Ovelhas Negras escrita por Bianca Vivas


Capítulo 3
Você já estragou seu futuro




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Maria de Lourdes

Ela esperava na porta da escola. Braços cruzados na frente do peito e uma perna apoiada na parede. As pessoas passavam e a cumprimentavam. Lola respondia com um leve aceno de cabeça e um sorriso. A maior parte deles, ela não conhecia. Os que reconhecia, não fazia questão de falar. Só havia uma pessoa que queria ver naquele momento. A única que ainda não havia chegado.

Quando já estava com as costas e as pernas doloridas por ficar tanto tempo na mesma posição, um carro parou e de lá saíram duas pessoas. Uma menina de cabelos louros e um rapaz alto de fios tão escuros quanto os dela própria. Duas pessoas conhecidas. Juno e Felipe. Lola correu até eles. A curiosidade e a preocupação a corroíam por dentro. Ela precisava saber o que aconteceu após a sua partida. De preferência, pela boca de Felipe.

— Precisamos conversar — ela disse, esbaforida, para os dois.

Felipe olhou de relance para ela, frio demais, e respondeu:

— Eu não quero conversar agora. Muito menos com você. 

Ele continuou andando e deixou uma Lola pasma e confusa para trás. Juno deu um tapinha no ombro da amiga, em solidariedade. Ela ia seguir Felipe para a sala de aula, mas Lola segurou seu braço, impedindo-a de prosseguir.

— O que foi isso? — Perguntou, sem se importar se seria grossa ou não.

— Sinto muito, Lola — começou Juno —, mas você realmente não é a melhor das influências para Felipe, nesse momento. 

— Como? — Ela estreitou as sobrancelhas e soltou o braço de Juno.

— Você ouviu — Juno falou, já saindo da presença de Lola. — Sinto muito mesmo.

Lola levou um tempo para se recuperar. Sabia que era irresponsável e impulsiva, que tinha sonhos demais e ações de menos e que muitas vezes dava a entender que não ligava a mínima para o futuro. Tinha inúmeras histórias que provavam isso. Mas era uma boa amiga.

O comentário de Juno atingiu a garota como um soco no estômago. Seu primeiro pensamento, naquele momento, foi que deveria ligar para Eric ⸺ ele saberia o que fazer, ele sempre sabia.

Apesar de ter rasgado o papel, a imagem dos nove dígitos ficara presa em sua mente. Só que não podia fazer isso. Só machucaria Eric ainda mais.

Ela decidiu, então, que iria conversar melhor com Felipe depois. Quando ele se acalmasse e não estivesse mais sentindo tanta raiva dela. Saiu do lugar em que estava parada e foi andando, de cabeça erguida. Atravessou o pátio da escola, subiu as escadas e se viu no corredor das salas de aulas. Cheio de estudantes. Gente se reencontrando após três meses de separação. Professores conversando com alunos. E pais, muitos pais perdidos, procurando pelas salas dos filhos. 

Entrou na sala do terceiro ano do ensino médio.  Jogou a mochila numa cadeira do fundo, pegou seu celular e voltou para o corredor. 

Não tinha amigos ali. Todos eles já haviam terminado o Ensino Médio há muito tempo. Eric já estava na faculdade. Logo, ela também estaria longe dali. Naquela escola, só havia conhecidos e ela não estava com paciência para conversar com nenhum deles. Portanto, decidiu ir até a biblioteca.

Procurou por seus livros favoritos nas prateleiras e começou a ler enquanto esperava o sinal tocar. Por vezes, seus pensamentos voavam para noite anterior e ela se lembrava do toque de Eric sob sua pele. Sempre tratava de jogá-los para o fundo da mente e se concentrava novamente em seu livro.

Aquele, porém, era o primeiro dia de aula. O sinal não tocou. Contudo, às sete em ponto, a voz da diretora começou a sair das várias caixas de som espalhadas pela escola.

— Por favor, todos os alunos se dirijam ao auditório, onde daremos início à nossa cerimônia de abertura do ano letivo.

Lola suspirou, porém, continuou sentada até que a bibliotecária fosse até ela, pedindo que se retirasse. Como já assistira aquela cerimônia milhares de vezes e sabia que, além de demorada, era insuportavelmente chata, ela decidiu que não iria até o auditório. Ao invés disso, desceu a escada que levava até a quadra. Passou o olho por ali, procurando um lugar que fosse escondido o suficiente para nenhum funcionário achá-la.  Só havia um: a parte de trás da arquibancada.

Para cortar caminho, ela atravessou a quadra, subiu na arquibancada e pulou dali para trás. Quando caiu no gramado, viu duas pessoas se beijando. Era uma menina baixinha do segundo ano e um garoto que ela não conhecia. Provavelmente aluno novo. Como não queria ficar de vela, coçou a garganta para que a notassem.

O casal parou de se beijar imediatamente. A menina viu Lola e ficou vermelha. Acabou se escondendo atrás de seu parceiro de travessuras. Ele, por sua vez, levou um tempo a mais para ver quem havia lhe interrompido. Quando o fez, primeiro se espantou e, depois, desatou a rir. 

— Eu não acredito nisso! — Lola disse, pausadamente, e olhando para Luan.

— Mundo pequeno esse, não? — Ele abriu um sorriso.

— Pois é! — Ela correu até o menino e começou a bater nele que, surpreendido com a atitude da garota, só pôde levantar os braços para se defender. 

— Ai! O que eu fiz?

— O que você fez? — Ela batia mais e mais, sem se importar com a presença da outra menina, que observava tudo. — O que você fez?

Lola deixou seus braços caírem ao lado do corpo. Olhou para Luan. Estava com raiva, muita raiva dele. Quando abriu a boca para falar, sua voz saiu seca e fria.

— O que você tá fazendo aqui?

— Eu estudo aqui. — Luan cruzou os braços e olhou sério para Lola.

Ela mordeu os lábios pensando no que fazer e então agarrou o braço dele. Despediu-se da menina do segundo ano e saiu puxando Luan. Ele passou o caminho todo reclamando e perguntando para onde estava levando-o. Ela não respondeu a nenhuma das perguntas dele. Só parou quando chegou à sala de aula. Empurrou Luan lá para dentro, fechou a porta e ligou a luz.

— Felipe não quer nem olhar na minha cara — ela disparou.

— Hã? — Ele não havia entendido e levou um tempo para se lembrar de tudo o que havia acontecido na noite anterior. — Ah, qual é, Lola? Você nem falava com ele antes disso. Até parece que está se importando tanto assim.

Lola deu um tapa no braço dele.

— O problema não é esse, seu idiota! — Ela puxou uma cadeira e sentou. — O caso é que Juno deve ter contado tudo o que aconteceu para ele e se ele falar para os pais dele, os pais dele vão falar com a minha mãe e eu estou ferrada. 

— Por quê? Quem estava bêbado e drogado era ele. — Luan sentou ao lado dela. Ria ironicamente.

— Acontece que eu vou ser acusada de ter dado essas porcarias a ele. E graças a você! — A voz dela subiu dois tons. Ela bateu as mãos na mesa, em sinal de raiva.

— Relaxa, Lolita. Vai dar tudo certo. — Luan apertou a bochecha dela e se levantou.

Ele abriu a porta e viu, parada do lado de fora, Juno. Lola apenas fechou os olhos.  

— Ah, quer dizer que agora você estuda aqui... — Juno observou, quando viu o uniforme dele.

Ele sorriu para ela e saiu. Juno olhou para Lola, que abaixou a cabeça. Se sua mãe descobrisse o que acontecera na noite anterior, ela estava ferrada. Sua vida se transformaria em um inferno.

Juno sentou na cadeira que Luan estava segundos antes. Inclinou o corpo para perto da amiga e passou as pontas dos dedos pelas tranças da garota.

— Fica tranquila, Lola. Felipe não vai contar nada.

— Não? — Ela perguntou sem levantar a cabeça.

Juno assentiu, segurando o rosto da garota nas mãos.

— Mas, antes de você agradecer, eu gostaria de te pedir algo. — Juno falava hesitando, como se estivesse pisando em ovos, o que foi motivo para Lola logo ficar em alerta. — Eu queria te pedir para ficar longe de Felipe.

A sala de aula vazia ficou em silêncio, como se nem elas estivessem ali. 

— Como? — Maria de Lourdes levantou a cabeça devagar, se livrou das mãos de Juno e fitou a garota à sua frente. — Eu não vou fazer isso.

— Ah! Pelo amor de deus, Maria de Lourdes! — Juno gritou. — Você nunca nem tinha olhado na cara dele antes e agora quer que sejam melhores amigos? Deixe as coisas como estavam! 

— Acontece que eu nem conhecia ele antes. — Lola se levantou. — Eu não vou fazer isso e fim.

— Eu repito o que disse ontem. — Juno se levantou também. — Você já estragou seu futuro, não estrague o dele também.

As duas se encararam. Naquele momento, ninguém poderia dizer que já haviam sido melhores amigas. Pareciam apenas duas inimigas, sem nada que as ligasse além do ódio mútuo. Porém, antes que pudessem agredir uma a outra, a porta se abriu. Por ela passaram todos os alunos da turma do terceiro ano. Incluindo a professora chata de português.


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