Fique Comigo escrita por naanyfaria


Capítulo 5
Amassado como um papel




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Eu – após tanto tempo – estava sonhando novamente. Não o meu sonho lindo e irreal, era outro. Nesse meu sonho eu me via em um lugar claro, muito claro. Tinha uma árvore no centro, e perto dela, havia uma pessoa encostada. Fixava o olhar para poder ver quem era, mas eu não conseguia decifrar. Decidia me aproximar, mas, quando eu fazia isso, a pessoa sumia e eu caia de joelhos e em lágrimas. Eu a queria perto de mim.

            Abri os olhos e fechei novamente pela claridade – igual a do sonho -. Tentei fazer meus olhos se acostumarem com ela e fui abrindo-os devagar. O teto era branco e com lâmpadas compridas. Olhei em volta pra ver se encontrava alguém, e então percebi que estava em um hospital. Cortinas brancas, paredes e teto branco. Tudo bem iluminado. Não havia ninguém no quarto. Sentia pontadas e irritações em minhas mãos, eu sabia que eram agulhas. Não demorou muito e apaguei novamente por causa delas.

            Ouvia vozes na minha cabeça, de primeiro pensei que fosse mesmo da minha cabeça, sonho ou coisa assim, mas não era. Dessa vez havia pessoas no quarto. Abri os olhos e tentei localizar os donos das vozes que eu escutava.

            - Não, Katy. Não se mova. – uma voz calma pediu.

            - O q-que...

            - Está tudo bem, Katy. Você desmaiou no parque... – era a voz da Kimi. Eu tinha certeza. Ela pegou minha mão – Tia! – ela gritou na direção da porta. Minha cabeça doeu.

            Agora eu me lembrava do que tinha acontecido. Roy... Roy tinha sido atropelado. E eu... Desmaiei por isso¿

            - R-R-Roy. – eu não consegui deixar de gaguejar. – Onde ele está¿ Roy! – eu entrei em desespero.

            - Katy, amiga, calma. – ela segurou mais forte a minha mão. – Tia! –ela gritou novamente na direção da porta.

            - N-Não. Roy. Cadê o Roy¿ Ele foi... atropelado... Ele está bem Kimi¿ - eu não conseguia me acalmar, ela estava evitando minha pergunta. Só podia ter acontecido algo grave. – Kimi! – eu gritei. Minha cabeça parecia querer explodir.

            - Filha! – minha mãe disse ao entrar na sala. – Ô meu Deus, Katy...

            - Mãe. – eu sussurrei. Kimi soltou minha mão e se afastou.

            - Você está bem¿ Algo dói¿

            - Não. – menti - O Roy. Onde ele está¿Me responde.

            - Filha, ele foi atropelado.

            - Eu sei disso, eu vi... Por isso estou aqui, eu acredito...

            - Filha, ele está internado.

            - O que¿ É. Deve estar. Espera ai, ele não está bem¿ É isso¿ É grave o estado dele¿ Mãe! Por favor... – nas minhas últimas palavras eu já não tinha tanto fôlego e as lágrimas escorreram no meu rosto.

            - Katy, ele está em coma... – ela acariciou meu rosto, como se quisesse me acalmar fazendo isso.

            - Que¿ Está o que¿ Mãe... Não... – o ar sumia.

            - Amor, fica calma. Katy. – ela me segurava com toda força que tinha.

            - Não! Não! – eu gritava enquanto me debatia contra a minha mãe. Meu braço ardeu no momento em que bati a mão nas agulhas. Pude sentir – sem saber como exatamente – o cheiro do sangue junto com o ardor da minha mão.

            Não tinha percebido, mas alguém havia entrado no quarto e agora estava do meu lado. Segundos depois minha vista ficou embaçada e eu apaguei. Estava novamente sedada.

            O tempo exato que fiquei dormindo sedada eu não sabia, mas parecia que havia sido bastante. Pessoas conversavam novamente por perto. Reconheci a voz da minha mãe e do meu pai. Não ouvi a da Kimi, então deduzi que já não estava mais ali. Um homem conversava com o meu pai, e uma mulher consolava minha mãe. Só podia ser isso. Eu não reconhecia a voz da mulher, mas me parecia familiar. Abri meus olhos – agora já acostumados com a claridade – e tentei me sentar. Um gemido saiu da minha boca e minha mãe escutou.

            - Não Katy.

            - Eu não vou dar problema, quero sentar só. – quando levantei o rosto vi quem era a mulher que conversava com a minha mãe. Era a tia Claudia.

            - Meu bem... – ela disse e veio me abraçar. – Você está bem¿

            - Minha cabeça dói um pouco tia... Não devia doer, eu só desmaiei.

            - Você bateu a cabeça, filha. Quando você desmaiou bateu a cabeça em uma pedra. Não fez todos os exames pra ver se deu alguma coisa...

            - Bati a cabeça¿ - eu não me lembrava disso. – O que mais aconteceu mãe¿ O Roy... Como ele entrou em... coma. – novamente lágrimas caíram dos meus olhos. Era obvio como aconteceu, mas eu queria detalhes.

            - A batida foi bem forte. O carro estava em alta velocidade. Ele foi jogado com força e caiu de cabeça. Quebrou uma perna e teve mais alguns machucados, além de entrar em coma. – ela levemente balançou a cabeça e colocou a mão na boca.

            - Pedro está apavorado... Acabado. – minha tia disse acariciando a minha mão, com um sorriso de dor nos lábios.

            Meu coração estava muito dolorido. Estava apertado.

            - E o Nick¿ - perguntei, me lembrando que ele estava junto.

            - Ele está muito abalado e apavorado também, ele diz que a culpa de você e Roy estarem aqui é dele...

            - E é! – eu a interrompi gritando.

            - Filha. O que é isso¿ Nick está sofrendo.

            - É culpa dele. Se ele não tivesse... – eu engasguei. – Eu não acredito... Roy...

            - Se ele não tivesse o que¿ Katy, o que houve antes do Roy ser atropelado¿ Por que você considera tudo culpa do Nick¿ - minha tia cuspiu as perguntas pra mim.

            Ela me ajudou a sentar assim que percebeu minha tentativa. Disse a elas sobre a discussão de Nick e Roy antes do acidente e também o soco de Nick no Roy. Elas disseram ser aquilo que todos estavam dizendo: rivalidade. Apenas rivalidade. Coisa de criança, coisa infantil deles dois, e nisso eu concordava com elas. Elas disseram que Nick não é perfeito e adulto o bastante para pensar nas conseqüências, ou seja, elas não queriam culpar ele de maneira nenhuma.

            Pedi milhares de vezes para ir ver o Roy, mas todas as tentativas foram sem sucesso. Fernanda não queria que eu movesse nem se quer um dedo até que o médico falasse pessoalmente que eu já poderia fazer isso. Era bizarro. Tinha uma TV no quarto, mas preferi dormir a assistir. Não estava com ânimo pra isso.

            Sonhei novamente, e dessa vez, foi muito dolorido. No meu sonho eu estava ajoelhada perto de um corpo – que no começo eu não sabia de quem era – e eu chorava feita louca. Minhas lágrimas caiam no rosto da pessoa quase morta que estava jogada no chão ao meu lado. Era uma dor forte, meu coração parecia estar sendo amassado como um papel na mão de alguém. Uma dor forte e emocional. Pensava que seria a dor de ter ou ver a morte de alguém querido – afinal, ela me lembrava àquela dor pela perda do vovô, apenas lembrava, não chegava a ser igual, eu era grata por isso até – mas, dessa vez eu não sabia quem eu estava perdendo pra sempre. Até que minhas lágrimas secaram como em um passe de mágica, e assim, eu pude ver a pessoa deitada aos meus pés. Era o Roy.

             Acordei apavorada. Lágrimas reais escorriam pelo meu rosto. Minhas mãos estavam agarradas fortemente ao lençol da cama hospitalar e minha respiração era irregular. Que dor, que pavor, que medo... Que angustia. Respirei fundo e fui deitando devagar, precisava me controlar. Minhas mãos soltaram o lençol e minha respiração voltou ao normal, só um pouco irregular, mas nada demais.

            - Katy¿ - uma pessoa perguntou. Eu não havia percebido sua chegada de tamanha era a minha concentração para me controlar. – Você está bem¿

            Quando a pessoa falou pela segunda vez, não tive dúvidas, eu sabia quem era. Precisava abrir os olhos e conferir para poder acreditar.

            - Nick¿ - perguntei incrédula.

            - Por favor, pelo bem da sua saúde, apenas me escute, não se exalte. – ele pediu carinhosamente. Eu precisava apenas escutar até que ele acabasse e me desse à vez para que eu pudesse acabar com ele. Balancei a cabeça concordando. – Katy, eu não tive culpa. Ou pelo menos não queria ter. Bati no Roy porque ele me provocou... Arrependo-me por isso agora, mas, sei que não tive culpa de tudo. Mesmo assim, sinto que tive parte nisso de algum modo. Estou confuso. É estranho e apavorante saber que mesmo não querendo você teve algum tipo de culpa em algo tão doloroso. Kay me perdoe.

            - Não me chame de Kay... Nickey Kintsu. – as lágrimas caíram do meu rosto ao pronunciar seu nome por completo, mesmo sendo difícil de pronunciar certo o sobrenome japonês herdado de seu pai. Eu abaixei a cabeça e senti que era a minha vez. – Ele me conheceu em apenas 24 horas, e mesmo com pouco tempo ele já era meu amigo... verdadeiro. Ele não queria mentir pra mim, eu sei disso, ele queria ser transparente, até mesmo me contar a razão da sua rivalidade com os amigos dele, mas, você, foi você quem não o deixou ser sincero comigo. Roy... me ama de verdade. Você o machucou porque ele estava sendo honesto comigo, coisa que você – eu levantei a cabeça e olhei nos seus olhos cor-de-mel que agora estavam profundamente dolorosos – não estava sendo. Droga, qual é esse segredo¿ É tão importante assim que custa uma amizade como a nossa, Nick¿ É¿ Por favor, só me responda isso. E-e-eu te amo Nick, sempre amei, não vou deixar de amar nunca. E, se for o caso, de ter que perder uma amizade, como a nossa apenas pra ganhar um segredo desses, eu prefiro morrer de curiosidade. Só que preferiria também que esse segredo não interferisse em minhas outras amizades. E...

            - Chega Katy. – eu o olhei e vi lágrimas transbordarem dos seus olhos. – Eu... Eu também te amo. E já vi que você o ama muito, mesmo que não tenha percebido. Perdoe-me...

            Ele saiu e bateu a porta do quarto. Fiquei parada, não conseguia pensar direito. As lágrimas caindo dos olhos de Nick me fizeram sentir arrependimento por dizer tudo que eu tinha dito. Eu não me lembrava exatamente de cada uma, mas algumas haviam sido marcadas. Nickey Kintsu perdoe-me. Soltei o meu corpo, respirei fundo, consegui – depois de tanto tempo tentando – conter as lágrimas e fechei fortemente os olhos. Tentei não pensar em nada, para que eu não sonhasse com nada também. Não adiantou. Eu sonhei novamente com o último sonho – aquele que eu via Roy quase morto – só que agora havia mais de um motivo para eu chorar desesperadamente. Roy e Nick eram os dois dolorosos motivos.

            Ouvi a porta se abrir e as rodas do carrinho se aproximar. Não abri os olhos. Apenas ouvi.

            - Ela vai ter alta quando, enfermeira¿

            - Não sei te informar com certeza, mas, pela diminuição de doses de alguns remédios e retiradas de outros, creio que logo. A pancada na cabeça foi forte, mesmo os exames não dando nada e bom ficar em observação, além do mais a dor não foi contida.

            - O.K. Mas, hoje já é quarta... – pude ouvir os suspiros e o choro da minha mãe, tudo ao mesmo tempo.

            - Acalma-se. Ela está fora de perigo, Senhora, mas, precisa de observação.

            - E-eu sei, eu sei. Mas, é difícil. Katylin nunca ficou em um hospital por tanto tempo. Me apavora vê-la aqui... Sua preocupação com o Roy... Tudo.

            A enfermeira suspirou.

            - Nunca teve uma explicação. – ela pausou, creio que como eu minha mãe não tenha entendido e, por sua expressão, a enfermeira tenha percebido – O amor de adolescentes. Nunca teve uma explicação lógica. Nunca.

            Minha mãe não disse mais nada, se levantou e saiu. A enfermeira começou a mexer no meu soro. Forcei mais ainda minhas pálpebras, não queria ver as agulhas novamente. As palavras da enfermeira rodavam na minha cabeça. Amor. Explicação. Lógica. Essas palavras não entravam em acordo. Não tinham a ver com minha preocupação com Roy, ou tinham¿

            Esperei a enfermeira sair do quarto para então abrir os olhos. Já com mais facilidade, eu consegui sentar na cama. Olhei em volta do quarto todo branco e suspirei. Eu ainda estava abalada por causa da conversa com o Nick, se é que foi uma conversa. O que mais havia feito nas últimas 24 horas foi ter chorado, então, quando isso me acontecia, eu já nem percebia. Nick estava mal, e eu tinha culpa nisso. Ele também tinha culpa em tantas outras coisas piores. Ou pelo menos eu ainda achava que ele tinha. Queria que ele me perdoasse, mas, eu não podia negar o culpado de tudo. Era impossível não ver isso.

            Balancei a cabeça negando meus pensamentos, não queria perder o Nick. Caso o Roy ficasse bem, eu iria perdoá-lo e ele iria me perdoar. Era uma troca de perdões. Nick teria que aceitar desse modo.

             Alguém bateu na porta e depois a abriu devagar. Era a Gi, minha amiga. Eu sorri pra ela e ela correu pra me abraçar. Atrás dela eu não havia percebido, mas tinha mais duas pessoas. Luck e a Kimi.

            - Caramba! – ela estava chorando junto comigo. – Eu fiquei tão preocupada, Katy!

            - Amiga. – eu sussurrei.

            - Algo está doendo¿ - eu sabia que teria que responder essa mesma pergunta mais algumas vezes.

            - Não. – seria sempre a mesma resposta. – Eu estou bem Gi.

            - Nossa. Eu nem gosto de hospital, mas... – Ela abaixou a cabeça. – Eu tinha que vir falar com você.

            Kimi se aproximou, soltando sua mão da do Luck e o deixando sozinho na porta.

            - Oi de novo amiga.

            - Oi Kimi. – eu sorri pra ela e me virei de novo pra Gi, eu estava curiosa. – Falar o que amiga¿

            - A gente falou com o Nick. – agora eu já não tinha tanta curiosidade – Sei que está com raiva dele Katy, mas, tipo, ele não fez por maldade. Katylin ele apenas estava tentando te proteger.

            - O que¿

            - Luck. – ela abaixou a cabeça ao chamar o menino alto e moreno parado na porta.

            - Oi Katy. – eu apenas balancei a cabeça e esperei que ele começasse afinal eu já havia entendido que ele era quem responderia minha pergunta. – O Nick estava apenas te protegendo, porque, ao contrário do que você pensa, os amigos do Roy não são lá grande coisa. Não precisa ficar nervosa com o Nick, é que ele apenas não pode te contar nada. Agora. Katy, Nick já foi amigo daqueles caras, muito antes do tal de Roy. Ele sabe o que esses caras são, Roy também sabe. Só que nenhum deles pode contar nada sobre isso. Roy fez um teatro na manhã do acontecido. Ele queria fazer você pensar que Nick era quem não estava sendo sincero. Nick apenas te protegeu da verdade. Os amigos do Roy acreditariam nele quando ele dissesse que não foi ele quem quebrou o pacto, e sim o Nick. Então, ele começou a provocar o Nick, para que ele dissesse algo. Roy queria te afastar dele! Katy, Nick está... sofrendo. Você sabe disso.

            Eu não conseguia respirar. Podia ouvir as batidas irregulares do meu coração. O que era tudo aquilo¿ Era tudo verdade¿ Roy estava querendo me afastar do Nick¿ O que estava havendo¿ Eu já não entendia mais nada.

            Kimi veio em minha direção.

            - Katy...

            - Não. Não. – coloquei minha cabeça em minhas mãos, como se em qualquer momento ela pudesse cair e precisasse de apoio – Deixem-me sozinha. Eu... Eu preciso pensar.

            - Katy, presta atenção, o Nick não sabe que a gente veio falar com você. Ele nem se quer aprovaria isso. Só queremos ajudar os dois. Não estou envenenando sua cabeça contra o Roy, apenas estou dizendo a verdade. Não sabemos o que Roy e Nick estão escondendo, mas sabemos que os dois sabem e que se abrirem o bico se prejudicarão, é importante o silêncio deles. Nem devíamos estar te enchendo o saco já que bateu a cabeça e está em um hospital, mas, Nick estava te protegendo e protegendo a si próprio... Katy entenda-o, ele não...

            - Cala a boca! – eu gritei desesperada – Saiam! Agora! Sai!

            - Katy, por favor... – a Gi falou quase chorando. Eu a ignorei.

            - Vamos. – Kimi disse puxando o Luck e a Gi, ela me conhecia e sabia que eu precisava de um tempo.

            Minha cabeça já não funcionava mais. De uns tempos, na verdade alguns dias, pra cá minha cabeça se enchia de perguntas. Perguntas essas que nunca recebiam respostas. Era apavorante. Eu precisava relaxar e descansar. Descansar principalmente minha cabeça. O que seria muito difícil, eu passava agora por acontecimentos que precisavam ser explicados. Eu tinha que agüentar.

            Levantei e retirei a agulha do meu pulso sem olhar. Senti um ardor, mas nem prestei atenção. Eu estava focada agora no meu objetivo. Eu iria ver Roy.

            Tomei muito cuidado para não encontrar com ninguém. Fui à recepção. Uma loira, alta e magra, estava no balcão desse andar. Ela me olhava desconfiada, mas mesmo assim respondeu minha pergunta e me mostrou onde ficava o quarto de Roy Steban. Andei rapidamente na direção que a mulher loira havia me indicado. Minha mão estava, com certeza, sangrando, eu podia sentir o sangue pingando. Quando cheguei à porta do quarto pude sentir também meu coração acelerar. Era como se eu estivesse apavorada, e creio que estava com certeza, eu estava. Respirei fundo e entrei. A sensação era horrível ao ver aquilo, senti minhas pernas tremerem e me segurei na maçaneta da porta. 

 


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Notas finais do capítulo

REWIEWS? please,