não estava muito frio la dentro então não tiveram problemas quanto a isso. Guardaram tudo em suas mochilas e trocaram de roupa; quando estavam prestes a sair a porta do salão foi forçada. Quem queria entrar parecia não desistir tão fácil da ideia.
As duas garotas correram para se esconder entre as infinitas fileiras de armários azuis e desgastados, ficando fora de vista bem no momento de porta ser arrombada, praticamente derrubada.
Sons de passos pesados chegaram aos ouvidos das duas.
"Merda,Rally, eu não devia ter vindo com você " choramingou Luna
"Fique quieta, o que menos precisamos agora é q ele nos ouça" seguraram uma exclamação de susto ao perceberem a sombra se aproximando, cada vez mais perto, então se afastaram e se esconderam o mais longe dela.
"Rally" susurrou Luna, se abaixando com as costas apoiadas nos armarios velhos.
"O que foi? "
"Você acha que pode ser o inspetor Sr. Fidero? "
"Xiii" Rally colocou seu dedo indicador em seus lábios fazendo sinal para ficarem quietas.
Os passos pesados pararam e o som foi ficando cada vez mais distante, sendo quem fosse, estava indo embora. Não havia mais ninguém ali, exceto elas. Esperaram mais um pouco, por precaução.
"Acho que já foi,vamos dar o fora" susurrou Luna
Rally não teve nem mesmo tempo de responder, tudo que pode processar daquele momento fora o estalo horrível de seu pescoço e o som do armário sendo amassado pelo choque de sua cabeça com o mesmo.
O homem não era parecido nem um pouco com o Sr. Fidero, muito pelo contrário. Um homem alto e monstruosamente musculoso, não possui cabelo e seus olhos eram saltados de raiva, um guarda-roupa inteiro de tão grande.
Luna estava sem reação e apenas encarava Rally, que estava muito pálida e desesperada por ar. Em um ato de pânico, ela pega um taco de baiseball que alguém felizmente deixara ali, e o quebra na cabeça do cara gigante.
O ato só fez com que ela chamasse a atenção para si, o que a deixou com mais pânico ainda. Seus olhos saltavam de Rally para homem medonho a sua frente e não tinha ideia do que fazer.
O medo que sentia era intenso, não sabia se era real ou consequência de seu pânico, mas quando o homem estava prestes a alcançar seu pescoço, alguém gritou do fundo da sala:
"Tsc tsc... ei garotão! " a garota que gritara era ruiva,branca e magra - "Sua mãe não te ensinou que é feio machucar garotas? " - completou, sorrindo de canto.
Com uma velocidade incrível, o cara grande partiu para cima da garota como um touro. Os olhos de Luna estavam vidrados na cena até que Rally, ofegante, a puxou pelo braço em direção a saída, que parecia quilômetros mais distante do que realmente era.
"Esperem! " a garota pediu, mas não deram ouvidos.
Correram porta a fora como nunca haviam corrido em suas vidas.
As duas pegaram o caminho mais longo até a casa de Rally, que atrevessava o centro da cidade.
Passavam por cima de qualquer coisa que estivesse em seu caminho. Quase foram atropeladas umas cinco vezes, no mínimo, fora as roupas encharcadas de água de poças de neve derretida.
Pararam em uma esquina, recuperaram o fôlego. Três ambulâncias passaram em alta velocidade seguidas pelo corpo de bombeiros. Avistaram fumaça negra e sentiram um cheiro forte de queimado , que vinha de algumas ruas depois da que estavam descansando. Rally morava bem ali.
Correram mais um pouco até a fumaça, seguindo um bando de curiosos que estavam na frente.
Chagando ao seu destino as meninas se depararam com uma velha Herrynson tão acuada e chocada que chegava a dar pena, só que não.
Abraçada em um cobertor laranja felpudo, a Sra. Herrynson tentava contar, inutilmente, o que acontecera ao policial.
Não era a casa de Rally que estava queimando.
Por ironia do destino, vontade de Deus ou um simples "bem feito", a casa da mais antiga Herrynson era agora uma fogueira gigante enquanto o cartaz "FESTA DE FOGOS DE INVERNO HOJE! " balançava feliz da vida, intacto, ao vento que soprava agradavelmente naquela manhã.