Ponto de vista de Ucker

O estúdio ficava em um prédio de dois andares, com fachada de vidro, salas amplas e decoração moderna. Depois de se apresentar a recepcionista, Christopher precisou esperar apenas alguns minutos até que seu amigo pedisse para que ele entrasse em sua sala.

– Christopher, a que devo essa visita tão inesperada? - Carlos Eduardo perguntou, levantado-se da sua cadeira quando viu o amigo entrar. Cadu, como era chamado pelos mais íntimos, conhecia Ucker da época que o cantor gravou o seu primeiro CD solo. Além de ser dono do estúdio, Carlos também era produtor musical e ajudara Chris na escolha do repertório. Os dois ficaram muitos próximos e não era raro que se procurassem para trocar ideias ou apenas para colocar o papo em dia.

– Ué, não posso mais visitar um velho amigo? – O outro brincou indo até o produtor para abraçá-lo.

A recepcionista trouxe café e biscoitos e os dois amigos engrenaram em uma conversa animada sobre música, trabalho e vida pessoal. Uma hora se passou até que Cadu interrompesse o papo e tomasse coragem para fazer a pergunta que estava o intrigando desde que Christopher chegara ali.

– Meu caro, sei que você não veio até aqui somente para me fazer uma visita de cortesia. Só pelo seu jeito sei que tem algo te incomodando. E então, como posso ajudá-lo? – O produtor resolveu ir direto ao assunto, deixando as amenidades de lado.

– Poxa, está tão evidente assim? – Ucker riu da sinceridade de Cadu – Então meu caro Carlos, você sabe que eu prezo muito pelos seus conselhos, não é? E hoje pela manhã recebi uma notícia muito delicada e não sei o que fazer... Por isso resolvi vir te procurar – Ele abriu o jogo, sentindo-se aliviado por enfim poder falar sobre o problema que vinha o incomodando tanto.

– Por favor, conte-me tudo! Ajudarei da melhor forma possível – Cadu respondeu de maneira carinhosa, antes de pedir mais uma rodada de café pelo telefone.

– Então, como estávamos falando, estou de volta ao RBD para uma turnê especial. E não sei se você sabe, mas eu namorei com uma das minhas companheiras de banda, a Dulce. Na época nós não chegamos a anunciar oficialmente o nosso relacionamento, mas nos gostávamos bastante e nos dávamos muito bem. Mas no fim, quando a banda acabou, a gente terminou... Na verdade foi um vacilo meu... Eu tinha medo de estar confundindo as coisas, sabe? Porque tínhamos que fazer encenações amorosas para os fãs e fiquei com receio de estar só me deixando levar, de aquilo não ser fruto de um sentimento de verdade. De ser algo frágil, insustentável... – Chris explicou enquanto a recepcionista servia o café e se retirava, deixando-o a sós novamente.

– Mas, naturalmente, você acabou descobrindo que o vocês tinham era algo realmente forte e sólido... – Cadu opiniou dando um gole na sua bebida.

– Sim, mas isso aconteceu tarde demais... – Ucker queixou-se mexendo nos cabelos – Acabamos ficando separados por todo esse tempo sem muito contato. Ela continuou a sua vida, ficou noiva, fez carreira solo, e é um sucesso em todo o mundo... E eu convivi com esse erro ao longos dos anos. Por isso, quando me fizeram a proposta para voltar ao RBD eu não pensei duas vezes. Era como se o destino estivesse me dando uma segunda chance, entende? E o recado era claro: Vê se não vai fazer tudo errado de novo!

– Nossa, mas essa história renderia uma ótima novela, hein? Não é sempre que encontramos amores como esse... – Cadu opinou – E aí você voltou para a banda, mas e ela? Como foi que te tratou depois de todos esses anos?

– Bom, no começo foi um pouco complicado... Nenhum dos dois sabia como agir, nos atrapalhamos nos ensaios, erramos as coreografias, foi uma loucura… - Ele riu ao se lembrar - Mas com o tempo nos acertamos e agora estamos em uma situação bem complicada... Porque sempre que estamos sozinhos nós acabamos ficando, mas como é comprometida, ela acaba ficando com peso na consciência, então fingimos que nada aconteceu... Já tem um mês que estamos nisso! E eu tento resistir para não complicar ainda mais as coisas, mas a atração que sentimos um pelo outro é muito grande. Não dá para controlar, cara... Quando estou perto dela é algo... inexplicável. Tudo o que eu preciso é estar o mais próximo o possível dela e nada mais importa... – O cantor se surpreendeu com a honestidade de suas palavras. Ele não pretendia expor os seus sentimentos daquela maneira.

– Peraí, mesmo estando noiva ela ainda fica com você? Caramba! Então pelo jeito não é só você que se sente dessa forma... Tenho certeza que é uma questão de tempo para que vocês se acertem. E espero que dessa vez você esteja certo dos seus sentimentos para não perder essa oportunidade – Cadu ponderou, bastante impressionado com o relato que estava ouvindo.

– Então, é aí que entra o problema... Não quero pressionar a Dulce. Eu a conheço bem e sei que não gosta de ficar mentindo ou enganando as pessoas. Também acho que é uma questão de tempo até nos acertamos de vez... Eu estava até que tranquilo com essa situação, mas hoje uma bomba caiu sobre o meu colo e eu não sei como agir – Chris voltou a ficar agitado, mexendo-se na cadeira.

– Por Diós, hombre! Conte-me logo de uma vez! – Carlos Eduardo pediu sentindo a aflição do amigo.

– Há um tempo eu dei uma festa na minha casa de praia e, por coincidência, Dulce e o noivo estavam na cidade e acabaram dando uma passada por lá. No dia o senhor que cuida da casa para mim há anos me disse que havia reconhecido o noivo dela da semana anterior. Parece que ele estava nas redondezas e parou para pedir uma informação. No dia eu não dei atenção para isso, mas hoje ele me ligou e disse que ontem viu esse mesmo homem caminhando na beira do mar com uma mulher. Disse que estavam abraçados e que se beijaram carinhosamente em um canto mais reservado da praia. Meu funcionário diz não ter dúvidas que trata-se do noivo da Dulce e que não é a primeira vez que ele vai até a Puerto Vallarta com essa mulher. Ou seja, ele está traindo a Dul e pelo jeito não é um caso passageiro – O cantor sentiu como se estivesse tirando um peso das suas costas. Guardar aquela informação só para si já estava o enlouquecendo.

– E agora você não sabe se deve contar ou não... Caramba, é uma situação muito delicada! Porque se você não contar, ela pode se sentir traída, achar que você escondeu algo muito importante dela... – Cadu começou a analisar as possibilidades ficando tão preocupado quanto Ucker.

– Mas por outro lado, se eu contar, ela pode pensar que estou tentando tirar proveito da situação, tipo, que só contei porque queria ficar com ela... Ou pior, a Dulce pode até mesmo considerar a hipótese de eu estar inventando tudo isso apenas para vê-la longe do Rodrigo. Cara, eu não sei o que fazer... Nesse momento a nossa relação ainda está muito frágil, muito superficial, uma notícia dessas pode abalar tudo – Christopher sentia-se sem saída, sufocado, como se as paredes ao seu redor estivessem se fechando contra ele e não tivesse para onde ir.

– E ela nem desconfia dessa situação?

– Não sei, Cadu. Nós não falamos muito sobre o noivo dela... Mas acho difícil que ela saiba de algo. Dulce não é do tipo que ficaria com a pulga atrás da orelha. Ela daria um jeito de tirar a história a limpo... – Ucker explicou remexendo o seu café pela centésima vez. Ele estava tão nervoso que mal tocara na bebida que agora já estava fria e muito mais amarga que o normal.

– Sem dúvidas você está em uma posição complicada! Se eu fosse você, eu esperaria um pouco. Espere para ver se esse lance de vocês vai realmente ficar sério, ou se ela vai dar algum sinal de que está desconfiando do noivo. O momento agora é muito crítico para fazer um anúncio desses – Carlos Eduardo opinou com a voz séria.

– Pois é, e ainda tem a nova turnê que começa em novos dias, os shows... É muita novidade, muitas mudanças... Tenho medo que isso possa atrapalhar a Dul profissionalmente – Foi a vez de Chris falar, agora já um pouco mais calmo.

– Sim, sim... Precisamos levar tudo isso em consideração. Dê um tempo Ucker, mas também não espere muito. Assim que se sentir seguro, que perceber que ela confia o suficiente em você e que você poderá dar o suporte que ela vai precisar ao ouvir essa notícia... Aí você conta!

– É um sábio conselho, amigo. Se não fosse você já teria metido os pés pelas mãos... Mas está certo. A nossa relação precisa de um pouco mais de base para que eu possa jogar uma bomba como essa sobre nós – Chris dise, finalmente conseguindo respirar aliviado desde que recebera aquele telefonema pela manhã.

– Mas não se esqueça: Você precisar mostrar para ela que dessa vez é para valer. Se ela duvidar disso em algum momento, aí já era... Você perde a garota! – O produtor o advertiu.

– Novamente, sábias palavras! Onde aprendeu tanto sobre relacionamentos, cara? – O cantor perguntou, intrigado.

– Acho que já ouvi tantas músicas de amor que, pelo menos na teoria, você acaba aprendendo uma coisa ou outra.... – Carlos Eduardo riu – Mas sei que na prática é tudo muito mais complicado. Por isso te desejo sorte, amigo! Porque sei que você vai precisar!

– Você tem razão... Precisarei de muita sorte e coragem. Mas pelo menos agora tenho um plano de ação: Ganhar a confiança da Dul, esperar pelo menos até que esse período de estreia passe e então abrir o jogo – Ucker foi contando os tópicos na ponta dos dedos, como se fosse um passo a passo simples de se seguir – Bom, eu preciso voltar ao hotel, Cadu. A rotina de ensaios e entrevistas está pesada e mal temos tempo para dormir. Vou aproveitar o resto do meu dia de folga para descansar e refletir melhor sobre tudo isso. De qualquer maneira, você me ajudou muito. Como eu disse, agora eu tenho um norte. Antes estava completamente sem rumo – Ele completou, mexendo nos cabelos e sorrindo.

– Sempre que precisar, Christopher. Estamos aqui para isso! Espero que os meus conselhos te sirvam para alguma coisa... E se isso der casamento, quero ser convidado para a festa! – Eduardo fez piada, levantando-se da cadeira para se despedir do amigo.

– E você será, pode apostar! Mas vamos com calma! Um passo de cada vez! – Ucker respondeu confiante

– Obrigada mesmo, Cadu! E desculpa te atormentar com um problema tão íntimo... É que eu não tinha como falar desse assunto com o pessoal da banda ou da produção, não sei se você me entende...

– Claro que entendo! E fique tranquilo! Foi um prazer poder ajudar!

– Então até mais, cara! Te mando um CD do RBD assim que lançar! Você vai adorar, as novas músicas estão ótimas! – Ucker disse antes de se despedir do amigo. Depois os dois trocaram mais algumas amenidades e por fim, Christopher deixou a sala.

Ele mandou uma mensagem para a Linda que não demorou a aparecer. Em questão de minutos ele já estava no carro, seguindo para o hotel.

– E então? Problema resolvido? – A assessora puxou assunto enquanto dirigia.

– Linda, minha cara, quando se trata de Dulce Maria nenhum problema nunca está resolvido, pelo menos para mim... – Chris comentou em tom de mistério – Mas eu diria que tudo está bem encaminhado. Os dados foram lançados. Se eu tiver sorte, e se souber dominar o jogo, saio ganhando dessa...

Ponto de vista de Dulce

Como se não bastasse estar super encanada com o fato de Christopher ter saído como um foguete dos estúdios da Televisa para sabe-se lá onde sem nem se despedir, Dulce ainda teve que ficar aguentando Anahí e Maite falando em seu ouvido sobre a sua gafe no programa.

Aquela tarde ensolarada era para ser um tempo livre para relaxar dos dias tão corridos de divulgação. Mas para María estava sendo um tormento. Não tinha ouvido notícias de Ucker até então. Mas como ficara o tempo topo na piscina com o pessoal da banda, não tinha como saber se Chris já tinha voltado ao hotel. O que a deixava profundamente frustrada porque não podia ficar perguntando por ele sem levantar suspeitas. Logo, não tinha outra opção senão aguentar as colegas de grupo empenhadas em infernizá-la.

– Você teve sorte porque os produtores avisaram o Yordi para pegar leve com você e Chris - advertiu Maite - Se não ele não teria deixado passar aquela sua olhada nada discreta pra ele!

– Que olhada Mai? - se fez de desentendida Dul - Vocês estão vendo coisas. Eu não estava olhando para ninguém especificamente. Foi uma resposta generalizada, só isso...

– Sei, sei - a interrompeu Any - Você pensa que me engana né Dulcezito?! Não nasci ontem, ok? É obvio que tá rolando alguma coisa aí...

– É... - emendou Maite - Vocês dois andam muito esquisitos. Aliás, desde o primeiro dia de ensaios. E depois daquele seu chilique de não querer mais ficar perto do Chris... E depois daquelas fotos que saíram de vocês na praia... Você não pode negar Dul. Onde há fumaça, há fogo!

– Ya basta, chicas! - se exaltou Dulce, sem perceber que estava soando muito na defensiva - Nesse caso não tem nenhum fogo, ok?! Deixem de ficar me atazanando. Eu e Chris estamos nos dando super bem, mas não há nada além de amizade entre nós!

Mai e Any trocaram um olhar malicioso. Elas não estavam acreditando em uma palavra do que ruiva dizia. Dulce decidiu que não ia ficar mais ali recebendo as alfinetadas das amigas. Ainda que elas tivessem absoluta razão em tudo que estavam dizendo, não deviam desconfiar dela. Deviam era acreditar que estivesse dizendo a verdade! Mas pensando bem, estava difícil mesmo de engolir aquela história. Só que Dulce não tinha opção, ela tinha que continuar escondendo. Ou melhor, agindo como se nada estivesse acontecendo. Se levantou da beira da piscina quando viu Poncho vir correndo na direção deles. Estavam, além das garotas, Christian e uns músicos da banda.

– Chaaaavos! - exclamou ele animado - adivinhem quem por fim apareceu? Christopher!! - e logo todos começaram a comemorar e dizer “finalmente”, mas Poncho acrescentou - Pera aí gente, nem adianta ficarem animados. O vacilão disse que não vai vir se juntar a nós na piscina. Falou que está “indisposto e precisa descansar” - todos riram do jeito que Alfonso afinou a voz para falar aquela última parte.

Óbvio que ninguém engoliu a desculpa de Ucker. Uns ficaram dizendo que ele devia ter ido ver alguma garota e que agora estava cansado por causa do que ficou fazendo com ela. Dulce tentou não reagir aqueles comentários. Tentou parecer indiferente. Mas por dentro estava explodindo de raiva. Por eles estarem falando aquilo e porque, talvez, pudesse ser verdade. Nada impedia Christopher de ficar com ninguém. Ele era solteiro, livre e desimpedido. E afinal não estava acontecendo “nada” entre os dois. Mesmo assim, Dul ficou muito incomodada com os comentários. Se já queria ir embora da piscina antes, agora ela iria mesmo!

Levantou-se e se despediu de todos falando que estava com dor de cabeça e queria ir descansar. Sua desculpa também não foi engolida pelo pessoal, mas ela não estava nem aí. Precisava subir para o quarto, precisava procurar Christopher. Não porque estivesse com ciúmes, mas algo parecia estar acontecendo com ele. Desde que recebera aquela ligação antes de gravarem o programa naquela manhã Chris estava muito estranho. Maria não podia evitar se preocupar com ele. Afinal, acima de tudo, eram amigos e queria ajudá-lo. Ele não quis contar nada naquela manhã talvez porque estava muito recente, mas agora era possível que quisesse... De todas as formas ela se convenceu de que tinha que ir atrás dele.

Subiu até o andar onde estavam hospedados, foi até a porta do quarto e bateu. Ela só estava encostada e se abriu com o toque de Dulce, o que era muito estranho. Ela então chamou por ele que veio em seguida atendê-la. Sua aparência estava péssima. Será que era verdade que ele estava indisposto no fim das contas?

– O que aconteceu, porque não se juntou a nós na piscina? - perguntou Dul quando ele fez sinal para ela entrar no quarto.

– Nada, só não estou me sentindo muito bem, só isso... - desconversou ele virando-se de costas e andando em direção a cama.

– Conta outra, Christopher Uckermann! - insistiu Dul - Você está todo esquisito desde de manhã. Depois do programa saiu para não sei onde sem nem avisar nada aos produtores - ou a ela, quis acrescentar, mas se conteve - E agora chega e já vem pro quarto. Fala sério, esse não é o seu normal. Precisa mais que uma mal-estar para fazer você agir assim.

– Agradeço a preocupação, Dul - devolveu ele ainda sem dar o braço a torcer - Mas realmente não aconteceu nada. Eu acho que devo ter comido algo estragado lá na Televisa ou algo assim, os petiscos deles nunca me fizeram muito bem...

– Verdade - concordou ela, lembrando-se da época em que gravavam Rebelde e de como a comida dos camarins realmente nunca caia bem para Chris. Mesmo assim a ruiva continuou desconfiada, achando que ele estava escondendo algo, porém achou melhor não perturbá-lo mais com aquilo. Então mudou de assunto - Bom, você não ia gostar muito mesmo do clima lá na piscina...

– Por que? - perguntou ele, curioso.

– Por nada - começou Dul, mas depois completou - É que a Anahí e a Maite ficaram me enchendo por causa do que eu fiz no programa.

– O que você fez?

– Tá vendo, eu disse que não tinha sido nada demais, você nem ao menos reparou - falou Dulce mais querendo convencer a si mesma do que qualquer outra coisa.

– Eu acho que estava distraído, mas afinal o que foi que aconteceu?

– Não importa - desconversou ela um pouco constrangida por lembrar do que havia dito - O fato é que agora elas, principalmente a Any, estão desconfiando que está acontecendo alguma coisa entre nós. E você

sabe como ela é, vai ficar no nosso pé até descobrir algo.

– Mas Dul - interveio ele com um sorriso tímido maravilhoso que deixou Dulce sem ar - Na verdade não está mesmo acontecendo nada entre nós...

– É, eu sei - ela revirou os olhos também não conseguindo conter um sorriso - Mas isso não vai parar a “detetive Any”. Quando ela quer, descobre até coisas que não existem!

Aquilo estava ficando engraçado, mas quando eles pararam para pensar no assunto ficaram sérios de repente. O fato de estarem fingindo que nada acontecia entre os dois, não impedia que alguém, no caso a Anahí, descobrisse tudo. E se eles estivessem dando bandeira esse tempo todo? Dulce coçou a cabeça enquanto tentava se lembrar das inúmeras vezes em que ela e Christopher tinham ficado ás escondidas, se alguém poderia tê-los visto. Ela não se lembrou de nada, afinal eles procuraram tomar cuidado. Ainda assim, a atitude deles pode ter entregado alguma coisa. Como aquela gafe de Dulce no programa ou então o fato de ela ter saído da piscina assim que falaram que Ucker havia chegado no hotel e ido pro quarto. Droga, ela havia dado uma bandeira imensa! Logo que constatou isso, como uma piada muito sem graça do destino, começou a ouvir-se o som de alguém batendo na porta e gritando. A voz inconfundível era de Any.

Dulce olhou para Chris mortificada. Ele parecia quase tão desesperado quanto ela. Any não podia de jeito nenhum ver Dulce ali. Isso entregaria tudo. Ela teria certeza que algo estava acontecendo entre os dois! Por sorte Dul havia trancado a porta quando entrara, mas isso não ajudava muito já que a loira era insistente e não parecia querer esperar muito. Imediatamente Dulce começou a gesticular e mexer a boca sem emitir som. Ucker indicou o espaço em baixo da cama, da mesma forma que ela fizera mais cedo com a penteadeira do camarim. Ela negou com a cabeça contundente. Depois começou a olhar em volta. Não viu nenhuma saída melhor do que se enfiar no banheiro. Era isso ou então se jogar pela sacada. O que não seria legal considerando que estavam no 13º andar. Então ela ficou em silêncio enquanto ouvia Chris abrir a porta e torceu para que Any não sentisse vontade de ir ao banheiro.

Ponto de vista de Ucker

Ucker respirou fundo algumas vezes antes de abrir a porta. Não bastasse o telefonema do funcionário com a notícia sobre o noivo de Dulce que já havia lhe roubado toda a paz, agora ele ainda precisaria enfrentar a fúria descontrolada da Anahí em busca de alguma informação. Se ele não falara a verdade ao dizer que estava com dor de cabeça antes, agora com certeza era só questão de tempo até que uma enxaqueca de verdade aparecesse.

– Bueno – Ele disse ao abrir a porta, com a voz sem nenhum ânimo.

– Fiquei sabendo que estava doente, e como sou a única mãe deste grupo, resolvi checar se está tudo bem com você... – Anahí respondeu com um falso tom de meiguice enquanto contorcia o corpo para todos os lados tentando ver o que havia dentro do quarto.

– Doente? Não, não... Eu estou ótimo! É só uma dor de cabeça à toa! Já, já, passa! – Ucker tentou desconversar, mantendo o corpo em frente à porta de propósito, só para deixar a loira ainda mais intrigada.

– Ahhh, é aí que você se engana! Uma dorzinha de cabeça à toa pode ser o sintoma de algo muito mais grave, e não podemos nos dar o luxo de perder um integrante da banda às vésperas da estreia! Venha, Uckerzinho! Preciso fazer um check up completo em você! – Antes mesmo que ele pudesse perceber, ou pior, antes que pudesse fazer qualquer coisa para impedir, a companheira de banda já havia o empurrado para dentro do quarto, entrando logo atrás dele.

– Que isso, Any! Não precisa se preocupar! Já disse que não é nada! – Ucker disse torcendo para que o desespero em sua voz não tivesse ficado tão evidente.

– Que foi, Ucker? De repente você ficou tão nervoso... Está me escondendo algo? – A companheira perguntou com a voz cheia de segundas intenções ao mesmo tempo que levantava uma sobrancelha.

– Eu? E o que eu teria para te esconder? – Ele tentou desconversar, sentando-se na cama. O cantor tentava parecer relaxado, mas cada parte do seu corpo estava tensa. Ou ele dava um jeito de tirar a loira dali, ou teria um grande problema.

– Sabe Uckerzito, agora que você tocou no assunto... Você anda beeem estranho. Aliás, não só você, como a senhora Dulce Maria também... Mas fiquei pensando com os meus botões essa tarde e pensei que... bom, vocês não me esconderiam nada se tivessem algo para me contar, não é mesmo? – Anahí disse exagerando em uma encenação de pessoa indefesa e inocente, mexendo nos cabelos como uma garotinha assustada.

– Tranquila chica, tranquila! Claro que te contaríamos, se houvesse algo para contar... Mas a verdade é que não há! Any, você deveria deixar de ser tão paranoica! Fica aí, imaginando! Isso é doença, sabia? – Ucker usou a famosa estratégia de mudar o foco da conversa para a outra pessoa para ver se ela esquecia o assunto inicial.

– Ahh, mas que bom que posso ficar tranquila! Por que você sabe que eu ficaria chateadíssima se algo estivesse acontecendo e você não tivesse me falado, né? – A loira pregou os olhos azuis nele de uma forma tão intensa que Ucker precisou desviar o olhar. Estava claro que a sua tática de mudar de assunto não ia dar certo. Any não era o tipo de pessoa que desistia fácil quando estava determinada, e aquele parecia ser o caso.

– Mas falando em doneça... – Ela retomou – Você sabe que essa dor de cabeça pode ser por causa de muito pó, ou até mesmo umidade do quarto, não é? Deixa eu ver como está isso aqui... – Ela começou a rodar todo o cômodo à procura da “causa” da dor de cabeça do amigo. A cantora abriu armários, olhou embaixo da cama e até mesmo atrás das cortinas. A cada passo que dava, ficava mais claro que não estava procurando algo, e sim alguém.

Ucker já estava desesperado. Ele precisava fazer alguma coisa, e urgente. A única explicação para aquela desconfiança da Anahí era o fato de Dulce ter desaparecido da beira da piscina assim que ele chegara! Christopher soltou o ar pesadamente. Ele e Dul estavam dando muita bandeira! Se continuassem desse jeito, não demoraria muito para alguém descobrir o que estava acontecendo. Ou melhor, o que estava “não acontecendo”...

– Any, francamente! Você sabe que o serviço de quarto desse hotel é ótimo! Tenho certeza que não tem nada a ver isso que você está falando. Estou pensando aqui e acho que o problema é que não comi nada desde manhã... Bora fazer um lanche comigo? Assim conversamos melhor e você me explica da onde tirou essa ideia maluca de que tem algo acontecendo... – O cantor jogou uma “isca”, cruzando os dedos para que ela aceitasse o convite.

–Hum... Lanche? Pode ser... – Anahí concordou com tom de desconfiança – E pode parar de me chamar de maluca, Christopher! Tem algo acontecendo sim! Por exemplo, essa sua saída misteriosa de hoje...

– Ê laiááá... Você está mesmo no clima da conspiração, hein? Sai hoje para resolver umas coisas que ainda estavam pendentes da minha carreira solo, só isso. Mas alguma pergunta? – Chris improvisou, respirando aliviado por ter conseguido pensar rápido.

– Várias! Não pense que vai escapar da minha sabatina! – Ela pareceu deixar a sua “busca” de lado e realmente aceitar a proposta do amigo.

“Nossa, devo uma ao meu anjo da guarda”, Christopher pensou, dando um pulo da cama e apressando-se em direção à porta – Então vamos, Any! Eu pago!

A loira caminhou em direção à saída lançando uma última olhada em direção ao armário, como se ainda considerasse a hipótese de ter esquecido de olhar alguma parte dele. Já no corredor, Christopher acompanhava cada movimento da loira com apreensão.

“Vem Anahí, veeeem”, ele repassava as palavras mentalmente, como se pensar nelas fizesse a companheira de banda sair do quarto mais rápido. Foi com um alívio imenso que ele a viu passar pelo batente, com uma tremenda cara de desanimo por não ter encontrado nada.

“Ufaaa! Essa foi por pouco”, ele pensou, fechando a porta. “A Dulce me deve essa”.

Porém, antes que pudesse passar o cartão magnético que trancava o quarto, Anahí deu um pulo ao seu lado, agitando os braços.

– Nãããõoo Uckerzito, não fecha ainda! Preciso ir ao banheiro! – Ela comunicou com a voz ansiosa e os olhos brilhando. Ucker a conhecia bem o suficiente para saber que estava aprontando algo.

– Vai no banheiro do restaurante, mulher! Estou morto de fome! – Ele tentou convencê-la a mudar de ideia.

– Não, Uckerzito! É urgente! Coisa de mulher! Abre logo essa porta! – Ela insistiu – Ou tem algo lá que eu não posso ver? – Emendou, com a voz cheia de malícia.

Vencido, Ucker abriu a porta e a empurrou. Não tinha mais nada que ele pudesse fazer... Se não o fizesse, estaria confirmando todas as desconfianças da amiga. O jeito agora era torcer para que Dulce tivesse arrumado um bom esconderijo que a detetive Anahí não conseguisse encontrar.

Assim que a passagem foi liberada, a loira passou feito um furacão pelo amigo, correndo imediatamente para o banheiro. Christopher foi atrás dela e a viu checar tudo: o box, o armário da pia, até mesmo o cesto com as roupas sujas do cantor...

Ela revirava tudo furiosamente, parecendo um cachorro atrás de um osso. Ucker já estava fazendo promessa e rezando para todos os santos que conhecia quando percebeu um movimento atrás da porta entreaberta. Disfarçadamente ele caminhou até lá e deu de cara com a Dulce. Aloira havia entrado tão determinada no cômodo que empurrara a porta de qualquer jeito sem perceber que havia alguém ali atrás. Dulce mostrou a tela do celular, onde já havia uma mensagem digitada: “Distraia ela, vou tentar fugir”.

Chris assentiu e imediatamente uma ideia veio a sua mente.

– Any, aproveitando que você está aqui, me fala: Esse shampoo é bom? É que comecei a usá-lo na semana passada, mas não sei... Achei que o meu cabelo meio seco – Ucker sabia que aquilo era algo bem “gay” para ser dito, mas situações extremas pediam medidas desesperadas. Logo, ele caminhou até o box, puxando a amiga pelo braço e começou uma longa explicação sobre a escolha do seu novo produto para os cabelos. Ele falava como um vendedor citando as vantagens e desvantagens do shampoo enquanto torcia para que a ruiva tivesse conseguido fugir.

Tudo ia muito bem, até que um barulho enorme seguido por um grito alto chamou a atenção dos dois. Rapidamente eles correram para o quarto e se deparam com a Dulce caída no chão perto de uma baqueta.

– Caramba Ucker, por que você deixa essas coisas no chão? Pisei nela e acabei escorregando! – Dulce queixou-se quando ele chegou perto para ajudá-la a se levantar.

– Foi mal! Deve ter caído quando a Anahí estava revirando o meu quarto – Ele desculpou-se.

– Aháaaa! Eu sabia! Eu sabia! Vocês estão juntos! Santa baquetinha que me ajudou! – Anahí começou a gritar, pegando o objeto do chão e o agitando no ar como se fosse um troféu – Mas agora quero saber porque não me contaram! Seus bandidos! Eu me esforcei tanto para ajudar aos dois e vocês me escondem uma coisa dessas...

– Então Anahí, calma! Na verdade, não tem nada acontecendo! – Dulce a interrompeu usando o velho “jargão” dela e do Ucker.

– Ahhh Maria, conta outra! Como assim não está rolando nada? Você quer mentir para mim? – A loira se fez de ofendida.

– Mas é a verdade, Any. Ó, eu vou te contar a verdade... Eu saí hoje porque precisava resolver um problema pessoal... Não queria falar sobre isso porque é um pouco constrangedor, mas hoje eu fui procurar um médico porque... estou com uma coceira horrível nas... minhas partes íntimas! Já faz um tempo e como já havia falado sobre isso com a Dul, ela me ajudou a encontrar um médico. Hoje fui me consultar com ele e a Maria só veio ver se tudo estava bem... Mas aí você chegou, e como queríamos evitar que você pensasse besteira, a Dulce resolveu se esconder. É por isso que estamos tão estranhos nesses últimos tempos... – Ucker mentiu na cara dura, esforçando-se muito para não cair na risada e exagerando no drama.

Felizmente a sua atuação pareceu satisfatória, porque Anahí pareceu ficar extremamente constrangida.

– Poxa Chris, eu não sabia que tratava-se de um problema de saúde... Se eu puder ajudar... – Ela se ofereceu de forma generosa.

– Por favor, você ajuda muito não espalhando essa notícia! Não preciso do Poncho ou do Christian me zuando... – Ele pediu, mexendo nos cabelos, parecendo estar muito encabulado e sem graça. Ao seu lado Dulce fitava um ponto qualquer na parede, tudo para não soltar uma gargalhada.

– Bom, e quanto ao seu lanche? Acho que podemos ir todos, não é? – A loira mudou de assunto propositalmente. Se ela havia realmente acreditando ou não na desculpa, o cantor nao conseguiu descobrir. Mesmo assim agradeceu mentalmente por ter conseguido adiar o momento de confessar que estava com a ruiva.

– Claro! Vamos todos! Também estou morta de fome! – Maria concordou de pronto, nem disfarçando que ela daria qualquer coisa para sair daquela situação.

Nesse momento, o celular da loira tocou e, com um gesto que voltaria em um minuto, ela deixou o quarto para atendê-lo.

– Sério Ucker? Coceira nas partes íntimas? – A ruiva comentou com a voz baixa caindo na risada assim que se viram sozinhos.

Ele apenas deu de ombros. Afinal, o que mais ele poderia dizer? Era isso ou assumir que os dois andavam se encontrando clandestinamente.

– Mas não posso negar que você foi brilhante! Achei que tudo estava perdido... – Ela confessou com suspiro de alívio – Mas precisamos parar com isso...

Ucker sentiu o coração gelar – Para com...? – Ele perguntou, ao mesmo tempo ansioso pela resposta e temendo o que ela iria dizer a seguir.

– De dar essas brechas, né?! Precisamos ser mais discretos – Ela explicou como se fosse óbvio – Só hoje foi a segunda vez! Primeiro foi no camarim e agora com a Any...

– Ahh é... Nossa, demos muita sorte mesmo! – Ele deu qualquer resposta, sorrindo como um bobo. Para Christopher, só o que importava é que ela não estava disposta a terminar tudo com ele. Se a Dul estava planejando ser mais cautelosa, era sinal que pretendia manter o relacionamento às escondidas. E só isso foi o suficiente para acalmar o seu coração.

– Melhor irmos indo... Senão vamos chamar atenção e não podemos nos dar esse luxo! – Ela o advertiu, já caminhando em direção a porta.

Christopher a seguiu, colocando-se ao seu lado, perto o suficiente para sentir o seu doce perfume, mas tomando cuidado para que não se tocassem.

Sem saber, Dul tinha transformando o dia de Chris com a sua última resposta. Porém, enquanto o trio caminhava em direção ao restaurante jogando conversa fora ele não pode deixar de pensar no futuro. Se eles realmente se firmassem, ele teria que contar sobre a traição do noivo.

Pelo jeito era só uma questão de tempo até a bomba explodir. E tudo o que ele podia fazer era torcer para que a frágil relação deles sobrevivesse aquela provação.