II

Hermione acordou sobressaltada. Nem queria acreditar que tudo não passara de um sonho.

Estivera a sonhar com todos os bons momentos que passara com os seus pais, relembrando a fortíssima ligação que tinham entre eles e, no final, sempre lhe diziam para ela não se preocupar, pois eles estariam sempre com ela… mas de uma maneira diferente…

Olhou o relógio. Eram 4 h da manhã.

Ela queria continuar a dormir e a sonhar com os seus pais, mas tinha a sensação de que alguma coisa de muito grave estava a acontecer e não voltou a adormecer.

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Draco olhava para o relógio, em pé, às voltas pela enorme, espaçosa e confortável sala de pedra ricamente decorada de verde e prateado que era a sua sala comum. Os enormes candelabros presos por correntes ao tecto estavam apagados por opção própria.

Parou um momento a observar com atenção os reflexos da água nas janelas; davam-lhe uma certa sensação de calma, mas ele não tardou a recomeçar a andar em círculos.

Ao olhar novamente para o relógio, viu que eram 5 h da manhã. Sentia que estava na hora de sair dali; se continuasse às voltas dava em doido…. Ou será que já estava?

Tinha acabado de sair da sua sala comum, e andava depressa pelos corredores e escadarias do castelo que a essa hora estavam desertos, mas não ia na direcção dos aposentos de Snape… então afinal estou a ir para onde? Nem controlava os seus próprios passos; só lhe restava deixar-se ir.

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Hermione dirigia-se à única pessoa que naquele momento poderia saber alguma coisa: Dumbledore, era a sua esperança. Ela tinha de falar com ele, precisava mesmo disso! Mas de vez em quando caía em si.

Por Merlin Hermione, a esta hora é que vais ter com o Director? Nem se quer tiveste maus sonhos, o que é que lhe vais dizer? Que tiveste uma 'má sensação'? Não achas que ele já tem problemas que cheguem? Além disso, provavelmente vais acordá-lo!

Só se deu conta de onde estava quando parou de se recriminar.

Estava mesmo em frente à estátua que tapava a entrada do escritório do Director.

Droga, droga, droga! Que bela ideia! Ir ter com Dumbledore quando não há ninguém a pé pela escola e sem sequer saberes a senha para entrar!

Resmungando mentalmente consigo mesma e sem conseguir conter as lágrimas que lhe brotavam dos olhos, sentou-se no chão ao lado da estátua, encostada à parede, braços em torno das pernas e com a testa apoiada nos joelhos. Começou a balançar-se, perguntando a si mesma quanto tempo mais iria esperar até alguém aparecer, quando ouviu passos a aproximarem-se. Quando levantou a cabeça para ver quem era, ficou em choque.

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Draco apercebeu-se de que se dirigia ao escritório do Director.

Nunca fora amigo dele, nem perto disso, mas era a única pessoa que poderia saber alguma coisa acerca dos seus pais e contar-lhe, sem o fazer sentir miserável com isso.

Qual não foi o seu espanto ao virar a esquina e encontrar uma rapariga sentada no chão e encostada à parede, com um cabelo volumoso e brilhante devido aos primeiros raios solares matinais, a esconder o rosto.

Por um breve momento, ficou a apreciar a bela cena: os reflexos do cabelo davam-lhe a mesma sensação de paz e calma que os reflexos da água na sua sala comum.

Toda a ilusão se foi quando a rapariga ergueu a cabeça para ver quem se aproximava e ele viu quem ela era: Hermione Granger! Notou (por momentos) desespero nos seus olhos.

Pelo que se apercebeu, ela estava tão chocada com a presença dele como ele com a presença dela. Parecia que estivera a chorar ou muito perto disso, pois os seus olhos estavam 'demasiado' brilhantes. Ainda teve a ideia infantil de se meter com ela, mas a preocupação que sentia pelos seus pais toldou-lhe essa vontade, fazendo com que ele não se lembrasse de nada que a pudesse magoar de alguma maneira, deixando-o simplesmente calado.

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Hermione estranhou o facto de Draco não a maçar, mas agradeceu silenciosamente por isso. Pelos vistos, ela não era a única a ter preocupações àquela hora e a ter a ideia louca de ir ter com Dumbledore, e também a não saber a senha.

Ela ficou um pouco espantada por reparar que ele parecia não ter dormido quase nada durante a noite e, por maior que fosse o seu desprezo por ele, ela não deixou de sentir uma pontada de pena; Draco estava com um ar esgazeado, notando-se um certo desespero também, tal como ela. Não parava quieto, andando de um lado para o outro, até que se decidiu a ir falar com a estátua.

- Por favor, podia deixar entrar só desta vez? – quase suplicou Draco.

Hermione ficou fortemente surpreendida com o tom de voz dele: sem cinismo, sem manias; apenas transmitia preocupação e sinceridade.

A estátua emproou-se e falou numa voz solene.

- Regras são regras, meu jovem! Nunca deixei semelhante coisa acontecer e não vou começar agora! Senha!

- Mas eu não a sei! – quase gritou Draco desesperado.

- Lamento imenso – ironizou a estátua.

Hermione levantou-se e dirigiu-se à estátua, decidida e furibunda.

- Pode haver vidas em risco e não nos vai deixar entrar?

Draco assustou-se momentaneamente, desconfiando que ela soubesse acerca dos seus pais.

- Não. Senha?

Aí, ambos estavam prestes a explodir e gritaram os dois em simultâneo:

- VAI-TE LIXAR!!!! – e ambos viraram as costas à estátua.

Passado um tempinho, a estátua chama-os, levemente aborrecida.

- Então? Primeiro dão a entender que precisam mesmo de entrar e depois de dizerem a senha não entram? Sinceramente, não vos compreendo…

Hermione e Draco voltaram-se ao mesmo tempo para a estátua. Estava com um ar confuso e estava a deixar aberta a passagem.

Olharam um para o outro com os olhos arregalados. Draco encolheu os ombros e foi na direcção da passagem. Hermione seguiu-o e depois de se certificarem de que a estátua não os ouvia, desataram a rir às gargalhadas.

- "Vai-te lixar"?! – disse Draco ainda a rir voltando-se para Hermione.

- Bela senha para os aposentos do Director, não haja dúvida! – completou ela também a rir.

Draco nunca a tinha ouvido a rir, e achou fantástico. Riso puro, cristalino como água, era quase música. Rapidamente afastou esse pensamento e parou de rir, apercebendo-se subitamente que falara bem e rira junto com a rapariga que maltratara e desprezara desde o seu 1º ano em Hogwarts.

Hermione também pensou no mesmo e ficou a matutar em como pôde ter rido com Malfoy (o que só por si já era de doidos) enquanto estava tão preocupada ao mesmo tempo.

Talvez ambos precisassem disso mesmo: uma boa gargalhada para os fazer acalmar. Bem, resultou durante um tempo, mas rapidamente ambos voltaram ao seu estado de ansiedade aguda.

Ao chegarem perto da porta, ouviram a voz de Dumbledore do lado de dentro – Entrem!

Mais uma vez olharam-se. Será que o Director sabia há muito tempo que eles estavam ali?

Antes de entrarem, Hermione virou-se para Draco.

– Eu espero cá fora, podes ir primeiro. - Ele nem teve tempo para pensar em qualquer resposta, pois logo a seguir o Director retorquiu – Por Merlin, entrem os dois!

Ambos ficaram tão espantados que por momentos não se moveram. Dumbledore soava mais cansado do que nunca, o que os admirou. Então Hermione empurrou a porta, encontrando o Director sentado na poltrona atrás da sua secretária, com a mão a apoiar a fronte, de olhos fechados como se tivesse uma terrível notícia a dar e não a quisesse contar. Aquilo não era bom sinal. Quando ela olhou para Draco de novo supôs que ele também pensava o mesmo pois estava muito pálido a olhar o Director. Nesse momento chegou mesmo a ter pena dele, mas a preocupação que sentia em relação ao seu próprio problema sobrepôs-se.

- Tenho péssimas notícias – disse Dumbledore ainda sem os encarar - Mandei-vos entrar aos dois pois a vossa situação é exactamente a mesma. Se não tivessem vindo aqui, teria mandado a professora McGonagal e o professor Snape buscá-los de qualquer maneira.

Ambos ficaram pálidos, Draco mais ainda do que já estava, se é que isso fosse possível. Só aí o Director olhou para eles com lágrimas a brilharem nos olhos profundos, analisando as expressões dos jovens à sua frente – Lamento informar-vos que os vossos respectivos pais morreram esta noite em St. Mungus. Nada se pôde fazer.

Os dois jovens sentiram-se gelar, sentindo o coração falhar um batimento. Seria aquilo um terrível pesadelo? O Director ainda esteve a falar de outras coisas relacionadas com o que lhes iria acontecer, mas eles apenas ouviam um burburinho muito longe.

Enquanto falava, Dumbledore apercebeu-se que eles já não o ouviam, mas não se importou. Doía-lhe ver aqueles dois jovens, tão diferentes, tão sensíveis à sua maneira, mas dilacerados por uma situação idêntica. Se pudesse, ele próprio aguentaria com a tristeza, com tudo o que os atormenta, apenas para os livrar de semelhante situação. 17 anos… Tão jovens… o mundo não é justo, definitivamente. Ninguém deveria perder assim as pessoas em que mais confia e ama. Todos os outros alunos que tinham perdido familiares tinham outros membros da família que os acolhiam, o que os ajudava imenso; mas estes dois casos não tinham. Os pais eram tudo o que lhes restava. Eles estavam a começar a sua auto-destruição, via-se bem. Ambos estavam a entrar rapidamente numa grave depressão. Isso não posso deixar acontecer… e lembrou-se. Uma leve esperança e compreensão iluminou-lhe a mente, uma pequena brecha de luz que poderia mudar tudo.

Ambos feridos… ambos os pais morreram nas mesmas condições… ambos o oposto um do outro… tanto em relação ao seu sexo como, e principalmente, em relação à sua personalidade… às suas escolhas pessoais…

Será que é mesmo? Será que vai funcionar? Será que são…? Tudo dúvidas que não tinham tempo de serem ponderadas, teriam de ser postas em prática o mais rapidamente possível. Era a sua única esperança… e deles também.