Ovelhas Negras escrita por Bianca Vivas


Capítulo 26
O meu... Amor




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Maria de Lourdes

Ela nem sabia o motivo de Eric tê-la seguido, ele não tinha muito a ver com aquela história, mesmo tendo a ajudado mais cedo. Sabia, apenas, que tinha de falar com sua mãe. Ela queria pedir desculpas. Porém, algo a impedia. Parecia uma espécie de bloqueio. Toda vez que tentava, as duas acabavam brigando.

Então, quando Eric abaixou o vidro do carro e ela viu seu rosto familiar, não pensou duas vezes. Entrou no carro sem dizer uma única palavra e ele aceitou a presença dela ali, sem questionar. Talvez, o rapaz apenas não quisesse que ela se afastasse de novo, como havia feito nos últimos tempos. Ou, talvez, só estivesse preocupado.

Depois de um tempo parados, ali, na calçada, ela contou a Eric das brigas com a mãe. Ele ouviu sem dizer nada, enquanto tirava a menina dali. Não havia nada a ser dito. Ele havia ficado distante por tempo demais, ela havia feito isso à relação dos dois, não podia exigir que ele se sentisse confortável para sair lhe dando conselhos ou emitindo opiniões.

Ainda assim, Eric sugeriu que ela ligasse para a mãe, alguns minutos depois que Lola parou de falar. Ela queria muito seguir o conselho dele, mas as palavras lhe fugiam toda vez que discava o número da mãe. Talvez fosse mais fácil ficar com Eric, onde quer que ele estivesse indo, até aquela confusão de sentimentos passar.

Lola recostou a cabeça no vidro do carro, depois de muitos minutos, e observou enquanto as luzes da cidade ficavam distantes. Ele tinha prometido, em algum momento da conversa, que a levaria para um lugar seguro. Lola achava que sabia onde era esse lugar. Pegou-se sorrindo quando chegaram à estrada deserta. Ir para longe de tudo talvez fosse a solução, mesmo que a distância nem fosse tão grande assim.

Eric não dizia uma única palavra. Vez ou outra, segurava a mão dela por um tempo, só para depois soltá-la. No fim, ele colocou o álbum novo da Taylor Swift para tocar. Lola se perguntava onde ele tinha arranjado aquilo. Pelo que ela se lembrava, Eric odiava aquele tipo de música. Contudo, ela não ficou muito tempo pensando naquilo. A Lua e as estrelas, a estrada silenciosa e o toque ocasional de Eric se misturavam à melodia da faixa Lover e Lola sentiu suas pálpebras pesarem. Aquele fora um longo dia e ela nem percebeu quando adormeceu, com a cabeça colada no vidro da janela.

— Já está acordando? — Ela ouviu a voz de Eric antes de vê-lo.

Levou um tempo para que conseguisse abrir os olhos. Mais tempo ainda até ajustar sua visão à repentina claridade. Procurou por Eric e o viu sentado numa poltrona à sua frente. Segurava um livro velho nas mãos e o fechou assim que viu Lola sentando na cama.

— Onde estou? — Ela perguntou, mesmo sem se importar com isso. Olhava ao redor, procurando por algo conhecido, porém, era tudo estranho.

— Num flat dos meus pais — ele disse, esticando os braços como se quisesse abraçar o quarto todo. — Todo redecorado, é claro.

— Sandra e Garcia não vão estranhar que você não está em casa? — Lola fez outra pergunta com a qual não se importava realmente.

— Eles nem vão perceber. — Eric piscou para ela.

Em seguida, o menino levantou da poltrona e foi até a cama. Sentou ao lado de Lola e começou a encará-la. A menina sentiu seu rosto assumir tons de vermelho. Não era de se envergonhar facilmente, mas Eric tinha esse efeito sobre ela. Sempre tivera. Entretanto, ele também podia ser um calmamente ou uma pílula do bem-estar. Naquele momento, era um pouco dos dois.

— Mas os seus pais vão perceber. — Ele quebrou o encanto. — É melhor você ligar logo.

Lola olhou para o celular que Eric estendia para ela sem realmente acreditar. O que mais gostava em Eric é que ele não fazia muitas perguntas e nem se metia na vida dela. Parecia que ele tinha resolvido mudar isso. E a pior parte é que ela sabia que ele estava certo.

— Posso deixar isso pra mais tarde? — Ela perguntou, quase suplicando. — Só um pouquinho? Eu acabei de acordar e é madrugada ainda...

Eric suspirou e abaixou o aparelho.

— Tudo bem — ele disse, por fim, segurando uma das mãos de Lola entre as suas. — Mas não é só com a sua mãe que você tem que conversar, Lourdinha.

Foi a vez dela de suspirar. Sabia que aquela conversa surgiria mais cedo ou mais tarde. Não teria para onde fugir. Não dessa vez, afinal, ela estava no apartamento dele. Não haveriam elevadores nos quais ela pudesse entrar ou carros dos quais ela pudesse saltar. Tampouco aquela situação poderia ser dispensada como se dispensa uma ligação indesejada. Estava presa ali, naquele momento. Precisava enfrentar os fantasmas de seu passado.

— O que você quer saber? — Ela perguntou depois de um tempo em silêncio. Não tinha mais escapatória.

— Ok — Eric parecia um pouco surpreso, aquela não era a típica Maria de Lourdes —, vamos começar do início? Por que você me afastou do nada?

Ela teve vontade de rir, mas preferiu calar-se. Ele realmente não lembrava do que havia acontecido? Ou só estava se fazendo de bobo?

— Bem — ela começou, meio hesitante meio ansiosa —, lembra daquela suspensão que você levou quando estava no terceiro ano? — Eric assentiu com a cabeça e incentivou a menina de tranças a continuar a falar. — Então, eu sei que você estava tentando uma bolsa de estudos numa Ivy League e eu sei como uma suspensão destruiria todas as suas chances, e eu sei que foi culpa minha também. E, como se não bastasse Juno enchendo minha paciência o tempo inteiro por qualquer coisa, principalmente quando eu falava alguma coisa daquele namorado estúpido dela, você ainda foi rejeitado pela Universidade e eu sei que aquilo era seu sonho e...

Lola interrompeu a fala no meio, porque mesmo estando quase chorando, a reação de Eric havia sido gargalhar. Parecia que ele achava aquela situação toda muito engraçada. A menina não conseguia entender. Estava prestes a ralhar com ele, mas o menino foi muito mais rápido:

— Quer dizer que você ficou sem falar comigo por que eu levei uma suspensão? É sério isso, Lourdinha?

Lola pegou o primeiro travesseiro que viu e jogou nele. Detestava que zombassem de seus sentimentos, ainda mais nas raras vezes que ela ousava mostrá-los para o mundo.

— É sério! — Lola gritou. — E eu não me afastei por causa de uma suspensão, me afastei porque estraguei seu futuro e destruí seus sonhos, e não queria fazer isso de novo.

— E quem te disse que você estragou meu futuro ou destruiu meus sonhos, hein? — Eric aproximou o próprio rosto do de Lola, com um sorrisinho de canto.

— Juno — ela respondeu friamente. — Ela me disse que depois da suspensão, que você levou por minha culpa, Harvard te recusou.

Eric assentiu, como se estivesse entendendo tudo, mas, em nenhum momento, desfez o sorriso que carregava no canto da boca. O que poderia ser tão engraçado assim, hein? Aquele assunto era bem sério.

— Olha, vamos começar pelo fato de que a minha suspensão não foi culpa sua — ele disse, e quando ela estava prestes a protestar, Eric pôs um único dedo sobre seus lábios, calando-a. — Eu levei aquele chá pra escola, eu que bolei ele, eu que acendi e eu que fumei. Você pode ter me pedido para fazer isso, mas eu fiz porque quis e, se você fosse pega, levaria muito mais que uma suspensão e sabe disso! Então para de se sentir culpada, por favor, Lourdinha. A culpa foi minha e nunca deixei de arcar com as consequências dos meus atos.

— Mas... Harvard... — Ela balbuciou as duas palavras, quase sem força na voz.

Sempre fora o sonho de Eric estudar fora do país, numa Ivy League. Ele sempre fora um excelente aluno, com excelentes notas, tinha um inglês perfeito e participava de vários tipos de atividade extracurriculares. Era com um menino de ouro, ninguém duvidava que ele conseguisse entrar em uma dessas disputadas universidades. Até o dia que Lola disse que queria fumar um baseado depois da aula e pediu que ele levasse a maconha para ela.

Eric, então, foi pego fumando atrás da quadra da escola. Quando viu Lola se aproximando, ele fez sinal para ela dar meia-volta e a menina obedeceu. No dia seguinte, soube que seu quase-namorado-e-amigo-colorido estava suspenso. Meses depois, ele foi rejeitado por Harvard, a única universidade norte-americana para a qual havia se candidatado. E ela... Ela teve que viver com a culpa de quem havia destruído a vida da pessoa que mais amava nesse mundo.

— Mas Harvard nada — Eric ria, como se ela estivesse falando uma grande bobagem. — Eu não fui para lá porque eu não quis.

Foi a vez de Maria de Lourdes rir.

— Me poupe, Eric, era seu sonho! — Ela gritou amargamente.

— E eu desisti porque eu queria ficar perto de você! — Ele gritou de volta. — Eu fui aceito, ok? Mas eu preferi não ir porque queria ficar com você, só que você começou a me ignorar do dia para a noite — a última frase quase não saiu, o tom de Eric evidenciava o seu sofrimento.

Lola encarava o menino louro a sua frente sem nem acreditar no que ouvia.

— Se não acredita em mim, fique à vontade para vasculhar meus e-mails. — Ele estendeu o braço, apontando para o próprio notebook, jogado a um canto. — Mas você nunca destruiu nada em minha vida, Maria de Lourdes. Não ir para Harvard foi uma decisão minha.

Eric olhava para Lola com uma expressão séria no rosto. Os olhos azuis dele brilhavam, mas ela não sabia dizer qual tipo de fulgor era aquele. A única coisa em sua mente agora era Juno. Sua ex-melhor-amiga havia mentido e ela havia decidido acreditar. Lola afastara Eric porque acreditou no que Juno dissera, que ela havia destruído o futuro do garoto.

— Eu não sabia — ela disse, por fim, com um fiapo de voz. — Me desculpe, me desculpe de verdade.

— Tudo bem — ele respondeu, alisando as pontas dos dedos da garota sentada ao seu lado.

Os dois ficaram em silêncio por um tempo, no meio da madrugada, apenas ouvindo a respiração um do outro. Lola sentia, também, as lágrimas queimando em suas bochechas sem conseguir controlá-las. Ela nunca recuperaria aquele tempo perdido, ou tamparia o vazio que a falta de Eric deixou nela durante tanto tempo, por sua única e exclusiva culpa.

Nem se questionava os motivos de Juno ter feito o que fez. Não fazia isso há muito tempo. Algumas pessoas são a definição mais perfeita do que é ser um animal irracional, Lara e Juno eram os exemplos mais próximos que ela tinha dessa verdade.

Ainda assim, perguntava-se de onde viera a confiança cega nas palavras de Juno. Talvez, fosse só um mecanismo que ela mesma usou para se proteger dos sentimentos que nutria em relação a Eric. Talvez, ela só quisesse esconder de si e dele que ela...

— Eu te amo — Lola disse de repente, sem planos ou enrolações. As palavras apenas soltaram-se de seus lábios e soaram através de sua garganta, dando voz a louca epifania de pensamentos sobre o assunto que ela estava tendo.

— Eu também te amo — Eric respondeu, olhando-a nos olhos.

Os dois, então, começaram a se encarar. Ficaram se olhando por um bom tempo, sem saber o que fazer. Então, finalmente, deram vazão ao sentimento e ao desejo, reprimidos por tantos dias, meses, anos... Eles se beijaram. 

 


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