Ninguém é de Ninguém. escrita por Dark Swan


Capítulo 5
Capítulo 5.




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Robin passou os olhos pelo jornal, desanimado. Estava difícil. Ele não tinha profissão definida. Sempre trabalhara por conta própria. Não cursara nenhuma faculdade. — “Está cheio de pessoas com diploma universitário que não conseguiram subir na vida. Vivem de um emprego que mal dá para se sustentarem” costumava dizer para justificar-se de haver parado de estudar quando acabou o primeiro ano. Mas vale quem conhece o mercado, quem aprende na escola da vida. Entretanto essa escola agora não estava sendo suficiente para conseguir-lhe um emprego em que ganhasse o que precisava para sustentar a família.

O advogado ajudara-o, esforçara-se para controlar os credores, parcelando a dívida, tentando dividir o prejuízo. Mas pouco conseguiu. O juiz já havia determinado, e os compradores dos apartamentos não quiseram nenhum acordo diferente. Robin teve mesmo de vender o depósito e ainda ficar com algumas prestações que teria de parar pelo menos durante cinco anos. Ele reservou algum dinheiro para manter a família durante dois meses. Confiava em arranjar um emprego nesse período. Entretanto, já fazia três meses que estava sem trabalhar e, por mais economia que tivesse feito, essa reserva havia se acabado.

Robin sempre se orgulhara de dizer que Regina trabalhava porque gostava e que ele não precisava do dinheiro dela. Agora, no entanto, estavam vivendo com o salário dela, e ele se sentia humilhado por ter de pedir-lhe dinheiro até para comprar o jornal ou ir cortar o cabelo. Além disso, não estava conseguindo pagar as prestações do restante da dívida, e os credores estavam sempre cobrando, alguns até dizendo que ele os estava enrolando, já que morava em uma casa boa e poderia vendê-la.

Robin ficava agoniado. A casa era a única garantia de sua família. Se a vendesse, para onde iriam? O aluguel de uma casa, mesmo mais modesta do que a sua, era caro, e ele, desempregado, como poderia pagar? Resistia. Vender a casa, não. Pelo menos tinham onde morar sem pagar nada. Olhou novamente o jornal, revendo os anúncios na esperança de encontrar alguma coisa. As empresas queriam currículo e experiência de pelo menos dois anos na área, e ele não tinha nenhuma dessas duas coisas.

Regina ajudou-o a montar um currículo que evidenciava sua experiência como gerente do depósito de construção. Graças a esse currículo, algumas empresas o chamaram para entrevistas. Entretanto, ao saberem que ele sempre fora proprietário e havia perdido tudo, não o escolhiam para a vaga. Desesperado, ele dizia à esposa:

— Acho que não deve escrever que eu era o dono. Como é que vão confiar em alguém que abriu falência? Vão pensar que não entendo nada do ramo.

Regina tentou reescrever o currículo, mas, para dizer que ele havia sido empregado, era preciso fornecer o nome das empresas nas quais ele havia trabalhado, e isso era impossível. Robin pensou em ser vendedor. Ele se considerava com talento para vendas, uma vez que foi negociando que arranjou dinheiro para montar o depósito. Mas mesmo na área de vendas estava difícil. Não conseguia nada. Se ao menos ele tivesse dinheiro para montar qualquer coisa por conta própria!

Regina tinha algumas economias. Já havia gasto uma parte, mas recusava-se a gastar o resto. E se as crianças adoecessem? E se ele demorasse a encontrar um emprego? Não. Ela se sentia mais segura tendo algum dinheiro na caixa econômica. Robin não tinha coragem de pedir-lhe esse sacrifício, mesmo porque a importância era pequena e não daria para resolver seu problema. O que ele precisava mesmo era arranjar um emprego. Mas como? A campainha da porta soou e ele foi abrir. Era Cora, que entrou dizendo:

— Vim ver você. Fiquei preocupada. Ainda não arranjou nada?

— Está difícil, mãe. Não sei mais o que fazer.

— Se eu tivesse dinheiro, daria para você abrir outro negócio. Mas infelizmente seu pai me deixou quase sem nada. A pensão mal dá para comer. Se não fosse a ajuda de sua irmã, não teria como viver.

— Eu sei, mãe. Vou dar um jeito, não se preocupe. Uma hora o emprego vai aparecer. Isso não pode ficar assim.

— Ainda se seu cunhado não fosse tão sovino, eu podia falar com Aurora. Mas ele é tão mão-fechada que ela soa para conseguir dinheiro dele.

— Não vou incomodar a família. Eu arranjei esta encrenca e eu tenho que dar jeito.

— Em todo caso, sei que Felipe tem dinheiro guardado. Ganha bem leva vida boa. Você podia ir falar com ele, ver se ele arranja um emprego para você na empresa em que ele trabalha.

— Não vou, mãe. Ele é cheio de pose. Desde que casou com Aurora nunca se chegou do nosso lado. Tem amigos ricos, frequenta lugares de luxo. Não perde chance de dizer que quem não fez faculdade é ignorante. Eu sempre senti que ele não gostava do meu ramo de atividade. É metido a intelectual. Prefiro morrer de fome a ir pedir alguma coisa a ele. E, por favor, nem comente com Aurora a minha situação. Não quero dar asa aquele pedante.

— Sua irmã já sabe de tudo. Sua falência saiu no jornal, todo mundo ficou sabendo. Depois, orgulho não enche barriga. Pobre não pode ser orgulhoso. Quem precisa tem que ser humilde.

— Pois eu não sou. Posso pedir ajuda para qualquer um, menos para Felipe. Depois, não fique dizendo que minha empresa faliu. Não gosto disso.

— Mas não foi o que aconteceu?

— Eu sei. Mas não precisa ficar repetindo isso. Está trovejando e eu vou recolher a roupa do varal.

— Que horror! Você precisa fazer isso? É serviço de mulher!

— Preciso e vou, senão vai molhar tudo. Já está seca. Ele saiu rápido apanhando uma cesta e recolheu a roupa.

Cora olhava-o contrariada. Os primeiros pingos de chuva já estavam caindo quando ele entrou colocando o cesto sobre a mesa da cozinha. Cora tinha lágrimas nos olhos quando disse:

— Meu filho! Que humilhação. Esse serviço deveria ser feito pela sua mulher. Ele se irritou.

— Regina está trabalhando. Estamos vivendo do dinheiro dela, se quer saber. Se ela não estivesse trabalhando, não teríamos o que comer.

— Aquela Granny antipática, assim que o dinheiro acabou, foi embora.

— Ela não foi embora, mãe. Nós não podemos pagar seu salário, então ela arranjou algumas casas para fazer faxina e garantir seu sustento. Quando está, faz o serviço como sempre.

— Quer dizer que ela dorme aqui sem pagar nada? Está se aproveitando de você!

— Você está sendo maldosa. Ela chega cansada e ajuda Regina a fazer todo o serviço da casa.

— Aposto que Regina gostaria que você fizesse tudo.

— Eu estou aqui enquanto elas trabalham. Não sei fazer nada em casa, mas se soubesse faria. Não tem nada de mais. É que não tenho jeito para essas coisas. Nunca aprendi. Cora olhou penalizada para o filho.

— Não encontrou nada no jornal?

— Separei algumas coisas. Vamos ver. - Mentiu ele, na esperança de que ela se contentasse e fosse embora.

— Vou conversar com alguns conhecidos para ver se arranjo alguma coisa.

— Mãe, preferia que não fizesse isso. Deixe comigo. Eu sou auto suficiente, posso cuidar de tudo. Ela deu de ombros, foi até a janela. A chuva forte caía do lado de fora, lavando a calçada.

— Preciso esperar a chuva passar. Ele se resignou e perguntou: — Vou fazer um café, você quer?

— Até isso você faz, agora? Ele fingiu que não ouviu. Colocou a água na chaleira, apanhou o bule, colocou o pó no coador, apanhou as xícaras, o açúcar, colocando tudo sobre a mesa. Sentia vontade de gritar, de obrigá-la a sair mesmo na chuva. Por que ela tinha de ser assim tão irritante? Controlou-se. Afinal, ela não tinha culpa por ele haver perdido tudo e estar naquela situação.

Era sua mãe, devia-lhe respeito e obediência. Coou o café, serviu, tomaram em silêncio. Quando a chuva passou e ela se foi, ele se deixou cair em uma cadeira, mergulhando a cabeça entre as mãos. As lágrimas desceram sobre o rosto e ele as deixou correr livremente. Sentia-se arrasado. Por que a vida fizera aquilo com ele? Por quê?


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