Johnny tinha uma arma. escrita por Fehliz


Capítulo 5
Destino e suas tecnologias


Notas iniciais do capítulo

Inicialmente, gostaria de me desculpar pela demora. Infelizmente, tive um bloqueio criativo muito forte, isso somado a falta de tempo por conto do cursinho/vestibular atrasou a elaboração do novo capítulo. Mas mesmo assim, espero que gostem...



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Segunda-feira, 8:50.

Tudo parecia se mover em câmera lenta.

O riso de Johnny ecoou pela sala. Cecília, a cúmplice, assim como todos presentes, mirou o rosto do atirador. Ana reparou rapidamente no braço que segurava a arma. No tempo de um piscar de olhos um espasmo denunciou o súbito movimento de Johnny. Os braços de Leonardo aliviaram o abraço devido à forte pressão do cotovelo de Ana contra seu peito. Um grito começou a se formar na garganta de Cecília. Johnny levantou a trava de segurança e piscou longamente para livrar-se das lágrimas do riso. Ana, com o corpo livre, virou o torso pensando em alcançar a mochila. O menino atrás desta levantou os olhos e abaixou o caderno devido ao súbito movimento à sua frente. Ana moveu a cabeça quase alcançando a alça da bolsa. Leonardo perdeu o fôlego e desequilibrou-se tombando para trás. O grito de Cecília ecoou simultâneo ao disparo. A bala voou do cano da Magnum 44 atingindo o pescoço do rapaz atrás de Ana e tingindo-a de um vermelho escuro.

O grito de Cecília, junto com o de outros vários colegas, superou o eco do disparo e dizia algo que parecia com pare. O sangue do rapaz manchava o, antes imaculado, uniforme de Ana, cujo choro, já presente, intensificara-se. Leonardo recuperava o fôlego caído no chão ao lado dela. Johnny finalmente notou o que havia feito.

Ele olhou, visivelmente alterado, a cúmplice que alterava o foco entre a cena sanguinolenta na cadeira da frente e o atirador que parecia ter se esquecido de tudo que havia dito até então. Ela levantou-se de sua cadeira percebendo que uma intervenção era necessária naquele momento.

Na verdade, a intervenção era necessária desde da hora em que as coisas saíram dos trilhos, pensou ela, e condenou-se mentalmente por condescender ao pequeno show realizado pelos dois pseudo-pombinhos. Quis gritar com Johnny, mas a culpa também era sua, pensou, tentando convencer-se. Por que ele sempre tinha que agir conforme suas próprias vontades? Provavelmente porque ela sempre estava lá para limpar a sua bagunça, apesar de duvidar seriamente que seria capaz de lidar com a situação atual.

Ana, apesar das lágrimas que teimavam em escorrer pelo seu rosto, apressou-se em tentar socorrer o rapaz ferido.

Imagens passaram pela cabeça de Johnny à medida que ele tentava entender o que dera errado. Nada daquilo estava previsto. Observava Ana pressionando o lado esquerdo do pescoço do rapaz recém-transferido numa inútil tentativa de conter a hemorragia. Virou a cabeça procurando algum sinal de desconformidade no cenário: quadro negro no lugar, nenhum raio de Sol que pudesse interferir em sua visão, cadeiras alinhadas aos rejuntes do piso de azulejos. O que havia de errado?

Diante de tais indagações, Johnny cometeu o seu segundo erro. Numa tentativa de forçar a memória, o rapaz fez o que todo ser humano normalmente faz: Fechou, inofensivo, os olhos. E esse pequeno intervalo de tempo, suficiente para um desbloquear de tela ou uma comunicação muda, foi sabiamente utilizado por um par de indivíduos que agora não veem ao caso.

O rapaz abriu os olhos e Cecília vinha em sua direção e sentiu-se ligeiramente mais tranquilo, retomando a posição firme. Ela deu um passo para fazer a curva entre a primeira cadeira, duas fileiras à direita de Ana, e a mesa do professor quando bateu o quadril na ponta desta. O barulho denunciou uma falha de cálculo que apenas os dois sabiam o que significava: A mesa com os pertences do professor estava vários centímetros à esquerda da posição estimada.

Olhou a moça e pôs a mão na testa. “Como você é burro!”, pensou. A pequena distância somada a pequena angulação de Ana momentos antes do disparo se somaram numa grande diferença na programação. Nada daquilo havia acontecido antes e ele começava a se sentir nervoso.

Cecília procurou pelo cenário alguma outra diferença que pudesse de alguma forma afetar o planejado, se já não tiver afetado, pensou. A precisão era imprescindível para a realização da meta a eles designada, pensou Cecília, e eles constantemente lembravam-se disso em seus ensaios, entretanto ela não podia pensar em nada daquele dia que pudesse mudar o rumo dos acontecimentos. Já estava cansada daquela maldita aula de Revolução Francesa.

Uma golfada de sangue do rapaz, tirou-os de seus devaneios. Ana ainda pressionava inutilmente o ferimento e os alunos ao redor davam sugestões ainda mais inúteis para mantê-lo respirando; Leonardo, em choque, não se movia.

Os sussurros na sala pequena intensificavam-se à medida que a situação do rapaz piorava, na mente do coletivo misturavam-se a vontade de ajudar o rapaz e o medo de tomar alguma atitude que os levassem à mesma situação deste. O barulho crescia aos ouvidos de Johnny e crescentemente o incomodava. Andava de um lado para o outro nervosamente, o sentimento de incômodo e raiva crescia no seu peito.

O que está acontecendo? Pensava Johnny inquieto. A enxurrada de imprevisibilidades atingia-o com força e o controle parecia vazar por entre os seus dedos. Essa era a última tentativa, o que poderiam fazer... Isso tudo fora um erro?

Uma mão alcançou seu ombro e Johnny instintivamente apontou a arma na direção desta. A sala ficou em silêncio e qualquer ação que pudesse estar sendo executada pelos estudantes foi cessada. – Johnny... – disse Cecília retirando a mão, compreensiva – Está tudo bem... Siga o plano. – Ela disse sem nenhuma convicção, mas foi o suficiente para Johnny abaixar a arma e suspirar.

– Pelo menos esses malditos ficaram quietos... – disse para si mesmo. Johnny dirigiu-se à porta, pouco mais de um metro e meio de onde estava, e abriu-a checando se alguém já havia chegado. O corredor estava vazio. Johnny franziu a testa e olhou o relógio, quase dois minutos haviam se passado após o disparo, os coordenadores da escola já deveriam ter começado a se movimentar. – Ninguém – disse a Cecília.

Ana levantou as sobrancelhas sutilmente. Que reação incomum, pensou. De fato, a reação mais inteligente da administração seria evacuar as outras salas e, para isso, os corredores deveriam estar cheios dos alunos das outras salas.

O fluxo de sangue escorrendo do ferimento do rapaz tornava-se cada vez menor, isso não era um bom sinal. O sangue era escuro, pouco oxigenado, logo o suprimento cerebral não estava sendo tão prejudicado, pensava a menina – que assistia muito a Grey’s Anatomy – mas a hemorragia ainda é muito séria, ele não vai aguentar muito tempo sem ir ao hospital.

Ela olhou em seus olhos, eles brilhavam e algumas lágrimas escorriam. Não sabia o seu nome, aquele era o primeiro dia dele. Trocaram apenas algumas palavras no começo da aula, ela teve a impressão de que era um bom rapaz, mas dificilmente se tornariam amigos. Quem diria que o destino os ligaria daquela forma tão mórbida...

Os estudantes ainda processavam a fala de Johnny quando Cecília, que até então mantinha-se impassível, arregalou os olhos subitamente e em seguida, um tímido barulho de um bloqueio de celular soou. Definitivamente, algo havia saído de errado no plano.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado =)



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