The Sages escrita por Maya


Capítulo 13
13 - Ajuda


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoas, tudo bem com vocês? Demorei um pouquinho e esse capítulo ficou bem grande (de novo), desculpem-me. Mas espero que ainda gostem!
Só pra esclarecer: nesse capítulo, a narração é dividida entre Sophie e Hailey. A primeira parte toda é narrada por Sophie. Depois dos três pontinhos no meio do capítulo (. . .), é com a Hailey. Ok? Boa leitura!



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Hospital de Hampton, Estados Unidos

Acabei de acordar do meu sétimo cochilo de hoje. Quando se está presa a uma cama de hospital sem poder andar ou ao menos sentir as pernas, dormir é a única coisa de divertido que se pode fazer.

Tudo bem, não é sempre tão ruim assim. O doutor Stanford, que é fisioterapeuta, está me ajudando. Ele vem aqui com algumas enfermeiras e tenta me ajudar a recobrar os sentidos das pernas. Eu adoraria retribuir o ânimo dele mas, depois que meu médico disse que há uma grande chance de eu nunca mais conseguir andar, fica difícil ficar animada. Às vezes, acho que o Dr. Stanford também pensa assim.

E ainda tem a Hailey. Minha irmã, que vi crescendo, que após a morte de nossos pais passei a cuidar como se fosse a mamãe, não é humana. Eu fui compreensiva quando ela me contou sua história, tentei passá-la a segurança que papai nos passava, mas na verdade, quando ela me contou, chorei por dentro. É difícil de digerir uma coisa dessas. Mas se eu não posso ajudá-la nessa missão, o que me resta a fazer é torcer por ela e esperar que ela cumpra sua promessa e volte aqui antes de... De desaparecer. Droga, minha garota não pode desaparecer assim, do nada. O que eu vou dizer a Liz?

Se bem que Hailey já deve ter contado tudo para ela também. Como será que ela absorveu essa notícia? Isso, claro, supondo que ela absorveu. Agora que Hailey está assumindo seu verdadeiro eu, o futuro de Liz está totalmente em minhas mãos. Ela é uma garota ótima que não merece o que a vida lhe deu. Primeiro, nossos pais se foram quando ela tinha só oito anos. Agora ela fica sabendo que uma das irmãs, a qual sempre adorou e que sempre a amou mais ainda, vai embora para sempre.

Por isso, no momento, o que mais me preocupa é Liz. Eu quero voltar a andar e ter uma vida normal. Quero me casar e ter filhos. Mas o que eu mais quero é lhe devolver uma família.

Droga, Hailey, você devia estar aqui para me ajudar...

Alguém bate à porta e digo que pode entrar. Quem entra é o Dr. Stanford – jovem, bonito, com barba rasa e cabelos castanhos penteados para trás com vários fios desgrenhados –, que sorri para mim.

– Boa noite. Como estamos hoje?

Olho pela janela. Já é noite? Bem, não devia estar tão surpresa. O tempo corre quando passo o dia inteiro dormindo. É mais uma vantagem de se fazer isso: quando fico acordada aqui, as horas se arrastam, bem devagar.

– Você sabe, doutor. O mesmo de sempre.

– Nós já conversamos sobre esse seu otimismo, Sophie. Aliás, eu também já disse que pode me chamar de Craig. “Doutor” é formal demais pra mim.

Sorrio. O jeito casual do doutor... De Craig sempre faz eu me sentir melhor.

Craig mexe no cabelo, o bagunçando ainda mais, enquanto checa a minha ficha.

– É, parece que não tem nenhuma atualização. Posso ver suas pernas?

Suspiro.

– Se for só você...

– Olhe, Sophie, você vai ter que encarar isso. Vai precisar olhar para suas pernas uma hora ou outra. Você não pode ficar com medo de sua própria realidade.

– É que minhas pernas são uma lembrança constante do que aconteceu. E não gosto de me lembrar daquilo.

– Eu entendo, e sinto muito por isso. Mas não dá para mudar o passado.

Baixo os olhos para minhas pernas cobertas pelo lençol.

– Sei disso. Mas... Elas me lembram tanta coisa. Naquele dia, o ex-namorado da minha irmã sacrificou sua vida para me proteger. Ele morreu e eu fui condenada a me lembrar disso para sempre.

Craig senta-se no banco ao lado da minha cama.

– Deve ser difícil. Mas Liz já tinha um namorado? Quero, dizer, sem querer julgar nem nada, mas ela não é um pouco nova pra isso?

Franzo as sobrancelhas. Do que... Ah, é. Eu nunca falei de Hailey para ele. E isso é estranho, mas não sei o que me levou a isso. Hailey com certeza não é como minhas pernas; ela nunca me despertaria uma lembrança ruim. Então, por que nunca falei dela tanto quanto falei de Liz?

– Ah, não. Estou falando da minha outra irmã, a Hailey. Ela apareceu na minha casa quando tinha só sete anos e meus pais decidiram adotá-la. É uma ótima garota. Você se daria muito bem com ela.

– E onde ela está? – Craig pergunta.

Tudo bem, isso eu realmente gostaria de evitar. Mesmo que Hailey não tenha me pedido segredo, tenho certeza de que sua história não é algo que eu possa me achar no direito de contar para qualquer pessoa, mesmo que essa pessoa seja alguém confiável como Craig.

– É uma longa história – digo por fim. – Muita coisa aconteceu depois daquele dia.

– Eu imagino. – Craig se levanta e pisca para mim. – Bem, quando Hailey voltar, diga a ela que tem alguém aqui ansioso para conhecê-la. Agora, vamos ver essas pernas...

O fisioterapeuta segura as pontas inferiores do lençol com delicadeza e olha para mim de novo. Fecho os olhos com força, mas logo depois os abro e faço que sim com a cabeça. Craig sorri, e sinto toda a sua aprovação nesse simples gesto. Ele é mesmo incrível... Espera, no que estou pensando? Minhas pernas são o foco agora. Além do mais, nenhum homem aceitaria uma mulher inútil da cintura para baixo... Droga, estou pensando besteiras de novo.

Craig puxa o lençol e tem a mesma reação de sempre: uma careta breve, impossível de conter, seguida por um sorriso fraco, porém carinhoso.

– Nada que tratamento e um pouco de paciência não resolvam.

Devolvo seu sorriso e começo a me inclinar para olhar minhas pernas também.

Mas então, ouço um barulho. Ele me assusta. Parece o som de várias coisas de metal e vidro caindo, produzindo um barulho muito agudo. Craig torna a cobrir minhas pernas e corre para a porta. E aí, ouço um grito fino de criança.

Já ouvi esse grito antes.

– Liz! – Exclamo. Tento me levantar, mas me lembro de que minhas pernas não fazem mais isso. – Craig, por favor, me ajude. Eu preciso ir até o quarto dela!

– O quê? Sophie, não! O que quer que esteja acontecendo naquele lado, pode ser perigoso.

– Mais um motivo para eu ir até lá. Mas se você não quer me ajudar, tudo bem. Eu me viro.

Apoio uma mão na lateral da cama e impulsiono o meu corpo para fora dela. Agarro-me ao banquinho para firmar meu tronco. Minhas pernas caem como um peso morto no chão, e só sei disso por causa do barulho que elas produzem. Dor? Nenhuma. Eu nem as sinto mais.

A mão de Craig aparece à minha frente e eu a seguro. Ele me levanta e, com a outra mão, traz uma cadeira de rodas para mais perto, na qual me ajuda a sentar.

– Meu Deus, você é muito teimosa.

– Ela e Hailey são as únicas pessoas que eu tenho. Eu preciso ajudá-la.

Craig suspira e abre mais a porta.

– Certo. Mas se eu perceber algum perigo, irei te tirar de lá imediatamente. Fechado?

– Fechado.

Então, ele me conduz para fora do quarto.

Durante o caminho, os gritos ficam mais frequentes. A maioria parece ser de adultos e alguns de crianças, mas não escuto Liz mais. E se tiver acontecido alguma coisa a ela? Como eu vou explicar isso à Hailey? Como vou viver sem as duas?

Não. Não posso pensar nisso. Há outras possibilidades: Liz pode estar bem e em segurança, sem mais nenhum motivo para gritar de medo, ou seu grito pode estar se misturando aos demais e por isso não consigo distingui-lo. Tenho que pensar positivo dessa vez. Depois que Hailey se for, Liz será o único pilar sustentando essa plataforma instável que eu sou.

Uma bandeja com medicamentos é jogada com força na parede ao meu lado e Craig nos recua.

Forço minha cadeira para frente, puxando as rodas. O doutor bufa e acaba cedendo. Passamos pela porta de onde a bandeja voadora saiu.

O que encontramos, no entanto, não é algo muito bonito. É um monstro. Sério. Ele é exatamente como Hailey descreveu seus inimigos. Seu corpo é totalmente negro, com apenas dois orbes brilhando no que deve ser seu rosto. Sua forma se contorce a cada pequeno passo que ele dá, como ondas negras de petróleo.

Certo, eu nunca vi petróleo, mas agora imagino que seja algo assim.

O monstro se prepara para pular como um gato se preparando para pegar um pássaro e Craig torna a me recuar. O resto do meu corpo já está tão paralisado quanto minhas pernas. Hailey se esqueceu de contar que eles são muito mais assustadores pessoalmente.

Mas por que estão aqui? Nem ela nem os outros Sábios estão nos Estados Unidos. Não é possível que essas criaturas, que já são supostamente evoluídas, não saibam disso.

Por sorte, ou por qualquer outro motivo que não quero entender agora, o monstro desiste de nos atacar e pula para outra porta. Solto todo o ar que segurei inconscientemente e ouço Craig fazendo o mesmo.

– O que... O que era aquela coisa? – Ele pergunta.

Abro a boca para responder, mas desisto. Só vai complicar ainda mais a cabeça do coitado.

– Ok, chega. Vou te levar de volta ao seu quarto e chamar a polícia.

– Pelo amor de Deus, Craig, você não viu aquela coisa? Não é humano. A polícia não vai cuidar dessas coisas.

Ele me encara.

– Você fala como se soubesse o que elas são.

– Er... – Desvio o olhar e me concentro apenas na segunda porta. – Não, é claro que não sei o que elas são. Só que eu sei que as pessoas estão gritando porque tem algo de muito errado acontecendo, e nós temos que ajudar.

Craig começa a balançar a cabeça, mas para e olha para cima.

– Os gritos pararam.

Ah... É verdade. Não tem ninguém gritando mais. Meu coração dispara com essa constatação e torno a pensar nas piores possibilidades.

Sem dizer nada, Craig começa a me empurrar para a porta pela qual o monstro acabou de passar. Quando passo, fecho os olhos imediatamente; tem algo muito brilhante aqui. Penso que Craig fez o mesmo porque minha cadeira para de se mover.

– Ah, eu sempre me esqueço disso. Perdoem-me.

A voz dessa pessoa é gelada. Sério. Ouvi-la falando me faz ficar com frio, mas um frio bom, aconchegante.

– Pronto. Podem abrir os olhos agora.

Assim o faço. A dona dessa voz é uma moça alta de pele muito branca, quase tanto quanto o vestido que ela usa. Seus olhos azuis ainda lhe dão um contraste terrivelmente lindo, mas não são capazes de mudar sua cara de fantasma.

Meus olhos conseguem se desviar dela depois de algum tempo e se focam no garoto sentado ao seu lado, ofegante e assustado. Ele tem cabelos negros com os lados raspados e a ponta espetada para a frente, pele bronzeada e olhos escuros. Já vi ele antes... Quem é mesmo?

– Está tudo bem agora, senhor Lewis. Está livre para completar sua missão.

O garoto ainda a encara por um momento, e então dá um pulo, pega um celular do chão e corre para a porta atrás da mulher.

Lewis... Lembrei! Trevor Lewis era o melhor amigo do Chase. Ele já foi lá em casa algumas vezes com Chase e seu deu bem com Liz, Hailey e eu. Bem, todo mundo se dá bem com Liz, mas eu e Hailey sempre fomos mais difíceis de sermos cativadas. Trevor era mesmo muito legal. Nunca pensei que alguém conseguiria superá-lo, mas então Dustin chegou e Hailey pôde se divertir mesmo depois de ter terminado com Chase. Sei que ela se divertiu porque isso estava estampado em seus olhos, mesmo que a expressão continuasse a mesma. Estar perto dele dava outro astral à Hailey. Se eu não fosse tão superprotetora...

Espera, no que estou pensando? Isso não é importante agora. O importante é que Trevor acabou de entrar no quarto de Liz.

– Que missão é essa? Esse quarto é da minha irmã! – Exclamo.

– Eu vou atrás dele – diz Craig.

Porém a moça de branco levanta apenas um dedo e ele para imediatamente.

– Está tudo bem, jovens. Foi Hailey quem o mandou até aqui.

Hailey?

– Como você sabe disso?

– Oh, não acredito. Hailey não falou de sua chefa para você?

Ah, é claro que falou. Sua chefa poderosa que deixa ela e os outros com medo com um simples olhar, Lady Crystal – L.C, Mackenzie, nem sei mais.

–... Lady Crystal?

Ela assente com um sorriso. Craig olha para mim.

– Conhece ela?

– Temos contatos em comum – diz Lady Crystal, sem tirar os olhos de mim. – Você é Sophie, não? Estava ansiosa para te conhecer. – Ela baixa o olhar. –Lamento muito pelas pernas.

Quase olho para baixo também, mas me lembro de que minhas pernas estão descobertas e torno a encarar a mulher.

– Tá, esquece isso. O que Trevor foi fazer no quarto de Liz e por que eu não posso entrar?

– Tenha calma, minha cara Sophie. Você já sabe tudo o que devia saber. Deixe o resto com Liz.

– Mas por quê? Ela só tem dez anos.

Craig volta para meu lado e se inclina para falar em meu ouvido:

– Quem é ela?

– Ela... Não sei explicar quem ela é – respondo. – E vá por mim, você não quer saber.

– Não mesmo – a moça-fantasma fala. – Humanos devem ficar o mais afastados possível disso tudo. Apenas alguns sabem, e só porque a Luz achou que tinha que contar...

Juro que nunca vi ninguém tão confuso quanto Craig.

– Como disse, não precisa se preocupar com Elizabeth – Lady Crystal continua. – E nem com os monstros. Já dei um jeito neles.

Então, ela acena com a cabeça para mim e para Craig se afasta, passando pelo meu lado em meu pé. Não me dou ao trabalho de reclamar. Ao invés disso, vejo que a porta do quarto de Liz ainda está aberta e empurro os pneus da cadeira para sua direção. Craig vê o que estou fazendo e me empurra pelos guidões.

Paramos a frente da porta e posso ver Liz, sentada e com o celular de Trevor na mão. Ela parece bem, mas seu olhar... Não é o mesmo olhar da irmã. Não é o mesmo olhar de nenhuma criança.

Liz me vê, sorri para mim – também não é o seu sorriso – e a porta se fecha.

. . .

– Pode nos dizer o que está planejando? – Dustin pergunta.

Balanço a cabeça, negando.

– Só tranquem a porta, por favor.

– Tranquei assim que chegamos – o Água diz. – Estou falando sério, Hailey. Precisamos saber.

Eu sei que tenho que contar, mas nem eu mesma consegui aceitar essa ideia ainda. Sentada numa cama do quarto dos garotos, no hotel, continuo passando os olhos pela lista de amigos de Dustin no Facebook. Ele já me disse que eu posso simplesmente colocar o nome na guia de busca, mas se eu fizer isso e não aparecer nenhum resultado, ficarei ainda mais nervosa. Não perguntei se Dustin tem essa pessoa em sua lista pelo mesmo motivo. Não quero nada que possa me dizer “não” agora.

Então, eu encontro o nome procurado: Trevor Lewis.

– Você é amigo dele – murmuro.

Dustin vê o nome por cima de meu ombro.

– Trevor? Não o conheço, mas naquele dia estava adicionando todos de nossa escola que consegui encontrar. Quem ele é?

– Ele era o melhor amigo de Chase – respondo enquanto abro a janela de chat. – Conheço quase todos os amigos de Chase, mas Trevor foi o único que conheceu minhas irmãs também. Na verdade, ele foi um dos únicos humanos que conheceram minha família através de mim. Ninguém da minha turma jamais se aproximou de verdade de Liz e Sophie.

– E o que você quer com ele? – Sohan questiona.

Respiro fundo e aciono o teclado do celular.

– Sinceramente, eu não quero nada.

– Então o que está fazendo? – Indaga Michele.

Não respondo. Paco vem se sentar de pernas cruzadas ao meu lado e ergue a cabeça para ver o que estou escrevendo. O empurro para o lado.

– Qual é, Luz. A gente vai ter que saber de um jeito ou de outro – ele fala.

– Eu sei. Mas será que pode esperar cinco minutos?

O Fogo bufa e vai se sentar na outra cama. Dou uma olhada nos outros antes de voltar à conversa.

“Trevor? Aqui é Hailey”.

A mensagem aparece como visualizada. Segundos depois, Trevor me responde:

“Hailey? Por que está usando o perfil desse cara?”

“É um amigo meu. Me emprestou o celular para eu falar com você.”

Trevor lê a mensagem e tenho que esperar mais um pouco por sua resposta.

“Ah... Olha, eu soube de Chase. Sinto muito mesmo.”

Droga. Temia que ele fosse tocar nesse assunto. Não quero pensar nisso agora. Não dá.

“Eu também. Mas não quero falar disso agora. Você pode me fazer um favor enorme?”

”Depende. O que é?”

“Preciso que leve seu celular até Liz, no hospital, e que deixe-a usar seu Facebook pra eu falar com ela.”

“Por que você não pode ir até lá?”

“Eu... Não estou na cidade. É uma longa história. Trevor, eu preciso falar com ela imediatamente. Por favor.”

Dessa vez, sua pausa é maior.

“... Isso está muito estranho, Hailey. Mas Chase faria isso mesmo que você dissesse que está presa e que precisa de alguém para pagar sua fiança, então farei isso em nome dele. E além do mais, você é minha amiga também.

Dou um sorriso involuntário.

“Muito obrigada.”

“Estou indo pra lá. Te mando uma mensagem assim que chegar.”

A bolinha verde ao lado de seu nome logo desaparece. Eu não pensei que conseguiria convencê-lo tão rápido. Solto um longo suspiro e recosto minhas costas na parede.

– Deu certo – digo.

– Legal. O que deu certo? – Dustin pergunta, impaciente.

Deixo o celular na cama e conto a eles o meu plano. Explico que quero despertar a consciência de Elena em Liz para que ela me conte tudo o que sabe sobre nós e Mackenzie.

Dustin e Paco ficam chocados. Nem preciso perguntar. Eu também ficaria assim se alguém me dissesse que quer correr o risco de acabar com a consciência de uma criança para deixar uma senhora de mais de cem anos dominá-la.

Michele e Sohan, por outro lado, não parecem muito afetados com a informação. Não posso culpá-los. Eles não tiveram tempo para ter contato com as minhas irmãs da mesma forma que Dustin e Paco. Contudo, eles ainda assim parecem preocupados, e os agradeço mentalmente por essa consideração.

– Tem noção dos riscos que estará correndo se Elena for mesmo despertada? – Pergunta Sohan.

– Totalmente. Mas ela pode ser nossa única saída para descobrir o que houve naquele século.

– Ainda acho isso uma loucura – Michele diz. – Como você pode ter certeza de que Elena está em Liz? E se aquele sonho tiver sido só sua imaginação?

– Não foi. Aquilo foi muito real, e explica todas as atitudes estranhas de Liz, inclusive a que você e Sohan viram.

– Ainda assim... – Murmura Paco. – Podemos perder Liz.

Ficamos todos em silêncio. Paco acabou de dizer toda a minha preocupação em relação a esse plano numa só frase. Liz pode perder a própria consciência e se tornar um corpo de criança sob o comando de uma mulher, e eu não teria como explicar mais essa história à Sophie e nem como me perdoar por isso. Ainda não acredito que estou levando isso para frente. O mais estranho é que sinto uma pequena parte de mim desejando falar com Elena. Tento reprimi-la porque tenho uma pequena suspeita de que não seja realmente uma parte minha.

– Qual é, foguinho, até você? Fiquem calmos – diz Dustin, olhando diretamente para mim com um sorriso extenso no rosto. – Liz vai ficar bem. É uma garota forte.

Sorrio. Não é um sorriso tão grande quanto o dele, mas Dustin responde com um aceno de cabeça.

– Deve ser mesmo – concorda Michele, que também tem um pequeno sorriso no rosto agora. – Liz deve ser bem especial para nós estarmos tão preocupados com ela.

– Até eu estou preocupado – Sohan admite. – E olha que nunca vi ela acordada.

– Ela é divertida – Paco fala. – E bem cativante, do tipo que faz qualquer pessoa querer passar um tempo com ela. Foi a primeira vez que senti algo assim com um humano. É diferente de Sophie.

Dustin dá um tapa na cabeça do menino e eu estranho essa reação. É claro que Sophie e Liz são diferentes. Sophie sempre foi mais madura e só ficou ainda mais adulta depois que nossos pais morreram e ela passou a cuidar de nós. O comentário de Paco foi perfeitamente normal. Então, porque Dustin teve uma reação dessas?

Olho para ele com a testa franzida e o australiano arregala os olhos.

– O que foi, Água?

– Bem, é que, bem... – Ele fecha os olhos, balança a cabeça e suspira. –Tá, eu falo. Sinto uma coisa estranha em Sophie desde que a conheci e falei sobre isso com Paco. Não é nada sobrenatural como o que a Terra e o Vento viram em Liz no hospital, é mais sobre a vibração de Sophie mesmo. Entendo que ela despertou o lado materno mais cedo pra cuidar de você e de Liz e que ela se esforça tanto que pode ter perdido o lado espontâneo e divertido... Sem querer ofender... Mas eu senti alguma coisa de errado nela. Como se ela fizesse isso não só para preencher o lugar de seus pais, mas para pagar alguma dívida que tem com vocês. Sabe de alguma coisa que possa explicar isso.

Faço que não com a cabeça. Nunca notei nada de estranho nela. A atitude de Sophie sempre foi bem justificada na minha cabeça. Eu e Liz ficamos tristes, e ela também, mas Sophie tinha que elevar sua responsabilidade de irmã mais velha. Para mim, isso sempre explicou sua maturidade e seriedade. Só que agora Dustin abriu uma nova caixinha de dúvidas.

Um bipe soa do celular e eu o pego na hora. Um ícone aparece na tela e clico nele para ler a mensagem.

“Hailey, você não vai acreditar. Aquelas coisas que atacaram nossa escola estão aqui!”

Me assusto com a mensagem e a leio de novo, dessa vez em voz alta. Meus irmãos chegam mais perto para podermos ler juntos a conversa juntos. Mando como resposta:

“O quê? Explique isso direito. O que aconteceu quando você chegou aí?”

“Eu estava tentando convencer a recepcionista que tinha que levar uma mensagem sua à Liz, mas ela não me deixava entrar porque não sou da família. Aí a porta do hospital quebrou, essas coisas entraram e eu corri pra me esconder.”

“Trevor, sei que é assustador e sinto muito por isso, mas preciso que você passe esse celular para Liz. Encontre-a, por favor.”

“Não posso!”

“Pode, sim!”

A mensagem é enviada e o celular sinaliza que Trevor recebeu, mas não que foi lida. Mostro para Dustin.

– Isso é normal?

Ele dá de ombros.

– Sempre aparece um sinal quando o outro lê a mensagem. E Trevor devia estar com o celular na mão e o chat aberto, então...

Solto um suspiro pesado.

– Droga – murmuro. – Vai acontecer de novo.

– O que...? Não, Hay, não pense nisso – Dustin se apressa em dizer. – Trevor não vai morrer e o episódio de Chase não vai se repetir, nem com ele e nem com ninguém.

– Ficar pensando nisso não vai ajudar em nada – Michele diz. – Pense positivo. Ele vai se safar dessa.

Ela abre um sorriso e os outros a seguem. Sorrio também. Sou grata por eles fazerem isso, mas não dá pra simplesmente deixar de pensar em Trevor e no que pode acontecer com ele. E se...

Não. Pare aí mesmo, Hailey. Meus irmãos estão aqui, sendo fortes para me apoiar, então eu devia parar de choramingar e retribuir a isso e ao título de irmã mais velha dos Sábios. Sou a líder, caramba. Tenho que agir como tal.

O celular apita de novo e todos olhamos para ele. Abro a mensagem de Trevor.

“Isso é muito estranho, Hailey. Eu tô vivo. Tô vivo!”

“O que aconteceu?”

“Uma mulher de branco, que parece um fantasma, apareceu do nada e matou todas aquelas coisas. Depois disse que eu estava livre pra completar minha missão. Muito doido. Mas eu tô aqui, com a Liz. Vou passar o celular pra ela.”

Eu mando uma mensagem o agradecendo, mas ainda é muita coisa na minha cabeça. Monstros atacaram o hospital, ok. Aí Mackenzie, a mulher de branco que parece um fantasma – não tenho dúvidas de que é ela – apareceu, matou os monstros e deu passagem para Trevor. Lembro-me do que ela disse antes de desaparecer na igreja: “Se me derem licença, tenho algo realmente importante para fazer”. Ela já sabia que isso tudo ia acontecer?

Outra mensagem aparece no chat, e a pessoa nem precisa se identificar para eu saber quem é.

“Hailey! Você está bem? E os outros? Já acabou sua missão? Vai voltar pra casa?

”Oi, Liz. Desculpe, não posso te responder agora.”

“Por que não?”

Escrevo a mensagem e paro o dedo em cima do botão de enviar. Murmuro um pedido de perdão à Liz e tenho absoluta certeza de que os outros ouviram, pois ouço suspiros e resmungos atrás de mim. Sei que eles são contra isso e eu também sou, mas o que mais podemos fazer? Como líder, essa é com certeza a decisão mais difícil que já tive que tomar, e acredito que seja exatamente isso o que me garante esse título.

“Preciso de você, Elena.”

A mensagem é lida. Fico nervosa com a demora para receber minha resposta, sem saber se consegui o que pretendia ou se Liz está estranhando o que disse. Então, outra mensagem chega:

“Não sabe quanto tempo esperei por isso, Johanna. O que minha irmã está precisando?”


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Notas finais do capítulo

Até o próximo!



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